Acórdão nº 1012/13.0TAVLG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelCASTELA RIO
Data da Resolução08 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso Penal nº 1012/13.0TAVLG.

P1 da 1ª Secção Judicial / Criminal Relator: Castela Rio Adjunto: Lígia Figueiredo Presidente: Francisco Marcolino Na 1ª Secção Judicial / Criminal do TRP acordam em Conferência os Juízes no Recurso Penal 1012/13.0TAVLG.P1 vindo da Juiz 5 da 1ª Sec. de Instruç. Criminal da Instância Central do Porto PARTE I - RELATÓRIO O Inquérito 1012/13.0TAVLG do DIAP de VLG culminou no Despacho de 15-12-2014 a fls 111-112 de Arquivamento ut art 277-2 do CPP «… por falta de indícios suficientes da prática, por parte do denunciado, do crime participado» porque: «Declaro encerrado o presente inquérito, nos termos do art. 276°, n° 1 do Código de Processo Penal.

***B…, id. a fls. 2, veio apresentar queixa contra C…, pai dos seus filhos menores, por este não ter cumprido a obrigação de alimentos a que foi obrigado na sequência de acção de regulação do poder paternal que correu termos no Tribunal de Família e Menores do Porto.

O denunciado, por decisão daqueles autos, ficou obrigado a entregar à denunciante a quantia de 200 Euros mensais, a título de alimentos para cada um dos seus filhos menores sua filha menor, e apenas o fez durante os primeiros 4 meses, até 2012.

A denunciante alega que o mesmo trabalha numa empresa chamada “D…” mas que está em nome do pai, e que utiliza uma viatura, em nome da empresa.

O denunciado alega não ter quaisquer rendimentos, nem possibilidade de pagar.

A questão que se coloca é se o arguido cometeu o crime de violação de obrigação de alimentos, p. e p. no art. 250° do Código Penal.

Sucede que para se verificar o crime em causa, não basta a não entrega da prestação de alimentos, mas o legislador exige que a sua não entrega coloque a satisfação das necessidades do menor em risco, e é necessário a prova da possibilidade de pagamento, ou seja, que o faltoso poderia pagar e optou dolosamente por não o fazer.

Sucede que neste caso, não existem indícios do 2° destes pressupostos.

Ou seja, a denunciante teve, de facto, que fazer face a dificuldades graves para sustentar os seus filhos no período em causa.

No entanto, embora a denunciante tenha aludido ao desenvolvimento de actividade comercial por parte do arguido, o certo é que estes rendimentos não são comprováveis, nem deles pode ser feita prova num possível julgamento.

Desde logo, temos junta uma sentença aos autos que declarou o arguido insolvente, em Abril de 2013, e só este facto prova legalmente a sua incapacidade de assumir as suas dívidas.

Por outro lado, os rendimentos que a denunciante alega que o mesmo tem, a verificarem-se, são no âmbito de economia paralela e não resultam em declarações de rendimentos nem descontos feitos.

Assim, por muito injusta que esta situação seja em termos sociais, o legislador não a entende como crime, por falta do pressupostos de que faz depender a punição criminal, que é o de haver indícios bastantes de que o pai faltoso tem rendimentos que lhe permitam pagar.

Ora essa prova, neste caso, é impossível.

Na verdade, o actual Código de Processo Penal, no seu artigo 283°, n.° 2, considera suficientes “os indícios sempre que deles resultar a possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento uma pena ou uma medida de segurança”, noção esta que deverá ser sempre norteadora na apreciação da prova nesta sede.

Ora, neste caso, e perante os elementos reunidos nos autos, fácil se torna antever que, no caso de se deduzir acusação, a mesma acabaria por resultar numa absolvição certa em sede de julgamento.

Perante estes indícios, não se vislumbrando possíveis quaisquer outras diligências úteis à descoberta da verdade, apenas podemos concluir que o procedimento criminal não tem qualquer viabilidade.

Face ao exposto, determino o arquivamento dos presentes autos, nos termos do art.

277°, n.° 2 do C…P…P…, por falta de indícios suficientes da prática, por parte do denunciado, do crime participado» [1].

Inconformada com o decidido, a Denunciante B… requereu: em 09-01-2015 a fls 118 constituição como ASSISTENTE; em 12-02-2015 a fls 124-128 a INTERVENÇÃO HIERÁRQUICA ut art 278-1-2 do CPP indeferida em 19-02-2015 a fls 132-135 «por extemporaneidade»; em 03-3-2015 a fls 139-143 a REABERTURA DO INQUÉRITO ut art 279 do CPP com a inquirição da Testemunha E… para lograr Despacho de Acusação.

O Inquérito 1012/13.0TAVLG do DIAP do PRT culminou no Despacho de 03-9-2015 a fls 185-186 de Arquivamento ut art 277-2 do CPP «… por falta de indícios suficientes da prática, por parte do denunciado, do crime participado» porque: «Declaro encerrado o presente inquérito, nos termos do art. 276°, n° 1 do Código de Processo Penal.

***Os presentes autos foram arquivados por despacho de fls. 111 e ss. dos autos, com os fundamentos aí aduzidos, que aqui se dão por reproduzidos.

