Acórdão nº 1241/11.0TTVNG.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelPAULA LEAL DE CARVALHO
Data da Resolução12 de Julho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Procº nº 1241/11.0TTVNG.P2 Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 1001) Adjuntos: Des. Jerónimo Freitas Des. Nelson Fernandes Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório Frustrada a tentativa de conciliação que teve lugar na fase conciliatória da presente ação declarativa de condenação, com processo especial de acidente de trabalho, B...

, com mandatário judicial constituído, apresentou petição inicial demandando C... – Companhia de Seguros, SPA, na qual pede que seja esta condenada a pagar-lhe: a pensão anual e vitalícia de € 6.587,41; a quantia de € 16.593,39 relativa a indemnização por incapacidades temporárias; a quantia de € 15,00 despendida em deslocações ao Tribunal; a quantia de € 1.176,60 despendida em transportes para se deslocar a tratamentos; a quantia de € 159,87 referente a medicamentos, consultas médicas e taxas moderadoras.

Invocou, para tanto e em síntese, que: no dia 20/03/2011, conduzia o veículo de matrícula ..-BG-.., no desempenho das suas funções de vendedor na D..., S.A., auferindo a retribuição anual de €1.794,00 x 14 meses, tendo sido vítima do acidente que descreve, do qual resultaram lesões determinantes de IPP de 37,4685%, desde a data da alta definitiva, esta ocorrida aos 01/03/2012, bem como das incapacidades temporárias que refere; a D..., SA havia transferido a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho de que fosse vítima o A. para a Ré mediante contrato de seguro titulado pela apólice .............., na modalidade de folha de férias.

A Ré contestou alegando, em síntese: - Sob a epígrafe “I. Da não cobertura do sinistro invocado” (arts. 1º a 33ºi), que: entre a contestante e D..., SA, na qualidade de segurada, foi celebrado um contrato de seguro obrigatório do «ramo acidentes de trabalho», titulado pela apólice uniforme nº .........., pelo qual esta última transferiu para aqueloutra a respetiva responsabilidade infortunística para com os trabalhadores por conta dela, constando o A. das folhas de férias enviadas pela dita segurada à Ré, o que a levou a pensar que aquele era, de facto, um trabalhador por conta daquela segurada, razão pela qual inicialmente o tratou como se assim fosse. Não obstante, posteriormente veio a saber que o A. não era trabalhador por conta da dita segurada da Ré, pois que com esta não havia celebrado qualquer contrato de trabalho, mas antes, e pelas razões de facto que invoca, um contrato de prestação de serviços e sendo, como tal, um trabalhador independente, o que foi comunicado à ora contestante pela sua segurada por correio eletrónico datado de 09.06.2011, com o seguinte conteúdo: “Informo que Sr. B... tem com a D... um Contrato de prestação de Serviços onde não é feita nenhuma referência ao horário de trabalho, até porque é um Trabalhador Independente. Nesta conformidade, pode trabalhar Sábados, Domingos e Feriados a qualquer hora.”. Assim, o mencionado contrato de seguro não cobre qualquer responsabilidade infortunística por acidentes ocorridos com o autor, que nele não é pessoa segura, sendo que existem apólices de seguro uniformes que cobrem os acidentes de trabalho dos trabalhadores independentes, a qual não era a apólice de seguro celebrada com a ré.

- Subsidiariamente, sob a epígrafe “II. Da anulabilidade do seguro” (arts. 35º a 43º), que: a mera inclusão do autor nas folhas de férias não significa, só por si, que o autor estivesse coberto por aquele contrato de seguro, uma vez que, face ao acima explanado, tal representou uma declaração inexata e dolosa da segurada da ré (cf. ac. do STJ de 15.05.2012 in www.dgsi.pt), já que era do seu prévio conhecimento que o autor não era seu trabalhador e, e ainda assim, incluiu o seu nome naquelas folhas, declaração essa geradora da anulabilidade do seguro em causa ao menos em relação ao autor (cf. artº 25º/3 do RJCS) e que invoca.

- Subsidiariamente, invoca a descaracterização do acidente em causa com fundamento em negligência grosseira e exclusiva do A. Mais impugna alguns dos factos alegados pelo A.

Termina concluindo no sentido de que a presente ação deverá ser julgada não provada e improcedente, por se considerar o sinistro invocado não coberto pelo seguro celebrado com a ré, por se considerar este anulável, ao menos em relação ao autor, como se requer seja declarado, ou, finalmente, por se considerar o sinistro descaracterizado, absolvendo-se sempre a ré dos pedidos, com as demais consequências legais.

