Acórdão nº 1400/14.4TBPNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA CEC
Data da Resolução14 de Junho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Sumário (artigo 663º, n.º 7, do NCPC): I - O efeito interruptivo da prescrição pelo reconhecimento do devedor tem eficácia subjetiva, isto é, só afeta a pessoa sobre que incide ou a quem é dirigido o ato interruptivo.

II - Identicamente, o reconhecimento do direito do credor só tem esse alcance interruptivo da prescrição se o devedor confirmar o objeto do direito, delimitado pelo seu concreto conteúdo.

III - Logo, o reconhecimento, pelo pagamento, do direito do Fundo de Garantia Automóvel em relação ao pedido judicial de reembolso da indemnização paga a um determinado lesado é insuscetível de comunicar o efeito interruptivo da prescrição às demais indemnizações pagas aos restantes lesados no âmbito do mesmo evento danoso.

*Recurso de Apelação Ação de processo comum n.º 1400/14.4TBPNF.P1 Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este, instância central, secção cível - J2 Acordam no tribunal da Relação do Porto: I. Relatório 1.

O Fundo de Garantia Automóvel, integrado no Instituto de Seguros de Portugal, com sede na Avenida …, ….-…, Lisboa, propôs a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra B…, residente no Lugar de …, …, …. Penafiel, pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de 97.876,15 euros, acrescida dos juros legais, vencidos e vincendos, até efetivo e integral pagamento, e das despesas que vier a suportar com a cobrança do reembolso, oportunamente liquidadas em ampliação do pedido ou em execução de sentença.

Evocou, para tanto, o acidente de viação ocorrido no dia 21 de setembro de 1993, pelas 13:50 horas, na E.N. …, em que embateram o veículo ligeiro de mercadorias com a matrícula JG-..-.., propriedade do réu e conduzido por C…, o veículo ligeiro misto de matrícula NM-..-.., o veículo ligeiro de mercadorias de matrícula QQ-..-.., o veículo pesado de mercadorias de matrícula QJ-..-.., o veículo ligeiro de mercadorias de matrícula FL-..-.., o veículo ligeiro de passageiros de matrícula PT-..-.. e o veículo ligeiro de mercadorias de matrícula RL-..-... Alegou que foi o condutor do JG que deu causa ao acidente, por circular a uma velocidade superior a 100Kms/hora e, no entroncamento que liga a Cete, embateu no veículo NM, que se encontrava imobilizado atrás do veículo QQ e que pretendia mudar de direção à esquerda. Ao aperceber-se que tinha à sua frente dois veículos imobilizados, o condutor do JG travou repentinamente, entrou em derrapagem e foi embater com a parte frontal do veículo na traseira do NM que, compelido pelo embate, foi projetado para a frente, indo embater na traseira do QQ, na frente na traseira do FL, que se encontrava estacionado no parque de estacionamento do café “D…”, o qual foi embater no RL, que também se encontrava estacionado fora da faixa de rodagem, junto ao restaurante “E..”. Aduziu que, em consequência destes embates, suportou os danos deles resultantes – uns determinados extrajudicialmente e outros judicialmente - no montante global de 95.769,20 euros, cujo valor tem de ser suportado pelo réu, por força da sub-rogação legal que lhe assiste.

  1. Contestando, o réu aceitou a culpa do condutor do seu veículo automóvel na eclosão do evento danoso e os valores pagos pelo autor, mas excecionou a prescrição do direito exercitado, uma vez que o acidente ocorreu há mais de 20 anos. Apesar de ter sido judicialmente demandado pelo lesado F…, bem como o ora autor e o condutor do seu automóvel, C…, na ação foi lavrada transação em que o autor reduziu o pedido para 2.250.000 escudos, obrigando-se o FGA a pagar tal quantia em 45 dias, a reembolsar em partes iguais pelos demais demandados. Instaurada contra eles a correspondente execução, foi a mesma declarada extinta pelo pagamento. De acordo com a certidão junta pelo FGA, o último pagamento ocorreu em 2003, pelo que prescreveu o seu direito ao pretendido reembolso.

  2. Proferido despacho judicial determinante da notificação do autor para, em 10 dias, se pronunciar por escrito quanto às exceções deduzidas na contestação, foi designada a audiência prévia, no decurso da qual a ilustre mandatária do réu expôs, quanto à exceção de prescrição, as razões da sua improcedência, que centrou na interrupção da prescrição pelo reconhecimento do devedor, que efetuou o último pagamento em janeiro de 2013. Considerando estar em causa apenas uma questão de direito e assente a totalidade dos factos relevantes para a decisão do litígio, após suspensão da diligência por uma hora, ditou para a ata sentença que declarou a procedência da exceção de prescrição e a consequente absolvição do réu do pedido.

  3. Inconformado, recorreu o autor (FGA), que aduziu, em síntese conclusiva, a seguinte alegação: 4.1. A relação obrigacional que une as partes estriba-se num único evento lesivo, o qual originou uma só responsabilidade civil – o acidente de viação ocorrido em Setembro de 1993.

    4.2. As quantias indemnizatórias pagas pelo FGA, a vários sinistrados, por efeito de um só sinistro, devem ser consolidadas num único montante.

    4.3. Não podendo ser aceite qualquer separação entre as várias indemnizações.

    4.4. Antes, deve ocorrer uma consideração global, integrada, de tais pagamentos.

    4.5. Assim, ao proceder ao pagamento, em 28-01-2013, da última prestação do acordo de pagamento da indemnização da vítima deste sinistro, o F…, assume, se não expressamente, tacitamente, a vontade inequívoca de pagar as indemnizações satisfeitas por este a todas as vítimas do sinistro.

    4.6. O mesmo vale por dizer que o réu, com tal pagamento, reconheceu, de modo concludente, que deve ao FGA as quantias que este pagou aos lesados em virtude do sinistro em que interveio o veículo de que este era proprietário à data do acidente e que circulava sem seguro automóvel.

    4.7. Tal reconhecimento tem eficácia interruptiva da prescrição, nos termos do artigo 325.º do CC, pelo que não ocorreu a prescrição do seu direito.

  4. O réu não contra-alegou.

    II.

    A instância é válida e regular, nada havendo que obste ao conhecimento do mérito da causa.

    A questão a dilucidar nucleariza-se em determinar se ocorre a extensão dos efeitos interruptivos da prescrição pelo reconhecimento do direito do autor quanto a um dos lesados – operado pelo último pagamento realizado pelo réu em 28-01-2013, no âmbito do processo executivo n.º 430/96, que correu termos no extinto 1.º juízo do Tribunal Judicial de Penafiel aos montantes indemnizatórios pagos aos demais lesados.

    1. Fundamentação de facto Com relevância para a apreciação da questão controvertida, com aceitação das partes, está apurada a seguinte matéria de facto: 1. No dia 21 de setembro de 1993, pelas 13:50, ocorreu um acidente de viação na E.N. …, no sentido …-…, concelho de Penafiel.

  5. Nele intervieram o veículo ligeiro de mercadorias com a matrícula JG-..-.., propriedade do réu e conduzido por C…, o veículo ligeiro misto de matrícula NM-..-.., o veículo ligeiro de mercadorias de matrícula QQ-..-.., o veículo pesado de mercadorias, de matrícula QJ-..-..., o veículo ligeiro de mercadorias de matrícula FL-..-.., o...

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