Posteriormente, a ofendida requereu a reabertura do Inquérito, alegando possuir novos meios de prova, que invalidam o despacho de arquivamento.

Foram exploradas essas novas linhas de investigação.

Designadamente, apurou-se que o arguido, na sua página do Facebook, aparece associado visível e publicamente à empresa “D…”, que a ofendida alegou ser a sua fonte de rendimento, e capaz de lhe proporcionar meios económicos para pagar a pensão de alimentos em dívida.

Sucede que foram feitas todas as averiguações junto da Segurança Social, e foi o arguido confrontado com essa exibição pública, em rede social, da ligação à empresa, e o que se apurou é que a empresa pertence a uma tal F…, e o arguido figura para todos os efeitos legais como trabalhador da empresa, com funções de gerência, pelas quais aufere a remuneração mensal de 520 Euros.

O arguido explica a publicitação da empresa na sua página do Facebook por ser gerente da mesma.

Ora a remuneração apurada de 520 Euros mensais não é bastante para se provarem os pressupostos do crime de violação da obrigação de alimentos.

Assim, e tal como já se expôs no despacho de arquivamento anterior, para a prova deste crime é necessário que haja indícios de que o não pagamento da pensão coloca o menor em carência efectiva, e também (cumulativamente) que o arguido age com dolo ao não pagar, ou seja, que se apura que o mesmo tem meios para o fazer e opta deliberadamente por não o fazer.

Ora o vencimento mensal de 520 Euros, tendo em conta as necessidades básicas de alojamento, alimentação, transporte, não permitem concluir pelo dolo no não pagamento.

Admitimos que, tal como a denunciante alega, o arguido obtenha outros rendimentos não declarados, designadamente por acordo com a dona da empresa, que até poderá ser apenas fictícia, mas, infelizmente, tal facto é de prova impossível.

Perante estes indícios, não se vislubrando possíveis quaisquer outras diligências úteis à descoberta da verdade, apenas podemos concluir que o procedimento criminal não tem qualquer viabilidade.

Não podemos perde de vista o artigo 283°, n.° 2 do CPP que considera que apenas estamos perante indícios suficientes quando “deles resultar a possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento uma pena ou uma medida de segurança”, noção esta que deverá ser sempre norteadora na apreciação da prova nesta sede.

Ora, neste caso, e perante os elementos reunidos nos autos, fácil se torna antever que, no caso de se deduzir acusação, a mesma acabaria por resultar numa absolvição certa em sede de julgamento.

Em suma, cremos que a solução para esta questão está, afinal, apenas na dedução de um incidente de incumprimento no processo de regulação do poder paternal.

Face ao exposto, determino o arquivamento dos presentes autos, nos termos do art. 277°, n.º 2 do Código de Processo Penal, por falta de indícios suficientes da prática, por parte do denunciado, do crime participado» [2].

Inconformada com o decidido, B… [3] requereu em 12-10-2015 a fls 191-202 abertura de INSTRUÇÃO que, admitida e realizada, culminou na Decisão Instrutória de NÃO PRONÚNCIA de 26-4-2016 a fls 326-343 II objecto de RECURSO da ASSISTENTE: «O Tribunal é competente.

O processo é o próprio.

O Ministério Público tem legitimidade para acusar.

Da invocada nulidade de insuficiência de inquérito: A assistente, veio ainda arguir a nulidade prevista no art° 120° n°2 al.d) do C.P.P. de insuficiência do inquérito, pelo facto de mesmo após a reabertura do inquérito o Ministério Público não ter procedido à inquirição de duas testemunhas que foram por si indicadas e cujos depoimentos considera determinantes para o apuramento da verdade dos factos visto tratarem-se de funcionárias da sociedade da qual o arguido é gerente podendo prestar informações quanto aos rendimentos deste bem como a origem e responsáveis pelas sociedade.

Cumpre decidir: A nulidade de insuficiência de inquérito por não terem sido praticados actos legalmente obrigatórios e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade prevista na alínea d) do n°2 do art° 120° do C.P.P. deve ser arguida até ao encerramento do debate instrutório ou, não havendo lugar à instrução, até cinco dias após a notificação do despacho que tiver encerrado o inquérito (art° 120° n° 3 al.c) do C.P.P.). Pelo exposto, tal nulidade, foi tempestivamente invocada.

Cumpra agora apreciar da sua verificação: Perante a formulação legislativa constante do art° 120° n°2 al.d) do C.P.P. tem a jurisprudência questionado se a insuficiência do inquérito respeita apenas à omissão de actos obrigatórios, ou a esses e ainda a quaisquer outros actos de investigação e de recolha de prova necessários à descoberta da verdade. A solução maioritariamente seguida, partindo daquilo que é considerado uma correcta ponderação da estrutura acusatória do processo penal, art° 32° n°5 da Constituição, dos princípios do contraditório e da oficialidade, entende que só se verifica nulidade quando ocorra ausência absoluta ou total de inquérito, (neste sentido, Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 21/10/99 C.J. ano XXIV, Tomo 4, pag.158) e/ou se omita acto que a lei...

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