Acórdão nº 2830/15.0T8VNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução13 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 2830/15.0T8VNG.P1 Sumário da decisão:I. O abuso de minoria negativo traduz-se na obstrução à tomada de deliberações, que pode consistir na recusa de participação dos sócios minoritários em assembleia, impedindo o quórum constitutivo e a possibilidade de deliberar sobre determinadas matérias.

II. Perante a falta de instrumento legal específico, há quem defenda que, revelando-se ainda possível tomar uma deliberação positiva, poderá o tribunal determinar que os votos não emitidos pelo credor minoritário a favor da proposta, o sejam por outrem, requerendo uma prestação de facto fungível (art.º 828.º Código Civil), considerando, por outro lado, aplicável o n.º 1 do art.º 830.º do Código Civil de modo a permitir à sociedade “obter sentença que produza os efeitos da declaração negocial do faltoso” (o sócio minoritário que não emitiu os votos a favor da proposta) III. Tal via, a considerar apenas em situações extremas, só poderá alicerçar-se no instituto do abuso de direito, impondo-se que a omissão do sócio cumpra todos os requisitos integradores da previsão do artigo 334.º do CC, de acordo como a doutrina tradicional recorta a figura em apreço, ou seja, tal omissão teria de ocorrer «em termos clamorosamente ofensivos da justiça (…) intoleravelmente ofensivo do nosso sentido ético jurídico», constituindo uma «clamorosa ofensa do sentimento jurídico socialmente dominante».

Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. Relatório Em 08.04.2015, B…, C… e “D…, Lda.”, instauraram no Tribunal de Comércio, da Instância Central de Vila Nova de Gaia, Comarca do Porto, ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra E…, F… e “G…, Lda.”, pedindo: a) Que seja ordenada a designação do 2º autor como gerente da 3ª autora; b) Que seja ordenada a transferência definitiva da sede da sociedade comercial autora para o local acordado e onde funciona em exclusivo a sua actividade comercial e administrativa, ou seja, no local do estabelecimento “I…”, sito na Rua …, n.º …, em Vila Nova de Gaia; c) Que seja reconhecido e declarado o direito dos autores a ver estabelecida a realidade societária, em termos de estrutura do capital social, nos termos delineados e acordados pelos 1º e 2º autores e pelos 1º e 2º réus e, por via disso, decretado: (i) O aumento do capital social para 25.000,00 euros, com entrada de novos sócios, por conversão em capital de créditos de que são titulares os novos sócios perante a sociedade comercial autora, abatendo-se o valor nominal das novas quotas a subscrever nas dívidas que a mesma sociedade comercial tem para com os novos sócios, subscrevendo: - O 2º autor, uma quota no valor nominal de 5.000,00 euros, equivalente a 20% do capital social após o aumento; - Os investidores da sociedade comercial, identificados no artigo 280º da petição inicial, quotas de valores nominais proporcionais ao investimento que cada um fez, num total, para todos os investidores, de 10.000,00 euros, equivalente a 40% do capital social após o aumento; d) Subsidiariamente, para o caso de improceder o pedido formulado na alínea anterior, que seja decretado o aumento de capital para 15.000,00 euros, com entrada de um novo sócio, o ora 2º autor, o qual subscreverá uma quota de 5.000,00 euros, equivalente a 20% do capital social após o aumento por conversão em capital de crédito de que é titular o novo sócio perante a sociedade comercial autora, abatendo-se o valor nominal da nova quota a subscrever na dívida que a sociedade tem para com o referido sócio; e) Subsidiariamente, para o caso de improcederem os pedidos formulados nas duas alíneas anteriores, que seja decretada: i) A divisão da quota de que é titular o 1º autor, no valor atual de 5.000,00 euros, em duas quotas distintas, uma com o valor nominal de 3.333,00 euros e outra com o valor nominal de 1.667,00 euros; ii) A divisão da quota de que é titular o réu E…, no valor atual de 5.000,00 euros, em duas quotas distintas, uma com o valor nominal de 3.334,00 euros e outra com o valor nominal de 1.666,00 euros; iii) A unificação das subsequentes quotas de valor nominal, respetivamente, de 1.667,00 euros e de 1.666,00 euros, numa única quota com o valor nominal de 3.333,00 euros; iv) O consentimento da sociedade comercial autora à posterior cessão da quota unificada ao autor C…; f) A condenação dos 1º e 2º réus a pagar solidariamente uma indemnização ao 1º autor pelos danos não patrimoniais provocados pela sua conduta, em montante a ser fixado pelo tribunal, mas nunca de valor inferior a 15.000,00 euros, acrescido de juros de mora, contados à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento; g) A condenação dos 1º e 2º réus a pagar solidariamente uma indemnização ao 2º autor pelos danos não patrimoniais provocados pela sua conduta, em montante a ser fixado pelo tribunal, mas nunca de valor inferior a 12.500,00 euros, acrescido de juros de mora, contados à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento; h) A condenação 1º e 2º réus a pagar solidariamente à 3ª autora, pelos danos patrimoniais provocados pela sua conduta, a quantia global de 84.689,42 euros, acrescida de juros de mora, contados à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento; i) A condenação 1º e 2º réus a pagar solidariamente uma indemnização à 3ª autora pelos danos patrimoniais provocados pela sua conduta, em montante a ser fixado em liquidação posterior, ainda que em execução de sentença, mas em quantia sempre superior a 10.000,00 euros; j) A condenação dos 2º e 3º réus a pagar solidariamente à 3ª autora pelos danos patrimoniais provocados pela sua conduta, a quantia global de 17.055,22 euros, acrescida de juros de mora, contados à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento; k) A condenação dos 1º e 2º réus a pagar solidariamente uma indemnização aos autores, a liquidar em momento ulterior, ainda que em execução de sentença, por danos futuros, decorrentes da perda de lucros, nos termos alegados nos artigos 338º a 342º da petição inicial.

