Acórdão nº 4058/12.1TBGDM-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelMANUEL DOMINGOS FERNANDES
Data da Resolução23 de Janeiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 4058/12.1TBGDM-B.P1-Apelação Origem: Comarca do Porto-Santo Tirso-Inst. Central-1ª Sec.Comércio-J3 Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Miguel Baldaia 2º Adjunto Des. Jorge Seabra Sumário: I- A acção de impugnação da resolução de acto em benefício da massa insolvente onde apenas sejam impugnados factos invocados para fundamentar a resolução é uma acção de simples apreciação negativa.

II- Como assim, compete ao Administrador de insolvência a alegação e prova dos factos constitutivos do direito potestativo de resolução de acto em benefício da massa insolvente que exerceu.

III- Fora dos casos previstos no artigo 120.º, nº 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas a resolubilidade dos actos prejudiciais à massa insolvente pressupõe a prejudicialidade do acto, requisito que se não verifica se apenas se prova que determinado imóvel foi vendido pelo preço referido no respectivo acto notarial e onde se declara que já foi recebido dando-se a respectiva quitação.

*I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B… veio, por apenso ao processo especial de insolvência em que é requerente C…, SA e requerido D…, intentar a presente acção sumária contra a massa insolvente de D…, representada pelo Administrador de Insolvência, Sr. Dr. E…, peticionando se declare a ineficácia da resolução do contrato de compra e venda em benefício da massa insolvente notificada pelo Administrador de insolvência. Devendo, em consequência manter-se válida a aquisição do imóvel em causa pela Autora.

Para tanto alega, em suma, que pagou, desde que o insolvente passou a ter dificuldades financeiras, as prestações por este devidas ao credor a favor do qual se encontram registadas hipotecas sobre o imóvel, pelo que era também a A. Credora do insolvente em €23.300,00.

Mais alega que foi como forma de pagamento deste crédito que o insolvente lhe vendeu o referido imóvel, inexistindo pois qualquer simulação, sendo que a A. tem no dito imóvel a sua habitação.

Refere por último que com a venda ora resolvida os credores não foram prejudicados, antes beneficiados, porque a autora está a pagar o crédito garantido por hipoteca e o valor do bem não é suficiente para pagar os credores não garantidos.

*Contestou a Massa, impugnando os factos alegados pela A., mais reafirmando os fundamentos da resolução, nomeadamente que há muito aquela, mãe do insolvente, da situação falimentar deste, e que a alienação do imóvel foi feita apenas e tendo em vista tal situação, para subtrair o dito imóvel à liquidação, e mais que a autora não assumiu os créditos hipotecários que sobre o imóvel por si adquirido continuam a existir, mas que oneram a massa, pois que continuaram a ser titulados apenas pelo insolvente.

*Saneados os autos, realizou-se audiência de julgamento em conformidade com o que da respectiva acta consta.

*A final, foi proferido decisão que julgou a acção totalmente improcedente e julgou válida e eficaz a resolução relativa ao negócio descrito em 1º) dos factos provados.

*Não se conformando com o assim decidido veio a Autora interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela forma seguinte: 1) A questão que se coloca à douta apreciação do Meritíssimo Tribunal “ad quem”, resume-se a saber se pode considerar-se devidamente fundamentada a resolução do negócio celebrado entre a Apelante e o Insolvente, declarada pelo Sr. Administrador de Insolvência.

2) A resolução em benefício da massa insolvente pode assumir a modalidade de resolução condicional, prevista no artigo 120.º do CIRE e de resolução incondicional, ínsita nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 121.º do CIRE.

3) Em primeiro lugar, importa averiguar se, ao caso, é aplicável alguma das alíneas do último daqueles normativos legais.

4) Nos termos do disposto na alínea h), do número 1, do artigo 121º do CIRE,-único enquadrável no negócio sub judice-são resolúveis em benefício da massa insolvente, sem dependência de quaisquer outros requisitos, os actos a título oneroso realizados pelo insolvente dentro do ano anterior à data do início do processo de insolvência, em que as obrigações por ele assumidas excedam manifestamente as da contraparte.

5) Porque ali se consagra uma presunção iuris et de iure (“sem dependência de quaisquer outros requisitos”), entende a Apelante, com o devido respeito, não terem cabimento as considerações tecidas, na douta sentença proferida pelo Tribunal “a quo”, no que concerne à presunção de má fé da contraparte, relativamente ao negócio dos autos.

