Acórdão nº 810/15.4PFPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelNETO DE MOURA
Data da Resolução03 de Junho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 810/15.4 PFPRT.P1 Recurso penal Relator: Neto de Moura Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto I – Relatório No âmbito do processo especial sumário que, sob o n.º 810/15.4 PFPRT, corre termos pela Secção de Pequena Criminalidade da Instância Local do Porto, Comarca do Porto, B…, devidamente identificado nos autos, foi submetido a julgamento, acusado pelo Ministério Público da prática, em autoria material e em concurso real, de dois crimes de condução de veículo automóvel em estado de embriaguez e de um crime de desobediência qualificada.

Realizada a audiência, com documentação da prova nela oralmente produzida, foi proferida sentença (fls. 46 e segs.), datada de 12.11.2015 e depositada na mesma data, com o seguinte dispositivo: “Por tudo o exposto, julgo a acusação parcialmente procedente e decido:

  1. Absolver o arguido B… da prática em 05/11/2013, pelas 03h00m, em autoria material, de 1 (um) crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelos artigos 292º, nº 1 e 69º, nº 1, alínea a) do Código Penal.

  2. Condenar o arguido B… pela prática em 05/11/2013, pelas 01h20m, em autoria material, de 1 (um) crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelo artigo 292º, nº 1 do Código Penal, na pena de 3 (três) meses de prisão, que nos termos do artigo 43º, nº 1 do Código Penal substituo por 90 (noventa) dias de multa, à taxa diária de €5,00, no montante global de €450,00 (quatrocentos e cinquenta euros).

  3. Condenar o arguido B…, pela prática, em autoria material, de um crime de desobediência qualificada p. e p. pelos artigos 348º, nº 2 do Código Penal e 154º, nº 2, do Código da Estrada, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de €5,00, no montante global de €600,00 (seiscentos euros).

  4. Condenar, também, o arguido B… na pena acessória de proibição de condução de veículos com motor, pelo período de 7 (sete) meses, nos termos do artigo 69º, nº 1, alínea a) do Código Penal, devendo o mesmo proceder à entrega da carta de condução neste tribunal ou em qualquer posto policial, no prazo de dez dias após o trânsito em julgado da presente sentença, (artºs 69º, nrs.2 e 3 do CP e 500º nr.2 do CPP), sob pena de não o fazendo incorrer na prática de um crime de desobediência (cfr. Acórdão de Fixação de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça nº 2/2013, de 09/01)”.

Inconformada, veio a digna magistrada do Ministério Público no tribunal recorrido interpor recurso da sentença condenatória para este Tribunal da Relação, com os fundamentos explanados na respectiva motivação, que condensou nas seguintes conclusões (em transcrição integral): 1. Os factos dados como provados integram os elementos objectivos e subjectivos de dois crimes de condução de veículo em estado de embriaguez e um crime de desobediência qualificada, uma vez que o arguido conduziu por duas vezes, um veículo automóvel na via pública, sendo da primeira vez submetido a análise toxicológica de quantificação de álcool no sangue, acusando a taxa de álcool no sangue de pelo menos 1,564g/l e na segunda vez acusou uma taxa de álcool no sangue de pelo menos 1,352g/l, tudo conforme decorre dos factos dados como provados sob os números 1, 2, 3, 5, 6, 7, 9 e 11. Por outro lado, o arguido foi devidamente notificado de que ficava impedido de conduzir pelo período de 12 horas sob pena de incorrer no crime de desobediência qualificada, mesmo assim conduziu o referido veículo, contra o que lhe tinha sido ordenado, conforme decorre dos factos dados como provados sob os números 4, 8, 10 e 11.

  1. Não ocorrendo qualquer causa de exclusão da ilicitude ou da culpa, teremos de concluir que o arguido cometeu os três crimes pelos quais foi acusado.

  2. Analisando os factos dados como provados e os elementos de prova considerados pelo Tribunal temos duas resoluções criminosas, tanto mais que, após a intercepção e a detenção ocorrida pelos factos de 5 de novembro de 2015, pelas 01h20m, foi o arguido advertido pelo Agente da P.S.P. que não poderia conduzir no espaço temporal de 12 horas, sob pena de incorrer na prática de um crime de desobediência.

