Acórdão nº 45/14.3TBVFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelMANUEL DOMINGOS FERNANDES
Data da Resolução30 de Maio de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 45/14.3TBVFR.P1-Apelação Origem-Comarca de Aveiro-St. Mª Feira-Inst. Local-Secção Cível- J3 Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Sousa Lameira 2º Adjunto Des. Caimoto Jácome 5ª Secção Sumário: I- Na reapreciação da prova a Relação goza da mesma amplitude de poderes da 1.ª instância e, tendo como desiderato garantir um segundo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto impugnada, deve formar a sua própria convicção.

II- A acta da assembleia de condóminos é um documento escrito que apenas tem como finalidade reproduzir aquilo que se passou na assembleia de condómino, ou seja, não constitui qualquer documento negocial ad substantiam nem ad probationem.

III- Daí que a sua existência possa ser provada pelo recurso a qualquer outro meio de prova, nomeadamente testemunhal ou confissão, expressa ou presumida.

IV- Nos termos do artigo 1436º nº 1 al. j) do C. Civil umas das funções do administrador é prestar contas a assembleia, as quais devem ser apresentadas na reunião a ter lugar na primeira quinzena de Janeiro-artigo 1431.º nº 1 do mesmo diploma legal.

V- Ora, não sendo apresentadas, qualquer condómino ou a respectiva administração mandatada para o efeito, pode pedir a quem exerceu funções de administração que preste contas reportadas ao período em causa.

VI- A obrigação de prestar contas deve recair sobre quem cobra as receitas e efectua as despesas comuns, no fundo, aquilo que constitui não só o núcleo da actividade de administração do condomínio, mas também o próprio objecto da acção de prestação de contas, tal como o define o artigo 941.º do CPCivil.

VII- A obrigação de prestação de contas do mandatário (aplicável ao administrador do condomínio) só se extingue quando sejam aceites e aprovadas pelo mandante e não cessa com a simples prestação extrajudicial de contas, cessa apenas com a aprovação de tais contas por parte de quem tem o direito de as exigir.

*I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: Condomínio Edifício …, sito na Rua …, nº .. a .., freguesia …, concelho de Gondomar, intentou a presente acção declarativa sob a forma especial de prestação de contas contra B…, Lda, com sede na Rua …., nº .., freguesia …, concelho de Santa maria da Feira, peticionando que esta preste contas, referente ao período de gestão do Bloco .., integrado no Edifício …, no período compreendido entre 1 de Dezembro de 2012 e 1 de Novembro de 2013, sob cominação de não poder deduzir oposição às contas que o autor apresente.

Alegou, para tanto e em síntese, que é um condomínio do prédio Edifício …, do prédio urbano sito na Rua …, nº .. a .., da freguesia …, concelho de Gondomar, sendo que a Ré é uma sociedade comercial que exerce a sua actividade comercial na execução de serviços de jardinagem, limpeza, manutenção e administração de condomínios, sendo o prédio do condomínio composto por quatro blocos de fracções, tendo cada bloco uma entrada individual, nomeadamente Bloco .., .., .. e .., constituídos por fracções autónomas destinadas a habitação e comércio.

Mais alegou que se realizou uma assembleia extraordinária a 2 de Fevereiro de 2012, nos termos da qual foi deliberado e aprovado permitir que o Bloco .. fosse gerido pela Ré, representada por C…, no período compreendido entre 1 de Dezembro de 2012 e 30 de Outubro de 2013, delegando-lhe poderes de gestão do Bloco .., relativamente ao espaço físico comum do referido bloco (entrada do bloco, elevadores, electricidade da escadaria e quotizações), permanecendo o demais na administração do condomínio. Por fim, alegou que no dia 30 de Outubro de 2013 a Ré cessou o seu mandato, tendo-se realizado a 1 de Novembro de 2013 uma assembleia extraordinária para prestação de contas da sua gestão, não tendo comparecido na reunião, não prestando contas do seu exercício.

*A Ré contestou a obrigação de prestar contas, porquanto as mesmas já foram apresentadas e aprovados em sede de assembleia de condóminos do Bloco .. sendo certo que a Ré também não tem legitimidade para apresentar contas, uma vez que esta cedeu a sua posição contratual que detinha no contrato de prestação de serviços de administração do condomínio do referido Bloco à sociedade “D…, Lda”, contrato esse a que não foi levantada qualquer objecção pelos condóminos do Bloco .. e dos condóminos dos restantes blocos, pelo que foi tacitamente aceite a cessão.

*O Autor respondeu, reiterando que a Ré não prestou contas, desconhecendo o acordo de cessão da posição contratual.

*Seguindo o processo os seus regulares trâmites foi realizado o julgamento com observância das formalidades legais tendo, a final, sido proferida sentença que concluiu pela existência da obrigação da Ré de prestar contas, determinando a sua notificação para as apresentar dentro de 20 dias, sob pena de lhe não ser permitido contestar as que o Autor apresente.

