Acórdão nº 7191/15.4T8VNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS GIL
Data da Resolução26 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc n.º 7191/15.4T8VNG.P1 Sumário do acórdão proferido no processo nº 7191/15.4T8VNG.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil: 1. Atualmente, os danos não patrimoniais causados ao outro cônjuge pela dissolução do casamento apenas são compensáveis na hipótese prevista no nº 2, do artigo 1792º do Código Civil.

  1. Nos demais casos, porque a dissolução do casamento por divórcio corresponde ao exercício de um direito potestativo, na falta de previsão legal expressa a estatuir a obrigação de compensação desses danos com base em facto lícito, tais danos não patrimoniais derivados da dissolução do casamento não são compensáveis.

  2. Quanto aos restantes danos não patrimoniais e patrimoniais, causados por um cônjuge ao outro, são ressarcíveis, nos termos gerais da responsabilidade civil e mediante ação a intentar nos tribunais comuns.

  3. A remissão da ressarcibilidade destes últimos danos para o regime geral da responsabilidade civil significa a sua sujeição às regras da responsabilidade aquiliana, nomeadamente a aplicação do prazo trienal de prescrição.

    *** * ***Acordam os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto: 1. Relatório Em 07 de agosto de 2015, na Secção Cível da Instância Local de Vila Nova de Gaia, Comarca do Porto, com o benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, B… instaurou ação declarativa na forma comum contra C… pedindo a condenação deste ao pagamento da compensação de € 7.481,97, a título de danos não patrimoniais resultantes quer da violação do dever de fidelidade e de respeito, quer da dissolução do casamento que a uniu ao réu até à sua dissolução por divórcio, mediante sentença proferida em 04 de janeiro de 2011[1].

    Para fundamentar a sua pretensão a autora alegou, em síntese, o seguinte: - que contraiu casamento católico com o réu em 24 de agosto de 1991, sob o regime da comunhão de adquiridos; - que em 10 de outubro de 2008, o réu saiu do domicílio conjugal, passando a partir de finais de setembro de 2008 a acompanhar uma mulher, como se fossem marido e mulher, passando a viver juntos e tendo dessa união dois filhos; - que em 26 de março de 2008, o réu intentou ação de divórcio sem consentimento contra a autora, vindo o divórcio a ser decretado por sentença proferida em 04 de janeiro de 2011; - que a dissolução do seu casamento por divórcio desfez um sonho de sempre da autora de que o seu casamento duraria para toda a vida, sofrendo dor e desconsideração social com isso e padecendo de perturbações psiquiátricas.

    Citado, o réu contestou invocando a prescrição do direito acionado pela autora, arguiu a ineptidão da petição inicial e, em reconvenção, pediu a condenação da autora como litigante de má-fé em indemnização no montante global de dois mil euros.

    A autora replicou pedindo, por sua vez, além do mais, a condenação do réu como litigante de má-fé em multa e indemnização.

    Dispensou-se a realização de audiência prévia e em 15 de abril de 2016, proferiu-se despacho saneador tabelar e conheceu-se o mérito da causa julgando-se procedente a exceção perentória de prescrição, não se admitindo a reconvenção deduzida pelo réu[2].

    Em 20 de maio de 2016, inconformada com a decisão que julgou procedente a exceção perentória de prescrição, B… interpôs recurso de apelação, oferecendo prova documental e terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões: “1º O prazo para a Recorrente pedir ao Recorrido pela dissolução do seu casamento a quantia de 7.481,97 € é prazo ordinário de 20 anos, e, não de 3 anos, pois que, por errada interpretação, e, má aplicação a Ex.ma Senhora Juiz do Tribunal a quo invocou e aplicou esse prazo como se a situação se integrasse na subsecção I do C.C. atinente à responsabilidade por facto ilícito; 2º E mesmo que tal ponto de vista perfilhado pela Ex.ma Senhora Magistrada quanto ao prazo de 3 anos pudesse ser aplicável tal prazo foi interrompido, como atrás se disse, e, apenas expirou em 09 de Setembro de 2015, pois que antes foi interrompido pelo pedido da A., ora Recorrente, na acção de divórcio sem consentimento em que ela invoca os mesmos factos, o mesmo pedido, e, o mesmo valor contra o R., pedido que, como estabelece o artº 1792º do C. C., não podia ser conhecido então naquele processo; 3º Aliás, não prevendo o instituto da prescrição prazo determinado para a A. exercer o seu direito, devia o Tribunal a quo aplicar a regra geral do prazo ordinário da prescrição; 4º De resto, como é sabido, perder um direito pelo decurso de certo tempo sem que o seu titular seja inerte ou negligente ao seu exercício, é profundamente injusto pelo que deve haver nas decisões uma ponderação de justiça caso a caso, o que não se surpreende na decisão recorrida, pois que a A. demonstrou com clareza a intenção de exercer o seu direito não negligenciando o seu exercício nem renunciando ao mesmo.

