Acórdão nº 877/15.5PCMTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelERNESTO NASCIMENTO
Data da Resolução24 de Maio de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo Comum Singular 877/15.5PCMTS da Comarca do Porto, Matosinhos, Instância Local, Secção Criminal, J1 Relator - Ernesto Nascimento Adjunto – José Piedade Acordam, em conferência, na 2ª secção criminal do Tribunal da Relação do PortoI. RelatórioI. 1. Efectuado o julgamento, veio a proferir-se sentença, através da qual foi o arguido B… condenado pela prática de um crime de furto qualificado na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22.º/1 e 2, 23.º/1 e 2, 203.º/1 e 204.º/1 alínea f) C Penal, na pena de 3 meses de prisão, substituída por 90 dias de multa, à taxa diária de €6,00, no montante global de €540,00.

  1. 2. Inconformado, com o assim decidido, recorre o arguido, pugnando pela revogação da sentença e pela sua consequente absolvição, rematando a motivação com as conclusões que se passam a transcrever: 1. por sentença proferida no âmbito do processo 877/15.5PCMTS que correu termos na Comarca do Porto, Matosinhos, Juízo Local Criminal, foi condenado pela prática de um crime de furto qualificado na forma tentada, na pena de 3 meses de prisão substituída por 90 dias de multa, à taxa diária de €6,00, no montante global de €540,00. Entende o recorrente existir uma alteração não substancial dos factos que não lhe foi comunicada: 2. o tribunal teve em consideração os testemunhos dos agentes da PSP, os quais se revelam em determinado momento contraditórios, nos quais os factos ora relatados por estes constituem uma versão dos factos relatados por terceiros; 3. considera o recorrente que o depoimento da testemunha C… não poderia ser valorado em virtude do mesmo não ter presenciado os factos, aliás como o mesmo confirmou; 4. quanto à testemunha D…, o recorrente não percebe como consegue o tribunal a quo ter em conta o depoimento desta testemunha fazendo referencia a determinada expressão na sentença proferida “por fim e de relevante, considerou-se o depoimento da testemunha D… que, apesar da dificuldade em expressar-se, deixou claramente perceber …”; 5. bem, não se entende os parâmetros aplicados pelo tribunal a quo para a apreciação daquele depoimento que apesar da dificuldade, deixou claro que aquela testemunha não foi quem relatou os factos aos agentes da PSP, que confirmou que os quartos estavam abertos e que não viu o arguido com nenhum televisor, nem sequer sabia onde aquele objecto se encontrava; 6. como foi possível de confirmar a testemunha E…, ainda que pouco credível, confirmou o regresso para o motel à procura de um telemóvel, bem como confirmou que não foi descoberto nenhum televisor, pelo menos, onde o mesmo se encontrava e ainda confirmou o pagamento de, pelo menos, 2 quartos; 7. assim sendo, não poderá o arguido ser condenado pela prática de uma tentativa de furto qualificado. Senão vejamos; 8. o crime de furto qualificado pressupõe que o espaço seja fechado, no entanto os quartos nos presentes autos estavam abertos, conforme depoimentos das testemunhas, 9. é pressuposto, que o agente permaneça aí às escondidas, também tal não aconteceu, porquanto o mesmo nunca fez questão de permanecer desse modo, tendo inclusive voltado para o motel uma 2.ª vez; 10. o tribunal a quo, ainda que considerasse que mesmo assim existia indícios da prática de tal crime, deveria ter ponderado que exista uma certa dúvida quanto aos factos descritos e absolver o arguido da prática dos mesmos, devido às contradições existentes, por remissão ao abrigo do disposto no artigo 32.º/2, 1.ª parte da CRP, o qual faz referência ao princípio in dubio pro reo, o qual constitui uma imposição dirigida ao julgador no sentido de se pronunciar de forma favorável ao arguido, quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a decisão da causa; como tal, é um princípio que tem a ver com a questão de facto, não tendo aplicação no caso de alguma dúvida assaltar o espírito do juiz acerca da matéria de direito: 11. no mais o tribunal a quo não teve em consideração o facto de o recorrente ser primário quanto a este crime, pressupondo que o mesmo já tinha cometido este tipo de crime, o que tal não acontece, para tal deveria ter consultado o seu registo criminal; 12. aplicando deste modo uma pena de forma excessiva e não ponderando todos os elementos essenciais de que fazem uma pena justa, violando desse modo o princípio da justa medida da pena; 13. a sentença proferida violou as seguintes normas jurídicas: - artigo 204.º alínea f) C Penal, porquanto não preenche os pressupostos daquele normativo legal; - artigo 358.º/1 e 3 C P Penal, a qual faz alusão à alteração da qualificação jurídica que deveria ter existido; - artigo 18.º parte final da CRP, no sentido de o tribunal a quo condenou excessivamente o recorrente por não ter em consideração o facto do mesmo ser primário; - artigo 32.º, 1.ª parte da CRP porquanto deveria o tribunal a quo ter considerado que existiam sérias dúvidas quanto aos factos relatados; - artigo 70.º e 71.º C Penal, alusivos ao critério de escolha da pena e determinação da mesma, a qual deveria de colher o facto do recorrente não ter perpetrado o mesmo crime pelo qual vem condenado.

