Acórdão nº 3540/08.0TBMTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA CEC
Data da Resolução14 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 3540/08.0TBMTS Comarca do Porto Póvoa de Varzim, instância central, 2ª secção cível - J3 Acórdão Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório A.

B… e mulher, C…, residentes na …, nº …, …, Matosinhos, instauraram esta ação declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra D… e mulher, E…, residentes na Rua …, nº …, Matosinhos; F… e mulher, G…, residentes na …, nº .., …, …, Matosinhos, e H…, residente na Rua …, nº …, .º, sala ., Matosinhos, pedindo: 1. A resolução do contrato-promessa melhor identificado no artigo 1º da petição inicial; 2. A sua condenação a restituir-lhes a quantia de 23.064,36 euros, recebida a título de sinal, nos termos plasmados no artigo 18.º-A da petição inicial; 3. A sua condenação a restituir-lhes a quantia de 46.128,75 euros (despacho de retificação requerida a fls. 145) a título do dobro do sinal 23.064,36 euros, nos termos referidos em 18.º-B da petição inicial; 4. A sua condenação nos juros legais de mora vencidos e vincendos até integral pagamento, nos montantes já peticionados em 20º, 21º e 22º da petição inicial.

Alegaram, para tanto e em síntese que, em 25/05/1987, celebraram com os réus um “Contrato de Promessa de Compra e Venda”, a que se refere o documento de fls. 17 e 18, acordando que a escritura definitiva deveria ser celebrada em dezembro de 1987. Entregaram-lhes, a título de sinal, o valor global de 8.479,56 euros. Só que, apesar de os terem instado a celebrar a escritura pública da prometida venda do prédio, através do envio de cartas em 14/05/2002, os mesmos não se dispuseram a outorgá-la. Perderam, por isso, interesse em celebrar o contrato definitivo e entendem terem direito à resolução do contrato-promessa devido ao seu incumprimento culposo e definitivo da parte dos Réus. Mais articularam que correu termos no 2º Juízo Cível da Comarca de Matosinhos a ação ordinária nº 184/1993, na qual demandaram os Réus pedindo a declaração de nulidade desse contrato e a sua condenação a restituir-lhes o valor das três prestações indevidamente pagas e a entregar-lhes os frutos civis vencidos, no total de 3.209.205$00, e vincendos. Essa ação foi julgada totalmente improcedente, na consideração de que o prédio objeto do contrato-promessa (o lote nº . do projeto de loteamento de terreno denominado “I…”, sito na Rua … e na Rua …, freguesia …, concelho de Matosinhos) não lhes pertence, porque o venderam, em 15/03/2000, à sociedade “J…, Lda.”. Prédio que foi registado, por compra, a favor de “K…, Lda.”.

B.

Por óbito do Réu D…, ocorrido na pendência da causa, foram habilitados os herdeiros L…, M…, N… e O…, que prosseguiram os termos da lide.

C.

Contestaram os Réus D… e mulher, E…, alegando que os Réus homens acordaram entre todos proceder, conjuntamente, à aquisição de diversas parcelas de terreno, nomeadamente do prédio identificado. Desde o início das operações em conjunto, os Réus F… e H… desrespeitaram o acordo e fizeram suas as quantias recebidas a título de sinal, sem lhes darem qualquer conhecimento de tais recebimentos. Por isso, defenderam que não lhes pode ser imputado qualquer comportamento culposo nem condenados a devolver o sinal que não receberam. Excecionaram a ineptidão da petição inicial e o caso julgado e, se assim não for entendido, a improcedência da ação.

D.

Contestou também o Réu H…, contrapondo que, na sequência de desavenças surgidas entre os vários Réus, o co-Réu D… insinuou-se junto dos promitentes-vendedores e conseguiu que estes lhe vendessem, exclusivamente a si, a referida "I…", cuja aquisição escriturou em nome da sua mulher E…. Não tendo ficado com o sinal dos autos, porque tais quantias foram totalmente absorvidas pelas despesas de arquitetura, topografia e desembaraço no processo na Câmara …, quem disso aproveitou foi o corréu D…, que veio a ficar com o terreno, com o loteamento já praticamente garantido. Opôs que, de qualquer modo, só teria obrigação de restituir o que recebeu, se bem que não tendo enriquecido, ache nada deve restituir aos Autores. Mais invocou a prescrição dos juros anteriores a 5 anos, os quais nunca seriam devidos senão a partir do incumprimento definitivo.

E.

Contestaram igualmente os réus F… e mulher, G…, peça processual que foi desentranhada por despacho 22/01/2209.

F.

Realizada a audiência preliminar, foi saneado o processo, declarada inverificada a nulidade decorrente de ineptidão da petição inicial e improcedente a exceção de caso julgado. Foi condensado o processo e elaborados os factos assentes e a base instrutória. Teve lugar a audiência de discussão e julgamento e foi ditada sentença com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julga-se a presente acção totalmente improcedente e, em consequência, absolvem-se os Réus E… e os habilitados do Réu D…, L…, M…, N… e O…; F… e mulher G… e H… dos pedidos contra si formulado pelos Autores B… e mulher C….” G.

