Acórdão nº 2087/14.0JAPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelARTUR OLIVEIRA
Data da Resolução14 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 2087/14.0JAPRT.P1 O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO – SECÇÃO CRIMINAL (QUARTA) - no processo n.º 2087/14.0JAPRT.P1 - com os juízes Artur Oliveira [relator] e José Piedade, - após conferência, profere, em 14 de setembro de 2016, o seguinte ACÓRDÃOI - RELATÓRIO1. No processo comum (tribunal coletivo) n.º 2087/14.0JAPRT, da 2ª Secção Criminal (J3) – Instância Central de Santa Maria da Feira, Comarca de Aveiro, em que são demandantes civis B… e C… e é arguido demandado civil D…, foi proferido acórdão que decidiu nos seguintes termos [fls. 632-633]: «A) julgar a acusação parcialmente procedente, nos seguintes termos: A.1) condenamos o arguido D…, em autoria material e concurso real, pela prática de um crime de violência doméstica, previsto pelo art. 152º/1 b), 2 e 4 do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão, e de um crime de incêndios, explosões e outras condutas especialmente perigosas, previsto pelo art. 272º/1 b) do Código Penal, na pena de 5 (cinco) anos de prisão, e em cúmulo jurídico na pena única de 6 (seis) anos de prisão; A.2) absolver o arguido do mais que lhe vinha imputado na acusação pública; B) julgar inteiramente procedentes os pedidos de indemnização civis deduzidos pelas Demandantes C… e B…, assim se condenando o arguido a pagar-lhes: B.1) à ofendida C… a quantia de € 12.750,00 (doze mil, setecentos e cinquenta euros), acrescida de juros de mora à taxa legal, neste momento de 4% (quatro por cento), desde a notificação da dedução do pedido e até efectivo e integral pagamento; B.2) à ofendida B…, a quantia de € 4.600,00 (quatro mil e seiscentos euros).

(…)» 1. Inconformado, o Ministério Público recorre, extraindo da respetiva motivação um texto que designa por “conclusões” e em que, no essencial, (i) impugna a decisão proferida sobre matéria de facto e, com base na alteração pretendida, pugna pela condenação do arguido (também) pela prática de um crime de detenção de arma proibida, do artigo 86.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro e pelo consequente agravamento da pena única [conclusões 1 a 7, 20 e 22]; e (ii) argui o erro notório na apreciação da prova [conclusões 17 e 18] [fls. 702-719].

  1. Na resposta, o arguido suscita, como questão prévia, a “rejeição ou não admissibilidade” do recurso por as conclusões se limitarem “praticamente e com pontuais alterações, a copiar integralmente as respetivas motivações” [fls. 730]. No mais, considera que as declarações prestadas não podem ser valoradas pelo tribunal uma vez que não foram lidas e audiência [fls. 730-734].

  2. Nesta Relação, a Exma. Procuradora-geral Adjunta, acompanhando a motivação, emite parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso [fls. 751-753].

  3. Em decisão de 16 de julho último, o Supremo Tribunal de Justiça declarou nulo o anterior acórdão desta Relação, por omissão de pronúncia quanto à oposição da valoração das declarações prestadas pelo arguido no 1º interrogatório judicial.

  4. Colhidos os vistos, realizou-se nova conferência.

  5. O acórdão recorrido deu como provados e não provados os seguintes factos, seguidos da respetiva motivação [fls. 598-613]: «(…) 2.1 Factos provados 1) Com interesse para a decisão consideramos provados os seguintes factos: 1) O Arguido passou a partilhar cama e mesa com C… desde momento não concretamente apurado do ano de 2007, no domicílio comum sito na rua …, nº …, ….-… …, Santa Maria da Feira.

    2) No dia 24 de Outubro de 2014, a hora não concretamente apurada da tarde, sempre antes das 18h00, no interior do quarto de ambos, após conversar com C… sobre o fim da relação, fim por esta pretendido, nomeadamente por ter conhecido outro homem há cerca de três meses por quem se enamorara, o arguido fechou as janelas e agarrou-lhe o pescoço com uma mão, deitando-a na cama, ao mesmo tempo lhe disse: “não te vou largar um palmo hoje quem manda sou eu”.

    3) A ofendida C… conseguiu esquivar-se e ambos saíram do quarto.

    4) Já na cozinha, o arguido agarrou-a por um dos braços e levou-a até à garagem do domicílio comum, dizendo que tinha uma coisa para lhe mostrar.

    5) Uma vez chegados ao interior da garagem do domicílio comum, o arguido, continuando a segurar a ofendida C… por um dos braços, dirigiu-se ao seu veículo automóvel, abriu a porta do mesmo, pegou numa vela de explosivo, escorvada, de dimensões não concretamente apuradas, constituído à base de nitrato de amónio, revestida em plástico de cor clara e exibiu-lhe tal objecto.

    6) Tendo-lhe parecido esse objecto ser constituído por dinamite, a ofendida C… perguntou «para quê?» ao arguido, ao que este respondeu que «não ia brincar com ele, que ia acabar com tudo».

    7) De forma não concretamente apurada, o arguido e a ofendida C… regressaram então ao primeiro piso e aí continuaram a conversar.

    8) Uma vez regressados ao interior do quarto de dormir, a ofendida C… tentou abrir as janelas, no que foi impedida pelo arguido, o qual, dirigindo-se-lhe, disse-lhe por palavras não concretamente apuradas que a iria violar, e para que tirasse a roupa.

