Acórdão nº 148/14.4TVPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelANABELA DIAS DA SILVA
Data da Resolução10 de Janeiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação Processo n.º 148/14.4 TVPRT.P1 Comarca do Porto – Porto – Instância Central – 1.ª Secção Cível – J2 Recorrente – B…, SA Recorrida – C…, Ld.ª Relatora – Anabela Dias da Silva Adjuntas – Desemb. Ana Lucinda Cabral Desemb. Maria do Carmo Domingues Acordam no Tribunal da Relação do Porto (1.ªsecção cível) I – B…, SA, com sede em …, …, Felgueiras, intentou na Comarca do Porto – Porto – Instância Central – 1.ª Secção Cível a presente acção declarativa sob a forma de processo comum contra C…, Ld.ª, com sede na Rua …, n.º . no Porto, pedindo que: 1. fosse declarado resolvido o contrato promessa de compra e venda celebrado entre autora e ré, devido a impossibilidade definitiva e culposa de cumprimento por parte desta; 2. fosse condenada a ré a devolver o sinal prestado, no montante de €116.850,00, em dobro; 3. e a pagar juros de mora desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Para tanto, alegou em síntese que entre a autora (como promitente-compradora) e a ré (como promitente-vendedora) foi celebrado o contrato promessa de compra e venda a que se referem os autos, estando a ré definitivamente impossibilitada de cumprir a obrigação prometida por, entretanto, ter vendido a(s) fracção (fracções) a terceiros.

*Pessoal e regularmente citada, a ré veio contestar ré por excepção, invocando caso julgado anterior, impugnando a versão dos factos tal como apresentada pelo autora e fornecendo a sua própria versão dos mesmos, que deverá conduzir à absolvição dos pedidos formulados, bem como deduziu reconvenção, pedindo que: A - fosse declarado o incumprimento definitivo e culposo, por parte da autora, do contrato, e o consequente direito da autora a fazer suas as quantias pagas a título de sinal, no valor de €116.850,00, condenando-se a ré nesses preciso termos; ou se assim não se entender, B - fosse a ré condenada a ressarcir a autora das despesas em que esta incorreu - e venha a incorrer, até ao cumprimento ou resolução do contrato - com a mora da autora, no valor, até à data, de €38.224,01, e dos restantes danos, a apurar em execução de sentença, acrescidos dos juros de mora, à taxa legal, desde os respectivos vencimentos e até efectivo e integral pagamento.

*A autora respondeu à contestação.

*Realizou-se audiência prévia, após o que foi proferido despacho saneador/sentença, onde se veio a decidir: “Em conclusão, tudo ponderado e ao abrigo das disposições legais supra referidas, nesta acção em que é autora/reconvinda B…, SA, e em que é ré/reconvinte C…, Ld.ª, ambas com os demais sinais dos autos, julgo improcedentes tanto a acção como a reconvenção e, em consequência, decido: A- julgar improcedente a excepção dilatória de caso julgado invocada pela ré, dela absolvendo a autora; B- Absolver a ré de todos os pedidos contra ela formulados pela autora em sede de acção, bem como absolver a autora de todos os pedidos contra si formulados pela ré em sede de reconvenção”.

*Inconformada com tal decisão dela veio a autora recorrer de apelação pedindo que a mesma seja revogada e substituída por outra que julgue procedente o pedido principal, considerando-se resolvido o contrato promessa e que seja a ré condenada a restituir à autora/apelante o sinal prestado em dobro, acrescido de juros moratórios à taxa legal a contar da citação e até integral pagamento.

A apelante juntou aos autos as suas alegações que terminam com as seguintes e manifestamente prolixas conclusões: 1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida nos autos, na firme convicção que a mesma incorreu na prática de uma nulidade processual de acordo com o disposto no art.º 195.º do CPC, atento o incumprimento da uma formalidade legalmente prescrita e que, em boa verdade, influenciou o exame e decisão da causa, bem como de uma errada e insuficiente qualificação jurídica que serviu de base à decisão, a qual vai em sentido diferente daquele que V.ªs Ex.ªs elegerão, certamente, como mais acertada depois da necessária reponderação dos pertinentes pontos da matéria de facto e de Direito.

  1. A autora B…, Ld.ª propôs a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra C…, SA, peticionando: a) que seja declarado resolvido o contrato-promessa de compra e venda celebrado entre os autores e a ré melhor identificado nos itens 1 a 4 da P.I.; b) que seja a ré condenada a restituir à autora a quantia recebida a título de sinal em dobro, no valor de 116.850,00€, acrescida de juros legais desde a citação da ré e até efectivo pagamento.

  2. Esta acção foi intentada na sequência de outra anterior, também proposta pela autora/apelante que peticionou que fosse declarado nula a resolução do mesmo contrato de promessa, operada pela ré.

  3. Na qual foi proferido Acórdão pelo STJ, em 21 de Janeiro de 2014, que considerou válido o contrato-promessa e que a autora se encontrava em mora debitoris.

  4. Entretanto, ainda na pendência do recurso no STJ, a ré, em 5.07.2012 vendeu a terceiro a fracção prometida.

  5. O saneador-sentença julgou a acção improcedente, e, em consequência, decidiu: a) não declarar resolvido o contrato-promessa de compra e venda, discutido nos autos; b) não condenar a ré a devolver o sinal dobrado.

