Acórdão nº 101/13.5JAAVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelNETO DE MOURA
Data da Resolução12 de Outubro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 101/13.5JAAVR. P1 Recurso Penal Relator: Neto de Moura Acordam, em audiência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto I - Relatório No âmbito do processo comum que, sob o n.º 101/13.5 JAAVR, corre termos pela 1.ª Secção Criminal (J6) da Instância Central da Comarca de Aveiro, B…, C… e D…, devidamente identificados nos autos, e ainda E…, entretanto falecido, tendo sido declarada extinta a respectiva responsabilidade criminal, foram acusados pelo Ministério Público da prática, em co-autoria material, de um crime de homicídio qualificado na forma tentada e o arguido D…, ainda, em concurso real, efectivo, de um crime de furto qualificado e outro de ameaça agravada.

Realizado o julgamento, por tribunal colectivo, com documentação da prova nela oralmente produzida, após deliberação do Colectivo, foi proferido acórdão (fls. 1401 e segs.), datado de 21.07.2015 e depositado no dia seguinte, com o seguinte dispositivo: “Face ao exposto, deliberam os juízes que compõem o Tribunal Coletivo, julgar a acusação deduzida nos autos parcialmente procedente por provada e, em consequência:

  1. Absolver os arguidos D… e C… da prática do crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 131º, 132º, nºs 1 e 2 al.s b) e) h) e j), com remissão para os arts. 22º, nº1 e 2 al. c), 23º, nº1 e 2 , 26º, e 28º nº 1, todos do Código Penal.

  2. Condenar a arguida B… pela prática, em autoria mediata de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 131º, 132º, nºs 1 e 2 al.s b) e j), com remissão para os arts. 22º, nº1 e 2 al. c), 23º, nº1 e 2, 26º, todos do Código Penal, na pena de 4 anos de prisão, que se suspende na sua execução, por igual período, com regime de prova e ainda subordinada ao dever de a arguida efetuar o pagamento da indemnização civil fixada nos autos – 15.090,00€ - fracionados da seguinte forma, 4.000,00€ no primeiro ano, 4.000,00€ no segundo ano, 4.000,00€ no terceiro ano e 3.090,00€ no últimos ano, devendo juntar aos autos, findo cada um destes períodos os respetivos comprovativos.

  3. Condenar o arguido D… como autor material de: ● Um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º, nº1 e 204º, nº1, al. a) do Código Penal, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão.

    ● Um crime de ameaça agravada, p. e p. pelos arts. 153º, nº1 e 155º, nº1, al. a) do Código Penal, na pena de 1 ano de prisão.

  4. Operando o cúmulo jurídico destas penas parcelares condenar o arguido na pena única de 2 anos e 10 meses de prisão que se suspende na sua execução por igual período, com regime de prova e ainda subordinada ao dever de o arguido efetuar o pagamento de parte da indemnização civil fixada nos autos – 4.000,00 - fracionados da seguinte forma, 1.400,00€ no primeiro ano, 1.400,00€ no segundo ano, 1.200,00€ no final dos remanescentes 10 meses, devendo juntar aos autos, findo cada um destes períodos os respetivos comprovativos.

  5. Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado por F… e em consequência: ● Condenar a demandada B… no pagamento de uma indemnização no montante de 15.090,00€, acrescida de juros de mora contados desde 28.03.2015, e até integral pagamento à taxa de 4%, absolvendo-a do restante pedido.

    ● Condenar o demandado D… no pagamento de uma indemnização no montante de 8.000,00€, acrescida de juros de mora contados desde 28.03.2015, e até integral pagamento à taxa de 4%, absolvendo-o do que para além desta quantia havia sido pedido.

    ● Absolver o demandado C… do pedido contra si formulado f) Determinar a perda a favor do Estado nos termos do disposto no art. 109, nº 1 do Código Penal das munições e invólucros melhor descritos a fls. 931 a 941.

  6. Determinar a notificação do Sr. Dr. G… (filho do já falecido E…) para em 10 dias indicar o nome dos herdeiros do senhor seu pai, para que estes sejam posteriormente notificados para, querendo em 90 dias juntar aos autos as respetivas licenças e manifesto (quando necessário), a fim de as armas lhes serem entregues, com a advertência de que não o fazendo no apontado prazo estas serão declaradas perdidas a favor do Estado.

    Inconformados com a decisão condenatória, quer o Ministério Público, quer os arguidos condenados – D… e B… - dela interpuseram recurso para este Tribunal da Relação, com os fundamentos explanados na respectiva motivação, que condensaram nas seguintes “conclusões” (em transcrição integral): Recurso do Ministério Público 1.ª – “Salvaguardando-se sempre o devido respeito, entende-se que o Tribunal a quo mal andou quando suspendeu a execução da pena de prisão em que condenou a arguida B…, ainda que sujeita a deveres e a regime de prova! 2.ª - Para que uma pena de prisão igual ou inferior a 5 anos possa ser suspensa na sua execução, o tribunal tem de concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição, isto é a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade (vide, respectivamente, arts. 50º e 40º do Código Penal).