Inconformados, recorreram os autores, concluindo a sua contra-alegação do seguinte modo: “I- Na douta sentença que ora se recorre o tribunal a quo deu como provado, o fato id. por n.º 15 que para aqui releva e se reproduz: “O Autor mantém a posse do lote, e recusa-se a proceder à respetiva entrega ao actual proprietário.” II- Considerando a prova testemunhal o tribunal a quo mal andou, pois desconsiderou e fez vista grossa a toda a panóplia de documentação junta aos autos bem como dos depoimentos gravados já retro reproduzidos, consequentemente, deveria fazer constar no fato 15 da matéria provada que “provado que o Autor mantém a posse do lote autorizada pelos RR”.

III- O tribunal a quo julgou arbitrariamente e sem que fundamento exista para concluir que o Autor se recusa até à presente data à entrega do lote, pois dos autos sequer consta qualquer meio de prova que conduza a tal asserção, mormente interpelação por parte dos RR ou pelos terceiros então sucessores na propriedade do lote, in casu J… e K…; IV- Ainda, e consequentemente a posse é pacífica, pública, titulada e de boa fé pois foi conforme decorre dos autos, foi expressamente autorizada pelos RR, e nunca estes foram instados a proceder à entrega do lote, e consequentemente, não há nem nunca houve recusa na entrega do mesmo.

V- Isto posto, e dado como provado que tal posse foi autorizada pelo RR, o desfecho da lide seria sempre diferente do então desenhado pelo tribunal a quo, a saber: o lote foi vendido à sociedade J…, Lda, e posteriormente à K…, Lda.

VI- Facto que o tribunal a quo desconsiderou e negligenciou, VII- Negligenciou ainda que o carácter definitivo do incumprimento do contrato promessa poderá ocorrer em três situações distintas a saber: se em consequência da mora do devedor, o credor perder o interesse na prestação; se, estando o devedor em mora, o credor fixar um prazo razoável para cumprir (prazo admonitório) e aquele não realizar a prestação, se o devedor declarar inequivocamente ao credor que não cumpre o contrato (recusa de cumprimento).

VIII- Encaixou o tema numa das situações de incumprimento fazendo vista grossa às demais, in casu, que quando existe a venda do bem (objeto do contrato) a terceiro estamos perante um incumprimento do contrato, realidade bem patente e dada como provada, a da venda a terceiros.

IX- Assim, admitindo o tribunal a quo que deveriam os RR ter que interpelar os RR, para dar como válido a resolução por incumprimento definitivo, e à data das cartas de fls. 633 e ss., sempre o lote já estaria registado a favor de terceiros, que alcance pratico e útil teria tal interpelação ainda que se desse como provada? Com o devido respeito, nenhuma, ponto parágrafo, pois nunca os RR poderiam celebrar qualquer escritura de compra e venda por já não terem a disponibilidade do lote, resvalando numa venda de bem alheio, proibida por lei.

X- Ao decidir como decidiu o tribunal a quo violou os arts.801 nº2 e 802 nº2 ex vi art.808 do CC), bem como o art.º a por lei (art.892 CC).

XI- Acresce ainda erro do tribunal a quo na apreciação da prova bem como erro no julgamento quanto à questão de direito, mostrando-se violados os art.º 607º n.º 4 e 5 e o art.º 615º do CPC.” H.

Respondeu o recorrido N…, que assim finalizou a sua contra-alegação: “1ª No seu recurso os Recorrentes não identificam a invocada “panópliade documentação junta aos autos” que deveria ter conduzido a Meritíssima Juiz a decidir em sentido diverso, porque não existe. Quanto aos depoimentos, todas as testemunhas, incluindo as dos Autores e por eles citadas no seu recurso, confirmam que actualmente estes cultivam o prédio, o que só poderia redundar na prova do 15º facto dado como provado.

  1. O que os Recorridos pretendem com o recurso ora apresentado é um segundo julgamento, do qual resulte como provada a sua versão dos factos e não a que resulta da prova produzida.

  2. A mera posse do prédio pelos Autores a que os Recorrentes aludem e invocam é contrária à prova da perda de interesse objectivo na celebração do contrato por parte dos Autores, cujo ónus da prova lhes incumbia.

  3. Deste modo, mesmo que a argumentação dos Recorrentes tivesse qualquer sustentabilidade na prova produzida – o que não é verdade e só se equaciona para efeito de raciocínio - carecia da imprescindível coerência técnico-jurídica, devendo improceder o recurso.

  4. O tribunal a quo apreciou bem e livremente a prova produzida e decidiu em conformidade. Em momento algum, o tribunal foi arbitrário. É certo que a prova nunca leva à certeza lógica acerca dos acontecimentos (histórico-empírica), contudo resultou da prova produzida o alto grau de probabilidade de que os factos dados como provados efectivamente sucederam (e quanto à recusa de entrega do terreno ainda hoje sucedem) como descrito.

  5. Aliás, toda a postura dos Recorrentes durante o julgamento, bem como, todas as testemunhas evidenciaram que os Recorrentes se mantêm a cultivar o terreno, mesmo sabendo que este pertence a terceiro com quem nunca tiveram qualquer relação contratual ou outra, e que o actual proprietário limpa periodicamente o terreno, nomeadamente quando...

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