Acórdão nº 1084/11.1TBCBR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelAUGUSTO DE CARVALHO
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação nº 1084/11.1TBCBR.P1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto B… e C… intentaram a presente ação declarativa, com processo ordinário, contra D…, S.A., e E…, Lda., pedindo: a) a condenação da ré E… a reconhecer o direito de crédito dos autores sobre esta; b) a condenação da ré E… a reconhecer o direito de sub-rogação contra a ré D…; c) a condenação da ré D… a pagar aos autores a quantia de €233.133,04, acrescida de juros de mora, a partir da citação, à taxa legal de 4%.

A fundamentar aqueles pedidos, alegaram, em síntese, que são sócios, juntamente com outra pessoa, da ré E…, sociedade que, no início do ano de 2002, manifestou aos responsáveis da agência de Coimbra do D1…, S.A., a intenção de adquirir um imóvel para exercer a sua actividade empresarial (comércio por grosso e a retalho de artigos de vestuário, representações, importação e exportação), iniciando-se negociações com vista a tal intenção da ré E….

Em 11/02/2003, a ré E… veio a celebrar um contrato de locação financeira imobiliária com a sociedade D2…, S.A., (anterior denominação da ré D…), tendo por objecto o prédio urbano composto por edifício destinado a armazém de rés-do-chão, sito em …, freguesia de …, concelho de Coimbra, inscrito na respectiva matriz daquela freguesia sob o artigo 1483 e descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o nº 1195 – ….

A sociedade D2…, S.A. havia adquirido o referido imóvel no mesmo dia da celebração do contrato de locação financeira.

O contrato de locação financeira veio a ser resolvido por incumprimento, através de carta datada de 14/01/2008.

A ré D… interpôs um procedimento cautelar destinado a obter a entrega do referido imóvel, tendo ocorrido a entrega judicial do imóvel em 03/12/2008.

À data da celebração do contrato de locação financeira, o imóvel encontrava-se completamente em ruínas, necessitando de avultadas obras, tendo a ré E… avançado imediatamente para a realização de obras profundas no imóvel, com vista à plena consolidação da sua actividade naquele local.

O D1…, S.A., sabendo da necessidade de realização de obras no imóvel (o que também era do conhecimento da sociedade D2…, S.A.), concedeu à ré E…, em 11/02/2003, um crédito para obras, no montante de € 50.000,00.

Entre 11/02/2003 e Dezembro do mesmo ano, a ré E… realizou diversas obras no imóvel, ascendendo o respectivo custo à quantia total de €226.342,76.

Tais obras impediram a deterioração do imóvel e/ou beneficiaram o mesmo.

Assim, a ré D… está objectivamente enriquecida em €226.342,76 e a ré E… está empobrecida no mesmo valor, sendo do mais elementar exercício de justiça que seja reposto o equilíbrio económico que a boa fé impõe, ao abrigo do instituto do enriquecimento sem causa (artigo 473º do Código Civil).

Para que a ré E… pudesse proceder às referidas obras, os autores emprestaram a esta as quantias necessárias para o efeito, sob a forma de provisões ou suprimentos, que estão contabilisticamente documentadas.

Tais provisões, ou empréstimos, jamais puderam ser pagas aos autores pela ré E…, pelo que se encontram em dívida, não tendo esta quaisquer bens ou rendimentos que permitam solvê-la, o que confere aos Autores, na qualidade de credores da ré E…, por sub-rogação e na medida em que esta não accionou o crédito que detém sobre a ré D…, o direito de obter da ré D…, a título de restituição por enriquecimento sem causa, o valor das benfeitorias úteis e necessárias realizadas de boa fé pela ré E… no imóvel da ré D…, que ascende a € 226.342,76, acrescido de juros compensatórios desde a entrega do imóvel, ocorrida em 03/12/2008, à taxa de 1% ao ano, num total actual de €6.790,28, bem como dos juros de mora vencidos a partir da citação, à taxa legal de 4%.

Apenas a ré D… apresentou contestação, dividindo este articulado em diversos temas, começando pelo das circunstâncias da celebração do contrato de locação financeira imobiliária, referindo, em síntese, que a ré E… escolheu o imóvel que decidiu adquirir e negociou as condições do negócio de aquisição com a vendedora, tendo depois contactado o D1… sobre a forma de financiar a aquisição e tendo optado, em face das diferentes alternativas de financiamento existentes, pela locação financeira, acabando o contrato por ser celebrado com a ré D… por ser a empresa especializada do grupo D1… neste tipo de financiamentos, sendo certo que a compra do imóvel por esta Ré ocorreu no mesmo acto da celebração do contrato de leasing, como é normal nos contratos de financiamento.

No âmbito do tema “o contrato de leasing e as cláusulas com relevância para a decisão”, a ré D… alegou que o contrato de leasing celebrado seria regido pelas condições particulares e condições gerais constantes do mesmo, bem como pela legislação subsidiariamente aplicável, salientando-se o conteúdo da cláusula 1ª, nº 2 e nº 3, da cláusula 6ª, alínea c) e da cláusula 8ª, nº 1 e nº 2, das Condições Gerais, cláusulas que a ré E…, na qualidade de locatária, declarou conhecer perfeitamente, declaração que ficou a constar da escritura pública de compra e venda e locação financeira celebrada.