Alegaram, em síntese, os autores: visam os autores, através desta ação, “estabelecer a verdade societária” na sociedade comercial por quotas D…, Lda., de modo a que a mesma adquira a estrutura de capital e de gestão que foi acordada entre os autores B… e C…, o réu F… e os investidores aquando da criação do projeto e da constituição da sociedade, bem como a retificar outros pontos relevantes da vida da sociedade, como a transferência da sede da residência do 1º réu para as (únicas) instalações onde a sociedade desenvolve a sua atividade; os réus obrigaram-se, em fase negocial anterior à constituição da sociedade, a proceder mais tarde às alterações que fossem necessárias a fim de fazer corresponder a realidade formal com a substancial, incluindo alterações ao pacto social; recusando-se posteriormente a cumprir aquilo a que se comprometeram; destina-se, também a presente ação a obter o ressarcimento dos avultados danos causados aos autores pelos réus; o 1º autor, B…, é sócio e gerente da 3ª autora, a sociedade D…, Lda.” (doravante, a “Sociedade” ou “D…”), sendo titular de uma quota de 50%, com o valor nominal de €5.000,00, o 2º autor C… é sócio e gerente de facto da 3ª Autora D…; o 1º réu, E… é também sócio e gerente da referida sociedade desde a data de constituição da mesma (27/2/2012), sendo daquela titular de outra quota de 50%, com o valor nominal de €5.000,00; o 2º réu, F… é o sócio e gerente de facto, na parte respeitante à quota e à gerência formalmente atribuídas ao seu filho, E…; a 3ª autora, D… detém um interesse paralelo ao dos outros dois autores, detendo na sua esfera jurídica, direitos coincidentes ou convergentes com os mesmos; a 3ª ré, G…, é uma sociedade comercial por quotas, que se dedica ao comércio e instalação de eletricidade, eletrónica, ar condicionado, aquecimento e tratamento de águas, e tem como sócios o 2º réu, F…, que também é gerente; a 3ª ré é, conjunta e solidariamente com o 2º réu, responsável por avultados danos causados à 3ª autora, em virtude da deficiente instalação elétrica que ali levaram a cabo, aquela como empreiteira, este como gerente de facto da 3.ª autora e responsável pelo pelouro das instalações, incluindo a elétrica, e do posterior comportamento de ambos em face do problema por si criado, o que motivou uma enérgica intervenção da V…, e, como consequência, danos elevadíssimos à 3ª autora; a constituição da sociedade (3.ª autora) foi negociada entre os autores B… e C…, e o réu F…; ficou a constar do o documento constitutivo que ambos os sócios foram designados como gerentes da sociedade (2.ª autora), obrigando-se a mesma com a intervenção conjunta de ambos os gerentes, tendo a sociedade ficado com a sede registada na residência do Réu E…, na Avenida …, em Vila Nova de Gaia, por não haver ainda, apesar de tudo, sido celebrado o referido contrato de arrendamento, outro ponto naturalmente a corrigir num momento posterior, conforme acordado; os dois primeiros réus recusaram-se a assinar o que quer que fosse – incluindo a regularização formal interna da Sociedade, situação que se mantém, e – mais grave – omitindo informação e não entregando aos autores notificações de toda a ordem, inclusive citações e notificações judiciais, que ali recebem, aquando da alegação e descrição dos danos; numa última tentativa dos 1º e 2º autores de tentar junto dos réus que estes cumprissem o acordado e se procedesse à alteração do pacto social conforme inicialmente acordado entre todos, os 1º e 2º autores agendaram uma escritura pública para esse efeito, a realizar em 13.11.2013, não tendo os réus comparecido na data e hora agendados; da conduta dos réus decorreram os danos que os autores especificam na petição.

Citados, os réus contestaram e deduziram pedido reconvencional, pedindo a condenação solidaria dos autores a pagar ao primeiro réu a quantia de 10.000,00 euros, a título de danos morais, a pagar ao segundo réu a quantia de 10.000,00 euros, a título de danos morais, a pagar a quantia mínima...

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