Acórdão nº 738/14.5T8VNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelPAULA LEAL DE CARVALHO
Data da Resolução05 de Dezembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Procº nº 738/14.5T8VNG.P1 Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 931) Adjuntos: Des.Jerónimo Freitas Des. Nelson Fernandes Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B…, aos 09.10.2014, intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra C…, Unipessoal, Lda, pretendendo que se reconheça a existência e validade do contrato de trabalho celebrado entre as partes, que seja declarada a ilicitude do despedimento operado e, em consequência, que a ré seja condenada a pagar-lhe: “a) 1/12 DO VALOR DA RETRIBUIÇÃO, REFERENTE A FÉRIAS, SUBSIDIO DE FÉRIAS E SUBSIDIO DE NATAL, RELATIVOS AO ANO DA ADMISSÃO E EM FACE DA DATA DESTA, NO MONTANTE DE €525,12; b) FÉRIAS VENCIDAS A 1 DE JANEIRO NOS ANOS DE 2003 A 2013, NUM TOTAL DE €41.972,60; c) SUBSIDIO DE NATAL RESPEITANTE AOS ANOS DE 2003 A 2013, NUM TOTAL DE €20.986,30; d) PROPORCIONAIS AO TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO EM 2013 REFERENTE A FÉRIAS, SUBSIDIO DE FÉRIAS E SUBSIDIO DE NATAL, NO MONTANTE DE €5.246,55; e) UMA INDEMNIZAÇÃO POR CADA 22 DIAS ÚTEIS POR CADA ANO DE TRABALHO, ISTO É, DOZE ANOS DE TRABALHO, NO VALOR TOTAL DE €25.183,56; f) AO VALOR DA RETRIBUIÇÃO VENCIDA DESDE A DATA DA CESSAÇÃO DO CONTRATO, ATÉ AO TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA, QUE FACE AO DISPOSTO NO ART. 390º. Nº 2, B), DO C.T., NUM TOTAL DE €93.914,13 E, g) A QUE ACRESCERÃO OS JUROS DE MORA DESDE A CITAÇÃO ATÉ INTEGRAL PAGAMENTO, COM CUSTAS E DEMAIS ENCARGOS.

Para tanto alegou que: em Julho de 2002 foi admitida ao serviço da D…, Sucursal de Portugal para exercer as funções de inspetora de pré-embarque, nas condições do contrato escrito que denominaram “contrato de prestação de serviços”, tendo em 2004 a D… transmitido a sua posição contratual à ré que prosseguiu a atividade daquela; como corolário da transmissão operada o autor e a ré assinaram "aditamento ao contrato de prestação de serviços” e que por via do modo, que descreve, como as suas funções foram exercidas, entre as partes existiu uma verdadeira relação laboral, com evidente subordinação económica e jurídica, à qual a ré pôs fim, em 30.10.2013, data aposta pela Ré no modelo destinado ao subsídio de desemprego.

Mais alega que nunca lhe foi pago subsídio de férias ou subsídio de natal e que não gozou férias.

Frustrada a conciliação em sede de audiência de partes, a ré contestou impugnando parcialmente o alegado pela autora e concluindo que entre as partes existia um verdadeiro contrato de prestação de serviços, pelo que nem estava obrigada a pagar ao autor retribuição nas férias, subsídio de férias ou subsídio de Natal, nem a cessação do contrato corresponde a um despedimento ilícito, pugnando pela improcedência total da ação.

A 1ª instância proferiu despachos de aperfeiçoamento de fls. 294 e de fls. 402 a 404, a que a A. respondeu nos termos de fls. 304 e de fls. 406/407, respetivamente, na sequência do que foi cumprido o contraditório.

Foi proferido despacho a fixar o valor da ação em €93.914,13.

Realizada audiência preliminar, no âmbito da qual foi proferido despacho saneador e consignada a matéria de facto assente e controvertida, bem como a audiência de julgamento e respondidos os quesitos, foi proferida sentença que julgou a ação totalmente improcedente, absolvendo a Ré de todos os pedidos formulados.

