Acórdão nº 9706/14.6T8PRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelJER
Data da Resolução14 de Março de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

APELAÇÃO n.º 9706/14.6T8PRT.P1 SECÇÃO SOCIAL ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO I.RELATÓRIO I.1 No Tribunal da Comarca do Porto – Instr. Central, o B…, por si e em representação de C…, … instaurou a presente acção emergente de contrato individual de trabalho, com processo declarativo comum, a qual veio a ser distribuída à 1ª Secção Trabalho – J2, contra o Centro Hospitalar de D… EPE, a anulação da decisão do Réu e, em consequência, o reconhecimento à sua representada a ver-lhe deferido o pedido para gozo dos direitos que decorrem do disposto no art.º 57º, do D.L. 437/91, de 8 de Novembro, nomeadamente as férias adicionais e a redução do horário, por funções particularmente penosas.

Alega para tanto, no essencial, que a sua representada celebrou contrato individual de trabalho com o R., por tempo indeterminado, tendo o seu início em 5 de Abril de 2007, destinando-se tal prestação de trabalho, ao desempenho de funções correspondentes à categoria profissional de …, nível 1, caracterizadas/enquadrada no art.º 7º capitulo II do D.L. 437/de 8 de Novembro.

A sua representada requereu em 3 de Junho de 2013 a atribuição do período adicional de férias e redução de horário, nos termos do disposto no art.º 57º, do D.L. 437/91, de 8 de Novembro, mantido em vigor pelo art.º 28º D.L. 248/2009, de 22 de Setembro, o que foi indeferido pelo Réu com o fundamento de que as férias dos trabalhadores vinculados por Contrato Individual de trabalho são atribuídas de acordo com o disposto no Código do Trabalho, que não prevê este tipo de majoração de férias ou redução de horários, nos termos requeridos.

Defende que a sua representada preenche todos os requisitos factuais e legais para aplicação do art.º 57º, do D.L. 437/91 de 8 de Novembro, pelo que a decisão impugnada viola o art.º 57º, do aludido diploma.

Procedeu-se a audiência de partes, mas sem que se tenha logrado obter o acordo.

Notificada para o efeito, a Ré contestou, em síntese, contestar alegando que o legislador, em 2009, separou os … em duas vertentes jurídicas: os em regime de contrato individual de trabalho e os … integrados na carreira especial de … cuja relação jurídica de emprego público foi constituída por contrato de trabalho em funções públicas (D.L. 248/2009, de 22 de Setembro).

A autora é trabalhadora vinculada por contrato individual de trabalho regulado pelo D.L. 247/2009, de 22 de Setembro, o qual remete para o Código de Trabalho; ao invés do D.L. 248/2009, que remete expressamente para o disposto no art.º 57º, do D.L. 437/91. O legislador ao criar os dois diplomas 248/2009 e 247/2009, clarificou aquilo que anteriormente era susceptível de criar dúvidas de interpretação; à representada do autor não é aplicável o disposto no art.º 57º, do D.L. 437/91 de 8 de Novembro.

Aceita a relação de trabalho com a representada do autor bem como a decisão de indeferimento do pedido de redução de horário e de férias adicionais, por funções particularmente penosas.

Concluiu pedindo a improcedência da acção.

Findos os articulados foi proferido despacho saneador e, na consideração de que a complexidade da causa não o justificava, foi dispensada a realização de audiência preliminar (agora denominada de audiência prévia).

Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento.

I.2 Subsequentemente foi proferida sentença, fixando a matéria de facto provada e aplicando o direito aos factos, concluída com o dispositivo seguinte: - «Nos termos legais e factuais expostos julgo a presente acção totalmente procedente e, em consequência: a) Declaro que a representada do autor C… tem direito a redução de horário e férias adicionais, por funções particularmente penosas; b) Condeno o Réu Centro Hospitalar de D… E.P.E. a deferir o pedido de atribuição do período adicional de férias e da redução do horário.

*Custas a cargo do Réu.

(..)».

I.3 Inconformado com esta sentença, o R. interpôs recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito adequados. As alegações foram concluídas nos termos seguintes: 1 - A questão de direito que se coloca nos autos - e objecto do presente recurso - é a de saber se a associada do Recorrido pode beneficiar da compensação decorrente do art.º 57° n.°3 do DL n.º 437/91, de 8/11; 2 - O Tribunal a quo considerou que, não obstante a omissão do legislador no DL n.º 247/2009, de 22/09, o art.º 57° do DL n.° 437/91, de 8/11 é aplicável a todos os …, estejam eles vinculados por contrato de trabalho em funções públicas ou por contrato individual de trabalho.

3 - Para chegar a tal conclusão, o Tribunal a quo fez um exercício interpretativo (ou aplicação analógica?), recorrendo aos elementos teleológicos disponíveis e ao princípio da igualdade, rematando no sentido de que a intenção do legislador só poderia ser a de aplicar o art.º 57° do DL n.° 437/91 a todos os … que trabalhassem no Serviço de ….

4- O Recorrente juntou aos autos a fls. 172, uma circular da Administração Central de Sistemas de Saúde (entidade pertencente ao Ministério da Saúde), na qual vem esclarecer que a vontade do legislador foi a de não conferir tais direitos aos … vinculados por contrato individual de trabalho, tal como a associada do Recorrido.

