Acórdão nº 324/14.0PAGDM.P2.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Março de 2017

Data da Resolução08 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso Penal 324/14.0PAGDM.P2.P1 Acordam na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto 1.

Relatório 1.1. O Ministério Público junto da Comarca do Porto, Gondomar, Instância Local, Secção Criminal, J2, requereu o julgamento em processo comum e perante o tribunal singular de B…, devidamente identificado nos autos, imputando-lhe a prática de um crime de ofensa à integridade física grave, previsto e punido pelas disposições dos artigos 143°, n.º 1 e 144º, alínea a), ambos do Código Penal.

1.2. C… apresentou pedido de indemnização civil, reclamando o pagamento de uma indemnização no valor de €50.000,00.

1.3. Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença com a seguinte decisão (transcrição): “(…) Pelo exposto, convolando a incriminação efetuada em sede de acusação,

  1. Condeno o arguido B… pela prática de um crime de ofensa à integridade física agravada pelo resultado, p. e p. pelos artºs 143º, nº 1, 144º, nº1, alª a) e 147º, nº 2 do C.P, na pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de prisão.

  2. Suspendo a pena acima aplicada pelo período de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses.

  3. A referida suspensão será acompanhada de regime de prova, acompanhada de regime de prova assente em plano a elaborar pelo Grupo de Atendimento de Agressores e Vítimas (GEAV) da Faculdade de Psicologia da Universidade …, por forma a assegurar que o arguido, quando colocado novamente em situações de stress, que suscitem a sua agressividade ou descontrolo emocional, conseguirá lidar com a contrariedade de forma não violenta.

  4. Na procedência parcial do pedido de indemnização civil contra si deduzido por C…, condeno o arguido ao pagamento ao demandante civil da quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros), absolvendo-o do demais peticionado.

  5. Condeno o arguido ao pagamento das custas criminais que, atento o número de sessões do julgamento e a sua complexidade, fixo em 3 (três) UC.

  6. As custas do pedido de indemnização civil ficarão a cargo do demandante e do demandado, em função dos respetivos decaimentos.

  7. Lida, vai ser depositada.

  8. Após trânsito, remeta boletins ao registo e solicite ao Grupo de Atendimento de Agressores e Vítimas (GEAV) da Faculdade de Psicologia da Universidade … a elaboração do plano acima referido.” 1.4. Inconformado com tal decisão, o assistente recorreu para este Tribunal da Relação, pedindo revogação da sentença e a condenação do arguido pela prática de um crime de ofensa à integridade física grave, p. e p. pelos artigos 143º, nº1 e 144º, alínea a), ambos do CP e, ainda, a sua condenação a pagar-lhe a quantia de € 50.000,00 euros a título de indemnização civil 1.5. O MP respondeu, pugnando pela improcedência do recurso.

    1.9. Por acórdão desta Relação, de 15-06-2016, foi anulada a referida sentença, por falta de fundamentação.

    1.10. O processo baixou à primeira instância, tendo sido proferida nova sentença com a seguinte decisão: “(…) Pelo exposto, convolando a incriminação efetuada em sede de acusação,

  9. Condeno o arguido B… pela prática de um crime de ofensa à integridade física agravada pelo resultado, p. e p. pelos artºs 143º, nº 1, 144º, nº1, alª a) e 147º, nº 2 do C.P, na pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de prisão.

  10. Suspendo a pena acima aplicada pelo período de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses.

  11. A referida suspensão será acompanhada de regime de prova, acompanhada de regime de prova assente em plano a elaborar pelo Grupo de Atendimento de Agressores e Vítimas (GEAV) da Faculdade de Psicologia da Universidade …, por forma a assegurar que o arguido, quando colocado novamente em situações de stress, que suscitem a sua agressividade ou descontrolo emocional, conseguirá lidar com a contrariedade de forma não violenta.

  12. Na procedência parcial do pedido de indemnização civil contra si deduzido por C…, condeno o arguido ao pagamento ao demandante civil da quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros), absolvendo-o do demais peticionado.

  13. Condeno o arguido ao pagamento das custas criminais que, atento o número de sessões do julgamento e a sua complexidade, fixo em 3 (três) UC.

  14. As custas do pedido de indemnização civil ficarão a cargo do demandante e do demandado, em função dos respetivos decaimentos.

  15. Lida, vai ser depositada.

  16. Após trânsito, remeta boletins ao registo e solicite ao Grupo de Atendimento de Agressores e Vítimas (GEAV) da Faculdade de Psicologia da Universidade … a elaboração do plano acima referido.

    (…). ” 1.11. Inconformado com a nova decisão, o assistente recorreu de novo para esta Relação, terminando a motivação com as seguintes conclusões: “ (…) I- A factualidade apresentada em audiência de julgamento conjugada com o teor do certificado de registo criminal e relatório social do arguido deveria ter permitido ao tribunal “ quo”, ter dado como provado que o arguido ao atuar da forma que fez, equacionou/previu a hipótese de provocar ao Assistente, aqui recorrente, a ruptura de um órgão do corpo.

