Acórdão nº 1859/10.9TBFLG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA CEC
Data da Resolução10 de Janeiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 1859/10.9TBFLG Comarca do Porto Este, Felgueiras, instância local, secção cível - J1 AcórdãoAcordam no Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B…, com benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, residente no lugar …, …, …-Felgueiras, intentou a presente ação declarativa constitutiva, sob a forma de processo ordinário, contra C… e D…, residentes no lugar …, …, ….-… Felgueiras, pedindo: a) a anulação da partilha realizada por escritura pública datada de 09/03/2000, na qual foi adjudicado aos réus o prédio misto descrito na Conservatória do Registo Predial de Felgueiras sob o n.º 00173 e inscrito na matriz urbana 141.º e na matriz rústica 178.º, atual matriz urbana 359.º da freguesia de …; b) o cancelamento, na respetiva Conservatória do Registo Predial de Felgueiras, de todos e quaisquer registos prediais, eventuais, provisórios ou definitivos, relacionados com os prédios partilhados entre o autor e restantes filhos e adjudicados aos aqui réus.

Alegou, para tanto, que tem sete filhos: E…, F…, G…, H…, I…, J… e C…. Contando com 86 anos de idade, decidiu efetuar partilha parcial em vida de alguns dos seus prédios, outorgando a escritura pública lavrada em 09/09/1997 para levar a cabo essa partilha. Nessa escritura ao filho C… foi adjudicada a raiz ou nua propriedade do prédio nela descrito e ao autor foi adjudicado o respetivo usufruto. Começaram, então, os réus a afirmar que o prédio que lhes tinha sido adjudicado naquela escritura de partilha parcial de bens estava mal identificado e que a escritura necessitava de ser retificada para poder registar o prédio em seu nome. E, na escritura de partilha, não tinha ficado incluída a parcela de terreno destinada ao quintal do prédio urbano composto de casa de rés-do-chão e andar, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 141.º, a qual se achava inserida em parte do prédio rústico na matriz sob o artigo 178.º. Nessa medida, o autor e os irmãos aceitaram celebrar nova escritura com a antedita finalidade. Os réus trataram de toda a documentação, foi feita a escritura subsequente, em 09/03/2000, e, mais tarde, verificaram que aqueles não realizaram a combinada escritura de retificação, mas sim a escritura de partilha total e integral de todos os bens que faziam parte do património hereditário do autor e sua falecida esposa, adjudicando ao réu marido o prédio misto, sito no lugar …, composto por casa de rés-do-chão e andar e quintal, cultura com videiras em ramada e mato, descrito na Conservatória do Registo Predial de Felgueiras sob o n.º 00173, inscrito na matriz sob os artigos 141.º urbano e 178.º rústico, apesar de terem apenas acordado a partilha parcial do prédio urbano composto de casa de rés-do-chão e andar, sito no lugar …, freguesia de …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Felgueiras sob parte do n.º 00173 e inscrito na matriz urbana sob o n.º 141 e, da matriz rústica n.º 178, o quintal da casa de habitação, a adjudicar ao filho C…, e a restante parte do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Felgueiras sob o n.º 173, isto é, o prédio rústico inscrito na matriz sob o n.º 178, composto de quintal com cultura com videiras em ramada e mato, com área de 9.190 m2, a adjudicar futuramente aos herdeiros descendentes G… e E…. Futuramente, porque era necessário proceder à divisão do terreno, através de loteamento ou destaque, operações que eram dispendiosas e estes herdeiros não dispunham de capacidade financeira para suportar tais custos e para pagar as tornas devidas aos restantes herdeiros, e ainda porque o autor pretendia continuar a beneficiar dos rendimentos agrícolas que eram extraídos deste prédio rústico. Na escritura de partilha celebrada no dia 09/03/2000 não foi explicado aos seus outorgantes o seu conteúdo, limitando-se o autor e os restantes filhos e cônjuges a assinar a escritura e à pressa, sem que lhes fosse entregue qualquer cópia ou minuta para conferência. Acresce que as matrizes declaradas deram origem à inscrição matricial urbana n.º 359 da freguesia de …, que está inscrita a favor do autor, como proprietário pleno, tendo subscrito aquela escritura convencidos que, como tinham acordado entre todos, a partilha seria do prédio descrito na Conservatória em parte do prédio com o n.º 173 e inscrito nas finanças no artigo urbano 141.º e em parte do artigo rústico 178.º, do que os réus tinham perfeito conhecimento. Houve vício na formação da vontade do autor, nomeadamente, erro na declaração, pelo que nos termos do disposto no artigo 247.º do Código Civil ocorre a anulabilidade da declaração negocial feita pelo autor na escritura de partilha outorgada em 09/03/2000.

Juntou documentos.