    1. Sem quebra de respeito pela douta sentença em recurso, e, salvo melhor juízo, esta fez errada interpretação, e, má aplicação do nº 1 do artº 498º do Código Civil, do nº 3 deste preceito que não devia ser chamado a debate, pois que os factos em que se funda o pedido da Recorrente não emerge, no caso, de condutas criminosas imputadas ao Recorrente.

    2. Acresce que a douta sentença nem sequer se pronunciou, como se lhe impunha, sobre quando começou a correr o prazo para a Recorrente poder exercer o seu direito violando a disciplina do artº 306º do C. C., nem as circunstâncias em que a prescrição pode ser interrompida, como dispõem os artºs 323º a 327º do mesmo diploma.

    3. Como vem alegando a A., ora Recorrente, a prescrição foi interrompida pela Recorrente, como dispõe o nº 1 do artº 323º do C. C. “A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.”, norma que a douta sentença deixou de aplicar, e, que à situação respeita.

    4. É que, na verdade, a Recorrente levou ao conhecimento do Recorrido antes de propor a presente acção a sua pretensão de por este ser indemnizada pela dissolução do divórcio, o que fez legalmente como prevê o nº 1 do artº 327º do C. C. podendo prevalecer-se da citação, notificação ou acto equiparado como dispõe o nº 1 do artº 227º do C. C. No caso foi pela notificação com essa interrupção que começou a correr novo prazo atento o disposto no nº 1 do artº 326º do C. C. cuja aplicação a douta sentença preteriu.

    5. E, nem sequer a sentença, apesar de aflorar tal questão, ao pretender questionar se a data de 10/10/2008, como se alega no artº 9º da petição, quando o Recorrente saiu de casa, constituiria o início do prazo para a Recorrente exercer o seu direito, é que em boa verdade a sentença ao questionar tal data pelo que se afigura à Recorrente não abordou os factos que devia, nem o direito aplicável foi investigado em profundidade, cometendo a nulidade prevista na al. d) do nº 1 do artº 615º, e, o dever de fundamentação imposto pelo artº 154º, ambos do C.P.C. Tal falta revela-se, ainda, ao invocar para a sua decisão os artºs 576º, 579º, e, 1792º todos do C. C. sem especificar os fundamentos de direito atinentes à questão, caindo na nulidade da al. b) do nº 1 do artº 615º já citado.

    ” O recorrido contra-alegou pugnando pela total improcedência do recurso.

    Não foi admitida a junção aos autos da certidão oferecida com a apelação e, atenta a natureza estritamente jurídica das questões decidendas e a existência de um substancial lastro doutrinal e jurisprudencial sobre as mesmas, com o acordo dos Excelentíssimos Juízes-adjuntos, decidiu-se dispensar os vistos e ordenar a imediata inscrição dos autos em tabela.

  4. Questões a decidir tendo em conta o objeto do recurso delimitado pela recorrente nas conclusões das suas alegações (artigos 635º, nºs 3 e 4 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil, na redação aplicável a estes autos), por ordem lógica e sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil 2.1 Da nulidade da decisão recorrida por falta de fundamentação de direito e por omissão de pronúncia; 2.2 Da prescrição do direito acionado pela recorrente.

  5. Fundamentos de facto exarados na decisão sob censura e que não se mostram impugnados 3.1 Factos provados3.1.1O réu intentou contra a autora a acção de divórcio litigioso com o n.º 3223/09.3TBVNG, da 5ª Secção de Família e Menores, J2, de Vila Nova de Gaia.

    3.1.2No âmbito dessa acção foi dissolvido o casamento, por divórcio por mútuo consentimento, entre o autor e a ré, tendo a sentença transitado em julgado na data de 11.04.2011.

    3.1.3A presente acção entrou em Juízo no dia 07.08.2015.

  6. Fundamentos de direito 4.1 Da nulidade da decisão recorrida por falta de fundamentação de direito e por omissão de pronúncia A recorrente suscita a nulidade da decisão recorrida no ponto nove das conclusões do seu recurso, nos seguintes termos: “E, nem sequer a sentença, apesar de aflorar tal questão, ao pretender questionar se a data de 10/10/2008, como se alega no artº 9º da petição, quando o Recorrente saiu de casa, constituiria o início do prazo para a Recorrente exercer o seu direito, é que em boa verdade a sentença ao questionar tal data pelo que se afigura à...

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