Acórdão nº 20/15.0GTPNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelJORGE LANGWEG
Data da Resolução07 de Junho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 20/15.0GTPNF.P1 Data do acórdão: 7 de Junho de 2017 Relator: Jorge M. Langweg Adjunta: Maria Dolores da Silva e Sousa Origem: Comarca do Porto Secção Central | Secção Criminal Sumário: Toda a decisão penal em matéria de facto constitui, não só, a superação da dúvida metódica, mas também da dúvida razoável sobre a matéria da acusação e da presunção de inocência do arguido.

Tal superação é sujeita a controlo formal e material rigoroso do processo de formação da decisão e do conteúdo da sua fundamentação –, a fim de assegurar os padrões de exigência inerentes ao Estado de Direito.

O artigo 374º, 2, do Código de Processo Penal exige, sob pena de nulidade da sentença penal, um exame crítico dos meios concretos de prova analisados em julgamento. Este só será suficiente quando identificar cabalmente o percurso lógico-dedutivo que presidiu à convicção firmada, não se confundindo com referências genéricas que, de tão abstratas, genéricas e esvaziadas de conteúdo preciso, ou que apenas reproduzam – total, ou parcialmente - o teor da prova produzida, não permitam perceber o que de útil, em concreto, o tribunal extraiu e valorou de cada meio concreto de prova produzido em julgamento e o motivo pelo qual assim decidiu.

Acordam os juízes acima identificados do Tribunal da Relação do Porto Nos presentes autos acima identificados, em que figuram como recorrentes o arguido B..., bem como os demandantes C..., D..., E..., F... e G...; I - RELATÓRIO1. No dia 24 de Outubro de 2016 foi proferido o acórdão recorrido no âmbito dos presentes autos, que terminou com a condenação do arguido nos seguintes termos: «Assim, e pelo exposto, acordam os juízes que compõem o Tribunal Coletivo, em julgar a acusação parcialmente procedente, por provada, e consequentemente: 1) Absolver o arguido do crime de condução de condução de veículo sob influência de estupefaciente p. e p. pelo artº 292º, nº 2, do Código Penal.

2) Condenar o arguido B... pela prática como autor material de um crime de homicídio negligente, p. e p. pelo art.º 137º, nº 1, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão, cuja execução se suspende por igual período de tempo, ao abrigo do artº 50º, nº 1 e 5, do Código Penal.

3) Condenar o arguido na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor previsto no artº 69º, nº 1, al. a), do Código Penal, pelo período de seis meses.

4) Condenar o arguido nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC.

Decisão Civil Pelo exposto, acordam os juízes que integram o coletivo em julgar parcialmente procedente e provado o pedido de indemnização civil formulado a fls. 330 a 345 e consequentemente: 1) Condenam a Companhia de Seguros H..., SA, a pagar aos cinco demandantes C..., D..., E..., F... e G..., em conjunto, o montante de € 45.000,00 (quarenta e cinco mil euros), acrescido de juros legais de mora desde a presente data até integral pagamento, a título de indemnização do dano decorrente da morte de I....

2) Condenam a Companhia de Seguros H..., SA a pagar aos demandantes C..., D..., E..., F... e G..., em conjunto, o montante de € 4.500,00 (quatro e quinhentos mil euros), acrescido de juros legais de mora desde a presente data até integral pagamento, a título de indemnização do dano decorrente das dores e antevisão pelo I... da sua própria morte no momento do embate.

3) Condenam a Companhia de Seguros H..., SA, a pagar à demandante C... (esposa) o montante de € 18.750,00 (dezoito mil e setecentos e cinquenta euros), a título de indemnização dos danos não patrimoniais próprios, acrescido de juros legais de mora desde a presente data até integral pagamento.

4) Condenam a Companhia de Seguros H..., SA, a pagar à demandante C... (esposa) o montante de € 26.002,62 (vinte e seis mil e dois euros e sessenta e dois cêntimos), a título de indemnização de dano patrimonial (alimentos), acrescido de juros legais de mora desde a notificação da demandada até integral pagamento.

5) Condenam a Companhia de Seguros H..., SA a pagar a cada um dos demandantes D..., E..., F... e G... (filhos), o montante de € 11.250,00 (onze mil euros e duzentos e cinquenta euros), acrescidos de juros legais de mora, desde a presente data, até integral pagamento, a título de indemnização de danos não patrimoniais próprios.

6) Condenam a Companhia de Seguros H..., SA a pagar aos demandantes C..., D..., E..., F... e G..., em conjunto, o montante de € 1.275,00 (mil duzentos e setenta e cinco euros), a título de indemnização de dano patrimonial (vestuário e despesas funeral), acrescido de juros legais de mora desde a notificação da demandada até integral pagamento.

7) Absolvem a Companhia de Seguros H... do demais peticionado.

Custas pelos demandantes C..., D..., E..., F... e G... e pela demandada Companhia de Seguros H..., SA, na proporção dos respetivos decaimentos.

