Acórdão nº 9108/16.0T8PRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelIN
Data da Resolução09 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. Nº 9108/16.0T8PRT-A.P1 Apelação em processo comum e especial Relator: Inês Moura 1º Adjunto: Francisca Mota Vieira 2º Adjunto: Teles de Menezes Sumário: (art.º 663.º n.º 7 do C.P.C.)1. Uma fundamentação deficiente e abreviada, não integra a previsão do art.º 615.º n.º 1 al. b) do C.P.C., que apenas comina com a nulidade a total ausência de fundamentação da decisão.

  1. O contrato de seguro de responsabilidade civil de advogado pode ser qualificado como contrato a favor de terceiro, de acordo com a noção que nos é dada pelo art.º 443.º do C.Civil, como acontece aliás em regra nos contratos de seguro de responsabilidade civil profissional, em que o beneficiário não é parte contratante, sendo terceiro que não intervém na elaboração do contrato de seguro.

  2. O seguro de responsabilidade civil a que alude o art.º 104.º do Estatuto da Ordem dos Advogados tem a natureza de seguro obrigatório, sendo do interesse público que a actividade do exercício da advocacia seja acompanhada de um seguro susceptível de proteger essencialmente as pessoas que a ela recorrem, visando em primeira lugar a protecção destas pessoas enquanto lesados, mas também dos advogados que a praticam.

  3. Nas apólices de reclamação, também denominadas claims made, a delimitação temporal da garantia do seguro reporta-se não à data da verificação do facto causador do prejuízo, mas antes à data da sua reclamação, diferentemente do que acontece nas apólices de seguro denominadas de ocorrência, que apenas admitem a indemnização quando o facto causador do dano se verifica na vigência do contrato de seguro.

  4. Num contrato de seguro obrigatório, não são oponíveis ao lesado beneficiário, enquanto terceiro que nele não é parte, as excepções que ali são previstas e que se referem ao incumprimento ou omissão por parte do segurado ou do tomador do seguro dos deveres que para ele decorrem de tal contrato ou da lei, sem prejuízo do direito de regresso da seguradora, nos termos do art.º 101.º n.º 4 da Lei do Contrato de Seguro.

    Acordam na 3ª secção do Tribunal da Relação do Porto I. RelatórioVem a A. B…, intentar a presente acção declarativa de condenação, contra as RR. C… e D…, S.A., pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de €25.371,88 acrescido de juros de mora à taxa legal, desde a citação, até integral pagamento.

    Alega, em síntese, para fundamentar o seu pedido, que outorgou procuração à 1ª R. para que esta intentasse e a representasse em acção de impugnação de despedimento ilícito e compensação de créditos laborais contra a sociedade E…, S.A., tendo-lhe entregue todos os documentos e prestado toda a colaboração, tendo constatado que a R. não deu entrada da referida acção judicial para a qual foi mandatada. A sociedade E…, S.A. foi entretanto declarada insolvente, não tendo também a referida mandatária reclamado os créditos da A. no processo de insolvência. Alega que é manifesta a ilegalidade do despedimento, pela forma como ocorreu, pelo que a A. ficou privada do ressarcimento a que tinha direito, por culpa exclusiva da 1ª R. que incumpriu o contrato celebrado com a A. ao não reclamar os seus direitos em tempo.

    Invoca a responsabilidade da 2ª R. por via do contrato de seguro de grupo contratado pela Ordem dos Advogados, com vista à responsabilidade civil pela actividade profissional de advogado, requerendo a junção aos autos pela R. da apólice respectiva.

    Conclui pelo pagamento pelas RR. da quantia de €10.371,88 que a A. deixou de poder auferir, a título de danos patrimoniais e de €15.000,00 de compensação por danos não patrimoniais sofridos.

    Devidamente citada a 2.ª R. veio contestar, concluindo pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.

