Acórdão nº 19383/09.0TDPRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelV
Data da Resolução11 de Abril de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso nº 19383/09.0TDPRT-A.P1 Origem: Comarca do Porto - Juízo Local Criminal do Porto- Juiz 6 Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto: I – No processo comum de onde foram extraídos os presentes autos de recurso em separado, em que é arguido B...

, aqui recorrente – acusado da prática de um crime de usurpação, previsto e punido pelos artigos 195.º n.º 2, alínea a) e 197.º, ambos do Código de Direitos de Autores e Direitos Conexos – encontram-se documentadas várias sessões da audiência julgamento.

Nessa sequência, relativamente à que corresponderia à última de tais sessões, com data de 23 de abril de 2014, encontra-se, “fazendo” folha 639, um documento com a designação de “ata de audiência e discussão de julgamento - continuação” (embora não assinado, enquanto tal, por qualquer magistrado ou funcionário, nomeadamente os aí identificados), onde pode ler-se, a certa altura, “(…), pelo Mm.º Juiz foi declara aberta a presente audiência tendo de seguida procedido à leitura da sentença, o que fez em voz alta.”(…).

Apesar desta referência a uma leitura de sentença, não foi junta aos autos qualquer sentença ou outra peça processual escrita e/ou assinada pelo Magistrado Judicial que presidiu às referidas sessões.

De tais autos consta, depois, mormente, um termo de recebimento, onde consta que “os autos foram deixados no gabinete pelo Mm.º Juiz Titular, no dia 3 de Maio de 2017, após as 17 horas.” Foram, posteriormente, juntos um pedido de aceleração processual do Ministério Público de 1 de março de 2017 e outros pedidos de informação e consulta dos autos, sobre os quais não recaiu qualquer despacho judicial específico.

Só em 6 de junho de 2017 foi proferido nos autos – por Magistrado Judicial diverso do que havia presidido à audiência de julgamento – o seguinte despacho (transcrição): «Compulsados os autos verifica-se que a produção de prova terminou no dia 20/02/2014 e que após tal diligência, nenhuma outra foi produzida, nem tampouco proferida qualquer decisão, não obstante constar dos autos uma alegada leitura de decisão proferida no próprio dia 23/04/2014.

A este propósito, convém esclarecer que o processo sub judice é um processo que segue a forma de tramitação comum, pelo que não há lugar à sentença oral a que se reporta o artigo 389º-A do Código de Processo Penal. Logo e não existindo qualquer decisão escrita, estamos perante um caso de inexistência de decisão e não de nulidade da mesma, pois que não se pode declarar nulo aquilo que simplesmente não existe.

Por outro lado, o juiz que presidiu à audiência de discussão e julgamento encontra-se ausente do serviço, desde março do presente ano, não sendo previsível o seu regresso.

O artigo 328º do Código de Processo Penal, na redação vigente à data dos factos postulava o seguinte: 1- A audiência é contínua, decorrendo sem qualquer interrupção ou adiamento até ao seu encerramento.

2 - São admissíveis, na mesma audiência, as interrupções estritamente necessárias, em especial para alimentação e repouso dos participantes. Se a audiência não puder ser concluída no dia em que se tiver iniciado, é interrompida, para continuar no dia útil imediatamente posterior.

5- A interrupção e o adiamento dependem sempre de despacho fundamentado do presidente que é notificado a todos os sujeitos processuais.

6- O adiamento não pode exceder 30 dias. Se não for possível retomar a audiência neste prazo, perde eficácia a produção de prova já realizada.

Este preceito legal tem a razão de ser nos princípios da oralidade, da continuidade da audiência, da concentração, da imediação, etc.

Conforme refere Figueiredo Dias, é na audiência de discussão e julgamento que o princípio da concentração ganha o seu maior relevo, ligando-se aí aos princípios da forma, enquanto corolário dos princípios da oralidade e da imediação. Salienta, ainda, o mesmo autor que “a oralidade e a imediação exigem uma audiência unitária, e continuada, em que tenha lugar a apreciação conjunta e esgotante de toda a matéria do processo. Daqui a concentração espacial – a propósito da qual se fala também por vezes de um princípio de localização –, exigindo que a audiência se desenvolva por inteiro em um mesmo local, apropriado ao fim que com ela se pretende obter e aonde devem ser trazidos todos os participantes processuais (a sala de audiência); e a concentração temporal exigindo que, uma vez iniciada a audiência, ela decorra sem solução de continuidade até final.

Na verdade, e como bem refere Paulo Pinto Albuquerque, a imediação e a descoberta da verdade são prejudicados pela interrupção da produção da prova repetidas vezes, ou por períodos longos, pois ela torna impossível a captação da uma imagem global dos meios de prova e a formulação de um juízo concatenado de toda a prova.

Como forma de reduzir os riscos que o tempo e a duração do processo podem provocar na memória do julgador inscreve-se o princípio da concentração, que sublinha a necessidade de proximidade entre os diversos atos processuais para que o juiz possa valer-se da impressão deixada no seu espírito pelos testemunhos e depoimentos. Consequentemente, para que a oralidade seja efetiva e traga todos os benefícios inerentes à sua aplicação, torna-se necessária a produção de um mínimo de sessões de audiência ou, idealmente, a produção de apenas uma audiência. A proximidade temporal entre aquilo que o juiz apreendeu, por sua observação pessoal, e o momento em que deverá avaliá-lo na sentença é elemento decisivo para a preservação das vantagens do princípio, pois um intervalo de tempo excessivo entre a audiência e o julgamento tornará difícil ao julgador conservar, com nitidez, na memória os elementos que o tenham impressionado na receção da prova, fruto de sua observação pessoal sujeita a desaparecer com o passar do tempo.

Estes princípios aplicam-se não só na fase de produção de prova como também na fase de prolação de decisão, não fazendo sentido o julgador aguardar mais de 30 dias sem proferir o julgamento sobre os factos em causa nos autos, correndo o risco de perder todas as lembranças da prova, bem como de não se lembrar de todo o quadro fático, e que só a imediação pode assegurar.

No caso sub judice, desde a última sessão de audiência de julgamento até à data de hoje já decorreram mais de 3 anos.

Nessa conformidade, entendemos...

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