(…).» 2. Inconformado com a decisão condenatória, o arguido interpôs recurso da mesma, concluindo a respetiva motivação nos seguintes termos: «O recorrente discorda do douto acórdão, quer na apreciação da prova produzida e na determinação dos factos provados, quer na aplicação do direito.

O Tribunal "a quo" entendeu dar como provada a factualidade constante dos pontos supra indicados, com a numeração (atribuída neste recurso) 1.1,1.2,1.3,1.4,1.5,1.6 e 1.7; O Tribunal "a quo" decidiu ainda dar como não provada a matéria constante dos pontos indicados com os números 2.1,2.2,2.3,2.4,2.5 e 2.6 neste recurso; Fundamentou tais decisões na prova documental junta aos autos, nas declarações do arguido, na prova testemunhal apresentada em julgamento, "conjugada com as regras da experiência comum". Mais, Na análise crítica, conjugou toda a prova produzida em julgamento com as regras da experiência, e logrou o Tribunal formar a sua convicção relativamente à dinâmica do acidente, fixando a matéria fáctica provada e não provada nos termos já referidos.

Nos pontos 1.1,1.2, 1.3, 1.4, 2.1, 2.2, 2.3, 2.4, 2.5 e 2.6 da matéria de facto, impugnada neste recurso, está em causa, no essencial, a dinâmica do acidente ocorrido, da qual emerge o cálculo da velocidade a que seguia o veículo do arguido.

O tribunal não valorizou o depoimento do arguido por entender que não merece credibilidade, face ao depoimento das testemunhas J..., K... e cabo N..., as quais contrariam a versão do acidente relatada pelo arguido.

Note-se que nenhuma das testemunhas que, no entendimento do tribunal, descredibilizaram o depoimento do arguido, assistiu ao acidente.

O arguido, conforme é descrito na douta fundamentação do tribunal, que neste recurso aceita na integra, disse "que conduzia o veículo a velocidade não superior a 50 km/hora, quando o peão surgiu subitamente a atravessar a estrada, nesse momento encontrava-se a menos de 15 a 20 metros do local onde a vítima iniciou o atravessamento da via, provindo de trás de uma carrinha da L... que, na altura, se encontrava estacionada na berma do lado direito da faixa de rodagem, em frente à rampa visível na foto 11 de fls. 95. Mais declarou que o peão percorreu cerca de um metro da hemi-faixa de rodagem e ao aperceber-se da presença do seu veículo hesitou, isto é, a vítima parou, dando a perceber de que, por o ter avistado, não iria concluir a travessia da via e que iria voltar para trás, mas subitamente, retomou a travessia da via em passo de corrida não conseguindo evitar o atropelamento. Referiu que, logo após a ocorrência, a referida carrinha da L..., foi retirada do local por funcionário da padaria, razão pela qual não é visível nas fotos de fls. 94 a 101.

No confronto da versão do arguido com a versão trazida pelas indicadas testemunhas, apenas está em causa saber se o infeliz I... saiu ou não de trás de uma carrinha da L..., e se a mesma depois foi retirada do local por um funcionário da padaria. Ora, No momento em que chegaram, os Senhores agentes da GNR não viram a carrinha, nem fizeram qualquer referência à mesma nos seus relatórios.

Do cotejo do depoimento da testemunha J..., verificamos que não há certezas, mas apenas dúvidas, quanto à existência ou não de outra carrinha por trás dos carros estacionados na berma e refletidos nas fotografias juntas aos autos.

Esse testemunho, que é muito vago e impreciso, em nada abala as declarações prestadas pelo arguido, antes as confirma.

Existiu, pois, a tal respeito, um claro erro na apreciação da prova, talvez devido a uma certa sobrevalorização do depoimento desta testemunha em detrimento das declarações do arguido e dos demais elementos que estão demonstrados neste recurso.

O relatório de fls 134 tomou em consideração uma distância total de paragem de 26,9m como premissa para o cálculo da velocidade, desconsiderando que o rasto de travagem é de apenas 6,00 metros e que o Sr. Agente participante declarou desconhecer o local de imobilização do veículo logo após o atropelamento; Desconsiderou o estado de acentuado desgaste dos pneus do veículo do arguido, declarando que esse estado não tem influência no cálculo da velocidade; Assumiu que a vítima bateu com a cabeça no tejadilho do veículo do recorrente, desvalorizando as fortes marcas de impacto no para-brisas; Não tomou em consideração as condições morfológicas da vítima, nem as características da viatura, utilizando, sem qualquer filtro, tabelas importadas dos Estados Unidos da América; Não tomou em consideração os danos provocados no guarda-lamas lateral direito da frente, nem as implicações que podem ter no estudo da dinâmica do acidente; Não tomou em consideração o tempo ae reação do arguido ao surgimento da vítima, e, Não efetuou qualquer simulação que tivesse em consideração as declarações do arguido, isto é, que não travou antes do embate, que se desviou para não embater no peão mas que a hesitação do mesmo foi determinante para o embate.

As medições consideradas para necessidade de imobilização da viatura estão em desacordo com a própria participação do acidente, quer quanto à extensão do rasto de travagem (6,00m), quer por não ter considerado, por não...

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