Acórdão nº 28171/15.4YIPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução06 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 28.171/15.4YIPRT.P1 Sumário do acórdão: I. O contrato de transporte internacional de mercadorias é oneroso, sinalagmático, consensual e de resultado, apenas se mostrando cumprido com a entrega da mercadoria ao destinatário, definindo-se como a convenção pela qual alguém (transportador) se obriga perante outrem (expedidor), mediante um preço, a realizar, por si ou por terceiro, a mudança de coisas de um local (designado de expedição) para outro (destino), sitos em países diferentes.

  1. Provando-se que as mercadorias foram transportadas de Portugal para o estrangeiro (países europeus), não tendo a autora, no requerimento de injunção, nem a ré na oposição, alegado o modo de transporte, desconhecendo-se se o mesmo foi realizado por via aérea ou por via rodoviária, já que da documentação junta aos autos também nada consta sobre tal matéria, não pode o tribunal em sede de recurso proceder à aplicação da convenção de transporte aéreo internacional de mercadorias ou da convenção de transporte rodoviário internacional de mercadorias, pelo que para a regulação do contrato em apreço haverá que convocar a disciplina geral do contrato de transporte enunciada nos artigos 366.º a 393.º do Código Comercial.

    Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. Relatório Em 18.02.2015, “B…, Sociedade Unipessoal, Limitada”, apresentou no Balcão Nacional de Injunções, requerimento de injunção contra “C…, Unipessoal, Limitada”, pedindo a condenação da requerida a pagar à requerente a quantia global de 10.714,41€, correspondente: ao capital de €10.576,16; juros de €36,25, contados até 18/2/2015; e €102,00 de taxa de justiça paga, acrescendo juros vincendos contados desde 19/2/2015 até integral pagamento.

    Alegou a requerente, em síntese, que no âmbito de um contrato de prestação de serviços de transitário, incluindo o transporte de mercadorias, prestou serviços à ré, cujo valor adicionado ascende a €10.576,16, não tendo a ré pago essa verba.

    Efetuada a notificação do requerimento de injunção à requerida, veio esta apresentar oposição, na qual alegou em síntese: a requerente prestou os serviços de forma defeituosa; oito pacotes destinados a D…, na Bélgica, nunca chegaram ao destino e foram entregues algures em França, desconhecendo-se o paradeiro dessa mercadoria, o que implicou €8.000,00 de prejuízo para a requerida; um pacote destinado a E…, em França, foi entregue em péssimas condições, com o invólucro violado e a mercadoria danificada, com €2.375,00 de prejuízo para a requerida; sete pacotes destinados a F… … G…, em França, foram entregues em péssimas condições, com o invólucro violado, faltando duas peças da referência 108, no valor de €90,00 cada, e oito peças da referência 110, no valor de €125,00 cada, com €1.180,00 de prejuízo para a requerida; estes prejuízos não incluem os custos de reexpedição da mercadoria em falta ou danificada; a requerida reclamou junto da requerente de todos os vício referidos, mas ela não deu o devido tratamento a tais reclamações, limitando-se a exigir o pagamento dos seus créditos.

    Os autos foram remetidos à distribuição na Instância Local de Amarante (Secção Cível – J1), passando a ser tramitados como ação especial de cumprimento de obrigações pecuniária emergentes de contrato de valor não superior a 15.000 euros.

    Em 20.05.2015 foi proferido despacho, a agendar a audiência final.

    Realizou-se a audiência final em 19.11.2015, após o que, em 8.02.2016, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: «Com fundamento no atrás exposto, condeno a ré a pagar à autora o montante de €3.905,98 euros (três mil novecentos e cinco euros e noventa e oito cêntimos), relativamente aos transportes efectuados correspondentes ao valor das facturas, deduzido da verba acima referida de €6.670,18 euros e relativa à factura ………….

    Condeno a ré a satisfazer os juros à taxa legal vencidos sobre as verbas das facturas com excepção da acima referida e a contar das respectivas datas de vencimento e até 18 de Fevereiro de 2015 (data da entrega do requerimento injuntivo).

    Condeno a ré a pagar à autora a verba de €51 euros de taxa de justiça suportada pela injunção.

    Absolvo a ré do restante pedido, incluindo juros moratórios e taxa de justiça peticionados pela autora.

    Custas pela autora e ré, em partes iguais, por ambas terem contribuído para esta lide e sem prejuízo da dispensa de elaboração da conta.».

    Não se conformou a autora, e interpôs o presente recurso de apelação, apresentando alegações, findas as quais formula as seguintes conclusões: 1. Não pode também a Autora, ora Apelante, conformar-se com a solução de direito sufragada pelo tribunal a quo: a douta sentença recorrida afasta a qualificação jurídica do contrato celebrado entre a Autora e a Ré como contrato de transporte internacional de mercadoria e vem qualificá-lo como “(...) um contrato de empreitada.

    1. A ora Apelante, é uma empresa que se integra no grupo B…, de origem norte americana mas de dimensão internacional, sendo notoriamente conhecida como uma empresa que opera na área dos transportes (v.g. chegou até a ser um dos patrocinadores dos Jogos Olímpicos). A qualidade da Autora enquanto transportador afigura-se, neste contexto, ser um facto notório que não carece de alegação e prova.

    2. Entre a Autora e a Ré foi celebrado um contrato de transporte, nos termos do qual a Autora se obrigou perante a Ré a transportar uma determinada mercadoria e a entregá-la no domicílio do destinatário, sendo que o lugar de carregamento e o lugar da entrega estão situados em países diferentes, respectivamente Portugal e França, pelo que tal contrato fica sujeito às normas previstas na referida Convenção para a Unificação de certas Regras Relativas ao Transporte Aéreo Internacional, feita em Montreal em 28 de Maio de 1999 e que entrou em vigor no dia 4 de Novembro de 2003.

    3. Nos termos do art. 1.º, n. 1, desse instrumento convencional, onde se define o seu âmbito de aplicação, pode constatar-se que a Convenção se aplica a todas as operações de transporte internacional de pessoas, bagagens ou mercadorias em aeronaves a título oneroso.

    4. Transporte internacional é definido, para efeitos de interpretação desse instrumento, como toda a operação de transporte em que, segundo a estipulação das partes, o ponto de partida e o ponto de destino, independentemente de se verificar uma interrupção no transporte ou transbordo, se situam no território de dois Estados Partes ou de um terceiro Estado, mesmo que este não seja Parte da Convenção.

    5. Em termos de aplicação geográfica, a convenção é plenamente aplicável ao litígio sub-judice, na medida em que, quer Portugal – como ponto de partida quer França ou Bélgica – como ponto de chegada – são partes na mesma.

    6. Em face do exposto, chega-se à conclusão que o presente litígio deverá ser regulado directamente pelas disposições da Convenção de Montreal, como fonte autónoma de Direito e directamente invocáveis pelos particulares nas suas relações privadas.

    7. Ora...

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