Acórdão nº 6629/11.4IDPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA DEOLINDA DION
Data da Resolução05 de Abril de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

RECURSO PENAL n.º 6629/11.4IDPRT.P1 CONFERÊNCIA 2ªSecção Criminal Relatora: Maria Deolinda Dionísio Adjunto: Jorge Langweg Processo: Instrução n.º 6629/11.4IDPRT Comarca – Porto Matosinhos - Instância Central – 2ª Secção Instrução Criminal-J2 Arguidos B… C…, Lda Recorrente Ministério Público Acordam os Juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto:I – RELATÓRIO

  1. Nos autos que corriam termos nos Serviços do Ministério Público da Comarca do Porto, Póvoa de Varzim – Secção de Processos, sob o n.º 6629/11.4IDPRT, o Ministério Público, por despacho proferido a 26/2/2013, decretou a suspensão provisória do processo por 2 (dois) anos, impondo aos arguidos supra referenciados, a título de injunção, o pagamento integral dos montantes devidos pela arguida sociedade, a título de IVA do último trimestre de 2010, referente a capital, juros de mora e coimas – fls. 308 a 312.

  2. Mediante informação da Autoridade Tributária, entrada em juízo a 6/12/2013, no sentido de que os arguidos nenhuma prestação haviam pago, realizou-se interrogatório ao arguido B…, no dia 16/1/2014, o qual invocou a vontade de cumprir a injunção até ao termo do prazo da suspensão e justificou a falta de pagamento com a sua situação de desemprego que, segundo disse, cessaria em Fevereiro seguinte, sendo, então ordenado que os autos aguardassem até ao final desse mês por nova informação sobre o cumprimento – fls. 337 e segs. e 354 a 358.

  3. Mantendo-se a falta de pagamento, realizou-se novo interrogatório a 23/5/2014 do arguido, a 23/5/2014, que invocou – e comprovou - apenas ter iniciado actividade laboral nesse mês de Maio, já ter pago uma prestação de €306 e feito acordo para pagamento das restantes parcelas – fls. 360 a 372.

  4. No dia 23/9/2014, o arguido B… fez juntar aos autos comprovativos das prestações pagas a 22/5, 2/7 e 6/8/2014, no montante de €306, cada uma – fls. 377 a 380.

  5. No dia 23/3/2015, o mesmo arguido fez chegar aos autos requerimento e vários documentos para explicar a falta de pagamentos ocorrida e a solicitar o prolongamento do prazo de cumprimento da injunção por 6 meses, pretensão que, submetida a apreciação judicial, sem oposição do Ministério Público, mereceu a referência de que nada havia a ordenar por já ter sido fixado o tempo máximo admissível de suspensão do processo – fls. 385 a 394 e 376 (erro de numeração já que devia ser 396.

  6. Por despacho do Ministério Público, de 17/6/2015, foi solicitada nova informação sobre o cumprimento da injunção decretada e obtida informação de que apenas fora paga a quantia de €918, tendo a arguido apresentado requerimento a invocar que a cessação de pagamentos se ficara a dever a razões de saúde do seu cônjuge, mantendo-se ele como única fonte de rendimentos do agregado o que inviabilizara outros pagamentos – fls. 384 a 399 (seguimos a numeração duplicada, pese embora errónea dos autos).

  7. Por despacho datado de 15/7/2015, o Ministério Público declarou o incumprimento culposo da injunção e determinou o prosseguimento dos autos para acusação que veio a ser deduzida a 26/2/2016, pese embora a oposição expressa pelo arguido em requerimento que apresentou a 8/9/2015, e que não foi objecto de apreciação, remetendo-se penas para o teor do despacho anteriormente proferido – fls. 400 a 402, 408 a 412 e 425 a 430.

  8. Inconformado com a dedução da acusação que lhe imputa, bem como à arguida sociedade sua representada, a prática de 1 (um) crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punível pelo art. 105º, n.ºs 1 e 4, als. a) e b), do RGIT, o arguido B… requereu a abertura de instrução questionando o incumprimento da injunção e peticionando, em consequência, a não pronúncia e o arquivamento dos autos.

    Subsidiariamente, solicitou a aplicação de suspensão provisória do processo mediante injunção de carácter patrimonial [pagamento de €100,00 mensais do montante ainda em dívida e disponibilizando-se a prestar, concomitantemente ou em alternativa, serviços de interesse público] – fls. 480 a 506.

  9. O requerimento foi admitido e, por isso, declarada aberta a instrução, tendo o M.mo Juiz de Instrução Criminal (doravante JIC) admitido a junção dos documentos apresentados e designado data de debate instrutório – fls. 510.

  10. Na decisão instrutória subsequente, foi proferido despacho de não pronúncia e determinou-se o arquivamento dos autos quanto a tal arguido, bem como a oportuna remessa dos autos à distribuição para julgamento quanto à arguida “C…, L.da”.

