Acórdão nº 138/14.7T8GDM.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Setembro de 2016
Magistrado Responsável | MANUEL DOMINGOS FERNANDES |
Data da Resolução | 12 de Setembro de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo nº 138/14.7T8GDM.P1-Apelação Origem: Comarca do Porto-Gondomar-Inst. Local- Secção Cível-J3 Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Miguel Baldaia 2º Adjunto Des. Jorge Seabra Sumário: I- Na reapreciação da prova a Relação goza da mesma amplitude de poderes da 1.ª instância e, tendo como desiderato garantir um segundo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto impugnada, deve formar a sua própria convicção.
II- A questão do sobresseguro e a consagração do princípio do indemnizatório, que vinha sendo objecto de expressa regulação no artigo 435.º do CComercial, é actualmente regulada pelo DL n.º 72/2008, de 16-04, nos seus artigos 128.º e seguintes.
III- São coisas distintas o valor seguro do valor em risco, o primeiro corresponde ao valor do capital seguro contratado entre as partes e, como tal, o limite até ao qual a seguradora se obriga a indemnizar o seu segurado em caso de verificação do risco (acidente, furto, roubo, incêndio, etc.) e o segundo ao valor do objecto seguro à data do sinistro e, como tal, o valor que a seguradora se obriga, em concreto, a pagar ao seu segurado (descontado de eventuais franquias e, eventualmente, valor do salvado) em caso de verificação do risco, que está, aliás em consonância com o princípio indemnizatório consagrado nos artigos 128.º e 130.º do RJCS.
*I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B…, residente na Rua …, nº …, … Gondomar, intentou a presente acção comum contra C… Companhia de Seguros, SA., com sede Largo …, nº .. pedindo a condenação do réu no pagamento da quantia de € 15.975,00, acrescido de juros de mora desde a citação até integral pagamento.
Para tanto alegou, em síntese, que celebrou um contrato de seguro com a ré relativamente ao seu veículo; sofreu um despiste, devendo ser paga à autora a quantia e € 10.975,00.
*O réu contestou, pugnando pela improcedência da acção, invocando, além do mais e em síntese, que a autora em conluio com os seus pais ou pai alterou o n.º de quilómetros da viatura, o que constitui falsas declarações, o que determina a nulidade do contrato de seguro.
*A autora respondeu negando ter existido falsas declarações.
*Realizou-se audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais.
*A final foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente, por provada, a acção e consequentemente condenou a Ré a pagar ao autor, quantia de € 3.128,00, acrescidos dos juros moratórios a contar da citação, à taxa que em cada momento vigorar por força da Portaria prevista no artigo 559.º do Código Civil, até efetivo pagamento.
*Não se conformando com o assim decidido veio a Ré interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela forma seguinte: 1ª)-A Autora celebrou com a Ré C…-Companhia de Seguros, S.A. um contrato de seguro facultativo, para cobertura dos danos próprios do veículo de matrícula ...-GV-..., em caso de choque, colisão ou capotamento, entre outros, tudo conforme melhor resulta do contrato de seguro titulado pela apólice n° ………..
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)-Tal contrato foi celebrado em 26 de Dezembro de 2013 e o valor seguro fixado para o veículo foi de € 16.000.00.
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)-A Ré cobrou o prémio de seguro, em função do referido valor (valor seguro), prémio esse que a Autora também sempre pagou à Ré.
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)-O valor seguro de € 16.000,00 foi livremente fixado pela correctora de seguros, que mediou o contrato em causa para a aqui Ré.
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)-Isto é, o valor fixado de € 16.000,00 não foi definido pela Autora, mas sim pela Ré, tendo em conta as características do veículo e as tabelas por ela utilizadas para o efeito.
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)-Para tanto, a correctora de seguros fez uma vistoria ao veículo e a Autora entregou-lhe todos os documentos exigidos e referentes ao veículo.
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)-O veículo da autora sofreu um despiste em 21 de Fevereiro de 2014.
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)-A Ré peritou os danos e concluiu pela perda total do veículo, enviando à Autora a carta com os valores da perda total e tendo em consideração o valor seguro de € 16.000,00 (cfr. Doc. n° 3 junto com a P.I.).
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)-Porém, a Ré, mais tarde, vem invocar a alteração dos Kms, para reduzir o valor comercial do veículo, e consequentemente o valor a pagar.
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)-Ora, a questão dos Kms era do inteiro conhecimento da Ré, na medida em que, ela conhecia o histórico do veículo: - Quer certificando-se dos Kms que o veículo tinha à data do contrato, na medida em que a correctora de seguros vistoriou o veículo.
- Quer porque, o veículo tinha sido objecto de um sinistro em 24 de Maio de 2013, também regularizado pela Ré, e nessa altura a Ré pode certificar-se que o veículo tinha 414.149 Kms (cfr. Doe. 20 e 21 juntos com a contestação).
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)-Assim, e repete-se, conhecendo a Ré o histórico do veículo, e tendo a mesma vistoriado o veículo na data em que o contrato de seguro foi celebrado, ou seja, em 26/12/2013, porque é que a Ré não esclareceu na altura a questão da diferença dos Kms com a Autora, já que o poderia e deveria ter feito, e só vem levantar esta questão depois do sinistro, e quando sempre cobrou o prémio em função do valor seguro, ou seja€ 16.000,00.
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)-Esta questão da diferença dos Kms não faz pois o menor sentido, quando é sabido que o funcionário da correctora de seguros que vistoriou o veículo e celebrou o contrato em causa, no depoimento que prestou em Tribunal, reproduzido na motivação à matéria de facto, refere: "No sistema apenas se introduz: o ano, data da matrícula, etc. Não introduz os Kms ".
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)-Assim, a Ré deve pagar à Autora o valor seguro fixado para o veículo, de € 16.000,00, retirando-se, porém, a este valor o que a Autora recebeu dos salvados, € 4.775,00 e a respectiva franquia contratual de € 250,00. Isto é, a Ré deve ser condenada a pagar à Autora a quantia de € 10.975,00.
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)-O Tribunal "a quo" fez pois, uma incorrecta interpretação e aplicação da Lei, nomeadamente, do Dec. Lei n° 77/2008, de 16 de Abril (RJCS)*A Ré contra-alegou concluindo pelo não provimento do recurso, interpondo ela também recurso subordinado que concluiu nos seguintes termos: 1ª.-A Ré discorda da decisão do Tribunal recorrido no que concerne aos factos alegados nos arts. 8º, 9º e 13° da contestação, 2ª.-Que o Tribunal recorrido deu como não provados.
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-Tendo em os seguintes meios de prova: condições gerais da apólice juntas com a petição inicial e com a contestação, proposta de seguro junta com a contestação, documento de fls. 190 e seguintes dos autos depoimento da testemunha I… outra deveria ser a decisão quanto à matéria fáctica alegada nos referidos arts. 8º, 9º e 13° da contestação.
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-Perante tais elementos de prova, a Ré entende que deve ser dado como provados os seguintes factos: - Art. 8º da contestação "A Autora indicou o valor de 16.000,00 € como sendo o valor do seu veículo e pelo qual o pretendia segurar." Art. 9º da contestação " Atenta a quilometragem que a Autora indicava e que era de 169.463 Kms, para mais confirmada pelo valor constante do certificado de inspecção periódica, a Ré aceitou segurar o ..-GV-.. pelo valor de 16.000,00 €." Art. 13° da contestação " A Autora propôs pagar o prémio de seguro mensalmente, o que foi aceite pela Ré." 5ª.-É o que se requer nos termos do art. 662° do CPC.
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-A proceder...
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