*Não se conformando com a sentença assim proferida veio a Ré interpor o presente recurso, concluindo as suas alegações nos seguintes termos: 1. Os pontos 7, 8, 10, 11, 13, 14, 18 e 19 dos factos dados como provados na sentença ora recorrida foram erradamente julgados, por não terem suporte de prova nos autos, chegando mesmo a ser contraditórios com a prova que resulta dos documentos juntos aos autos e prova documental e testemunhal em sentido diverso, que implica que tais pontos concretos devam ser alterados.

  1. Relativamente aos pontos 1, 2, 3 e 4 dos factos não provados na sentença, da conjugação da prova que consta dos autos, quer documental, quer testemunhal que demonstram esses factos, pelo que devem os mesmos serem dados como provados.

  2. O Bloco .. do Edifício … é servido por partes comuns que lhe são exclusivamente inerentes, não servindo outros blocos e, pelo menos, desde 2012 que tem uma administração autónoma, sem prejuízo da coordenação com a administração geral das partes comuns relativas a todos os blocos.

  3. Situação esta que é perfeitamente possível por a lei não proibir directamente a fragmentação da propriedade horizontal ou do condomínio para efeitos de administração–cf. Ac. do STJ de 16-10-2008, processo n.º 08B3011, e Acs. TRP, de 16-10-2012, processo n.º 1859/11.1YYPRT-B.P1, e de 30-11-2015, processo n.º 3361/09.2TBPVZ.P1, todos disponíveis em www. dgsi.pt.

  4. Face às actas juntas pelo autor verifica-se que a assembleia a que se reporta o ponto 7 dos factos dados como provados na sentença ocorreu em 2013 e não em 2012, como erradamente foi dado como provado.

  5. Naquela ata de 2 de Fevereiro de 2013 foi deliberado consentir a administração autónoma do Bloco .., não tendo sido definido o tempo de duração da administração do Bloco .. pela ré (aplicando-se o critério supletivo de administração por um ano), nem ficou a constar qualquer delimitação temporal relativamente à autonomia da administração desse Bloco .., contrariamente ao que foi dado como provado no ponto 7 dos factos dados como provados na sentença.

  6. Relativamente ao ponto 7 dos factos dados como provados na sentença, de acordo com o conteúdo da ata de 2 de Fevereiro de 2013 e dos depoimentos prestados em audiência, devia antes ter sido dado como provado o seguinte: - A 2 de Fevereiro de 2013 realizou-se uma assembleia, na qual foram os condóminos informados de que o Bloco .. se encontrava a ser administrado pela ré desde Dezembro de 2012, não tendo sido levantada qualquer objecção; - Naquela assembleia de 2 de Fevereiro de 2013 foi deliberado e aprovado que o Bloco .. continuasse a ser administrado pela ré.

  7. Por não ter sido junta a acta de eleição de E… como administrador para o ano de 2012, existindo mesmo a ata de 20 de Janeiro de 2012 (junta com a petição inicial como Doc. 1) na qual é feita a eleição como administrador para o período de 20 de Janeiro de 2012 a 31 de Janeiro de 2013 empresa “F…, Lda.” (cf. página 1 da ata de 20 de Janeiro de 2012, junta com a P.I. como Doc. 1), no ponto 10 dos factos dados como provados apenas podia ser dado como provado o seguinte: Com excepção das funções que tinham sido atribuídas à ré, a administração das áreas e serviços comuns relativas a todos os blocos e as dos restantes blocos (.., .. e ..) eram exercidas por um único administrador… 9. O ponto 11 dos factos dados como provados é contraditório com o direito, uma vez que o autor enquanto condomínio é administrado pelo administrador que por sua vez é que está dotado de personalidade jurídica e este é que atua em representação do autor, devendo então ficar a constar como provado o seguinte:-As despesas com as áreas e serviços comuns relativamente aos quatro blocos, nomeadamente as fossas e electricidade das garagens continuavam a ser geridas por administrador eleito para o efeito.

  8. Perante o depoimento da testemunha E…, que se intitulou como administrador do condomínio geral do Edifício … no ano de 2012, a instâncias do advogado da ré, respondeu o seguinte: Advogado da ré: - Certo? E os serviços que eram prestados pelo senhor C… eram pagos também pelo Bloco .., é isso? Portanto, não era o condomínio, não era o senhor E… que pagavam a esta empresa. Era o próprio Bloco .., os condóminos do Bloco .. que pagavam os serviços a esta empresa, estou certo? Testemunha: - Exactamente.

    Advogado da ré: - E que pagavam também as suas próprias despesas, com excepção da luz das garagens e das fossas, que aí teriam de lhe pagar a si. A única excepção seria a G…, estou certo? Testemunha: - Exacto.

    Advogado da ré: - Que pagava directamente ao senhor. Portanto, para todos os efeitos o senhor era administrador do condomínio e a G… pagava-lhe toda a prestação de condomínio e esse dinheiro serviria para quê? Para pagar a luz das garagens e as fossas? Testemunha: - A luz das garagens e as fossas. Impunha-se, por isso, que relativamente ao ponto 12 dos factos dados como provados fosse aditado o seguinte: … e entregar à Autora, mensalmente, a comparticipação para as demais despesas do referido Bloco, o que era feito através da comparticipação da condómina G… paga directamente ao administrador das áreas e serviços comuns...

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