    Junta a apólice de seguro e invoca a excepção peremptória por exclusão de pré-conhecimento prevista na al. a) do art.º 3.º das condições especiais da apólice de responsabilidade civil profissional. Refere que os factos alegadamente geradores da responsabilidade foram conhecidos da 1ª R. em 10/05/2012, data em que a mesma teve conhecimento da revogação da procuração pela A. e terão ocorrido em data anterior ao início de vigência da apólice de seguro (1 de Janeiro de 2014) pelo que não se encontram abrangidos pela mesma, atento o disposto na cláusula referida, não podendo por isso responsabilizar-se esta R. por qualquer pagamento. Mais impugna os factos alegados pela A. e conclui que a conduta da 1ª R. nunca seria susceptível de gerar o dano de “perda de chance”.

    A A. veio responder à excepção peremptória invocada, após notificação do tribunal para o efeito, concluindo pela sua improcedência. Refere que a situação em presença está abrangida pela apólice de seguro junta aos autos, como resulta designadamente do ponto 7 das condições particulares, não tendo a A. conhecimento prévio das suas cláusulas por ser terceiro e não parte no contrato, sendo além do mais a invocada cláusula contrária ao princípio da boa fé e não podendo a A. ser prejudicada pelo facto do beneficiário do seguro não ter feito a comunicação dos factos à Seguradora.

    Foi dispensada a realização da audiência prévia.

    O tribunal a quo conheceu da excepção peremptória invocada em sede de despacho saneador, concluindo pela sua improcedência, referindo a este propósito, o que se transcreve para melhor compreensão: «A) Da exceção perentória da exclusão de pré-conhecimento prevista na cl. 3ª, al. a), da Condição Especial da Responsabilidade Civil Profissional.

  5. A A. demandou as Rés, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de 25.371,88 euros, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, alegadamente causados pela 1ª demandada, Drª C…, a qual na qualidade de advogada violou o contrato de mandato entre si e A. celebrado.

  6. No articulado-contestação, a segunda demandada, “D…, S.A., arguiu a dita exceção.

  7. Notificada, a A. respondeu, no sentido da rejeição da referida exceção, atento o teor da cláusula 7ª das Condições Particulares do Contrato.

    Conhecendo.

    Sobre a questão enunciada, afirme-se que se concorda inteiramente com a posição da A. expressa no articulado resposta, a qual, por uma questão de economia processual, aqui se dá por inteiramente reproduzida.

    No sentido expendido, ver, na Jurisprudência, o acórdão S.T.J., proc. nº 5440/15.8T8PRT-B.P1.S1, datado de 14/12/2016, www.dgsi.pt. que trata um caso semelhante ao dos autos.

    Ora, retira-se daquele acórdão as seguintes conclusões: “Concluindo: 1. O seguro de responsabilidade civil de advogado estabelecido no n.º 1 do art.º 104.º do EOA é de natureza obrigatório. O elemento filológico de interpretação tirado do sentido das palavras que integram o texto descrito no n.º 1 do art.º 104.º do EOA e também a “ratio” que superintendeu à redação deste texto normativo, apontam no sentido da obrigatoriedade do seguro do Advogado no exercício do seu cargo, mais precisamente que tem natureza imperativa o seguro de responsabilidade civil do advogado prescrita no seu estatuto.

  8. O contrato de seguro de responsabilidade civil profissional, celebrado entre a ré/recorrente “D…, S.A.” e a “Ordem dos Advogados, S.A.”, garantindo a indemnização de prejuízos causados a terceiros pelos advogados com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados que exerçam actividade em prática individual ou societária, configura um contrato de seguro de grupo.

  9. Tomando o que dispõe o ponto 7. das condições particulares da apólice, a propósito do seu "âmbito temporal", dele depreendemos em termos genéricos que, desde que participados após o início da vigência da presente apólice, estão abrangidos por este seguro todos os sinistros reclamados pela primeira vez contra o segurado ou contra o tomador de seguro.

  10. Contrapondo-a à apólice de ocorrência (para fins de indemnização o fato causador do dano ou prejuízo a terceiros deve ocorrer durante a vigência do contrato), podemos afirmar que estamos perante uma apólice de reclamações, também chamada “claims made” (“reclamação feita”), que condiciona o pagamento da indemnização à apresentação da queixa de terceiros durante o prazo de validade (vigência) do contrato e que possibilita a extensão da...

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