Acórdão nº 1158/14.7TBPVZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelFILIPE CARO
Data da Resolução20 de Abril de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 1158/14.7TBPVZ.P1 – 3ª Secção (apelação) Comarca do Porto - Juízo de Família e Menores de Vila do Conde Relator Filipe Caroço Adj. Desemb. Judite Pires Adj. Desemb. Aristides de Almeida Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.

B…, residente na Rua …, nº .., …, Póvoa de Varzim, instaurou ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge contra C…, residente na Rua …, …, Matosinhos, invocando a rutura definitiva do casamento, com base na separação de facto do casal, nos termos da alínea a) do art.º 1781º do Código Civil, com as alterações introduzidas pela Lei nº 61/2008, de 31 de outubro.

Citada, a R. contestou a ação e deduziu reconvenção.

Quanto àquela, impugnou parcialmente os factos, mas nada opôs a que o divórcio seja decretado.

Em sede de reconvenção, alinhou um conjunto de factos tendente a sustentar a sua dependência económica na pendência da vida em comum e depois dela, para defender o alegado direito a receber alimentos do demandante, quer na pendência da ação, quer posteriormente, com o seguinte pedido: «(…) - Deve ser julgado procedente, por provado, o pedido de alimentos, condenando-se o A. a pagar à R., a esse título, a quantia mensal de eur. 1.260,00€, a prestar, por transferência bancária, até ao dia 5 do mês a que respeite, e sendo a quantia actualizada anualmente, com base no índice de inflação publicado pelo Instituto Nacional de Estatística em relação ao ano anterior ao da actualização.

- Deve, igualmente, ser julgado procedente, por provado, o pedido de alimentos provisórios, fixando-os na importância de eur. 650,00€, a prestar pela mesma forma e no mesmo tempo.

» (sic) Em resposta, o A. defendeu a improcedência do pedido reconvencional, por ser de negar o direito que a reconvinte invocou.

Foi elaborado despacho saneador tabelar, identificou-se o objeto do processo e definiram-se dos temas de prova.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença fundamentada, com o dispositivo que se segue, ipsis verbis: «Assim e nestes termos, de harmonia com o disposto nos artºs 1781º, 1773º, 1781º, nº 1, al. a) e 1782º do Código Civil, na redacção da Lei 61/2008, de 30.10, decido: A)-Decretar o divórcio entre Autor e Ré e a consequente dissolução do seu casamento.

B)- Absolver o Autor da totalidade do pedido reconvencional apresentado pela Ré Reconvinte.

Custas a cargo do autor, dado que está a exercer o direito potestativo do divórcio, nos termos do artº 535º nº 2 al. a) do C.P.C. e da Ré reconvinte relativamente ao pedido reconvencional efectuado.

Fixo em € 30.000,01 o valor da acção para efeitos de custas.

Registe e notifique e oportunamente cumpra-se o artº. 78º do C.R.Civil.

» Inconformada, recorreu a R. alegando com as seguintes CONCLUSÕES: «1ª – Conforme os elementos de prova que os autos oferecem, mormente o depoimento de parte prestado em audiência e os depoimentos das testemunhas invocadas, deve: A - Ter-se como provado que: - A ré esteve sempre colocada na dependência económica de seu marido; - Assoberbada também com a organização e trabalho doméstico; - A ré nunca recebeu, efectivamente, qualquer salário da D…; - A ré tem vindo a angariar trabalhos esporádicos em tarefas de serviço doméstico, auferindo reduzida retribuição.

- Além das alinhadas no facto provado nº 49, que a ré despende mensalmente, em média, em alimentação, eur. 400,00€, em vestuário e calçado, eur. 150,00€ e em combustível e manutenção de automóvel, eur. 100,00€.

  1. – Com base nos mesmos elementos, deve o facto provado nº 30 ser alterado de forma a ficar formulado “para o que contava, por vezes, com ajuda de mulheres-a-dias”.

  2. – Ainda com base nos mesmos elementos de prova e na decorrência das alterações requeridas deve, evitando contradição, deve ter-se como não provado o facto assente sob o nº 43,.

  3. – O depoimento de parte é forma de confissão judicial e foi prestado de forma espontânea e inequívoca, pelo que deve bastar-se como suficiente no sentido da demonstração dos factos em causa.

  4. - Os depoimentos das testemunhas que invocamos foram prestados denotando interesse pelo esclarecimento da verdade, produzidos em condições de merecerem credibilidade.

  5. – A reforma introduzida pelo Decreto-Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro, manteve inalterado o preceito do art. 2009º do mesmo diploma, pelo que o ex-cônjuge permanece obrigado a prestar alimentos.

  6. - A conjugar esta obrigação subsistente com a alteração legislativa, que prevê que cada cônjuge deverá prover à sua subsistência, depois do divórcio.

  7. - Nunca, porém, no sentido de que, pura e simplesmente, o dever de prestar alimentos cessa com o divórcio.

  8. - A conjugação das duas normas há-de ser feita, como se diz no douto acórdão Desse Tribunal, de 27 de Outubro de 2016, proc. nº 1412/14.8T8VNG.P1 – “nas condições previstas no subsequente art. 2016º-A, pode um dos ex-cônjuges ser obrigado a prestar alimentos a favor do outro, contanto que este demonstre impossibilidade ou grave dificuldade de prover, por si, à sua subsistência.” 10ª - Correspondente ao disposto no art. 2016º-A, nº 1, do Código Civil.

