Acórdão nº 791/09.3TBVCD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelRODRIGUES PIRES
Data da Resolução27 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 791/09.3 TBVCD.P1 Comarca do Porto – Póvoa de Varzim – Instância Central – 2ª Secção Civel – J1 Apelação Recorrente: “Companhia de Seguros B…, SA” (principal); C… (subordinado) Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e Maria de Jesus Pereira Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO O autor C…, no âmbito da presente ação, pediu a condenação da ré Companhia de Seguros B…, SA a pagar-lhe: a) A indemnização global líquida de 76.147,55€, mais juros à taxa legal, desde a data de citação; b) A indemnização ilíquida que por força dos factos alegados nos artigos 190º a 202º da petição inicial vier a ser fixada em decisão ulterior.

Fundamentou tal pedido no ressarcimento de danos sofridos em acidente de viação culposamente causado por segurado da ré.

Por seu turno, a interveniente Companhia de Seguros D…, SA pediu a condenação da ré Companhia de Seguros B…, SA no pagamento da quantia de 9.277,12€, a título de reembolso de montante equivalente que despendeu com a regularização de acidente de trabalho culposamente causado por segurado da ré e de que foi vítima o autor.

Posteriormente veio ampliar o pedido em 796€ a título de reembolso de despesas judiciais suportadas no processo do Tribunal do Trabalho.

A ré Companhia de Seguros B…, SA apresentou contestação na qual assumiu a responsabilidade pela indemnização dos danos que resultem provados como tendo sido sofridos pelo autor em consequência do acidente objeto dos autos, tendo impugnado, por o entender excessivo, o montante indemnizatório peticionado, assunção de responsabilidade esta que reiterou em sede de audiência de julgamento.

Foi proferido despacho saneador, com fixação da matéria de facto assente e organização da base instrutória.

Realizou-se audiência de julgamento com observância do legal formalismo, tendo sido proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, condenou a ré Companhia de Seguros B…, SA a pagar ao autor a quantia de 13.312,29€, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, contados desde a citação até integral pagamento.

Mais condenou a ré Companhia de Seguros B…, SA a pagar à interveniente Companhia de Seguros D…, SA a quantia de 9.277,12€, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

Inconformada com o decidido, interpôs recurso a ré Companhia de Seguros B…, SA que finalizou as suas alegações com as seguintes conclusões: - Da não verificação do dano patrimonial decorrente da incapacidade permanente 1. As sequelas incapacitantes, traduzidas numa incapacidade permanente, que afectam qualquer indivíduo podem dar origem a indemnizações diferentes, a nível patrimonial e não patrimonial. Isto é, no “desdobramento” do dano futuro, o mesmo dano pode reflectir um dano patrimonial e um dano não patrimonial.

  1. E se o segundo se traduz numa afectação da integridade física ou psíquica que se repercute nas actividades da vida diária, incluindo as familiares, sociais, de lazer ou desportivas – critérios orientadores, aliás, da Tabela Nacional para a Avaliação de Incapacidades em Direito Civil, constante do Anexo II do DL nº 352/2007, de 23 de Outubro – consubstanciando-se assim, genericamente, numa diminuição da qualidade de vida, já o primeiro constitui um prejuízo com reflexos na perda de capacidade aquisitiva ou de ganho.

  2. Tal como se referiu no Acórdão do STJ de 27.10.2009, disponível em www.dgsi.pt, a situação terá de ser apreciada casuisticamente, verificando se a lesão origina, no futuro, durante o período activo do lesado ou da sua vida e, só por si, uma perda da capacidade de ganho ou se traduz, apenas, uma afectação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, para além do agravamento natural resultante da idade, não oferecendo grandes dúvidas que a mera necessidade de um maior dispêndio de esforço e de energia mais traduz um sofrimento psico-somático do que, propriamente, um dano patrimonial.

  3. A ressarcibilidade do dano patrimonial decorrente de incapacidade permanente depende da demonstração de factos que permitam criar um juízo de previsibilidade da existência desse dano, em termos, precisamente, de perdas patrimoniais.

  4. No caso em discussão nos presentes autos sabe-se que as sequelas incapacitantes sofridas pelo recorrido, implicando, é certo, esforços suplementares, são no entanto compatíveis com o exercício da sua actividade profissional. E nada nos autos permite concluir razoavelmente que as limitações físicas sofridas pelo recorrido se traduzam ou venham a traduzir numa efectiva perda de capacidade de ganho, seja em termos de progressão de carreira, seja em termos de evolução salarial.

  5. A análise ao elenco dos factos provados permite concluir não estar positivamente demonstrado que as sequelas sofridas pelo recorrido possam, ainda que no recurso a juízos de previsibilidade, consubstanciar um dano patrimonial futuro.

