Acórdão nº 353/09.5TYVNG-E.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução07 de Julho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 353/09.5TYVNG-E.P1 Sumário da decisão I. Nos termos do n.º 2 do artigo 186.º do CIRE, considera-se sempre culposa a insolvência do devedor que não seja uma pessoa singular quando os seus administradores, de direito ou de facto, tenham praticado qualquer facto enunciado nas suas várias alíneas.

  1. Do advérbio “sempre”, retiram a doutrina e a jurisprudência, de forma pacífica, a conclusão de que a presunção estabelecida pela norma, relativamente aos comportamentos enunciados nas suas várias alíneas tem natureza inilidível ou iuris et de iure.

  2. Contrariamente, o n.º 3 do citado normativo consagra mera presunção ilidível ou iuris tantum, de existência de culpa grave, sempre que se verifique a omissão das condutas ali previstas.

    Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto I. Relatório Por sentença proferida em 6.05.2009 no Processo de Insolvência n.º 353/09.5TYVNG, que correu termos no 2.º Juízo do Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia, transitada em julgado em 5.07.2009, foi declarada a insolvência da sociedade “B…, Lda.”.

    Em 23.11.2010, o credor Banco C…, SA., requerente da insolvência, juntou requerimento aos autos, no qual formula a seguinte pretensão: «Assim, e face ao exposto, entende o credor/requerente que existem indícios da prática de ilícito criminal bem como fundamentos para qualificar a presente Insolvência como culposa, devendo todos os efeitos abranger não só a Insolvente, bem como os seus ex-sócios».

    Em 26.11.2010, o Digno Magistrado do MP promoveu que «se dê conhecimento do requerimento que antecede à A.I., notificando-a para, em dez dias, proceder à apresentação do parecer relativamente à qualificação da insolvência, uma vez que há muito se encontra ultrapassado o prazo legal para o efeito», o que foi deferido por despacho de 30.11.2010.

    Foi junto pela Administradora da insolvência o Parecer a que alude o n.º 2 do artigo 188.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas[1], aprovado pelo DL n.º 53/2004, de 18 de Março, no sentido de a insolvência ser qualificada como fortuita.

    Em 17.06.2011, o Digno Magistrado do MP tomou a posição que se sintetiza: «Presentemente estão juntos aos autos documentos em qualidade e quantidade aptas a fundar um juízo quanto ao carácter culposo da insolvência, sem prejuízo dos complementos que venham a ser tidos por necessários ou convenientes à fundamentação da decisão, entre os quais se sugere, desde já, a inquirição da A. I. nomeada e que esta proceda à junção dos documentos que sugere a fls. 28, parte final.

    Neste contexto, o parecer do Ministério Público, em consonância com o parecer da Sr.ª administradora da insolvência, é no sentido da qualificação da insolvência como culposa.

    Deverão ser afectados por tal qualificação os gerentes D… e E….».

    Em 18.07.2011, a insolvente “B…, Lda.”, veio deduzir oposição à qualificação da insolvência como culposa, alegando em síntese: é certo que foram praticados os atos constantes do parecer da Administradora da Insolvência; porém, já não é certo que deles tenha decorrido prejuízos cujo risco de produção haja sido imprevisto, não ponderado e não assumido pelos credores visados; na verdade, todas e cada uma das operações em causa foram previamente submetidas à consideração daqueles credores, sendo que todos eles anuíram na sua concretização; de facto, à míngua de outras fontes de financiamento, atentas as dificuldades financeiras já então sentidas pela insolvente, esta viu-se na necessidade de propor aquelas operações; os credores aceitaram essas formas de financiamento; conforme é sabido, sobretudo desde que “rebentou” a crise financeira de 2008, veio a constatar-se que o sistema financeiro, e mormente o bancário, foi pródigo na criação, estimulação e favorecimento de contratos visando a constituição de alternativas formas de financiamento, não raras vezes, como é o caso, com contornos de alguma opacidade e duvidoso rigor ético e legal.

    Em 7.10.2011, foi proferido o seguinte despacho: «Assim, extraia certidão dos pareceres, das oposições e da sentença de insolvência, com nota de trânsito, deste despacho e proceda à sua entrega imediata ao Exmº Sr. Procurador da República para fins de procedimento criminal, em simultâneo, com a tramitação do incidente.».

    Em 7.01.2016, foi proferido o seguinte despacho: «Tendo falecido o requerido D…. declara-se extinta a presente instância incidental de qualificação da insolvência relativamente ao mesmo por impossibilidade superveniente da lide, ao abrigo do disposto no artigo 277.º, alínea e) do C.P.C. ex vi artigo 17.º do CIRE.

    Notifique.».

    Em 12.01.2016 foi realizada a audiência de julgamento, tendo sido proferido despacho sobre a factualidade provada, nos termos que consta da respetiva ata.

    Em 2.02.2016 foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo: «Assim, nos termos e pelos fundamentos expostos: a) Qualifico a insolvência da sociedade “B…, Lda.", como culposa; b) Declaro afectado pela qualificação de insolvência culposa o sócio-gerente E…; c) Declaro que, durante o período de 3 (três) anos, o sócio gerente E… fica inibido para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa; d) Declaro a perda dos créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente detidos pelo mesmo.

    Custas pelo requerido E…, fixando-se a taxa de justiça a seu cargo em 3 UC`s. – artigos 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil e 7.º do Regulamento das Custas Processuais e tabela respectiva.

    Registe e notifique.».

    Não se conformou o sócio-gerente da insolvente, E… e interpôs o presente recurso de apelação, apresentando alegações, onde formula as seguintes conclusões: 1) Do n.º 1 do art.º 186.º do CIRE decorre a necessidade da verificação de três requisitos cumulativos para que a insolvência possa ser qualificada como culposa: a) facto inerente à actuação, por acção ou omissão, do devedor ou seus administradores, nos três anos imediatamente anteriores ao início do processo de insolvência; b) a culpa (dolo ou culpa grave); c) nexo de causalidade entre aquela actuação e a criação/agravamento da situação de insolvência.

    2) Por seu turno, no n.º 2 do citado preceito legal, o legislador entendeu fazer um elenco...

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