  9. - No que ao nosso caso interessa, a duração do casamento, a idade dos cônjuges, as suas qualificações profissionais e possibilidades de emprego, os seus rendimentos ou proventos e, de modo geral, todas as circunstâncias que influam sobre as necessidades de quem recebe e das possibilidades de quem presta.

  10. - Tendo em vista que o direito a receber alimentos não pressuporá a impossibilidade de prover ao seu sustento, bastando que esteja demonstrada a grande dificuldade.

  11. - A antiguidade do casamento, a prestação voluntária de alimentos e a continuidade de prestação de trabalho na gestão dos bens do casal – facto provado nº 24, mesmo após a separação.

  12. - A ré não tem habilitações técnicas ou académicas que lhe permitam angariar emprego que proporcione rendimentos que não sejam muito reduzidos.

  13. - Com 53 anos de idade, não irá já consegui-las e irá continuar a não conseguir mais do trabalhos esporádicos e incertos, que mais esporádicos e incertos serão no futuro.

  14. - Todas estas circunstâncias, que resultam dos factos dados como provados e daqueles que ora propugnamos como tal sejam declarados, adequam-se à previsão do art. 2016º-A, nº 1, do Código Civil, pelo que sustentam a condenação do autor a pagar alimentos à ré.

  15. - Finalmente e sempre sem conceder, o pedido de alimentos foi formulado na reconvenção, a qual deu entrada em Juízo em 26 de Janeiro de 2015.

  16. - Em plena vigência do casamento e da sociedade conjugal, as razões em que a douta sentença se fundamenta para a denegação do direito a alimentos não têm cobertura legal, uma vez que as disposições dos arts 2016º e 2016º-A valem para depois do divórcio.

  17. - Acrescendo como provado que, durante dez anos após a separação – facto nº 33 - o que corresponde a cerca de dois anos antes da entrada do pedido de alimentos, o autor ter prestado espontaneamente alimentos no montante mensal de eur. 1.300,00€, tal pressupõe a possibilidade de o fazer e o reconhecimento da sua necessidade por parte da autora, durante esse período não existe qualquer impedimento a que os mesmos sejam decretados.

  18. - Os alimentos são devidos desde a propositura da acção – art. 2006º, do Código Civil.

  19. - As resumidas necessidades da ré traduzem-se na média mensal de eur. 904,37€.

  20. - Será razoável a fixação da quantia mensal de eur. 500,00€.

  21. - Mas, até ao decretamento do divórcio, nenhuma razão legal há para que o pedido de alimentos não deva proceder integralmente, em montante até inferior ao que o autor prestou voluntariamente após a separação.

  22. - Verificam-se os pressupostos legais do art. 2004º do Código Civil.

  23. -Nos termos do disposto no art. 662º, nº 1, do Código de Processo Civil, Esse Tribunal pode alterar a decisão acerca da matéria de facto.

  24. - Ao decidir como decidiu, sempre salvo o devido respeito, que é muito, a Meritíssima Juíza a quo não fez a adequada ponderação da prova produzida, no que tange à decisão da matéria de facto, e proferiu decisão violadora das disposições dos arts 356º, 358º, 2004º, 2006º, 2009º, 2016º e 2016º-A do Código Civil.» (sic) Pretende, assim a R., que a sentença seja alterada em sede de matéria de facto e que o A. reconvindo seja condenado a pagar-lhe alimentos no montante mensal de €1.260,00, desde a proposição da ação e até ao trânsito em julgado da sentença que decrete o divórcio, e de €500,00 após esta.

    *Em contra-alegações, o recorrido argumentou que nada se apurou quanto à alegada impossibilidade da R. prover, por si, ao seus sustento, procurando e prestando trabalho e que as testemunhas por ela indicadas referiram que o prestava, apesar de desconhecerem o respetivo rendimento. A decisão em matéria de facto não deve ser alterada e a situação da R. não se enquadra no nível de exigência que o art.º 2016º, nº 1, do Código Civil estabelece para o reconhecimento do direito a alimentos por parte do ex-cônjuge.

    *Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    * II.

    O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões da apelação, acima transcritas, sendo que se apreciam apenas as questões invocadas e relacionadas com o conteúdo do ato recorrido e não sobre matéria nova, excepção feita para o que for do conhecimento oficioso (cf. art.ºs 608º, nº 2, 635º e 639º, do Código de Processo Civil).

    O Tribunal deve apreciar todas as questões decorrentes da lide, mas, embora o possa fazer, não tem que discutir todos os argumentos ou raciocínios das partes, ou seja, apenas deve considerar o que for necessário e suficiente para resolver cada questão[1].

    Para decidir está a questão da pensão de alimentos provisórios e definitivos a favor da R. e a cargo do A., ex-cônjuges; saber se há condições para ser atribuída e, na afirmativa, qual deve ser o seu montante, o que passa também --- atentos os termos da apelação --- pela revisão da decisão em matéria de facto.

    * III.

    É a seguinte a matéria de facto dada como provada na 1ª instância:[2] 1- Autor e Ré contraíram casamento civil, em 27 de Abril...

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