5 - Ao ter ignorado o esclarecimento do legislador sobre esta matéria e ao ter recorrido a uma interpretação própria e marginal, o julgador aplicou erradamente a lei vigente.

6 - Face ao esclarecimento do legislador (Ministério da Saúde), não deveria o Tribunal a quo ter recorrido à interpretação legal, pois o sentido da lei foi previamente "fixado" no sentido de se excluir os … com contrato individual de trabalho da aplicação do art.º 57° do DL n.º 437/91, de 8/11.

7 - O Recorrente, ao negar o direito à associada do Recorrido, cumpriu a lei tal como está configurada e em função do sentido da lei "fixado" pelo legislador.

8 - A presente condenação, a manter-se, conduziria ao caricato de o Recorrente violar uma instrução de carácter vinculativo emanado da tutela (Ministério da Saúde), com todas as legais consequências.

9 - Face ao esclarecimento inequívoco do legislador e por ter ignorado o sentido da lei determinado pela circular da ACSS, o Tribunal a quo violou o art.º 9° e 10° do CC, assim como violou o princípio da legalidade previsto no art.º 266° n.°2 da CRP, pois condenou o Recorrente a conceder à associada do Recorrido um direito não previsto na lei (DL n.º 247/2009) e não pretendido pelo legislador.

10 - Outra questão é a de saber se o legislador violou ou não o princípio da igualdade e, em caso afirmativo, quais as consequências legais que daí podem advir para os presentes autos.

11- O Recorrente considera que tal princípio não foi violado, na medida em que "...as diferenças havidas entre sectores laborais público e privado afastam que, convicta e objectivamente, aqui raciocinemos a partir da ideia de igualdade." - ver Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 28/02/2013 (Proc. 01171/12), in www.dgsi.pt 12 - Se o legislador quis diferenciar, não há razões legítimas para o julgador querer igualizar o que é diferente, pois a "função pública" tem características específicas que não são compatíveis com o setor privado.

13 - Levada a tese do Tribunal a quo ao extremo, no que concerne à igualdade, a própria distinção legal entre o DL 24712009, de 22/09 - "… privados" - e o DL 248/2009, de 22/09 - "… públicos" - estaria, no seu todo, ferida de inconstitucionalidade, pois sempre teríamos … com funções materialmente idênticas mas separados por realidades jurídicas distintas.

14 - Mas ainda que, por hipótese académica, o legislador tivesse violado o princípio da igualdade, não poderia ser o Recorrente a sofrer as consequências de uma eventual inconstitucionalidade suscitada, sob pena de se condenar o Recorrente à revelia da lei vigente na altura em que este negou o direito à associada do Recorrido.

15 - O julgador apenas poderia suscitar uma inconstitucionalidade por acção, pela atribuição do direito decorrente do art.º 57° apenas aos … beneficiados ou uma inconstitucionalidade por omissão do DL n.° 247/2009, de 22/09, pela não atribuição do mesmo direito aos … vinculados por contrato individual de trabalho.

16 - Em qualquer dos casos, o direito não poderia ser concedido à associada do Recorrido, pois o eventual reconhecimento da inconstitucionalidade por acção conduziria à eliminação do benefício do art.º 57° em relação a todos os …, enquanto o reconhecimento da inconstitucionalidade por omissão apenas pode ser apreciada pelo Tribunal Constitucional, em processo próprio, nos termos do art.º 283° da CRP.

17 - Também por esta via não poderia ser o Recorrente condenado a conceder o direito à associada do Recorrido.

Conclui pugnando pela procedência do recurso, com a consequente revogação da sentença recorrida.

I.4 O Recorrido A. apresentou contra alegações finalizadas com as conclusões que seguem: 1. Reitera-se quanto se disse na P. I., que se dá por reproduzida para os devidos efeitos.

  1. O ora Recorrido acompanha a, aliás, douta Sentença do Tribunal a quo, bem como a sua fundamentação, por com a mesma estar concordante.

  2. Invocámos o Acórdão do TAF Porto, de 16/04/2012, confirmado pelo Acórdão do TCA Norte, de 19/04/2013, ambos proferidos no Processo n.° 2115/08.8BEPRT.

  3. Tais Acórdãos condenam o R., ora Recorrente, no cumprimento daquela disposição legal (art. 57.° do Dec.-Lei n.° 437/91, de 8/11, com a redacção introduzida pelo Dec.-Lei n.° 412/98, de 30 de Dezembro) num caso exactamente idêntico ao da Representada do A, ora Recorrido (aliás a beneficiária daqueles Acórdãos também é nossa associada e o processo foi por nós conduzido).

    5, É óbvio que idênticas causas devem conduzir a idênticos efeitos.

  4. A decisão do R., ora Recorrente, de recusa da satisfação do referido pedido viola o art. 57.° do DL n.° 437/91, de 08/11, e os arts. 13.º , 18.° e 59.°, n.° 1, al. a), da CRP.

  5. Estando o princípio "trabalho igual, salário igual" consagrado no artigo 59.° da CRP enquadrado nestes "preceitos...

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