    1. - Não basta, pois, um juízo de prognose positivo relativamente ao comportamento futuro de um arguido, para que a suspensão da execução de uma pena de prisão igual ou inferior a 5 anos seja determinada.

    2. - A suspensão da execução não pode, ainda, colocar em causa a crença da comunidade na validade da norma e a confiança dos cidadãos nas instituições jurídico-penais. Ou seja, exige-se ainda que a suspensão da execução não comprometa uma das finalidades precípuas da pena, a de protecção dos bens jurídicos! 5.ª - Ora, no caso sub judice, e salvaguardado todo o respeito devido, discordamos da formulação de um juízo de prognose favorável à arguida e entendemos que menosprezou ou, pelo menos, desvalorizou de forma inaceitável o tribunal a quo aquela última exigência legal! 6.ª - Na verdade, no caso da arguida, as únicas circunstâncias invocadas pelo tribunal foram o facto de ela se mostrar integrada familiar e socialmente e não ter antecedentes criminais.

      Porém, não só tais circunstâncias já existiam à data em que praticou o crime e não foram de molde a evitá-lo, como a arguida não manifestou no decurso da audiência de julgamento qualquer valoração crítica da sua conduta, qualquer atitude de arrependimento ou contrição, que nos permita concluir por um reforço da sua consciência ético-jurídica futura, pois que negou a comissão dos factos que lhe são imputados.

    3. - Daí que, a par com a gravidade do crime cometido e personalidade nele manifestada, não se compreenda e, por isso, não se aceite, que seja de esperar que a ameaça da execução da pena seja suficiente para afastar esta arguida da prática de novos crimes, não devendo o tribunal a quo ter considerado um juízo de prognose favorável relativamente à mesma! 8ª - Acresce que é exigência incontornável que a suspensão da execução da pena, neste como nos demais casos, não comprometa também uma das finalidades precípuas da pena, a de protecção dos bens jurídicos.

    4. - Assim, não poderia o tribunal colegial decidir só com base no juízo de prognose positivo que formulou relativamente à arguida B… pela suspensão da execução da pena em que a condenou, impondo-se que ponderasse se tal suspensão era comportável com os fins das penas, designadamente com a protecção dos bens jurídicos violados.

    5. - E, nessa sede, o tribunal a quo só poderia ter concluído que, in casu, tais exigências se opõem firmemente à suspensão da execução da pena.

    6. - Na verdade, o entendimento que tem prevalecido nesta matéria na jurisprudência é o de que, nestes casos, a aplicação da suspensão não satisfaz aquele conteúdo mínimo de prevenção de integração indispensável à defesa do ordenamento jurídico.

      E que a pena de prisão efectiva há-de ser a regra para os crimes que se posicionam no segmento da criminalidade mais gravosa, especialmente os crimes contra as pessoas e, em geral, os que integram a assim chamada " criminalidade violenta" e "criminalidade altamente organizada".

    7. - A menos que factores ou circunstâncias ponderosos reclamem a suspensão da sua execução, o que in casu o tribunal colegial, com todo o respeito, não fundamentou.

    8. - Os tribunais não podem abdicar da irrenunciável função de garantir que a pena é adequada às necessidades de tutela dos bens jurídicos e de reafirmar a validade das normas jurídicas violadas.

    9. - As fortes exigências preventivas, sobretudo as de prevenção geral, impõem não só a severidade das penas na criminalidade grave, designadamente nos crimes contra a vida, mas também a denegação, por norma, da suspensão da sua execução, para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e a estabilização das expectativas comunitárias.

    10. - Razões pelas quais são cada vez mais prementes as necessidades de prevenção geral (também negativa ou de intimidação), acentuando-se as exigências repressivas, em detrimento da reinserção social.

    11. - Portanto, sempre que a execução da pena se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias, deverá ser postergada a possibilidade de suspensão da execução dessa pena.

    12. - Não se vislumbram no caso, e nem o tribunal a quo as concretizou, quaisquer razões ponderosas que superando as exigências preventivas, justifiquem a suspensão da execução da pena de prisão em que a arguida B… foi condenada.

    13. - Bem pelo contrário, as razões concretamente eleitas pelo tribunal a quo para suspender, como suspendeu, a execução da pena de prisão a tal arguida são manifestamente elementares e insuficientes, longe de assumirem qualquer carácter de excepção que clame pela suspensão.

    14. - Salvo o devido respeito, e que é muito, cremos que nenhuma dessas circunstâncias tem a virtualidade de fazer ceder as fortíssimas exigências de prevenção geral a que vimos aludindo! 20.ª - Essas mesmas circunstâncias não podem, assim, fundamentar a suspensão da execução da pena...

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