O A. respondeu no sentido, em síntese, da inadmissibilidade de invocação da alegada invalidade ou ineficácia do contrato de seguro, mais referindo que: tal como o A., cerca de 30 colaboradores que celebraram contratos de agência, estavam incluídos, desde 01.07.2008, nas folhas de férias remetidas à Ré no âmbito do mencionado contrato de seguro, a qual separava e separa os trabalhadores dependentes dos independentes; tudo sempre foi do conhecimento da Ré, que sempre aceitou a cobertura dos acidentes que vitimassem, para além de outros trabalhadores, os seus agentes comissionistas no desempenho das suas funções, tal como ocorreu com o A. no âmbito de um outro acidente de trabalho, e tendo a Ré feito uma consciente avaliação do risco e fixado o prémio em função do mesmo; a apólice em causa continua em vigor, não tendo a Ré posto termo ao contrato de seguro depois de 09.06.2011, data em que diz ter sabido das funções desempenhadas pelo A., tendo este, e todos os demais comissionistas, nelas continuado incluído, consubstanciando o comportamento da Ré um verdadeiro abuso de direito (art. 334º do C).

Estava o A. obrigado a prestar serviços apenas a “D...”, sendo falso o que, em contrário, é alegado pela Ré.

Sem prescindir, alega que a Ré, em 20.06.2011, remeteu à “D...” uma carta a declinar a sua responsabilidade, porém apenas com base num alegado comportamento temerário, inútil e indesculpável do A., não fundamentando a sua recusa nos factos atinentes à relação entre o A. e a “D...”; tendo a Ré tido conhecimento dos factos que agora invoca em 09.06.2011, como alega a mesma, entre esta data e a data em que invocou a anulabilidade do contrato de seguro (27.03.2013), decorreu mais de um ano, pelo que caducou o direto a tal arguição. E, mesmo que assim senão entendesse, a anulabilidade é sanável mediante confirmação (art. 288º, nº 1, do CC); tendo a Ré tido conhecimento dos alegados factos em 09.06.2011, não os invocou nem na carta de 20.06.2011, nem na fase conciliatória do processo, pelo que renunciou tacitamente à invocação da anulabilidade, o que consubstancia confirmação tácita da eventual anulabilidade que, a porventura existir, se deve ter por sanada, o que também decorre do facto de ter mantido em vigor o contrato de seguro e continuando a cobrar o respetivo prémio.

Sem prescindir, se a “D...” tivesse proposto à Ré a celebração de contrato de seguro de acidentes de trabalho de trabalhadores independentes, esta tê-lo-ia aceite, pelo que o contrato se poderá converter em tal modalidade, o que requer seja declarado (art. 293º CC).

Termina concluindo como na p.i. ou, caso se entenda que o contrato de seguro celebrado entre a “D...” e a Ré se encontra ferido de vício que determine a sua anulabilidade, deve o mesmo ser convertido em contrato de seguro de acidentes de trabalho de trabalhador independente, e a ré condenada como litigante de má-fé em multa e indemnização a favor do A.

Por despacho de 14.05.2013, foi determinada a notificação da Ré para, para além do mais que dele consta “(…) explicar porque, tendo tido conhecimento de que o A. não era afinal trabalhador dependente pelo mail de 9/06/2011 que refere no art. 29º da contestação, assumiu a responsabilidade pelo vencimento de 1794 euros x 14 meses no auto de tentativa de conciliação de 10/07/2012, constante de fls. 44.

Na ausência de uma justificação juridicamente atendível e face ao disposto no art. 131º, nº 1, al. c), do C.P.T., não serão quesitados os factos ora alegados nos arts. 6º a 43º da defesa/contestação ora apresentada.”, Na sequência do que veio a Ré responder, informando “que a aceitação, por ocasião da tentativa de conciliação, da remuneração indicada pela Entidade Patronal na Participação de Sinistro, decorre, única e exclusivamente, do facto de a ré não ter, na altura, analisado com o devido rigor, a questão do vínculo (ou, neste caso, da sua ausência) entre sinistrado e segurada, apesar da informação sobre isso prestada pelo mail de 09.06.2011, fruto da impreparação jurídica de alguns dos seus funcionários”.

Aos 17.06.2013, foi proferido despacho saneador, com seleção da matéria de facto, consignando-se a assente e elaborando-se base instrutória (BI), da qual a Ré reclamou, reclamação que foi indeferida pela 1ª instância.

Realizada a audiência de...

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