Acórdão nº 5/14.4T8OAZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelPAULA LEAL DE CARVALHO
Data da Resolução30 de Janeiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Procº nº 5/14.4T8OAZ.P1 Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 922) Adjuntos: Des. Jerónimo Freitas Des. Nelson Fernandes Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B… intentou ação declarativa de condenação, com processo comum, contra C…, pedindo o reconhecimento da existência, validade e eficácia de um contrato de trabalho subordinado sem termo, entre o autor e a ré, vigente desde 05.09.2012 até 15.09.2013, e em consequência ser a ré condenada a pagar-lhe: i) a remuneração correspondente ao trabalho experimental por este prestado no mês de Setembro de 2012, no montante de €433,33; ii) a remuneração correspondente ao trabalho prestado pelo autor no mês de Outubro de 2012, no montante de €500,00; iii) os proporcionais do subsídio de Natal, referentes aos anos de 2012 e 2013, no montante de €520,84; iv) a retribuição do período de férias e subsídio, referentes aos anos de 2012 e 2013, no montante total de €1.043,56; v) a retribuição correspondente ao total das setenta horas de formação, relativas aos anos de 2012 e 2013, no montante de €248,52; vi) a retribuição correspondente às cento e noventa e nove horas de trabalho suplementar prestadas pelo autor, no montante de €883,56; vii) o reembolso das despesas suportadas pelo autor a favor da ré, montante de €135,00; e viii) juros de mora, vencidos e vincendos, devidos até ao efetivo e integral pagamento das quantias supra mencionadas, cifrando-se, os vencidos, calculados à taxa legal em vigor, em €176,62.

Para tanto alegou, em síntese, que: celebrou um contrato de trabalho com a ré, prestando-lhe serviços de elaboração de peças processuais e realizando diligências, trabalho que era executado no horário indicado pela ré, no seu escritório, sob instruções desta, contra a remuneração de € 500 mensais, tendo trabalhado para além do horário fixado; não lhe foi pago o primeiro mês de salário na medida em que a ré entendeu que se tratava do período experimental sem remuneração, nunca lhe tendo sido pago qualquer valor a título de horas extraordinárias, subsídio de férias e de natal, pagamento de férias, nem um valor de despesas que fez por conta da ré, bem como não lhe foi prestada formação.

A Ré contestou alegando, em síntese, que não existiu qualquer contrato de trabalho mas antes um contrato de prestação de serviços, não havendo horário de trabalho, nem instruções dadas pela ré ao autor, sendo que caso assim não se entenda ocorreu já a prescrição dos alegados créditos laborais. Invocou ainda a incompetência material do tribunal e o abuso de direito pois, segundo diz, o A. nunca pôs em causa, durante a sua vigência, o contrato de prestação de serviços existente, nunca reclamou pagamentos de férias, subsídio de férias e de Natal. Requereu também a condenação do A. como litigante de má-fé.

O A. respondeu pugnando pela improcedência das exceções e do pedido de condenação como litigante de má-fé.

Proferido despacho saneador, no qual se julgaram improcedentes as exceções da incompetência material e da prescrição, dispensada a seleção da matéria de facto e realizada a audiência de discussão e julgamento, com gravação da prova pessoal, foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: “julgo parcialmente procedente a ação e, em consequência, declaro a existência, validade e Deficácia de um contrato de trabalho subordinado sem termo, entre o autor e a ré, vigente desde 05.09.2012 até 15.09.2013, e em consequência condeno a ré no pagamento ao autor: Da remuneração correspondente ao trabalho experimental por este prestado no mês de Setembro de 2012, no montante de €433,33; Da remuneração correspondente ao trabalho prestado pelo autor no mês de Outubro de 2012, no montante de €500,00; Dos proporcionais do subsídio de Natal, referentes aos anos de 2012 e 2013, no montante de €520,84; Da retribuição do período de férias e subsídio, referentes aos anos de 2012 e 2013, no montante total de €1.043,56; Do reembolso das despesas suportadas pelo autor a favor da ré, montante de €135,00; e Dos juros de mora, vencidos desde a cessação do contrato e vincendos, devidos até ao efectivo e integral pagamento das quantias supra mencionadas.

No mais, julgo improcedente a ação e, em consequência, absolvo parcialmente ré do pedido.

Julgo improcedente o pedido de condenação do autor e do seu mandatário como litigantes de má-fé.

Condeno autor e ré no pagamento das custas, na proporção do decaimento, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que o autor beneficia.

Valor da causa: €3.941,43.”.

Inconformada, a Ré veio recorrer, tendo arguido, no requerimento de interposição do recurso, nulidade da sentença e tendo, a final das suas alegações, formulado as seguintes conclusões: “1 - Ora, salvo o devido respeito – que é muito – a douta Sentença recorrida ao decidir como decidiu, fez uma valoração errónea dos factos dos Autos, considerando como provados alguns factos que, como se verá, não ficaram provados na Audiência de Discussão e Julgamento.

