Acórdão nº 1634/14.1T8MTS-C.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 25 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS GIL
Data da Resolução25 de Janeiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

1634/14.1T8MTS-C.P1 Sumário do acórdão proferido no processo nº 1634/14.1T8MTS-C.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil: 1. Do artigo 245º, nº 1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas resulta, diretamente, que a decisão final de exoneração do passivo restante implica a extinção de todos os créditos da insolvência que ainda não se mostrem satisfeitos, ainda que não tenham sido reclamados, tal como se extrai também desta norma que os créditos da insolvência que não tenham sido reclamados não se extinguem pelo facto de não terem sido reclamados.

  1. A exoneração final do passivo restante não abrange, entre outros, os créditos de alimentos, tenham ou não sido reclamados.

  2. Não obstante as especificidades do dever de sustento dos menores previsto no artigo 1878º, nº 1, do Código Civil, relativamente à geral obrigação de prestação de alimentos prevista no artigo 2003º, do mesmo diploma legal, a exigibilidade de prestações alimentares devidas a menores vencidas após a declaração de insolvência, pelas forças da massa insolvente, segue o regime previsto no artigo 93º do CIRE.

  3. De acordo com o disposto no nº 1, do artigo 242º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, a impossibilidade de instauração de execuções contra o devedor beneficiário do incidente de exoneração do passivo restante, durante o período da cessão, apenas opera relativamente aos créditos da insolvência, não sendo aplicável aos créditos constituídos após a declaração de insolvência, como sucede relativamente às prestações alimentares vencidas após a declaração de insolvência.

  4. A aferição da conduta relevante para efeitos de abuso do direito há-de pautar-se, em regra, pela conduta do representante.

  5. Há que ser particularmente exigente no que respeita o preenchimento dos requisitos do abuso do direito nos casos de representação legal que, regra geral, não deixará de ser percecionada pela contraparte e ainda mais quando, como sucede no caso em apreço, a contraparte é o outro progenitor dos menores.

    ***Acordam os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto: 1. Relatório Em 24 de Junho de 2015[1], no processo nº 1634/14.1T8MTS-C.P1, pendente na 3ª Secção de Família e Menores, J1, Instância Central de Matosinhos, Comarca do Porto, foi proferida a seguinte decisão: “O tribunal é competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia Não há nulidade que invalidem o processo As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas*********Nos presentes autos de embargos de executado vem o embargante suscitar várias exceções que cumpre desde já apreciar, decidindo ainda que parcialmente do mérito dos presentes embargos.

    O embargante começa por alegar que procedeu ao pagamento de dois mil euros valor que deve ser considerado, abatendo-se no valor em execução (questão que depende ainda de produção de prova) Alega o embargante que foi declarado insolvente por sentença de 26-04-2010, tendo posteriormente sido proferido despacho que admite liminarmente a exoneração do passivo restante, sendo certo que a ora exequente nunca veio ao processo de insolvência reclamar os créditos de alimentos devidos aos filhos menores que agora pretende executar.

    Defende que relativamente aos créditos anteriores à declaração de insolvência, não os tendo reclamado no processo de insolvência, precludiu-se o direito atento o carater de execução universal do processo de insolvência Relativamente aos créditos de alimentos posteriores à declaração de insolvência, não são os mesmos exigíveis ao embargante/insolvente, devendo a exequente seguir o prescrito no art. 93º do CIRE.