    II – Desta forma deveria o arguido ter sido condenado por um crime de ofensa à integridade física grave, p. e p. pelos artigos 143º, n.º 1 e 144º, a) do CP, conforme vinha acusado.

    III – A quantia arbitrada pelo tribunal a quo a título de danos não patrimoniais é manifestamente insuficiente e injusta, face às lesões e danos que o Assistente, aqui recorrente sofreu.

    IV – Se tais danos não patrimoniais, dados como provados em audiência de julgamento, tivesse sido arbitrados tendo em conta a gravidade das consequências, lesões provocadas, tempo necessário para a cura, o valor peticionado pelo recorrente seria considerado justo e equitativo”.

    1.12. O arguido respondeu, pugnando pela manutenção da sentença recorrida, concluindo: “(…) 1º - A sentença recorrida não merece qualquer reparo, já que a mesma resultou de uma apreciação cuidada da prova produzida.

    1. - As alegações apresentadas pelo recorrente são extemporâneas por apresentadas no 1º dia do prazo com multa, não tendo sido efectuado, no entanto, qualquer pagamento a tal título.

    2. - Tendo sido efectuada uma valoração criteriosa e prudente das provas produzidas, quer as provas documentais trazidas pelas partes, quer testemunhais, produzidas em audiência de julgamento.

    3. - Inexiste qualquer prova que pudesse levar a decisão diversa da proferida pelo tribunal a qual quanto à matéria de facto e, concomitantemente à decisão final proferida.

    4. - Pelo que a douta sentença é, assim, inatacável.

    ” 1.13. O MP na 1ª instância respondeu também à motivação do recurso, concluindo que a sentença proferida pelo Tribunal “a quo” não merece censura.

    1.14. Nesta Relação, o Ex.º Procurador-geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

    1.15. Deu-se cumprimento ao art. 417º do CPP.

    1.16. Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência.

    1. Fundamentação 2.1.

      Matéria de facto A sentença recorrida deu como assente a seguinte matéria de facto: “Factos Provados Da acusação: 1. No dia 28 de Julho de 2014, cerca das 18h00m, C… encontrava-se sentado num dos bancos existentes no jardim público, sito na …, em…, Gondomar, quando foi abordado pelo arguido B…, seu conhecido, o qual lhe solicitou que lhe desse um charro.

    2. C… acedeu ao solicitado tendo-lhe entregado um charro mas deixando-lhe o reparo de que não poderia ser sempre assim, porque também ele estava desempregado.

    3. O arguido ficou desagradado com tal afirmação e lançou ao solo o sobredito charro.

    4. Nessa altura C… vergou-se para o apanhar e, quando já se estava a erguer para retomar a posição vertical, o arguido, sem que nada o fizesse prever, desferiu-lhe um pontapé imprimindo bastante força, atingindo-o na zona do hemitórax esquerdo.

    5. Como consequência directa e necessária de tal atuação, C… sofreu um traumatismo intra-abdominal, foi submetido a uma intervenção cirúrgica de urgência, tendo sido politransfundido, sendo-lhe diagnosticada laceração do baço.

    6. Foi esplenectomizado (remoção total do baço), o que implicará, de futuro, a necessidade se acompanhamento médico regular para reforço do seu estado imunitário, uma vez que o baço tem uma importante função imunológica de produção de anticorpos e a sua falta importará, consequentemente, um maior risco de infeções por bactérias capsuladas.

    7. Por força da intervenção cirúrgica a que foi submetido, o arguido ficou com uma cicatriz linear na linha média do abdómen estendendo-se desde a região xifóide até à cicatriz umbilical, de coloração avermelhada, não aderente aos planos profundos, com 16 por 0,7 cm de maiores dimensões e uma cicatriz linear na fossa ilíaca esquerda, hipercrómica relativamente à pele circundante com 1,3 cm por 0,5 cm de maiores dimensões.

    8. As lesões sofridas demandaram 86 dias de doença para cura, 12 dos quais com afectação da capacidade de trabalho geral.

    9. O arguido sabia que o descrito comportamento era proibido e penalmente punível.

    10. Agiu livre, deliberada e conscientemente com o propósito alcançado de atingir C… no seu corpo e, desse modo, causar-lhe sofrimento físico.

    11. Não previu, contudo, que o seu gesto pudesse provocar a laceração do baço do ofendido e, como consequência disso, a sua remoção, resultado que não quis e com o qual não se conformou.

      Também se provou: 12. O arguido é proveniente de agregado residente em conjunto habitacional de cariz social localizado em zona central de Gondomar e assinalado por problemáticas de exclusão e desvio social relativamente às quais o casal progenitor observava algum distanciamento, observando imagem de adequação social e suporte protector às necessidades dos descendentes (alargada igualmente a dois sobrinhos do arguido, relativamente aos quais assumiram desde muito cedo funções parentais de substituição).

    12. O arguido iniciou a frequência escolar em idade adequada, não tendo registado problemas de insucesso ou de adaptação a este contexto de relevo até ao início da adolescência. Durante a frequência do 2º ciclo do ensino básico começou a observar comportamentos de...

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