Acórdão nº 3602/15.7T8OAZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Janeiro de 2017
Magistrado Responsável | ALBERTO RU |
Data da Resolução | 23 de Janeiro de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Tribunal da Relação do Porto – 5.ª Secção.
Recurso de Apelação.
Processo n.º 3602/15.7T8OAZ da Comarca de Aveiro – Oliveira Azeméis – Instância Central – 2.ª Secção de Comércio – J2*Juiz relator……………...Alberto Augusto Vicente Ruço 1.º Juiz-adjunto…………Ana Paula Pereira de Amorim 2.º Juiz-adjunto…………Manuel Fernandes*Sumário O facto do réu não poder estar presente, em pessoa, nas instalações ou meio físico onde a sociedade desenvolve a sua actividade, com o fim de desempenhar os deveres de gerente, pode constituir causa de destituição de gerente, nos termos do n.º 6 do artigo 257.º do Código das Sociedades Comerciais (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 262/86, de 02 de Setembro).
*RECORRENTE…………………B…, NIF ………, com residência habitual em …, n.º .., …, …, …, Estado de São Paulo.
RECORRIDO……………………C…, NIF ………, residente na Avenida …, n.º .., Santa Maria da Feira.
*I. Relatório
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O Autor C…, ora recorrido, instaurou a presente acção especial de destituição de gerente, nos termos do artigo 1055.º do Código de Processo Civil, contra o Réu B…, ora recorrente, com o fim de obter decisão judicial que destituísse este último da gerência da sociedade «D…, Lda.», alegando, para o efeito, factos tendentes a demonstrar que o mesmo violou reiteradamente os seus deveres enquanto gerente, porquanto revogou a procuração em que tinha instituído como seu representante o Autor, pelo que sendo necessárias duas assinaturas para obrigar a sociedade, com tal revogação a vida da sociedade ficou comprometida no seu normal desempenho.
O Réu contestou alegando, em síntese, que revogou a procuração por ter perdido a confiança que depositava no Autor, o qual, diz, lhe negou o acesso a informações sobre a vida da sociedade, tendo, no entanto, convocado logo uma assembleia da sociedade para nomear novo gerente à qual o Autor não compareceu, sendo certo que caso tivesse comparecido teria sido nomeado um procurador que assegurasse as funções que o Autor deveria desempenhar.
No final, foi proferida a seguinte decisão: «Em face de todo o exposto, decidimos julgar a acção procedente, e em consequência do que declaramos o réu destituído do cargo de gerente da empresa “D…, Lda.” Custa pelo réu – artigo 527ºdo CPC.» b) É desta decisão que o Réu recorre, tendo apresentado as seguintes conclusões [1]: «1 - O apelado não fez prova da factualidade integradora da justa causa da destituição das funções de gerente do apelante.
2 - Foi dado como não provado os artigos 17.º, 26.º, 28.º, 29.º, 30.º, 32.º, 35.º, 39.º e 40.º da petição inicial do apelado e que fundamentavam o seu pedido de destituição: 17º Era o Autor quem, quando estava com o Réu em Portugal, tomava a iniciativa e dava conta a este da situação da sociedade.
26º O não pagamento desses valores está a levar que os fornecedores da sociedade deixem de fornecer a matéria-prima e os produtos que esta necessita para exercer a sua atividade.
28º Face à impossibilidade de movimentar as contas bancárias da sociedade e de sacar cheques sobre as mesmas, registaram-se já atrasos no pagamento de salários aos trabalhadores da sociedade, há mesmo alguns trabalhadores que ainda não receberam a totalidade do salário de Junho.
29º Assim como está em falta o pagamento de valores devidos pela sociedade à Segurança Social e ao Fisco que se venceram após 18/06/2015.
30º Bem como o IVA.
32º Acresce que Para poder fechar e celebrar um contrato de venda de embalagens a uma grande empresa de distribuição, a “E…”, a sociedade “D…, LDA” tem de obter e apresentar a essa empresa o documento bancário respeitante às suas contas bancárias.
35º A sociedade “D…, LDA”, por força do comportamento do Réu, seu sócio e gerente, está prestes a perder um excelente contrato de venda, bastante importante para a sua faturação e para a sua atividade durante os anos de duração desse contrato.
39º Não tem aliás, conhecimentos técnicos para a gestão da atividade da “D…”.
40º E até a sua idade de cerca de 80 anos dificulta, se não, impede, mesmo, a gestão.
3 - Para a destituição de um gerente os Tribunais tendem a erigir padrões de exigência em relação à prova da existência de condutas negligentes, particularmente elevados.
4 - Desde o ano de 1993 o apelado, sobrinho do apelante, vem por meio de procuração gerindo sozinho a sociedade D…, Lda., de facto e de direito. Em 18 de Junho de 2015 o apelante revogou a procuração que tinha conferido ao apelado seu sobrinho.
DA OPORTUNIDADE No dia 24 de Julho de 2015, no espaço de 1 mês, o apelado intenta contra o apelante acção de destituição e suspensão do cargo de gerente.
Pergunta-se Venerandos Juízos Desembargadores: - neste período curto de tempo há matéria suficiente e bastante para destituir o apelante? Entendemos, salvo o devido respeito, que não.
5 - Para que a acção de destituição proceda é necessário não só a existência de uma conduta violadora dos deveres da gerência mas também causadora de danos.