6) Designadamente, o [des]conhecimento por parte da impugnante da situação de iminente insolvência da R., e a [in]existência de relações especiais entre ambas.

7) De facto, um acto a título oneroso, mesmo que praticado naquele período, só é resolúvel se a obrigação nele assumida pelo insolvente for manifestamente excessiva em confronto com a atribuída à contraparte–usura (Vide artigo 282.º do Código Civil).

8) Ora, nos presentes autos, foi dado como provado que: - Sobre o imóvel alienado pelo insolvente recaíam duas hipotecas voluntárias a favor do Banco F… (ponto 2 dos factos provados).

- O insolvente adquiriu o imóvel aos anteriores proprietários por escritura celebrada em 21 de Abril de 1998 pelo preço de 5.000.000$00 (ponto 3 dos factos provados).

- Para pagamento desse preço, o insolvente contraiu empréstimo hipotecário no Banco G… SA (“G…”), no valor de 22.964,74€, constituindo-se a Apelante fiadora e principal pagadora desse empréstimo (ponto 4 dos factos provados).

- Posteriormente, em 06/11/2002, o insolvente transferiu esse empréstimo para o Banco F…, para o que contraiu empréstimo junto dessa instituição, voltando a A. a constituir-se fiadora e principal pagadora do mesmo (ponto 5 dos factos provados).

- Na mesma data, o insolvente contraiu, junto do mesmo Banco, um outro empréstimo hipotecário, no montante de 75.000,00€ para realização de obras de beneficiação do imóvel, constituindo-se também aí a Apelante fiadora e principal pagadora desse empréstimo (ponto 6 dos factos provados).

- A apelante, em meados de 2009, começou a transferir, de forma regular para o Banco mutuante, diversas quantias até que estas atingiram o montante global de EURO 19.800,00 (ponto 7 dos factos provados).

9) Desta matéria provada, resulta, inequivocamente, que a Apelante pagou, pelo imóvel, um valor manifestamente superior ao valor patrimonial deste.

10) Isto porque, enquanto que a prestação do insolvente consistiu na entrega de um imóvel cujo valor patrimonial, em 13/07/2012, era de EURO 1.041,31 (Cfr. ponto 1 dos factos dados como provados), a prestação da Apelante consistiu no seguinte: - No pagamento, ao banco mutuante, da quantia global de EURO 19.800,00 (Cfr. onto 7 dos factos provados), - No recebimento do aludido imóvel sobre o qual recaiam duas hipotecas, para garantia do reembolso de dois empréstimos hipotecários com o valor originário de EURO 22.964,74 e EURO 75.000,00–Cfr. pontos 5 e 6 dos factos provados, - Na subsistência de garantia pessoal–fiança com renúncia ao benefício da excussão prévia – para o mesmo fim–Cfr. pontos 4, 5 e 6 dos factos provados, 11) Nessa medida, por aplicação do número 3, do artigo 120º e da alínea h), do número 1, do artigo 121º do CIRE, estima a Apelante não ser válida, à luz destes preceitos legais, a resolução do contrato de compra e venda em benefício da Massa Insolvente.

12) Por outro lado, dispõe o número 1 do artigo 120º do CIRE que podem ser resolvidos em benefício da massa insolvente os actos prejudiciais à massa praticados dentro dos dois anos anteriores à data do início do processo de insolvência.

13) Considerando-se prejudiciais à massa, nos termos do número 2 daquele normativo legal, os actos que diminuam, frustrem, dificultem, ponham em perigo ou retardem a satisfação dos credores da insolvência, desde que ocorra má fé por parte de quem os outorga, sendo que esta se presume quando, para além daquela limitação temporal, neles participem pessoas que se encontrem especialmente relacionadas entre si.

14) Esta presunção de má fé, que é ilidível, verifica-se na situação dos autos, uma vez que o negócio sub Júdice ocorreu dentro daquele perímetro temporal e foi celebrado entre pessoas especialmente relacionadas entre si.

15) Sucede, porém, que, a montante desta presunção de má fé, não ocorre o pressuposto basilar da resolução, isto é, o que se acha consignado nos números 1 e 2 do artigo 120º do CIRE, concretamente a pratica de acto que diminuiu, frustrou, dificultou, pôs em perigo ou retardou a satisfação dos credores do insolvente. Senão vejamos: 16) O imóvel in casu encontra-se onerado com duas hipotecas, garantindo um valor global de EURO 97.964,74, em confronto com o seu valor...

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