    9) C… negou-se a tirar a roupa que vestia e ambos dirigiram-se para a cozinha do domicílio comum e, uma vez aí chegados, o arguido empunhou uma faca que lá se encontrava, dizendo-lhe que já não havia outra solução e que teria de ir até ao fim, dando-lhe a entender que a iria matar.

    10) Seguidamente, o arguido levou a ofendida C…, puxando-a por um braço, até à sala do rés-do-chão do domicílio comum e fechou as janelas.

    11) Em momento não concretamente apurado, naqueles instantes, o arguido fechara já a porta de saída para a rua a partir desse piso e retirara a chave do canhão da fechadura.

    12) Instantes depois o arguido manifestou a C… o desejo de que ambos se deslocassem de novo à garagem.

    13) C… recusou acompanhar o arguido até àquela dependência do domicílio comum, por suspeitar que aquele fosse detonar o explosivo.

    14) Nesse momento o arguido agarrou-lhe ambos os pulsos e, tendo a ofendida C… dirigido o olhar para as fotos de familiares que se encontravam naquela divisão do domicílio comum, o arguido disse-lhe: «olha bem para as fotos que será a última vez».

    15) Em seguida o arguido puxou a C…, levando-a até à sobredita garagem.

    16) Aí chegados, o arguido largou um dos pulsos da ofendida C…, pegou num isqueiro e em seguida, largando o outro pulso da ofendida C…, segurou na tal vela de explosivo, e simulou o movimento de atear fogo a tal engenho explosivo.

    17) Nesse momento o arguido, dirigindo-se à ofendida C…, perguntou-lhe se queria que terminasse com a vida de ambos naquele instante.

    18) Então, a ofendida C…, aproveitando um momento de distracção do arguido, fugiu da garagem, subiu ao primeiro piso, trancou a porta de acesso da garagem ao interior do resto do domicílio comum e, posteriormente, fechou a porta da cozinha.

    19) Quando C… subia as escadas de acesso ao primeiro piso do domicílio comum, o arguido partiu o vidro da porta da garagem.

    20) Seguidamente a ofendida C… conseguiu fugir para o exterior do domicílio comum.

    21) Após, o arguido chegou também a vir ao exterior da habitação, regressou ao interior e passado alguns minutos accionou o engenho explosivo à base de nitrato de amónio, ligando-o ao detonador eléctrico constituído por uma cápsula de alumínio, com as dimensões aproximadas de 6,3 centímetros de comprimento e 0,74 centímetros de diâmetro, fazendo detonar o sobredito engenho.

    22) Em resultado da detonação do engenho no interior da garagem do domicílio comum, a habitação, de valor superior a € 5.100,00 (cinco mil e cem euros), sofreu: a) rebentamento de paredes, tecto e portas da garagem; b) rebentamento das caixilharias exteriores do domicílio comum; c) fissuras nas paredes do restante domicílio comum; d) rebentamento da parede da lareira do domicílio comum; e) rebentamento das caixilharias interiores do 1º piso do domicílio comum.

    23) Os referidos danos afectaram a estrutura e a integridade do edifício, ocasionando estragos de valor não concretamente apurado.

    24) Em resultado da detonação do engenho explosivo, a habitação contígua, sita na Rua …, nº …, lugar …, ….-… …, Santa Maria da Feira, pertencente a B…, e de valor superior a € 5.100,00 (cinco mil e cem euros), sofreu fissuras nas paredes interiores e exteriores, gerando estragos em valor não inferior a € 4.600,00 (quatro mil e seiscentos euros), nos termos descritos no orçamento de fls. 433 (aqui dado por reproduzido).

    25) O arguido adquiriu a sobredita vela explosiva de modo e em momento não concretamente apurados.

    26) O arguido soubera em Agosto de 2014 que a ofendida C… encetara relacionamento amoroso com outro indivíduo de identidade não apurada.

    27) O arguido bem sabia que o que exibiu à ofendida C… era um engenho explosivo civil.

    28) O arguido quis e conseguiu molestar física e psicologicamente C…, nos termos atrás descritos, no interior do domicílio comum, bem sabendo que era a pessoa com quem vivia em condições análogas às dos cônjuges, e fê-lo porque aquela pretendia pôr fim à relação amorosa que mantinham.

    29) O arguido quis e conseguiu provocar explosão, mediante a utilização de engenho explosivo civil, no interior do domicílio comum, bem sabendo que dessa forma criava, como sucedeu, perigo para a estrutura e integridade de tal domicílio, de valor superior a € 5.100,00 (cinco mil e cem euros), e suas partes integrantes, ocasionando danos de valor não concretamente apurado.

    30) O arguido quis e conseguiu provocar explosão, mediante a utilização de engenho explosivo civil, no interior do domicílio comum, bem sabendo que, dessa forma, criava, como sucedeu, perigo para a estrutura e integridade da habitação contígua ao domicílio comum, de valor superior a € 5.100,00 (cinco mil e cem euros), e suas partes integrantes, pertencente a B…, nessa habitação contígua ocasionando danos na cozinha, nos quartos, na sala, na casa de banho e nas paredes exteriores, no valor de € 4.600,00 (quatro mil e seiscentos euros), conforme documento de fls. 433 (aqui dado por reproduzido).

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