  2. 3. Na resposta, o Exmo. Sr. Magistrado do MP pugna pelo parcial provimento do recurso, por efeito do que se deve rectificar o facto julgado como provado no ponto 8. e ser o arguido assim condenado na pena de 180 dias de multa à taxa diária de €6,00, no montante global de €1.080,00.

  3. 1. Subidos os autos a este Tribunal o Exmo. Sr. Procurador Geral Adjunta, pronunciou-se, igualmente, no mesmo sentido da resposta, ressalvada, no entanto a possibilidade de aplicação de pena mais gravosa, por efeito do princípio da proibição da reformatio in pejus.

    Proferido despacho preliminar e colhidos os vistos legais, vieram os autos à conferência e dos correspondentes trabalhos resultou o presente Acórdão.

  4. FundamentaçãoIII. 1. Tendo presente que o objecto dos recursos é balizado pelas conclusões da motivação apresentada pelo recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas - a não ser que sejam de conhecimento oficioso - e, que nos recursos se apreciam questões e não razões, bem como, não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, então, as questões suscitadas no presente são, a de saber se, a sentença é nula; deveria o tribunal ter lançado mão do princípio geral da prova em processo penal do in dubio pro reo; a subsunção dos factos ao direito se mostra correcta e adequada e, a pena é excessiva.

  5. 2. Vejamos, então, para começar, a matéria de facto definida pelo Tribunal recorrido.

    FACTOS PROVADOS1. Pelas 7 horas do dia 6-10-2015 o B… estava no quarto … do “Motel F…”, sito na Rua …, n.º ..., em …, Matosinhos, saiu para os corredores, entrou sem autorização no quarto … que estava apenas fechado com o trinco, tirou da parede uma “TV LCD” da marca “LG” no valor de pelo menos €300,00 que aí estava, saiu desse quarto com esta “TV” nas mãos, ao aproximar-se do quarto … quando aí passava uma funcionária desse “Motel”, entrou de imediato nesse quarto, escondeu a “TV” na garagem correspondente, tornou a sair, foi para o quarto … e depois abandonou as instalações desse “Motel” pagando o preço da estadia.

    1. Nessa altura disse aos funcionários que o atenderam que se havia esquecido do seu telemóvel e pediu para regressar ao interior do “Motel”.

    2. Com isto pretendia trazer consigo o televisor que havia escondido e integrá-lo na sua esfera patrimonial e de disposição, fazendo-o coisa sua, sem a autorização dos legais representantes da sociedade “G…, SA”, que explora este “Motel” e à qual pertence este bem.

    3. Como os funcionários do “Motel” já estavam de sobreaviso chamaram a PSP e na presença da autoridade policial A “TV”, FOI devolvida ao legal representante da “G…”.

    4. Agiu de forma livre, deliberada e consciente de infringir a lei.

    5. No intuito de se apoderar, apropriar e integrar na sua esfera patrimonial e de disposição, pelo modo descrito, a “TV” referida bem sabendo que não era sua e que actuava contra a vontade dos legais representantes da “G…”; 7. … só não o tendo conseguido por ter sido descoberto a tempo pelos funcionários do “Motel” que chamaram a PSP e conseguiram evitar que o B… a levasse consigo.

    6. Do certificado de registo criminal do arguido consta um condenação pela prática de um crime de furto por sentença transitada em julgado em 11.02.2013.

    FACTOS NÃO PROVADOSa televisão tinha o valor de €399; o arguido apenas voltou ao motel porque tinha perdido o telemóvel.

    Porque tal questão releva igualmente para a discussão do recurso, vejamos, também, o que em sede de fundamentação se deixou exarado no que concerne à convicção assim formada pelo Tribunal.

    O tribunal formou a convicção com base na prova produzida em audiência de julgamento, analisada de forma conjugada e crítica à luz das regras da experiência comum.

    Assim, consideraram-se os depoimentos das testemunhas H… e I…, agentes da PSP que confirmaram a deslocação ao Motel e os motivos da mesma, referindo que a televisão se encontrava no quartos … na respectiva garagem, tapado com uma toalha, conjugado este depoimento com o teor do auto de apreensão de fls. 9, C…, que pertence à direcção do motel, que igualmente confirmou a presença dos agentes da PSP no local e confirmou ter sido encontrada a TV LCD, que faltava num quarto, numa garagem de um outro, referindo ainda que o televisor valia entre €300,00 e €400,00 (assim permitindo apenas apurar o valor mínimo), e E…, que acompanhava o grupo de 4 pessoas em que se integrava o arguido e que se deslocaram ao motel e que esclareceu as condições em que ficaram, dizendo que ficou com o irmão do arguido e a amiga com o arguido, e bem assim, confirmou o regresso ao motel por causa de um alegado telemóvel esquecido (dizendo que só nessa altura foi confrontada com a situação da televisão).

    Por fim e de relevante, considerou-se o depoimento da testemunha D… que, apesar da dificuldade em expressar-se, deixou claramente perceber que visualizou o arguido nos...

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