  11. Inconformado com o decidido, interpôs recurso o Ministério Público finalizando a motivação do seu recurso com as seguintes conclusões: (transcrição com correcção de gralhas ortográficas) I. O despacho de revogação da suspensão provisória do inquérito é da competência do MP, conforme dispõe o art. 282º, n.º 3 e n.º 4, a) do CPP.

    1. Actualmente entende-se que a revogação não é automática, devendo ser aferido, após a audição do arguido, se o incumprimento da injunção foi culposo, aplicando-se analogicamente o disposto no art. 56º do Cód. Penal, confundindo-se a natureza jurídica das penas com as injunção/regras de condutas impostas na SPP.

    2. E, segundo esta orientação, caso o arguido não seja ouvido no inquérito, sobre os motivos do incumprimento, o despacho de revogação da SPP enferma da nulidade prevista no art. 120º, n.º 2, d) do CPP e art. 61º, n.º 1, b) do CPP.

    3. Esta nulidade, bem como outras e qualquer irregularidade do inquérito respeitante a actos da exclusiva competência do MP, só podem ser arguidas perante o MP, devendo ser pedida a intervenção hierárquica, conforme dispõe o art. 48º do CPP, art. 76º, nº 3 do EMP e 219º, nº 4 da CRP.

    4. O JIC não pode conhecer nem sindicar tal nulidade em sede de inquérito, dado que tal não vem previsto no art. 268º e 269º do CPP, nem das normas respeitantes à suspensão provisória do inquérito.

    5. E, no caso em apreço, em sede de abertura de instrução, o JIC não pode apreciar o despacho prévio de revogação da SPP mas sim os factos pelos quais o MP o acusou, conforme dispõe o art. 287º, nº 1, a) do CPP, a fim de comprovar judicialmente a decisão de se ter deduzido acusação.

    6. Não está prevista a hipótese de, na instrução, o JIC, revogar o despacho de revogação da suspensão provisória do inquérito.

    7. Assim, o despacho de não pronúncia de que se recorre, ao se ter limitado a reavaliar o despacho em causa e não a acusação deduzida contra o arguido, sem ter competência para tal, violou o princípio do acusatório consagrado no art. 32º, n.º 5 da CRP e o disposto nos arts. 282º, nº 4, a), o art. 268º e 269º do CPP, 286º, n.º 1, 287º, n.º 1, a) e 308º, n.º 1 e n.º 3 do CPP.

    8. E, enferma de nulidade insanável, prevista no art. 119º, f) do CPP.

  12. Admitido o recurso, por despacho de fls. 540, respondeu o arguido, sufragando, sem alinhar conclusões, a sua improcedência e manutenção do decidido.

  13. Neste Tribunal da Relação, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido da procedência do recurso e revogação do despacho recorrido louvando-se nos fundamentos que dele constam, aduzindo ainda pertinentes considerandos sobre a fase de instrução.

  14. Cumprido o disposto no art. 417º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, nada mais foi aduzido.

  15. Colhidos os vistos legais, vieram os autos à conferência que decorreu com observância das formalidades legais, nada obstando à decisão.

    *** II – FUNDAMENTAÇÃO1.

    Consoante decorre do disposto no art. 412º n.º 1, do Código de Processo Penal, e é jurisprudência pacífica (cfr., entre outros, Acórdão do STJ de 24/3/1999, CJ-STJ, Ano VII, Tomo I, pág. 247 e segs. – especialmente fls. 248, último parágrafo), são as conclusões, extraídas pelo recorrente da sua motivação, que definem e delimitam o objecto do recurso.

    Todavia, no caso em apreço, importa anotar que parte do segmento recursório não tem objecto já que se reporta a casos de conhecimento de invalidades decorrentes da falta de audição do arguido antes de ser revogada a suspensão provisória do processo e da associada competência do JIC durante a fase de inquérito questões que não têm qualquer reflexo na decisão recorrida [decisão instrutória que culminou em despacho de não pronúncia e que nenhuma nulidade ou irregularidade processual decretou].

    Consequentemente, estas matérias não serão objecto de conhecimento pois que a única questão válida e efectivamente suscitada é a de saber se o JIC pode, em sede de instrução, apreciar as vicissitudes de anterior suspensão provisória do processo e divergir do entendimento do Ministério Público quanto ao (in)cumprimento da injunção fixada.

    ***2.

    A fundamentação da decisão recorrida é, no que ao caso importa, a seguinte: (transcrição) “Depois de considerar culposamente incumprida pelo arguido pessoa singular a injunção que fora associada à suspensão provisória do processo (cfr. fls. 400 e seguintes), o Ministério Público deduziu a fls. 425 e seguintes acusação contra os arguidos (…).

    Veio então o arguido B… requerer a abertura de instrução a fls. 453 e seguintes, dizendo em síntese o seguinte:

  16. A sociedade comercial arguida...

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