    Invoca ainda, em qualquer caso, a prescrição do crédito de alimentos nos termos do art. 310º al. f) do CC relativamente às pensões vencidas até 10-12-2009 Por fim, alega abuso de direito por parte da exequente que durante sete anos não reclamou por qualquer forma os alimentos em dívida criando no espírito do embargante a confiança de que as prestações de alimentos não lhe seriam exigidas*************A exequente/embargada respondeu impugnando o pagamento dos dois mil euros e alegando, em síntese, que - desconhece qualquer processo de insolvência, sendo que a eventual existência do mesmo nunca pode exonerar o executado do pagamento de alimentos devidos aos filhos menores - relativamente às prestações vencidas após a declaração de insolvência haverá que ter-se em conta que a exoneração do devedor não abrange créditos por alimentos - relativamente às prestações vencidas após a declaração de insolvência, estando em causa uma obrigação especial de alimentos a filhos menores, não se aplica o art. 93º do CIRE sendo de salientar ainda que o montante que o executado aufere a título de subsídio de desemprego ficou disponível na totalidade para sustento do devedor e seu agregado familiar (do qual fazem parte os seus filhos menores) - nenhuma das prestações de alimentos se encontra prescrita uma vez que a prescrição apenas se inicia após a maioridade dos filhos (que são os credores) - por várias vezes a exequente solicitou ao executado o pagamento dos alimentos em dívida (conforme doc. que junta) nunca tendo, por qualquer forma, dado a entender intenção de “perdoar” a dívida***********Na audiência prévia realizada ambas as partes mantiveram as posições assumidas nos articulados É desde já possível conhecer, ainda que parcialmente, do mérito uma vez que várias das questões suscitadas são questões de direito e os autos contêm já elementos que as permitem apreciar Da análise dos autos, seus apensos, documentos e elementos deles constantes e posições assumidas pelas partes, são de considerar desde já demonstrados e relevantes para a decisão a proferir, os seguintes factos: - B… nasceu a 20 de dezembro de 1996 e foi registado como filho do embargante e da embargada – cf. doc. fls. 20 do processo de alteração das responsabilidade parentais apenso - C… nasceu a 02 de Janeiro de 2003 e foi registado como filho do embargante e da embargada – cf. doc. fls. 18 do processo de alteração das responsabilidade parentais apenso - O exercício das responsabilidade parentais referente aos filhos de embargante e embargada foi regulado no âmbito do processo de divórcio por mútuo consentimento dos seus progenitores que correu termos na 2ª CRC do Porto, por decisão de 08 de janeiro de 2007, tendo ficado determinado, além do mais que os filhos do casal residiriam com a mãe, obrigando-se o pai a prestar-lhes alimentos no montante mensal de total de quinhentos euros (sendo duzentos e cinquenta euros para cada menor), quantia essa atualizável anualmente em função da taxa de inflação publicada pelo INE, procedendo-se à primeira atualização em janeiro de 2008 – cf. doc. fls. 5 a 8 do processo de execução apenso - A 05 de dezembro de 2014 a progenitora intentou execução reclamando o pagamento das prestações de alimentos devidas pelo pai desde fevereiro de 2007 a dezembro de 2014, com as atualizações decorrentes da inflação e juros devidos, tudo num total de 58.752,81€ - cf. processo de execução apenso - Por sentença datada de 26-04-2010 proferida no processo que correu termos com o nº 254/10.4TJPRT da 2ª secção do 1º juízo cível do Porto o embargante foi declarado insolvente, tendo sido fixado o prazo de trinta dias para os credores reclamarem os seus créditos - Em 28-07-2010 foi proferido despacho que admitiu liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante, fixando em uma vez e meia o salário mínimo nacional como a quantia necessária ao sustento mínimo do insolvente (e portanto excluída do seu rendimento disponível) - Ambas as decisões transitaram em julgado e foram levadas a publicação no DR - Por decisão judicial de 09-07-2010 foi declarado o encerramento do processo de insolvência por insuficiência da massa insolvente - Através de mails enviados a 05 de julho de 2012, 19 de junho de 2011, 25 de janeiro de 2012 a embargada relembrou ao embargante a sua dívida de alimentos aos filhos solicitando o pagamento - – cf. doc. fls.46 a 49 dos presentes autos de embargos*********Cumpre decidir as eceções suscitadas e que constituem matéria de direito A) Relativamente aos créditos anteriores à declaração de insolvência, defende o embargante que não tendo sido reclamados no processo de insolvência, precludiu-se o direito atento o carácter de execução universal do processo de insolvência.

    Efectivamente decorre do art. 1º do CIRE que “O processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a satisfação dos credores pela forma prevista num plano de insolvência, baseado nomeadamente, na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente, ou, quando tal não se afigure possível, na liquidação do património do devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores.

    Não obstante, o crédito de alimentos filho menor, sendo um crédito especial e decorrente das responsabilidades parentais, está sujeito a um regime especial.

    Nos termos do disposto no art. 245º nº 1 do CIRE “A exoneração do devedor importa a extinção de todos os créditos sobre a insolvência que ainda subsistam à data em que é concedida, sem exceção dos que não tenham sido reclamados e verificados (…) Porém na al. a) do nº 2 da referida norma são excluídos deste regime os créditos de alimentos.

    Significa isto que, quer tenham ou não sido reclamados e verificados, os créditos de alimentos não se extinguem e portanto subsistem como tal os créditos de alimentos anteriores à declaração de insolvência e à concessão da exoneração Pelo exposto é de concluir que os créditos de alimentos aos filhos menores anteriores á declaração de insolvência persistem como tal não estando precludido o direito de os exigir judicialmente*********B) Relativamente aos créditos de alimentos posteriores à declaração de insolvência, defende o embargante que não são os mesmos exigíveis ao embargante/insolvente, devendo a...

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