Acórdão nº 943/15.7T8PVZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 28 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelFERNANDO SAM
Data da Resolução28 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 943/15.7T8PVZ.P1*Do Tribunal Judicial da Comarca do Porto - Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim - Juiz 6.

*Relator: Fernando Samões 1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha 2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró* Acordam no Tribunal da Relação do Porto - 2.ª Secção: I. RelatórioB…, S.A., com sede na Avenida …, .., em Lisboa, instaurou contra C… e mulher D…, E… e F…, residentes na Travessa …, n.º …, …, Matosinhos, a presente acção declarativa, com processo comum, pedindo: 1. Seja declarada a ineficácia em relação à autora do contrato de compra e venda outorgado, mediante o “título de compra e venda”, na 1.ª Conservatória do Registo Predial, em 9.05.2013, entre os réus C… e D…, na qualidade de vendedores, e a ré E…, na qualidade de compradora, em relação ao seguinte imóvel: - Fracção autónoma designada pela letra N, correspondente ao terceiro andar B, com entrada pelo n.º …, da Travessa …, da freguesia… e concelho de Matosinhos, inscrito na matriz com o n.º 7010, do prédio descrito na CRP de Matosinhos com o n.º 1002; 2. Se condene os réus a reconhecer o direito da autora à restituição do imóvel em causa ao património dos réus C… e D…, bem como o direito da autora a executar o mesmo imóvel no património da sua actual detentora, a ré E… ou dos seus posteriores adquirentes, na medida do seu interesse e para o pagamento do crédito que detém sobre os referidos C… e D….

Subsidiariamente, se assim não se entender: 3. Ser declarada nula, por simulação, a referida compra e venda, cancelando-se, em consequência, os registos Conservatória do Registo Predial inscritos pela Ap. N.º 1249 de 2013/05/09 (aquisição a favor da ré E… RR e reserva em venda a favor dos réus C… e D…), bem como os registos que venham posteriormente a ser lavrados.

Para tanto, alegou, em resumo, o seguinte: É titular de um crédito sobre o réu F…, que decorre de dois empréstimos, nos montantes de 82.500,00€ e 17.500,00€, concedidos em 25/5/2006, garantidos por duas hipotecas constituídas sobre um imóvel deste réu e por fiança prestada pelos réus C… e D…, cujas prestações deixaram de ser pagas a partir de 25 de Março de 2010, o que implicou o imediato vencimento de toda a dívida e a exigibilidade do seu pagamento, ascendendo o montante daquela a 59.104,03€, em 19/6/2015.

Os réus C…, conluiados com os demais réus, com intuito de prejudicar a autora, por escritura pública de compra e venda, de 9/5/2013, declararam vender à sua filha, a ré E…, com reserva de usufruto e pelo preço de 15.876,00€, a nua propriedade da referida fracção.

Ao celebrarem a dita escritura pública, pretenderam os réus obstar a que a autora lograsse cobrar os créditos emergentes do incumprimento dos mencionados empréstimos.

Acresce que, apesar do que declararam na mencionada escritura pública, nem a ré E…, nem os réus C… e D… quiseram comprar e vender tal imóvel. O preço declarado não foi pago, nem recebido por estes réus que, sabendo do crédito da autora, actuaram com o intuito de esconder desta o património pertencente aos réus C… e D….

Os réus contestaram, em separado, em termos que aqui se resumem: A E…, impugnando toda a factualidade descrita na petição inicial e concluindo pela improcedência da acção.

O C… e a D…, excepcionando a nulidade da fiança que prestaram com fundamento no incumprimento do dever de esclarecimento previsto no regime legal das cláusulas contratuais gerais; invocando o benefício da excussão prévia, a falta de comunicação da situação de incumprimento por parte do mutuário e de interpelação para pagar as prestações em atraso; afirmando a vontade real de realização do negócio de compra e venda e negando a intenção de prejudicar a autora, admitindo, contudo, o não recebimento do preço declarado na escritura, o qual fora pago através da contribuição nas despesas do lar e das prestações referentes a outros empréstimos que contraíram para a aquisição do mesmo imóvel. Concluíram também pela improcedência da acção.

O F… excepcionou a nulidade do contrato de mútuo, por incumprimento do dever legal de informação a que a autora está vinculada por força da aplicabilidade do regime legal das cláusulas contratuais gerais, aceitou o não pagamento das prestações do empréstimo desde Março de 2010 e impugnou a demais factualidade alegada na petição inicial, concluindo pela improcedência da acção.

Foi realizada uma audiência prévia, onde a autora se pronunciou pelo indeferimento das excepções invocadas; foi proferido despacho saneador tabelar, foi fixado o objecto do litígio e foram seleccionados os factos considerados assentes e enunciados os temas de prova, sem reclamações.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento e, em 16/6/2017, foi proferida douta sentença, onde se deram como verificados os requisitos da impugnação pauliana, com excepção da má fé, cuja prova não foi feita pela autora, que também não provou a divergência entre a vontade real e a declarada necessária à verificação da simulação, acabando com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, decide-se julgar improcedente a presente acção e, em consequência, absolver do pedido os réus C…, D…, F… e E…”.

Inconformada com o assim decidido, a autora interpôs recurso de apelação e apresentou a respectiva alegação com as seguintes conclusões: “1. Para a verificação dos requisitos da impugnação pauliana, o acto oneroso implica, para cada um dos contraentes, a obtenção de uma vantagem patrimonial à custa dum sacrifício correspondente, enquanto o contrato gratuito cria, para um só dos contraentes, uma vantagem patrimonial sem nenhum equivalente.

2. Na impugnação pauliana, os interesses do credor sobrepõem-se às expectativas do terceiro que enriqueceu gratuitamente ou à custa duma contrapartida desprezível, devendo, nesse caso, dispensar-se o requisito da má fé.

3. Demonstrado em acção pauliana que, no acto impugnado – contrato de compra e venda de imóvel - a ré, compradora, não pagou aos Réus, vendedores, o preço da venda, o acto só é formalmente oneroso, tornando-se, assim, gratuito ou com contrapartida desprezível, pelo não se exige a má-fé.

4. Em acção pauliana, verificados os requisitos respectivos da (i) existência do crédito, (ii) anterior à celebração do acto, (iii) do qual resultou a impossibilidade para o credor de obter a satisfação plena do seu crédito ou o agravamento dessa impossibilidade, e tratando de acto gratuito ou à custa duma contrapartida desprezível, deve aplicar-se a regra do nº 1, do artigo 612º do CC, quanto à procedência da impugnação, ainda que os contratantes tivessem agido de boa-fé.

5. Por cautela, e sem conceder, a demonstração de que os réus transmitiram a nua propriedade de um imóvel para a sua filha, com a anuência do seu outro filho, mediante contrato de compra e venda, e o não pagamento do preço declarado no contrato, é suficiente para a demonstração do espírito de liberalidade.

6. A douta sentença recorrida, ao decidir como decidiu, violou ou aplicou mal o disposto nos artigos 610º, 612º, 616º e 874º do Código Civil.

7. Termos em que, deverá a douta sentença recorrida ser revogada e, com consequência, julgando procedente a acção, ser declarada a ineficácia em relação à autora do contrato de compra e venda outorgado, mediante o “titulo de compra e venda”, da fracção autónoma designada pela letra N, inscrita na matriz com o nº 7010, do prédio descrito na CRP de Matosinhos com o nº 2002 e, em consequência, a condenando-se dos réus a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT