Acórdão nº 453/16.5T8FLG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelFILIPE CARO
Data da Resolução12 de Julho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 453/16.5T8FLG.P1 (apelação) Comarca do Porto Este – Juízo Local Cível de Felgueiras Relator: Filipe Caroço Adj. Desemb. Judite Pires Adj. Desemb. Aristides Rodrigues de Almeida Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.

B…, NIF ……… casado, residente na Rua …, …. - … …, Felgueiras, instaurou ação declarativa sob a forma de processo comum contra C…, com sede na Rua …, .., …. - … Lisboa, alegando essencialmente que, quando, no dia 14.3.2014, conduzia o seu veículo numa via com dois sentidos de marcha, ao fazer uma curva para a direita, surgiu um veículo em sentido contrário, que não conseguiu identificar, a ocupar cerca de um metro da hemifaixa da via destinada ao sentido de marcha do A., o que o fez guinar para a direita para evitar o embate e entrar em despiste, com imediato embate num muro, de que resultaram vários danos no seu veículo, com impossibilidade de circular, cuja reparação ascende a €11.026,09.

Apesar de ter deixado o automóvel à disposição da R. para proceder à devida reparação, pois que havia celebrado com ela um contrato de seguro que cobre também os danos próprio do veículo, aquela, até hoje, não assumiu a regularização da situação.

Para tanto, sendo a apólice anual (um ano e seguintes), de 6.2.2014, com pagamento do prémio em prestações mensais, a R. invocou falta de pagamento da segunda prestação do seguro, para recusar a sua responsabilidade, considerando o contrato automaticamente resolvido no dia 8.3.2014. Porém, foi ela que não atuou regularmente no sentido de cobrar aquela prestação mensal (mora do credor), sendo, por isso, inaplicável, no caso, a sanção da não renovação do contrato ou a sua resolução automática e imediata.

O A. insistiu no pagamento da indemnização, de acordo com o valor contratualmente seguro, mas sem sucesso.

Deve, na perspectiva do A., ser fixada uma sanção pecuniária compulsória não inferior a € 50,00 por cada dia de incumprimento da decisão que vier a ser proferida.

Acrescenta o A. que a R. litiga de má fé ao negar a sua responsabilidade quando os danos próprios do veículo estão cobertos pela apólice contratada, que era válida à data do acidente.

Faz o A. culminar o seu articulado com o seguinte pedido, ipsis verbis: “Nestes termos deve a presente acção ser julgada provada e procedente e em consequência a Ré condenada a pagar à A.:

  1. A quantia de 11.026,09€, correspondente ao valor de reparação, acrescida de juros vincendos a contar da citação e até efectivo e integral pagamento, b) A quantia de 50,00€/dia, a título de sanção pecuniária compulsória como supra alegado.

  2. E no que mais for devido por direito.

    » Citada, a R. contestou a ação, por exceção e por impugnação.

    Invocou a sua ilegitimidade, por inexistir seguro válido e eficaz na data do sinistro. A respectiva apólice havia sido anulada no dia 8.3.2014, por falta de pagamento do prémio pelo segurado e aqui A.

    Acordado que estava entre as partes que as prestações mensais relativas ao prémio deveriam ser pagas até ao dia 6 de cada mês subsequente e estando expressamente referido que o período de validade é de 6.2.2014 a 8.3.2014, a 2ª prestação mensal ou fracção do prémio de seguro devida venceu-se no dia 8.3.2014, mas foi paga apenas no dia 17.3.2014, depois do acidente que participou à R. apenas nesse dia do pagamento, depois daquela liquidação, quando já se encontrava anulado o contrato de seguro.

    O seguro apenas é válido, produzindo os seus efeitos, com o pagamento do prémio ou fracção, não sendo eficaz, quanto às obrigações de ambas as partes, se não se verificar o pagamento.

    Não procedendo o tomador de seguro ao pagamento do prémio, verificam-se duas consequências: - Por um lado o risco deixa de estar coberto pelo contrato; - Por outro, o valor do prémio ou fracção em dívida, deixa, relativamente à generalidade dos contratos, de poder ser judicialmente exigido da seguradora.

    Vale o princípio “no premium, no risk”, segundo o qual o contrato de seguro só deve produzir os seus efeitos com o pagamento do prémio ou fracção efectivado, independentemente de ser inicial ou subsequente, ressalvadas as exceções legalmente previstas com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 122/2005, de 29 de Julho, ao regime jurídico do pagamento dos prémios de seguro, constante do Decreto-Lei n.º 142/2000, de 15 de Julho. É indispensável o pagamento antecipado do prémio ou fracção para que se verifique, consoante seja inicial ou subsequente, o início da cobertura do risco ou a renovação do contrato de seguro, ou ainda, quando esteja em causa uma qualquer fracção do prémio no decurso da anuidade, a sua não resolução automática e imediata.

    Sem prescindir, passou depois a R. a impugnar parcialmente os factos alegados na petição inicial, tendo concluído o seu articulado como se segue: «Nestes termos e nos mais de Direito aplicável:

  3. Deve ser confirmada judicialmente a anulação do contrato de seguro por falta de pagamento de prémio consoante alegado nos artºs 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13 e 14 desta contestação e, em consequência, a ré seguradora declarada parte ilegítima para a presente acção e absolvida da instância; b) Se assim se não entender – o que só para efeitos de hipótese de raciocínio se admite - deverá a acção ser julgada consoante a prova a produzir na audiência.