Regularmente citados, com benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, os réus contestaram, excecionando a ilegitimidade ativa por preterição de litisconsórcio necessário ativo, a determinar a necessária intervenção de todos os outorgantes da escritura de partilha. Mais arguiram a ineptidão da petição inicial, por contradição da causa de pedir com o pedido, e excecionaram a caducidade do direito do autor, que intentou apresente ação em 02/11/2010 para evocar a anulabilidade da escritura de partilha outorgada em 09/03/2000. Impugnaram os factos alegados pelo autor quanto ao desconhecimento do conteúdo da escritura a anular e defenderam a improcedência da ação.

Na réplica, o autor manteve a posição assumida na petição inicial, defendeu a improcedência das arguidas exceções e deduziu o incidente de intervenção principal provocada dos restantes filhos e respetivos cônjuges.

Admitida a intervenção dos chamados, citados para os termos ação, não apresentaram contestação nem constituíram mandatário.

Sob determinação do tribunal foi efetuado o registo da ação.

Dispensada a realização de audiência preliminar, foi proferido o despacho saneador que julgou suprida a ilegitimidade ativa, improcedente a exceção dilatória de ineptidão da petição inicial e relegada para final a decisão da exceção perentória de caducidade. Feita a condensação do processo, foi objeto de reclamação do autor, que não foi atendida.

Por óbito do chamado F…, foi proferida sentença de habilitação dos seus herdeiros, K…, L… e M….

Procedeu-se à realização da audiência final com observância das formalidades legais e foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: «Nos termos e fundamento expostos, decide o Tribunal julgar a presente ação totalmente procedente, por provada e, nesta sequência: - declara anulada a partilha titulada pela escritura pública celebrada em 09/03/2000, melhor identificada no facto provado l); - determina o cancelamento do registo sob a AP 12 de 2000/03/22, concernente ao facto aquisitivo identificado no facto provado l), que se reporta ao prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Felgueiras, freguesia de …, com o n.º 173/19940623, nos termos do artigo 13.º do Código do Registo Predial».

Irresignados, recorreram os réus da sentença, assim concluindo a sua alegação: «1. Com recurso à reapreciação da prova gravada, os Recorrentes impugnam a decisão da matéria de facto das alíneas f), g), h), i), j), k), m), n), o), p), q), u), v), w), x), y), bb) e cc) dos factos provados, e dos pontos 7) e 9) dos factos não provados, pretendendo que sobre eles sejam proferida a seguinte decisão: a. Julgados não provados os factos das alíneas f), g), h), i), j), k), m), n), o), p), q), u), v), w), x), y) e bb) da fundamentação de facto; b. Alterada a redacção o facto cc) e julgando-se provados os pontos 7 e 9, com a seguinte redacção: cc. Entre os Autores e os Réus ocorreu uma desordem nem data não concretamente apurada, mas pelo menos há 12 anos.

  1. Julgados provados os pontos 7 e 9, com a seguinte redacção: 7. Na ocasião descrita em cc), o Autor já sabia que a escritura de partilha identificada em l) titulava a partilha de todos os seus bens e da sua falecida esposa; 9. Conhecimento esse que continuou a manter ao longo do tempo.

2. Com efeito, com a entrada em vigor no novo CPC, é hoje entendimento pacífico que os Tribunais da Relação devem fazer o seu próprio julgamento da matéria de facto, procurando, de forma livre, a sua própria convicção e assim verdadeiramente concretizando o princípio do duplo grau de jurisdição; 3. O Tribunal a quo esforça-se, ao longo das 20 páginas da motivação, por explicar porque razão o depoimento de N… permitiu julgar provada a factualidade plasmada nas alíneas f), g), h), i), j), k), m), n), o), p), q), u), v), w), x), y) e bb) da fundamentação de facto, porém sem respalde na gravação; 4. N… admite não ter assistido a nenhuma negociação entre o A., o R. marido e os Chamados, não ter estado presente na outorga da escritura e, não menos importante, que tem interesse directo no desfecho da lide; 5. Tal testemunha demonstra especial animosidade e azedume em relação a R. marido, afirmando ter vergonha de ser sobrinha dele; 6. Surpreendendo ao afirmar que está irremediavelmente incompatibilizada com o R. marido por essa razão, mas que os seus pais e tios não, sendo outro o motivo; 7. N… revela total parcialidade, mostrando-se indisponível para, depondo de forma espontânea e descomprometida, falar com toda a verdade mesmo que isso prejudicasse a posição do A. e dos Chamados, o que se verificou quando alterou o teor do seu depoimento quando percebeu que as suas afirmações iam de encontro com a excepção dilatória de caducidade alegada pelos RR.; 8. Analisado o depoimento da testemunha N… sem recurso a qualquer presunção ou exercício de suposição, resulta que o seu conhecimento se resume ao que “ouviu dizer” do A., dos pais e dos tios (Chamados), sem que se esclarecesse se aquilo que “ouviu dizer” foi algum tempo depois da outorga da escritura, ou se ouviu dizer agora; 9. Concretizando, N… afirmou o A. e a sua esposa (AC…), ainda viva, terão decidido partilhar os seus bens pelos 7...

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