  6. Na verdade, se pela mera necessidade de maior dispêndio de energia e esforço na realização de uma actividade profissional se concluir, sem mais, pela repercussão futura em termos de perda de capacidade de ganho, então deixará pura e simplesmente de ser possível a destrinça entre o dano patrimonial e o dano não patrimonial.

  7. Haverá assim que concluir pela não verificação do dano em causa e, consequentemente, pela revogação da douta sentença recorrida na parte em que condena a recorrente no pagamento da quantia de € 3.500,00.

    Sem Conceder, II- O montante indemnizatório atribuído a título de dano patrimonial futuro decorrente da incapacidade permanente 9. Com base em todos os elementos utilizados na douta sentença recorrida e lançando ainda mão das tabelas financeiras usualmente utilizadas para o cálculo da indemnização em causa afigura-se justo, razoável e equilibrado o arbitramento de indemnização não superior a € 2.000,00, não se justificando, pois, a quantia de € 3.500,00 a tal propósito fixada na decisão sob recurso, a qual e para além do mais corresponde a cerca do dobro da quantia alcançada com o recurso à fórmula matemática utilizada na mesma decisão.

    Ainda, Sem Conceder, III- A indemnização a atribuir ao recorrido pela incapacidade permanente de que ficou afectado deverá ser ponderada à luz do dano biológico na vertente de dano não patrimonial 10. No caso dos presentes autos, sabe-se que a incapacidade de que o recorrido ficou portador não afecta a sua capacidade aquisitiva ou de ganho. A incapacidade deve, por conseguinte, colocar-se em termos de prejuízo funcional, dano biológico que consiste, precisamente, na diminuição somático-psíquica do indivíduo com repercussão na vida de quem o sofre – cfr. Acórdão do STJ de 04.10.2005, disponível em www.dgsi.pt.

  8. Dito de outro modo, dada a ausência de consequências que o dano biológico teve em termos de perda efectiva de rendimentos do recorrido, dever-se-á ponderar nas repercussões que a incapacidade permanente sofrida por ele tem, em termos físicos e psíquicos, para os actos da vida corrente.

  9. Nesta conformidade e seguindo a jurisprudência maioritária dos nossos tribunais superiores, a respectiva compensação deverá ser feita em termos de danos não patrimoniais.

  10. Considerando que a título de danos não patrimoniais foi arbitrada ao recorrido a indemnização respectiva, não há assim que atribuir qualquer outra quantia.

    IV - A compensação devida pelo dano não patrimonial 14. À face dos factos relevantes para a apreciação da questão que ora se discute, isto é, dos factos relativos aos padecimentos e incómodos que do acidente resultaram para o recorrido e que determinam a atribuição a este de compensação por danos não patrimoniais, afigura-se à recorrente ser excessivo o montante a tal título fixado.

  11. É na justa medida dos danos sofridos que o recorrido tem o direito a ser compensado, e a justa medida dos danos concretizados nos autos permite concluir que o montante arbitrado de € 10.000,00 é inadequado, por excessivo, para compensar esses danos.

  12. Na verdade, na fixação da indemnização o tribunal deve atender aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito – cfr. art.º 496º, nº 1, do CCivil – indemnização que, preceitua o nº 3 do mesmo dispositivo legal, deve ser fixada equitativamente pelo tribunal.

  13. Os danos não patrimoniais em causa nos presentes autos merecem, indiscutivelmente, a tutela do direito, mas justificam compensação com quantia não superior a € 5.000,00, aliás no seguimento do que vem sendo decidido pelos nossos tribunais no âmbito dos cálculos das compensações devidas a título de danos não patrimoniais ocasionados por acidente de viação.

    V- Os juros de mora devidos sobre as quantias arbitradas a título de indemnização pelo dano decorrente da incapacidade permanente e a título de compensação pelos danos não patrimoniais 18. É a própria Lei, nomeadamente, no art.º 566º, nº 2, do CCivil, que manda ter em conta, na fixação do montante indemnizatório, a data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, ou seja, a data de encerramento da discussão na primeira instância.

  14. Na verdade, sempre que a indemnização tenha sido objecto de correcção monetária, ao abrigo do disposto no art.º 566º, nº 2, do CCivil, deve o nº 3 do art.º 805º do CCivil ser interpretado restritivamente, pois que, como se lê no Acórdão do STJ de 6.07.2000, o papel indemnizatório atribuído aos juros moratórios (destinados a cobrir, em abstracto, todos os prejuízos resultantes da mora, aí incluídos os provenientes da desvalorização da moeda) já se encontra, em tais hipóteses, desempenhado pelo mecanismo do nº 2 do art.º 566º do CCivil.

  15. O supra exposto entendimento encontra-se, aliás, sufragado no STJ, pelo Acórdão Uniformizador de Jurisprudência, proferido em 9.05.2002 na Revista Ampliada nº 1508/01, com a seguinte norma interpretativa: Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT