Acórdão nº 817/15.1T8MTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelPAULA LEAL DE CARVALHO
Data da Resolução07 de Julho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Procº nº 817/15.1T8MTS.P1 Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 910) Adjuntos: Des. Maria José Costa Pinto Des. António José Ramos Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B…, intentou ação declarativa de condenação, com processo comum, contra “C…, Lda”, formulando os seguintes pedidos: “a) A reconhecer que no caso, por falta de fundamento real para a celebração de contrato a prazo e da sua descrição em concreto, como o exige o art. 141º, nº 3, do C. Trabalho, o contrato de trabalho celebrado entre a A. e R. deve ser considerado contrato de trabalho sem termo; e, em consequência disso, b) Que a revogação de contrato de trabalho a termo certo assinada por A. e R. não teve por objecto qualquer contrato realmente existente, e, por isso, não é legalmente possível, pelo que é nula, nos termos do art. 280º do C. Civil, ou mesmo inexistente.

  1. Que (sem conceder) ainda que o contrato a termo existisse realmente, com fundamento válido, a sua revogação era anulável, conforme o disposto no art. 247º do C. Civil, por erro da A. em que a R. a induziu, fazendo-a acreditar que a declaração para o fundo de desemprego que lhe passaria lhe garantiria o subsídio de desemprego – o que desde já se invoca.

  2. Que (também sem conceder) ainda que não ocorresse o erro referido na alínea anterior e a nulidade ou inexistência do contrato a termo, a revogação deste contrato não está reconhecida notarialmente, pelo que não ocorre o impedimento à cessação da revogação constante do art. 350º, nº 4, do C. Trabalho; devendo julgar-se lícita, por isso, a cessação dos efeitos da revogação.

  3. A readmitir a A. ao seu serviço ou a pagar-lhe a indemnização substitutiva prevista no art. 391º do C. Trabalho, conforme esta vier a escolher; f) A indemnizar a A. por todos os danos causados pelo despedimento de natureza não patrimonial, com quantia nunca inferior a 3.500,00€ (três mil e quinhentos euros).

  4. A pagar à A. as retribuições que auferiria até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento (art. 390º do C. Trabalho);”.

Para tanto, alegou, em síntese, o seguinte: No dia 13.11.2014, A e R. celebraram contrato de trabalho escrito a termo certo, de seis meses, com início a 14.11.2014.

A justificação invocada para a aposição do seu termo [«acréscimo excepcional de actividade das clínicas dentárias»], por falta de concretização, não dá cumprimento ao disposto no art. 141º, nº 3, do Código do Trabalho (CT/2009), para além de que não se verifica qualquer acréscimo excecional da atividade que justificasse a contratação a termo, pelo que deverá considerar-se o contrato como sem termo.

Logo em Janeiro de 2015, a A. começou a ser pressionada para assinar um acordo de revogação do contrato de trabalho, argumentando a Ré, perante objeção da A., que lhe passariam declaração para o Fundo de Desemprego, pelo que passaria a beneficiar do respetivo subsídio, e ordenando-lhe que passasse apenas a arrumar papéis na zona de arquivo.

Tal criou na A. um estado de forte perturbação emocional que a tornou incapaz de resistir à pressão da R., acabando por assinar o acordo de revogação de contrato, que juntou.

A Ré entregou-lhe o formulário destinado ao Fundo de Desemprego, mas não indicou como motivo da cessação do contrato qualquer um dos que poderiam justificar a atribuição do subsídio de desemprego, referindo apenas a simples revogação voluntária do contrato de trabalho.

A Ré induziu a A. em erro ao fazê-la supor que, assinando a revogação do contrato, poderia beneficiar do subsídio de desemprego, e foi nessa convicção que ela o assinou. Tal erro foi determinante para a decisão da A. e prende-se com um facto de especial relevância na negociação da revogação do contrato, pelo que este é anulável, nos termos do art. 247º do C. Civil, e deve efetivamente ser declarado anulado.

Para além do referido, comunicou à Ré a sua intenção de fazer cessar o acordo de revogação, ao que esta lhe respondeu que a assinatura da A. havia sido objeto de reconhecimento notarial presencial, o que impedia o exercício do direito ao arrependimento, alegação esta que, contudo, carece de fundamento legal uma vez que a assinatura não foi reconhecida por notário, mas sim por advogado ao abrigo do DL 76-A/2006.

De todo o modo, a revogação do contrato de trabalho a termo seria de todo ineficaz uma vez que o contrato passou a contrato sem termo, ab initio, ou seja, o contrato de trabalho a termo objeto da revogação era, ao tempo desta, um contrato inexistente, pelo que a revogação também o é.

Em consequência do seu despedimento, a A. sofreu graves danos de ordem não patrimonial que invoca.