2 - Assim, afigura-se premente, desde já, confrontar os requisitos exigíveis para a verificação da presunção da existência de um contrato de trabalho, previstos no artigo 12.º do Código do Trabalho e a não subsunção dos mesmos a uma evidente situação de prestação de serviços – conforme sucede in casu –. Vejamos: 3 - Quanto ao local do exercício da actividade do Autor, ora Recorrido, bem como no que respeita aos equipamentos e consumíveis por este utilizados, sempre se dirá que o ora Recorrido desempenhava as suas funções, enquanto Advogado Estagiário, no escritório de Advogados da ora Recorrente e do Advogado abaixo signatário.

4 - Sendo que, de outra forma, não o poderia ser, porquanto o fim último da actividade era o resultado do cumprimento de prazos processuais, resposta a e-mails e demais questões suscitadas, no interesse e por solicitação dos Clientes da aqui Recorrente, cujos documentos se encontravam, fisicamente, no escritório da aqui Recorrente, conforme se afigura lógico.

5 - No tocante, à propriedade dos instrumentos de trabalho, o aqui Recorrido, de facto, utilizava o computador pertencente à aqui Recorrente, sendo certo, aliás, que a mesma adoptou um sistema de rede, dentro do qual encontravam-se todas as pastas dos seus Clientes, sendo acessíveis apenas por esta via, atenta a necessidade de a aqui Recorrente manter o controlo e a confidencialidade sobre os processos em curso.

6 - Evidente se afigura que não se encontra preenchido o pressuposto previsto nas alíneas a) e b) do número 1 do artigo 12.º do CT, o que não se pode deixar de alegar, para os devidos efeitos legais.

7 - Ora, no que respeita ao horário de trabalho, afigura-se evidente que o ora Recorrido foi informado do horário de funcionamento do escritório, mas tal não significa – como não significou jamais – que este tivesse que se reger pelo mesmo.

8 - O aqui Recorrido não possuía qualquer horário de entrada e de saída, desempenhando as suas funções no estrito intuito de obter determinado resultado fruto da sua actividade, pelo que a comparência do ora Recorrido, no escritório da aqui Recorrente, nunca observou um horário certo e previamente determinado, perante qualquer subordinação laboral à mesma.

9 - Jamais esteve o aqui Recorrido obrigado ao cumprimento de qualquer horário, tanto mais que não teria que permanecer no escritório da aqui Recorrente caso não tivesse tarefas para executar e, por outro lado, caso as mesmas revelassem a necessidade de o aqui Recorrido despender mais tempo, atenta a complexidade das mesmas, este ficaria no escritório da ora Recorrente até à obtenção do respectivo resultado a que se havia proposto, pois não podemos desassociar as funções do aqui Recorrido às de um advogado estagiário e, como tal, pautada pelo cumprimento de prazos processuais.

10 - Vejamos, neste sentido, o vertido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito do Processo n.º08S1688, datado de 01.10.2008, quando esclarece que “da matéria de facto apurada” não se extrai “que a ré tivesse estipulado um horário de trabalho ou sequer um período normal de trabalho ao autor, nem se configurando a sujeição deste ao poder disciplinar da empregadora”.

11 - Acresce que o aqui Recorrido em momento algum teve que justificar quaisquer faltas ou atrasos, o que, desde logo, deixa antever esta desobrigação de horário, conforme o mesmo assim o admite.

12 - Destarte, também não se encontra preenchido o pressuposto previsto na alínea c) do número 1 do artigo 12.º do CT, o que não se pode deixar de alegar, para os devidos efeitos legais.

13 - A retribuição mensal que o ora Recorrido auferia, consubstanciava um regime de avença, comum na prestação de serviços, nomeadamente, de advocacia – nos termos e para os efeitos da parte final do número 1 do 105.º do Novo Estatuto da Ordem dos Advogados –, sendo que daí não se pode retirar qualquer elemento objectivo da existência de um contrato de trabalho.

14 - Jamais poderia, a douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo presumir que tal retribuição pudesse resultar a favor da existência de um contrato de trabalho, atendendo ao facto de o aqui Recorrido não auferir qualquer retribuição a título de subsídio de férias e de Natal, bem como subsídio de alimentação e, mesmo, diuturnidades – prestações, essas sim, verdadeiramente típicas de um contrato de trabalho –.

15 - Nos termos do douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito do Processo n.º08S1688, datado de 01.10.2008, “acresce que o autor nunca gozou férias, nem recebeu subsídios de férias e de Natal, nem quaisquer prestações complementares”, o que jamais constituiu fundamento de discórdia ou de qualquer oposição pelo ora Recorrido, que nunca, na vigência da prestação de serviços, requereu, confrontou ou questionou a ora Recorrente sobre o não pagamento de tais retribuições.

16 - Além do mais, o aqui Recorrido não dependia, em exclusivo, desta prestação de serviços à ora Recorrente, só prestando os seus serviços a demais entidades, com maior...

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