  6. No entanto, esta sentença foi proferida sem que as partes fossem notificadas para a finalidade prevista no art.º 591.º n.º 1 al. b) do C.P.C., pelo que, foram confrontadas com um despacho saneador-sentença, que conheceu do mérito da causa, sem que lhes tenha sido facultada a oportunidade processual de se pronunciarem quer de facto quer de direito.

  7. A formulação legal determina que o Juiz só estará habilitado processualmente a conhecer do mérito da causa, se convocar as partes, obrigatoriamente, para a audiência prévia em despacho que expressamente contenha o objectivo e/ou finalidade previsto no art.º 591.º n.º 1 al. b) do C.P.C., sob pena de o não fazendo, violar o disposto nos art.ºs 6.º, n.º 1 e 3.º n.º 3 do mesmo código.

  8. A prolação de decisão final de mérito em saneador-sentença com dispensa de audiência prévia, desacompanhada da prévia auscultação das partes constitui nulidade susceptível de influenciar o exame e a decisão da causa e prevista no art.º 195.º n.º 1 do C.P.C.

  9. Deste modo, deve ser a sentença ser anulada bem como os termos processuais subsequentes à mesma.

  10. Caso assim não seja entendido, a autora também não se conforma com a decisão do Tribunal a quo, porquanto, fundamentou o Mm.º Juiz a sua decisão no facto de entender que a venda a terceiro da fracção prometida vender, não significa, sem mais, o incumprimento definitivo do contrato-promessa, pois que a mesma ainda é possível, fazendo a ré intervir o terceiro, readquirindo a fracção ou outras diversas soluções, que não especificou.

  11. A sentença recorrida considera que ambas as partas ainda mantêm interesse no negócio, pelo que devem interpelar-se mutuamente por forma cumpri-lo, com o que se discorda, 13. São três as questões do dissídio que opõem a autora relativamente à decisão do tribunal a quo.

  12. A primeira, saber se a alienação a terceiros da fracção habitacional prometida vender, configura Incumprimento definitivo do contrato promessa de compra e venda.

  13. A segunda, saber se a recorrente deveria interpelar a parte contrária para cumprir a sua obrigação.

  14. A terceira, saber se, apesar de alienado a terceiro, o bem, objecto do contrato ainda pode ser possível a prestação da ré e se assim se entender, saber se foi acertada a decisão de por fim ao processo, ou se, porventura, deveria passar-se à fase instrutória, para que a ré provasse, como lhe competia, de que forma a poderia cumprir.

  15. Quanto à primeira questão, a recorrente fundamentou o seu pedido de resolução do contrato promessa de compra e venda no facto de ter constatado que a promitente vendedora alienou a fracção habitacional prometida, vender, a terceiro.

  16. Entendeu o Tribunal a quo, que o facto da fracção habitacional se mostrar registada em nome de terceira pessoa, não significa que o contrato se mostra definitivamente incumprido, 19. Sublinhe-se que a autora efectivamente alegou – art.º 25.º da P.I. que a promitente vendedora havia vendido a fracção a terceira pessoa, a qual registou em seu nome, conforme atestava a cópia do registo na conservatória predial, correspondente, 20. E posteriormente juntou aos autos, cópia da escritura de compra e venda, na qual ficou a constar que o comprador declarou “... que a fracção autónoma ora adquirida se destina exclusivamente a sua habitação própria e permanente”.

  17. Apesar disso, o Tribunal a quo, malgrado manifestar conhecer a jurisprudência que milita no sentido apontado pela autora, decidiu que não podia subscrever tal entendimento sem mais.

  18. Prosseguindo, mais adiante, que não está demonstrado que tal incumprimento se mostre como incumprimento definitivo que justifique a resolução do negócio sem mais.

  19. No entanto, e recorrente entende que um dos efeitos essenciais de compra e venda é a "transmissão da propriedade da coisa", de acordo com o disposto nos artigos 408.º, n.º1, 874.º e 879.º, alínea a), do Código Civil.

  20. De modo que, vendida a coisa a terceiro, o promitente vendedor já não pode vendê-la, segunda vez, ao promitente-comprador, pois ela deixou de ser sua, pelo que se colocou na posição de, por culpa própria, lhe ser impossível satisfazer a sua prestação prometida.

  21. É esta a posição que cremos ser unânime, quer na doutrina quer na jurisprudência, pelo que a posição do tribunal a quo se afigura única e isolada.

  22. Na doutrina, apontam-se, entre outros, Brandão Proença, “A Resolução do Contrato no Direito Civil", pp. 89 a 92, Antunes Varela, "RLJ ano 121", pp. 223 e ss. e "Das Obrigações em Geral, II, reimpressão 7.ª edição", p. 74; Pires de Lima e Antunes Varela, "Código Civil Anotado, Vol. II, 4.ª Edição Revista e Actualizada", pp. 58-59, nota 4, Vaz Serra em anotação a acórdão na "RLJ 100, n.º 3349 de 15.12.1967". pp. 253 e 55; Galvão Telles, "Direito das obrigações", pág. 90, 145/146; Baptista Machado "Pressupostos de...

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