Acórdão nº 45675/15.1YIPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução12 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 45675/15.1YIPRT.P1 Sumário do acórdão: I. A previsão legal do n.º 1 do artigo 155.º do Código de Processo Civil engloba as ações especiais, sendo obrigatória a gravação da audiência final realizada na ação declarativa no âmbito dos procedimentos para cumprimento de obrigações pecuniárias, apesar de o artigo 4º, da Lei 41/2013 não ter procedido à revogação do n.º 3 do artigo 3º, do regime dos procedimentos a que se refere o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro.

  1. No regime jurídico do cumprimento defeituoso no contrato de empreitada o legislador facultou ao dono da obra uma série de direitos a exercer desta forma sequencial: i) em primeiro lugar, o dono da obra goza do direito de exigir ao empreiteiro a eliminação dos defeitos; ii) caso tal eliminação não seja viável, tem o direito a exigir nova construção, salvo, em ambos os casos, se as despesas com a eliminação dos defeitos ou a nova construção forem desproporcionadas em relação ao proveito; iii) apenas no caso de não serem eliminados os defeitos ou construída de novo a obra, tem o dono da obra o direito a exigir a redução do preço ou a resolução do contrato, mas, neste último caso, somente se os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que se destina.

  2. O dono da obra não tem o direito de por si próprio proceder à eliminação dos defeitos, apenas podendo atuar desse modo após o incumprimento definitivo por parte do empreiteiro da obrigação de eliminar os defeitos.

  3. Não tendo sido alegada por qualquer das partes a estipulação de qualquer cláusula a conferir a alguma das partes ou a ambas o direito potestativo de resolução do contrato, verificando-se cumprimento defeituoso, é facultado ao dono da obra o direito de resolução do contrato, quando não sejam eliminados os defeitos ou construída de novo a obra e desde que os defeitos tornem a obra inadequada ao fim a que se destina.

  4. A inadequação da obra ao fim a que se destina é um dos factos constitutivos do direito de resolução conferido ao dono da obra pelo artigo 1222º, nº 1, do Código Civil, recaindo sobre o dono da obra o ónus de alegar e provar factualidade integradora daquele requisito VI. Provando-se que o empreiteiro se recusou a efetuar os trabalhos de eliminação dos defeitos da obra denunciados, e que deu o seu consentimento à sua eliminação por terceiro, deverá considerar-se definitivamente incumprida a sua obrigação de eliminar tais defeitos.

    Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. Relatório Em 21.03.2015, B…, Lda., apresentou no Balcão Nacional de Injunções, requerimento de injunção contra C… (injunção n.º 45675/15.1YIPRT), pedindo que esta seja notificada para pagar a quantia de € 6.109,82.

    Alegou a requerente, como fundamento da sua pretensão: requerente e requerida celebraram contrato de empreitada ao abrigo do qual foram prestados diversos serviços de carpintaria na casa de habitação da requerida conforme seguidamente se discriminam: 1) substituição do soalho danificado numa área de 83,32 m2, com a colocação do soalho em sucupira no valor de 5.799,90€; 2) colocação de rodapé em madeira de sucupira no valor de 714,00€, mais iva, no valor total de 878,22€; 3) colocação de soalho novo e levantamento do velho não danificado (20.68m2x69, 61€), no valor de 1.439,53€, mais iva legal, no valor total de 1.770,62€; 4) colocação de seis portas lisas completas, aros e guarnição sucupira, ferragem inox JNF, borracha de vedação e envernizamento, no valor de 1.830,00€, mais iva legal, no valor total de 2.250,90€; 5) colocação de duas portas (sala e cozinha) com vidro laminado e envernizadas, no valor de 980, 00€, mais o iva legal, no valor total de 1.205,40€; 6) guarnecimento das 4 frentes de roupeiro a madeira de sucupira envernizada, no valor de 1.000,00€, mais iva legal, no valor total de 1.230,00€; 7) revestimento da porta de entrada com painel em madeira sucupira e envernizamento interior, no valor de 200,00€, mais iva legal, no valor total de 246,00€; 8) substituição de 10 perfis puxadores das portas dos roupeiros, no valor de 200,00€, mais iva legal, no valor total de 246,00€; 9) um móvel armário escritório, no valor de 900,00€, mais o iva legal, no valor total de 1.107,00€; 10) fornecimento e colocação de empainelados em madeira maciça para cinco portas exteriores, com guarnição e envernizamento, no valor de 450,00€, mais iva legal, no valor total de 553,50€; 11) retirar móvel quadro, deslocar a Carpintaria para alterar, recolocar e fazer porta nova em MDF com mola Tic Tac, no valor de 150,00€, mais ival legal, no valor total de 184,50€; 12) fornecimento e colocação de calhas superiores em quatro roupeiros revestidas na face a sucupira,calhas inferiores em alumínio bronze, 20 carros inferiores e 20 carros superiores, material e mão de obra 580,00€, mais iva legal, no valor total de 713,40€ Tudo conforme factura nº ../…., de 04/11/2013; a requerida procedeu ao pagamento de 5.000,00€, pelo que ficou devedora do valor restante de 5.385,54€ (cinco mil, trezentos e oitenta e cinco e cinquenta e quatro cêntimos); não obstante, as diversas tentativas da requerente em obter o pagamento do valor em dívida, sempre a requerida se recusou a efetuá-lo.