Quanto ao tema “da inexistência do direito de crédito que os autores pretendem fazer valer através da presente acção”, alegou a ré D… que a ré E… não realizou no imóvel as obras que alega ter realizado, nem as que efectuou custaram os montantes que alega na petição inicial, não sendo igualmente verdade que os Autores tivessem efectuado quaisquer suprimentos à ré E…, muito menos do montante alegado pelos Autores.

De todo o modo, as obras que os autores alegam terem sido efectuadas pela ré E… circunscrevem-se a adaptações que a locatária entendeu efectuar por serem convenientes ao exercício da sua actividade e, por outro lado, todas as eventuais obras ou benfeitorias que a locatária pudesse ter efectuado nunca consubstanciariam um enriquecimento sem causa do locador, pois a sua causa resulta, precisamente, do acordo celebrado entre as partes e das obrigações assumidas pela locatária.

No âmbito do tema “a questão da prescrição do direito à restituição com fundamento no alegado enriquecimento sem causa”, a ré D… alegou que, ainda que o direito à restituição existisse, já o mesmo se encontraria prescrito, uma vez que a ré D…, na qualidade de locadora financeira, em face do incumprimento definitivo do contrato pela locatária ré E…, resolveu o contrato, resolução que se efectivou por carta registada com aviso de recepção enviada, em 14 de Janeiro de 2008, à locatária, e resolução cuja validade foi confirmada por sentença transitada em julgado.

Assim, nos termos do disposto no artigo 482º do Código Civil, o direito à restituição por enriquecimento sem causa deveria ter sido exercido até 14 de Janeiro de 2011, ou seja, dentro do prazo de três anos a partir da data em que se operou a resolução do contrato, sendo certo que a presente acção deu entrada em juízo em 09/09/2011.

No âmbito do tema “a impugnação especificada dos factos articulados na petição inicial”, a ré D… impugnou a esmagadora maioria dos factos alegados na petição inicial.

No âmbito do tema “[por mera cautela de patrocínio] da compensação do putativo crédito da E… com o crédito da contestante referido no antecedente nº 88 desta contestação”, a ré D… alegou que é credora da ré E… de uma quantia que, no momento actual, atinge o montante de € 83.242,25, a qual está a ser reclamada no âmbito de uma acção executiva, crédito que sempre a ré D… teria direito a ver compensado com o alegado contra-crédito cuja titularidade dos Autores atribuem à ré E….

Por fim, sob o tema “os pressupostos da acção sub-rogatória indirecta e o pedido formulado”, a ré D… alegou que a ré E… (da qual os Autores são sócios maioritários e o seu pai é o gerente) só não exerceu o alegado direito a reclamar a restituição da putativa quantia que os Autores invocam ter direito, para, formalmente, ser preenchido o requisito da instauração da acção sub-rogatória, não se verificando, assim, os requisitos do artigo 606º do C.C.

Os autores apresentaram réplica, na qual, no que aqui ainda releva, pugnaram pela improcedência da excepção de prescrição, alegando que o prazo prescricional de 3 anos, a que se reporta o artigo 482º do Código Civil, conta-se a partir da data em que o credor teve conhecimento do direito que lhe compete, momento que, no caso dos autos, tem de ser reportado à data em que o imóvel foi entregue à locadora, i.e., em 03/12/2008, inexistindo, por isso, a invocada prescrição.

Também na réplica, vieram os autores requerer a ampliação da causa de pedir e do pedido, alegando factos tendentes a demonstrar que a invocação das cláusulas contratuais pela ré D… (esta ré tinha alegado na contestação que as cláusulas contratuais do contrato de locação financeira obstavam à pretensão dos autores de obtenção de indemnização por benfeitorias) constitui um abuso do direito, sendo por isso ilegítima, e alegando também que as mesmas cláusulas contratuais são nulas, por ofensa à ordem pública e aos bons costumes, formulando, a final, os seguintes pedidos: 1. Deve considerar-se ilegítima, por abuso de direito, a invocação das cláusulas 1ª, nº 3, 6ª, al. c) e 8ª, nº 1 do contrato de locação financeira imobiliária celebrado em 11/02/2003, nos termos do disposto no artigo 334º do Código Civil.

  1. Deve, caso assim se não entenda, declarar-se nulas as mesmas cláusulas, por ofensa à ordem pública e aos bons costumes, nos termos do disposto no artigo 280º do Código Civil.

    A ré D… apresentou tréplica, na qual pugnou pela inexistência de abuso de direito ou nulidade.

    Foi proferido despacho saneador, nos termos do artigo 595º, nº 1, alínea b), do C.P.C., no qual: a) a ação foi julgada improcedente, quanto ao pedido de condenação da ré D…, S.A., a pagar aos autores a quantia de €233.133,04, acrescida de juros de mora, a partir da citação, à taxa legal de 4%; b)declarado insubsistente/prejudicado o conhecimento autónomo dos demais pedidos deduzidos pelos autores, decidindo-se não conhecer dos mesmos, no âmbito desta...

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