    » (sic) O A. respondeu à matéria de exceção, alegando que a fracção do prémio em causa foi paga por débito em conta bancária apenas no dia 17.3.2014 porque só então a R. apresentou a pagamento na conta nº …………… do A. a prestação devida correspondente à segunda mensalidade. Foi a R. quem deu ordem de pagamento (por débito em conta) apenas naquela data e não antes. Daí que a R. não possa imputar um comportamento moroso ao A., que sempre se pautou pelo cumprimento pontual.

    Reafirma a existência de mora da R. credora.

    Teve lugar audiência prévia onde se decidiu que o processo deveria seguir a sua normal tramitação para apuramento das causas do não pagamento atempado da 2ª fracção mensal relativa ao prémio do seguro.

    Foi ali proferido despacho saneador tabelar, a que se seguiu a identificação do objecto do litígio e a definição dos temas de prova.

    Designada data para a audiência final, tiveram, entretanto, lugar algumas diligências de prova, em especial junto do D…, para obtenção de documentos relacionado com a conta do A. e os respectivos débitos.

    Foi realizada a audiência final, em duas sessões, onde, além de outras provas produzidas, persistiu o esforço de obtenção de informações junto daquele Banco, após a qual foi proferida sentença com o seguinte segmento decisório, ipsis verbis: «Pelo exposto, decide-se julgar a ação parcialmente procedente, e, em consequência:

  4. Condenar a ré “C… – Companhia de Seguros, SA” a pagar ao autor B… a quantia de 11.026,09€, correspondente ao valor de reparação, acrescida de juros vencidos desde a citação e até efetivo e integral pagamento.

  5. Absolver a ré “C… – Companhia de Seguros, SA” da sanção pecuniária compulsória peticionada.

    *Custas pelo autor e ré na proporção de 10% para o primeiro e 90% para a segunda – cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

    »*Inconformada, apelou a R. da sentença, tendo alegado com as seguintes CONCLUSÕES: «1.

    Salvo sempre o devido respeito e melhor opinião, entende a Ré apelante C… que a Exmª Juiz “a quo” não interpretou e nem aplicou proficiente e correctamente o direito pertinente, designadamente o disposto no art. 59º, 61º e 80º do Dec. Lei nº 72/2008 de 16/04 e ainda o art. 6º, nº 1 e 8º, nº 1 do Dec. Lei 142/2000 de 15/07 com a redacção dada pelo Dec. Lei 122/2005 de 29/07 e o art. 799º, nº 1 do Código Civil.

    1. Nem tão pouco apreciou devidamente toda a prova produzida – testemunhal e documental – efectuando uma incorrecta apreciação da matéria de facto em apreço e lavrando em manifesto erro na apreciação da prova.

    2. A Lei do Contrato de Seguro (LCS) e o Regime Jurídico do Pagamento dos Prémio de Seguro consagram a premissa de “no prémium, no risk”, ou seja, na falta de pagamento do prémio ou da fracção, o risco não deve estar coberto pelo contrato, ideia essa que se encontra desde logo realçada no preambulo do Dec. Lei nº 122/2005 de 29/07, onde se encontra exarado que “o contrato de seguro apenas deve produzir os seus efeitos com o pagamento do prémio ou fracção por parte do tomador do seguro”.

    3. Deste modo, e sendo o contrato de seguro apenas válido e produzindo os seus efeitos com o pagamento do prémio ou fracção, não se mostrando pago o prémio correspondente e contratado não é o mesmo contrato eficaz, pelo que atendendo à factualidade dada como provada nos presentes autos – Cfr. Pontos 14, 16, 21 e 23 dos Factos dados como Provados – e demonstrado documentalmente - que está - que o Autor na data de vencimento da segunda prestação do prémio de seguro não possuía fundos na sua conta bancária para proceder ao pagamento da quantia a que se havia obrigado, deveria também a Mmª Juiz “a quo” ter dado como provado a alínea A e B dos Factos Não Provados e em consequência ter julgado a acção improcedente por não provada.

    4. Foi dado como provado na douta sentença recorrida nos PONTOS nºs 11 e 12 dos Factos Provados, que o Autor havia celebrado com a ré apelante um contrato de seguro titulado pela apólice nº …………… pelo qual transferiu para a mesma a responsabilidade, também pelos danos próprios do seu veículo com a matrícula ..-FO-... e até ao limite de €11.426,40, e aquando da contratualização desse seguro o Autor aderiu em 06-02-2014 a uma apólice anual (um ano e seguintes), em que o prémio devido pelo contrato seria pago em prestações mensais e sucessivas pelo mesmo segurado até ao dia 6 (seis) de cada mês subsequente – PONTO nº 14 dos Factos Provados na sentença.

    5. No dia da celebração do contrato de seguro a 1ª prestação do prémio e a que corresponde o recibo nº 1006584506 e as seguintes seriam por débito directo na conta bancária do Autor – PONTO nº 15 dos Factos Provados.

    6. Em 6 de Março de 2014 a Ré apelante tentou cobrar a 2ª...

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