6 - Os gerentes devem gerir com cuidado, o que implica, designadamente, a disponibilidade, a competência e o conhecimento.
Contudo, trata-se de matéria a clarificar caso a caso.
7 - No caso concreto o apelante tem disponibilidade, competência técnica e o conhecimento da actividade da sociedade.
8 - Quanto à competência técnica e conhecimento da actividade do apelante não foi posta em causa pelo Tribunal: - O apelante é empresário de sucesso no Brasil onde gere as suas empresas há mais de 50 anos.
- Tem no Brasil, nas empresas de que é administrador, cerca de 150 trabalhadores a seu cargo.
- Foi o apelante que criou a marca D… no Brasil e depois em Portugal que é a continuação das suas empresas no Brasil as quais têm o mesmo objecto.
- O apelante tem competência e conhecimentos técnicos para a gestão da actividade da D…, Lda., em Portugal.
9 - O apelante, salvo o devido respeito, não violou o artigo 64.º nº 1 al. a) revelado na disponibilidade e no exercício das funções com diligência de um gestor criterioso e ordenado.
10 - A gerência é o órgão de administração da sociedade por quotas. Cabe-lhe, assim, praticar os actos necessários ao seu funcionamento e à realização do seu objecto, ou seja, à prossecução da actividade social.
11 - Salvo o devido respeito, é redutor a interpretação da Meritíssima Juiz “a quo” quanto ao conceito de disponibilidade.
12 - Tal disponibilidade no mundo global actual não tem de ter uma presença diária física.
13 - A presença diária física, na empresa, é redutora na sociedade globalizada.
14 - O apelante conforme decorre do seu depoimento, demonstrou a disponibilidade para gerir a empresa D… em Portugal no Brasil.
15 - A prática de actos de gerência das sociedades pode ser feita fora da sede social, em território nacional e no estrangeiro.
16 - Diz a Meritíssima Juiz “a quo” na sentença de fls.
É certo que em Julho deu ordens de pagamento necessários para pagamento de alguns fornecedores, mas esse acto não se traduz num acto de gestão diária, informada, criteriosa e interessada. E foi apenas esse o acto que praticou.
17 - Para além das ordens de pagamento praticou outros actos de gerência. O apelante B… antes de se deslocar ao Brasil praticou actos internos, gerindo os meios, assinando em particular algumas coisas para o seu sócio pagar, nomeadamente um cheque para o mesmo pagar o que precisasse.
18 - Vejamos o depoimento do apelante e das testemunhas do apelante quanto à sua disponibilidade e aos actos de gestão que praticou após a revogação da procuração: Depoimento de parte/ declarações de parte do apelante B… (…) Depoimento da testemunha do apelante F… (…) Depoimento da testemunha do apelante Dr. G… (…) 19 - O apelante praticou também actos externos, intervindo no comércio jurídico, pagando a fornecedores estrangeiros.
20 - Convocou, em 24 de Julho de 2015, uma Assembleia Geral Extraordinária da sociedade D…, Lda.
21 - O apelado não compareceu à Assembleia. Justificou a sua ausência com o gozo de férias.
22 - A gestão da sociedade nunca esteve em causa. O gozo de férias é um direito do apelado, mas se estava em causa a vida societária existe um interesse social superior que deve prevalecer.
23 -A disponibilidade e interesse do apelante contrasta com o desinteresse do apelado na resolução conjunta da vida societária.
24 - A presença física do apelante não é indispensável ao governo da sociedade D…, Lda.
25 - O apelante não praticou conduta desleal, em relação aos interesses da sociedade, com os interesses dos credores.
26 - Não ficaram demonstrados prejuízos, quer para a sociedade, quer para os sócios, quer para os credores e funcionários.
27 - Diz a Meritíssima Juiz “ a quo “ na sentença de fls. “ O réu violou o dever de cuidado, demonstrando não ter disponibilidade e não actuou como um gestor criterioso e ordenado na medida em que, após ter revogado a procuração ausentou-se para o Brasil e deixou o autor sem conseguir gerir a empresa”.
O apelante não aceita e repudia de forma veemente, pois é falso, o argumento, a ideia que após a revogação da procuração ausentou-se para o Brasil sem conseguir o apelado gerir a empresa.
28 - Não existe prova nos autos em que dia o apelante viajou para o Brasil.
29 - O apelado não conseguiu demonstrar que, a ausência temporária do apelante, impediu de governar a sociedade.
30 - Não resulta demonstrado que o apelante não tenha actuado como um gestor criterioso e ordenado Vejamos, 31 - Depois de revogada a procuração o apelante, na qualidade de gerente, praticou actos de gestão corrente e demonstrou interesse e disponibilidade: - assinou algumas coisas para o apelado pagar nomeadamente um cheque para pagar o que ele precisasse. (ver depoimento do apelante de 00:17:43 a 00:18:06).
- assinou 3 ordens de pagamentos a fornecedores.
- convocou uma Assembleia Geral Extraordinária para o mês de Agosto de 2015. Fls. 89 e 90.
- convocou outra Assembleia Geral Extraordinária para o mês de Fevereiro de 2016. Fls. 166 a 174.
Veja-se os depoimentos das testemunhas do apelante F… a (00:09:32 a 00:10:56 e 00:11:51 a 00:13:15) e Dr. G… (00:15:47...
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