Acórdão nº 1018/14.1TAVFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 04 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelARTUR OLIVEIRA
Data da Resolução04 de Maio de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO – SECÇÃO CRIMINAL (QUARTA) - no processo n.º 1018/14.1TAVFR.P1 - com os juízes Artur Oliveira [relator] e José Piedade, - após conferência, profere, em 4 de maio de 2016, o seguinte: AcórdãoI - RELATÓRIO 1. No processo comum (tribunal singular) n.º 1018/14.1TAVFR, da Secção Criminal (J1) – Instância Local de Santa Maria da Feira, Comarca de Aveiro, em que é arguida B…, foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos [fls. 122]: «(…)

  1. Condenar a arguida B… pela prática, como autora material e na forma consumada de um crime de descaminho de objecto penhorado previsto e punido pelo artigo 355.º do Código Penal na pena de 7 (sete) meses de prisão que se substitui pela pena de 210 (duzentos e dez) dias de multa, à taxa diária de € 8,00 (oito euros), perfazendo um total de € 1680,00 (mil seiscentos e oitenta euros); (…)» 2. Inconformada, a arguida recorre, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [fls. 140, v.º e 141]: «A. No entendimento da recorrente, o tribunal recorrido interpretou o art. 355.º do Código Penal no sentido de que preenche o conceito de "subtracção ao poder público" qualquer acção ou omissão, intencional ou não, do depositário que não seja a entrega do bem, quando o mesmo lhe for solicitado. Contudo, não integra o crime de descaminho, previsto e punido no art. 355.º do Código Penal, a não entrega dos bens penhorados ao encarregado da venda. Tal crime exige uma acção directa sobre a coisa, isto é, uma actuação que a destrua, inutilize ou impeça a sua entrega em definitivo.

  1. E igualmente não integra o crime de descaminho, na forma de dolo eventual, prevista no n.º 3 do art. 14.º do Código Penal, deixar os bens penhorados nas diversas casas da arguida e de amigos, em local ou locais diversos da morada primária, a qual foi entregue ao banco por dificuldades financeiras. Para preencher tal previsão legal exige-se uma acção directa sobre os bens, ainda que não intencional, que conduzisse à destruição, inutilização ou impedimento de sua entrega em definitivo.

  2. Os factos provados na sentença recorrida não permitem concluir que a arguida cometeu um crime de descaminho pelo qual vinha acusada. Nem podem fundamentar a aplicação à arguida da pena de prisão na qual foi condenada, substituída por multa.

  3. Ressalta do teor da decisão condenatória a insuficiência da prova. Por outro lado, devia o tribunal a quo ter-se pronunciado (o que não fez) sobre o alegado pela arguida quanto ao facto de ter-se mudado de residência, obrigando-se a ter de entregar a casa onde se encontravam os bens penhorados, salvaguardando, no entanto e sempre, os bens que acabou por apresentar e foram susceptíveis de serem vendidos, arrecadando valores financeiros para o processo executivo.

  4. Pelo que a sentença proferida é nula, nos termos do art. 379.º n.º 1, al. c), do Código de Processo Penal.

  5. Sem condescender, acresce que a arguida beneficiou, sempre da condescendência do encarregado da venda, o qual facilitou e negociou com a arguida a venda dos bens em detrimento da apresentação dos mesmos, o que criou expectativas na própria arguida e abriu a possibilidade dos bens serem liquidados em detrimento da sua devolução, o que acabou por acontecer; - A arguida não se recusou em tempo algum a entregá-los; - Muito menos foi advertida de que a não apresentação dos bens fosse cominada com o crime de descaminho; O tribunal a quo ao não relevar tais factos essenciais para o cumprimento dos requisitos formais, materiais e subjectivos do crime, errou na apreciação da prova, violou o art. 410º, n.º 2, al. c) do CPP. Deve, por isso, a arguida ser absolvida.

  6. O Tribunal "a quo" optou pela pena única de 210 dias de multa. Atentas as circunstâncias do crime e o facto de se tratar de arguida com uma condição financeira muito débil (beneficia do apoio judiciário), considera-se que foram violados os determinativos da medida da pena (art. 71º do CP), os quais deveriam ter sido levados mais em conta, ou seja mais brandamente, pelo tribunal singular. A pena deverá ser alterada para uma pena única de 120 dias de multa, à taxa diária mínima exigível por lei. O juiz a quo violou o art. 71º do CP.

O Recurso interposto deve, por conseguinte, proceder, assim se fazendo a melhor e sã justiça.

(…)» 3. Na resposta, o Ministério Público refuta todos os argumentos da motivação de recurso, salientando que os factos provados preenchem o tipo objetivo do crime pelo qual a arguida vem condenada, pela subtração dos bens verificada, uma vez que lhes deu “sumiço” [fls. 153]; e quanto à medida da pena, conclui que a mesma se mostra justa e adequada às circunstâncias apuradas. Pugna pela manutenção do decidido [fls. 148-160].

  1. Nesta Relação, o Exmo. Procurador-geral Adjunto considera que a argumentação da motivação de recurso não procede, emitindo parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso [fls. 167-168].

  2. Colhidos os vistos, realizou-se a conferência.

  3. A sentença recorrida deu como provados e não provados os seguintes factos, seguidos da respetiva motivação [fls. 105-113]: «(…) Produzida a prova e discutida a causa, o Tribunal tem como provada a seguinte factualidade: 1. No dia 25 de Maio de 2007, cerca das 17h00m, no âmbito do processo n.º 781/07.0TBVFR (execução comum) que correu termos no 2.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Santa Maria da Feira, foram penhorados na residência da arguida, aí executada, na Rua …, n.º.., Urbanização …, em …, nesta cidade de Santa Maria da Feira, os bens melhor descritos no auto de fls. 3 a 6 para o qual se remete e se dá por integralmente reproduzido e em concreto: a) 2 candeeiros de mesa de sala de jantar, 2 candeeiros de mesinha de cabeceira, 1 candeeiro de pé, um candeeiro de mesa, 1 candeeiro de quarto, 1 armário tipo sapateira de cor branca, 2 mesinhas de cabeceira, uma de cor branca e outra em madeira no valor global de €50,00 (cinquenta euros); b) duas televisões de marca Sony, 1 aparelhagem de marca Denver, com duas colunas, 7 CD’s de música, 1 mesa com o tampo branco e estrutura azul e uma mesa...

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