  3. Mais, após ter sido intercetado e detido pela P.S.P. uma primeira vez conforme descrito, o arguido, manifestou indiferença para com o Direito e apesar da advertência que lhe havia sido dirigida, o que denota uma maior culpa, conduziu novamente sob a influência de uma taxa de álcool no sangue superior à legalmente permitida no nosso Código Penal.

  4. O que gera a responsabilidade penal do arguido não é a ingestão de bebidas alcoólicas, mas ao facto de ter conduzido, por duas vezes, veículo com motor na via pública em diferentes circunstâncias de tempo e lugar, em estado de embriaguez, uma no dia 5 de novembro de 2015, pelas 01h20m, na Rua … e outra no mesmo dia pelas 03h00m, na Rua …, pelo que não se mostra violado o princípio plasmado no artigo 29.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa, pelo que, nesta parte, deve igualmente também por este motivo a sentença ser alterada.

  5. Conforme se refere no Acórdão da Relação do Porto, proferido em 9 de setembro de 2015, disponível em www.dgsi.pt: “Julgamos verificada a prática de dois crimes de condução de veículo em estado de embriaguez porquanto propugnamos que a génese de tal crime é - não a ingestão de bebidas alcoólicas em excesso (se assim o entendêssemos, como o artigo 154.º, n.º 1, do Código da Estrada, fixa em 12 horas o efeito desta ingestão, sendo o arguido encontrado a conduzir por diversas vezes durante tal período e sujeito a testes de alcoolemia positivos, seria autuado e submetido a julgamento mais do que uma vez com base na mesma fonte geradora de responsabilidade criminal) – mas sim a ingestão de bebidas alcoólicas em excesso agregada à condução automóvel por parte do agente. Por tal, ainda que se demonstre que a ingestão de bebidas alcoólicas em excesso é ainda a mesma e não foi reforçada no entretanto com novos consumos, atenta a génese da comissão do crime tal segunda condução, no período de 12 horas após a primeira verificada, é considerada no âmbito da problemática do concurso de crimes e de crime continuado ou do crime único, a qual se encontra regulada no artigo 30.º do Código Penal. No n.º 1 do artigo 30.º, referem-se as situações de pluralidade de crimes cometidos pelo mesmo agente. Na primeira parte, consagra-se que o número de crimes se determina pelo número de tipos de crime efetivamente cometidos pela conduta do agente (concurso heterogéneo) e na segunda parte, declara-se que o número de crimes também se determina pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente (concurso homogéneo), sendo que em ambos os casos o comportamento do agente tanto se pode consubstanciar num só facto ou numa só acção, como em vários factos ou várias acções. Mas, em qualquer dos casos, estamos perante concurso de crimes uma vez que este ocorre desde que o agente cometa mais do que um crime, quer mediante o mesmo facto, quer através de vários factos. Por seu turno consagra o n.º 2 do referido artigo 30.º que “constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crimes que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa.” Ora, havendo uma única resolução, há um único delito e tendo havido mais do que uma resolução, a regra será o concurso de crimes, constituindo a continuação uma exceção a aceitar quando a culpa se mostre consideravelmente diminuída mercê de factos exógenos que facilitem a recaída ou recaídas. O crime de condução de veículo em estado de embriaguez é um crime cometido no exercício da condução e para o seu preenchimento, conforme supra exposto, basta, pelo lado objetivo, a condução na via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l. Assim, consuma-se o crime quando, já sob a influência do álcool, o agente inicia o acto da condução ou se coloca nessa situação de excesso durante tal acto da condução. Como resulta da matéria de facto provada, o arguido foi fiscalizado por duas vezes, a primeira pelas 23h41m, tendo sido restituído à liberdade, após a realização de exame de pesquisa de álcool no sangue, que revelou ser portador de uma taxa de 3,03 g/l e notificação de que ficava impedido de conduzir pelo período de doze horas, sob pena de incorrer no crime de desobediência qualificada; e a segunda pelas 00h47m, quando circulava naquele mesmo veículo, revelando, então, após a realização do competente exame, uma taxa de 2,72 g/l de álcool no sangue. A consumação da primeira resolução cessou quando o arguido foi fiscalizado, pela primeira vez, e...

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