Acórdão nº 1677/15.8T8VNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelJORGE SEABRA
Data da Resolução21 de Novembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 1677/15.8T8VNG.P1 - Apelação Origem: Comarca do Porto – VNG – Instância Local – Secção Cível – J2.

*Relator: Jorge Seabra 1º Adjunto Des.

Sousa Lameira.

  1. Adjunto Des.

Oliveira Abreu* * Sumário:I. O caso julgado constitui uma excepção dilatória, que tem por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de repetir ou contradizer uma decisão anterior – arts. 577º, al. i)-, e 580º, n.º 2, do CPC.

  1. A excepção de caso julgado tem em vista o efeito negativo de obstar à repetição de causas, implicando a tríplice identidade a que se refere o artº 581º do CPC -, ou seja a identidade de sujeitos, pedido e a causa de pedir.

  2. A autoridade de caso julgado visa o efeito positivo de impor a força vinculativa da decisão antes proferida [e transitada em julgado] ao próprio tribunal decisor ou a qualquer outro tribunal (ou entidade) a quem se apresente a dita decisão anterior como questão prejudicial ou prévia em face do «thema decidendum» na acção posterior.

  3. A autoridade de caso julgado tem a ver com a existência de relações entre acções, já não de identidade jurídica (própria da excepção de caso julgado), mas de prejudicialidade entre acções, de tal ordem que julgada, em termos definitivos, uma certa questão em acção que correu termos entre determinadas partes, a decisão sobre essa questão ou objecto da primeira causa, se impõe necessariamente em todas as acções que venham a correr termos, ainda que incidindo sobre objecto diverso, mas cuja apreciação dependa decisivamente do objecto previamente julgado, perspectivado como relação condicionante ou prejudicial da relação material controvertida na acção posterior.

  4. Não intercedendo entre o objecto dos processos em concurso (anterior e posterior) a aludida relação de prejudicialidade ou de condição prévia não é invocável a força vinculativa da autoridade de caso julgado.

  5. A parte que em acção de reivindicação obtém sentença declaratória do seu direito de propriedade sobre determinado imóvel não pode, regra geral, em confronto com um terceiro (que não interveio sob qualquer título na aludida acção prévia) invocar a seu favor a autoridade de caso julgado e para efeitos de impor a este último, de forma reflexa, um certo conteúdo do direito de propriedade (não concretamente esgrimido e decidido na acção anterior) excludente do direito invocado pelo terceiro em posterior acção contra si interposta.

* * Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto: I-RELATÓRIO 1.

B… e C…, propuseram a presente acção comum contra “ D…, Lda. ”, pedindo, a final, que seja a Ré condenada (i) a reconhecer o seu direito de domínio ou propriedade sobre a dependência e o quintal que abusivamente ocupou; (ii) com a consequente restituição da aludida dependência e quintal, livre e devolutas; (iii) a desobstruir a porta de acesso do quintal à via pública; (iv) a abster-se de praticar quaisquer actos lesivos do aludido direito de propriedade.

Como fundamento, e no essencial, invocam as autoras que são elas donas, em comum, do prédio urbano destinado a habitação, composto de casa de dois pisos, dependência e quintal, sito na Rua …, n.º …, da União de Freguesias de …., concelho de VN Gaia, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o n.º 02434/20020830 (antes sob o n.º 46 346, a fls. 91 verso, do livro B-119) e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 762 (antes sob o artigo 2 da extinta freguesia de …), ocupando a aludida casa ou moradia a área de 105 m2, a dependência a área de 40 m2 e o quintal a área de 290 m2.

Invocam, ainda, a seu favor não só a aquisição derivada do aludido prédio (com a sobredita configuração e áreas) por escritura pública de compra e venda de 7.08.2002 a E… (que, por sua vez, o havia adquirido a “ Massa Insolvente da Sociedade F…, Lda. “, na mesma data de 7.08.2002), assim como, ainda, a sua aquisição originária por via de usucapião, considerando, para tanto, a «posse» de tal prédio por si e antepossuidores.

No que se reporta à aludida dependência sustentam que a mesma foi ocupada e anexada (com destruição das paredes e telhado) a um armazém que é pertença da Ré e, quanto ao aludido quintal, que a Ré invoca que o mesmo também se integra no seu prédio (dela Ré), sendo certo que a mesma tapou a única porta que permitia o acesso do quintal à via pública com tijolos e cimento.

Por último, ainda, sustentam as autoras que os prédios da Ré (e que identificam sob o art. 8º da petição inicial) não possuem, nem jamais possuíram, qualquer dependência ou quinta (área descoberta), sendo irrelevantes, nesse conspecto, as demolições efectuadas após a aquisição do prédio e a sua transformação em terreno para construção.

*2.

A Ré deduziu contestação impugnando a factualidade alegada pelas AA. e invocando a excepção de autoridade de caso julgado, sustentando, nessa matéria, de essencial, que nos autos de acção ordinária n.º 4952/08.4TBVNG [em que eram partes, como Autora, a ora Ré “ D…, Lda. “, e ali Ré “ G…, Lda. ”], da extinta 2ª Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, foi considerado provado, na sentença ali proferida e no próprio Acórdão desta Relação de 27.03.2014 (sob apelação da ali Ré) que a mesma é proprietária do prédio urbano composto por armazém de um cume térreo e amplo, sito na Rua …, n.º … a …, da freguesia de …, concelho de VN Gaia, inscrito na matriz sob o artigo urbano 3893 (actual 3429) e descrito na Conservatória sob o n.º 46350, a fls. 93 verso do livro B-119.

Sucede que, segundo ainda sustenta a Ré, por via da presente acção, as AA. visam precisamente que lhes seja reconhecida a propriedade sobre uma parcela de terreno que faz parte integrante do seu aludido prédio sito à Rua …, com entrada pelo n.º … da União de Freguesias de …, concelho de VN Gaia.

Em suma, e segundo se alcança da posição da Ré, sustenta esta última que, situando-se as áreas de terreno reivindicadas pelas AA. (40 m2 da alegada «dependência» e 290 m2 do alegado «quintal») no seu prédio antes referido (n.ºs 200 a 206), e mostrando-se definitivamente reconhecido e declarado nas aludidas decisões judiciais (sentença e acórdão proferidos) que o mesmo prédio lhe pertence, este sentido ou segmento decisório impõe-se perante as mesmas AA., que, assim, não o podem esgrimir novamente, sob pena de violação da autoridade de caso julgado.

*3.

Cumprido o legal contraditório quanto à matéria de excepção, as AA. responderam pugnando pela sua improcedência.

*4.

Com prévio acordo dos Ils. Mandatários, foi dispensada a realização de audiência prévia, sendo proferido despacho saneador em que se sentenciou no sentido de julgar procedente a excepção da autoridade do caso julgado e se declarou extinta a instância.

*5.

Inconformadas com a aludida decisão, vieram as AA. interpor recurso de apelação, formulando as seguintes CONCLUSÕES A) Não se verifica, «in casu», qualquer exceção de autoridade de caso julgado e/ou de caso julgado, porquanto: B) Sujeitos, causa de pedir e pedidos desta demanda não coincidem minimamente Com iguais elementos constantes do proc. 4952/98.4TBVNG. sobre o qual a Demandada sustenta toda a sua defesa; C) Tendo considerado procedente aquela exceção o Tribunal recorrido violou...

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