    Efetuada a notificação do requerimento de injunção à requerida, veio esta apresentar oposição, na qual alegou em síntese: o valor total das obras orçado, já com IVA era de 14.791,22€, aos montantes a que acrescia IVA à taxa legal; o montante peticionado em 1) e 3) da Injunção já está descrito na fatura n.º ../…. datada de 14/06/2013 e paga a 17 de Junho de 2013, conforme recibo n.º ../…. emitido pelo requerente no valor de 7.134,00€; quanto ao peticionado em 11) e 12) da Injunção, tais serviços não foram orçados, nem se faz a descrição dos mesmos em sede de orçamento, tais serviços encontravam-se incluídos nos remates do roupeiro; apesar de constar na fatura n.º ../.. de 04/11/2013, nunca foram aceites pela requerida, tendo impugnado tais valores após receção da mesma; a requerente desde inícios de novembro de 2013, abandonou a obra da requerida, deixando-a inacabada e defeituosa até aos dais de hoje; a requerida teve de recorrer a serviços de outra carpintaria para tentar minimizar parte dos defeitos deixados pela requerente, tudo com o consentimento desta, com tais serviços despendeu a requerida, a quantia de 1.322,25€, montante que a requerente assumiu pagar em sede de acerto de contas; os defeitos são visíveis, podem ser reparados, mas o orçamento para tal reparação ascende à quantia de 910,00€ +IVA à taxa em vigor; montante, que seria deduzido ao valor em dívida, na hipótese da requerida ter algo a pagar, o que não é verdade; a requerida, tendo em conta os valores abaixo descriminados nada deve à requerente; pagou: a) 7.134,00€ em 17/06/2013, b) 5.000,00€ em 04/11/2013; o valor pedido pela requerente, 5.385,54€, baseia-se na fatura ../…., cujo montante era de 10.385,54€ ao que o requerente deduziu a quantia de 5.000,00€ paga em b) do ponto anterior, esquecendo-se a requerente de deduzir o valor dos 7.134,00€ pagos a 17/06/2013.

    Os autos foram remetidos à distribuição na Secção Cível, J2, da Instância Local de Vila Nova de Gaia, da Comarca do Porto, onde, em 11.09.2015, foi proferido o seguinte despacho: «Nos presentes autos de acção declarativa com forma especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, o(a)(s) ré(u)(s), regularmente citado(a)(s) para contestar, com a advertência de que se consideram reconhecidos os factos articulados, não contestou(aram), nem deduziu(ram) qualquer oposição.

    Por força do disposto no artigo 2º do Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, considero confessados os factos articulados e confiro força executiva à petição.».

    Em 14.09.2015, foi aberta conclusão nos autos, tendo a Mª Juíza proferido o seguinte despacho: «Ordenei a conclusão nestes autos porquanto o último despacho proferido, foi-o sem atentar no teor do requerimento apresentado a Juízo a fls. 4 e ss..

    Urge corrigir tal facto.

    Nos termos do previsto no artigo 613º, do Código de Processo Civil, proferida a sentença, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa. Porém, é lícito, porém, ao juiz rectificar erros materiais, suprir nulidades e reformar a sentença, nos termos dos artigos seguintes.

    Sendo que o disposto nos números anteriores, bem como nos artigos subsequentes, aplica-se, com as necessárias adaptações aos despachos.

    Ora, a sentença que foi proferida a fls. 15 foi-o antes de tempo e sem ter em conta o requerimento que consta de fls. 4 e ss., portanto, é nula e de efeito nenhum.

    O que julgo.

    Notifique e anote em local visível.».

    Em 7.03.2016 realizou-se a audiência final, tendo sido proferida sentença em 12.03.2016, com o seguinte dispositivo: «Nestes termos e nos melhores de Direito improcede, por não provado, o pedido formulado pela requerente nos termos em que o foi, sendo, pois, a requerida é absolvida do pedido.

    Mais, e no que ao pedido de condenação da requerente como ligante de má fé diz respeito, absolve-se a requerida do pedido que contra si foi formulado.» Não se conformou a requerente, e interpôs o presente recurso de apelação, apresentando alegações, findas as quais formula as seguintes conclusões[1]: 1. A recorrente não pode conformar-se com a sentença proferida pelo Tribunal a quo, cingindo-se a sua discordância aos seguintes aspectos: a nulidade decretada do acto de gravação da prova em sede de audiência de julgamento, impugnação da factualidade dada como provada, relativa ao valor facturado e devido pela demandada à demandante por força do contrato de empreitada celebrado e a aplicação do direito à factualidade assente, quanto à absolvição da demandada do pedido.

    2. Constando do processo todos os elementos probatórios que sustentam a decisão recorrida - prova documental, testemunhal, com documentação/gravação da audiência de discussão e julgamento -, pugna-se nos termos do art.º 640º e 662º, nº 1 do CPC. pela alteração da...

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