Inconformado, a A. veio Recorrer, tendo formulado, a final das suas alegações, as seguintes conclusões: “- Toda a prova feita em audiência de discussão e julgamento e a demais, incluindo documental, carreado nos autos, é suficiente para qualificar o contrato celebrado entre a Autora e a Ré como contrato de trabalho; - Todas as testemunhas inquiridas, assim o comprovaram, afirmando perentoriamente que os inspetores trabalhavam a “recibo verde” por imposição da Ré; - Verifica- se contradição entre os factos dados como assentes e a decisão; - Toda a fundamentação de facto leva à qualificação do contrato celebrado entre a Autora e a Ré, como de trabalho; - Verifica-se contradição entre os factos assentes e a Douta Decisão; - O Tribunal não valorou o teor do contrato de trabalho junto, nomeadamente a sua cláusula 6ª (exclusividade), tendo decidido em contrário ao aí constante, aceite pelas partes e não impugnado, dado como facto assente; - São integradores da qualificação do contrato de trabalho, a prestação de trabalho, a retribuição e a subordinação jurídica; - É o relacionamento das partes- a sua subordinação ou autonomia que permite aferir a distinção entre contrato de trabalho ou prestação de serviços; - A dependência económica da Autora e a subordinação jurídica, que se traduz no facto do trabalhador, na prestação da sua atividade, estar sujeito a ordens, direção e fiscalização da Ré, encontra- se devidamente provada nos autos; - As relações estabelecidas entre a A. e Ré e os exportadores, em nada pode interferir nas relações estabelecidas com a Autora; - A Autora nada contratou com os exportadores, nem tão pouco com os Governos dos outros países, nomeadamente de Angola; - Era da Ré que a Autora recebia todos os materiais e instrumentos de trabalho, bem como as instruções para exercer a sua atividade; - A Ré pagava ao quilómetro acima dos 150, percorridos por dia, não podendo ter influência negativa o facto de o veículo, ser propriedade da Autora; - Verifica-se a exclusividade da Autora para com a Ré; - Os rendimentos auferidos pela Autora eram exclusivamente provenientes da Ré; - Trabalhar a “recibo verde” foi imposição da Ré; - A Ré detinha um poder de direção/poder disciplinar incontrolável e absoluto sobre a Autora e demais inspetores; - O facto de a remuneração ser variável, em nada colide com a qualificação do contrato como de trabalho; - A Autora era avaliada, fiscalizada e classificada pela Ré; - A fundamentação da matéria de facto e demais indícios levam à conclusão que o contrato celebrado entre a autora e a Ré era um verdadeiro contrato de trabalho; - A Douta Sentença recorrida violou o disposto nos artigos 11º e 12º do Código do Trabalho, 1152º do Código Civil, e ainda os artigos 615º, 1, alínea c) do Código do Processo Civil.

NESTES TERMOS (…) DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, REVOGANDO-SE A DOUTA DECISÃO EM CRISE.

A Recorrida contra-alegou, tendo formulado, a final das alegações, as seguintes conclusões:“1.ªNão ficou provado em sede de audiência de julgamento a existência de qualquer indício de que a relação estabelecida entre o recorrente e a recorrida era um contrato de trabalho.

  1. Pelo contrário, resultou, de forma mais que evidente, que na realidade estávamos perante um verdadeiro contrato de trabalho.

  2. Ficou provado que o A. podia livremente recusar a realização de inspeções, não só não sendo necessária qualquer justificação, como nunca tendo existido qualquer “sanção” ou “castigo”, e consequentemente qualquer poder disciplinar da R. sobre o A.

  3. Nunca existiram quaisquer ordens ou instruções da R. em relação à A..

    5.ºNão existindo qualquer contradição entre o n.º 1 dos factos assentes e o artigo 18 da base instrutória, já que a cláusula da exclusividade deve ser interpretada confirme a efetuada pelo Tribunal a quo, o seja, que a mesma apenas limitava o exercício por parte da A. de uma actividade semelhante á inspeção de pré-embarque, para empresas concorrentes; não impedindo, porém, que o fizessem relativamente a quaisquer outras actividades de outra natureza.

  4. A A. gozava férias em períodos e com a duração que entendia e que comunicava à ré, sem necessidade de autorização ou aprovação.

  5. Provou-se que o gozo de férias por parte dos inspetores funcionava do mesmo modo que as situações de indisponibilidade para a prestação de atividade de inspeções de pré embarque por qualquer outro motivo, ou seja, os inspetores limitavam-se a comunicar os períodos em que não estariam disponíveis para a realização das ditas inspeções, sendo que durante esses períodos a R. limitava-se a procurar outros inspetores para a realização das mencionadas inspeções.

  6. Jamais a Ré exigiu que qualquer um dos inspetores que teve ao seu serviço trabalhassem em exclusivo para si, sendo certo que existem inspetores que colaboram com a R. nos mesmos moldes que o A. que desempenham outras atividades profissionais.

  7. Entre as partes existia um verdadeiro contrato de prestação de serviços e, consequentemente, só mediante a emissão de recibos verdes poderia o recorrente regularizar a prestação da sua atividade.

  8. Sendo certo que nunca o recorrente revindicou a celebração de um contrato de trabalho, pois obviamente bem sabia que a relação que tinha com a R. era de prestação de serviços.

  9. Ora, dos factos elencados pelo recorrente, no entender da recorrida e do Tribunal a quo, não resultam sequer indícios de uma relação contratual laboral, mas sim de uma verdadeira prestação de serviços, designadamente: a. A autora outorgou com a D… um contrato escrito, na sequência e em execução do qual, aquele passou a exercer a atividade de inspeções de pré embarque.

    Tal contrato, que as partes assinaram sem menção de qualquer reserva, foi denominado como “contrato de prestação de serviços”, não tendo sido alegada pela autora qualquer circunstância da qual resulte que o mesmo desconhecia qual o regime legal que corresponde a tal modalidade de vínculo contratual, ou qualquer facto revelador de vício da vontade do autor (facto 1 da matéria dada como provada); b. Das cláusulas do contrato supra mencionado cabia em exclusivo à autora organizar os meios necessários à execução do contrato, comprometendo-se a prestar os serviços de acordo com as boas regras da arte, assumindo a responsabilidade pela subscrição de seguro de acidentes de trabalho, responsabilizando-se perante a outra parte pelo respeito das normas de segurança desta e todas as outras existentes no trajeto e locais de inspeção, o que não é compatível com o regime relativo ao contrato de trabalho (documento de fls 11 a 12).

    1. Do mesmo contrato resulta ainda obrigações expressas de exclusividade e sigilo profissional, cuja estipulação...

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