A Ré contestou invocando, sob a epígrafe defesa por exceção, a motivação que justificou a contratação a termo da A.. Impugnou o alegado pela A., mormente os alegados vícios da vontade, mais invocando o circunstancialismo relativo à celebração do acordo de revogação do contrato de trabalho, cujas assinaturas foram reconhecidas por advogado nos termos do DL 76-A/2006, havendo entregue à A. a declaração de situação de desemprego nos termos por esta pretendidos, pagando-lhe também os créditos devidos pela cessação do contrato de trabalho e a quantia de €300,00 a título de compensação global pela revogação do contrato de trabalho, que não lhe foi devolvida.

Invocou também a litigância de má-fé da A., requerendo, em consequência, a condenação desta em indemnização não inferior a €2.000,00.

A A. respondeu à matéria da alegada defesa por exceção, concluindo nos termos da p.i.

Proferido despacho saneador tabelar, realizada a audiência de julgamento e decidida a matéria de facto, foi proferida sentença que julgou a ação improcedente, absolvendo a Ré do pedido. Mais fixou à ação o valor de €30.000,01.

Inconformada, a A. recorreu, tendo formulado, a final das suas alegações, as seguintes conclusões: “1ª) Há omissão na decisão da matéria de facto na parte em que não inclui a afirmação, de resto reconhecida no último parágrafo da pág. 11 da sentença, de que o que as partes representavam no momento da revogação do contrato era que o contrato a termo era o que estava em vigor.

  1. ) Tal conclusão resulta, aliás, do teor literal do próprio acordo de revogação, tal como da contestação da R., arts. 1º e 2º, em que esta reitera a convicção e confessa que o contrato a termo se mantinha em vigor e foi este que se quis revogar.

  2. ) Acresce que não podiam estar em vigor em simultâneo um contrato a termo e um contrato sem termo, pelo que a alusão a revogação do contrato a termo exclui radicalmente a intenção de revogar o contrato sem termo.

  3. ) Deve, por isso, acrescentar-se à matéria de facto a seguinte factualidade: - Do teor do acordo de revogação, da p. i. e dos arts. 1º e 2º da contestação resulta que o que as partes quiseram revogar foi apenas e só o contrato de trabalho a termo certo, que era o contrato que ambas estavam convencidas de que estava em vigor.

  4. ) Por outro lado, independentemente da interpretação que se lhe queira dar, também o teor literal do acordo de revogação celebrado, enquanto tal, tem que ser incluído na matéria provada, porque é essencial como pressuposto da determinação da decisão de direito a proferir.

  5. ) Tendo em conta que estamos perante um negócio formal, como decorre do art. 349º, nº 2, do C. Trabalho, o acordo revogatório só poderia ser contrariado no seu teor e interpretação por documento de força probatória superior, que não existe nos autos (art. 364º, nº 1, do C. Civil), ou confissão expressa, 7ª) Sendo o seu teor, por isso, indiscutível, cumpre interpretar as declarações negociais das partes; ora, prescrevendo o nº 1 do art. 236º do C. Civil que “a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante», e assente que está que os declarantes (A. e R.) estavam ambos convencidos de que o que existia era um contrato de trabalho a termo, e que queriam revogá-lo, obviamente nenhum deles poderia interpretar a declaração do outro no sentido de que quisesse revogar o contrato sem termo que desconhecia existir.

  6. ) Por outro lado, nos negócios formais, a declaração negocial não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência literal (nº 1 do art. 238º).

  7. ) No momento da outorga do acordo revogatório, o contrato a termo era legalmente inexistente, pelo que o objecto do acordo era impossível, 10ª) Do que resulta a nulidade do acordo, nos termos do art. 280º do C. Civil.

  8. ) O erro que aqui importa sobrelevar é bilateral e reporta-se à própria existência e validade do contrato a termo, que não ocorria.

  9. ) Mesmo que foquemos a questão do erro apenas na perspectiva da A., tudo leva a crer, dado o prejuízo muito maior que para ela acarretaria, que não aceitaria de modo nenhum a revogação do contrato se a revogação se reportasse a um contrato sem termo.

  10. ) A intenção com a qual as partes num acordo o celebraram consubstancia matéria de facto.

  11. ) Não constando da matéria de facto, nem sequer da alegação de qualquer das partes, que as partes no acordo de revogação do contrato de trabalho a prazo tenham tido, porém, a intenção de revogar antes o contrato sem prazo realmente em vigor, não podia a sentença ter tal matéria em consideração.

  12. ) Por cautela, e sem conceder, sempre se dirá que, se, por qualquer forma, se entender que na matéria de facto se encontra dada como provada essa intenção, então necessariamente deve tal matéria ser removida dos factos assentes, porquanto, pelas normas probatórias atrás citadas (art. 364º do C. Civil), tal não podia nem pode acontecer.

  13. ) A entidade patronal, aliás, devidamente patrocinada pelo seu Ilustre Advogado no momento da elaboração e outorga do acordo revogatório, tinha obrigação de saber e de informar a A. que o contrato de trabalho a termo que com ela celebrara era inválido por falta de fundamentação, e, por isso, se convertera em contrato sem termo (art. 106º do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT