Acórdão nº 6984/11.6IDPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução11 de Abril de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 6984/11.6IDPRT.P1 Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto I. RELATÓRIO 1. No Processo Comum (Singular) nº 6984/11.6IDPRT (do Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo Local Criminal de Vila Nova de Gaia – Juiz 4), em que são arguidos B..., C... e D..., S.A (devidamente identificadas nos autos), após realização da audiência de julgamento, no dia 06.07.2017 foi proferida sentença (constante de fls. 2138 a 2162) onde se decidiu nos seguintes termos (transcrição parcial na parte relevante): “- Condeno o arguido B... pela prática, em autoria material, de um crime de abuso de confiança, previsto e punido pelo artigo 105º, nº 1 e nº 4, alínea a), e b), e nº 5, e pelo artigo 7º, nº 3, todos do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5 de Junho, na pena de 3 (três) anos de prisão, suspensa na execução por igual período; - Condeno o arguido C... pela prática, em autoria material, de um crime de abuso de confiança, previsto e punido pelo artigo 105º, nº 1 e nº 4, alínea a), e b), e nº 5, e pelo artigo 7º, nº 3, todos do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5 de Junho, na pena de 3 (três) anos de prisão, suspensa na execução por igual período, condicionada ao pagamento, no período dos 3 anos de duração daquela suspensão, da quantia de 10 (dez) mil euros, com a obrigação adicional, imposta a título de regra de conduta, de o arguido documentar, a cada seis meses, nos autos pagamentos parciais à Administração Fiscal, por conta do montante global a liquidar (cfr. artigos 50.º e 52.º, ambos do Código Penal e artigo 14º do RGIT).

(…)” 2. Inconformados com o assim decidido na sentença, dela interpuseram recurso os arguidos B...[1] e C...[2] (o arguido B1..., a fls. 2177 a 2191, e o arguido C1..., a fls. 2204 a 2210).

Assim, tendo em atenção os respectivos recursos por esta ordem: 2.1 O arguido B1...

finaliza a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): “Com a factualidade dada como provada nos presentes autos, a Sentença recorrida, condenou, o ora Recorrente, B... em autoria material, de um crime de abuso de confiança previsto e punido pelo disposto no artigo 105 nº 1 e nº 4 das alíneas a) e b) do nº 5, e pelo artigo 7º nº 3 do RGIT em pena suspensa.

Julga o Recorrente que a Sentença recorrida enferma de erro na apreciação da matéria de facto, porquanto, Tinha necessariamente que tomar em consideração a matéria de facto apurada nos autos, que publica e notoriamente implicava reconhecer:

  1. A existência da ruptura económica e social, em todas as relações económico-sociais, que levaram ao colapso e crise financeira que inequivocamente constitui causa justificativa e de exculpação da conduta do ora recorrente.

    a1) Que cumprindo escrupulosamente as obrigações declarativas de vinculação tributária, o Recorrente adoptou conduta social justificativa de interesse social e económico preponderante: manter o Estabelecimento Industrial em funcionamento assegurando o pagamento prioritário dos salários, e aquisição de fuel necessário á laboração industrial.

  2. Ao dar como não provado, o facto da acusação de que o R. não se locupletou com o montante do imposto declarado e não entregue ao Estado, cumpria á Sentença ora recorrida, reconhecer que o ora Recorrente se encontrava incurso no mesmo circunstancialismo fáctico do Administrador Financeiro Dr. E..., contra o qual o Ministério Público não deduziu acusação, não ajuizando com base nos mesmos factos, e perante as mesmas circunstâncias fácticas, de forma divergente – não cumprindo assim o disposto no Art. 13 nº 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa.

    b1) Não acusando um cidadão e condenando outro cidadão, nas mesmas circunstâncias, sendo que aplicado o preceito legal incriminatório do ora Recorrente nas circunstâncias dos Autos, violou a Sentença recorrida o principio constitucional de igualdade de todos os cidadãos perante a Lei.

    Sendo que nesta interpretação judiciária da norma incriminatória revela-se a mesma inconstitucional – Art. 412 nº 3 do Código de Processo Penal.

    A Sentença recorrida, erra também sob o ponto de vista do Direito.

    Porquanto: c) Tendo o Estado, admitido derrogar, o conteúdo normativo da exigibilidade do cumprimento tempestivo da entrega do imposto ao Estado, derrogou o Estado a obrigação Tributária, eliminando em consequência, a imputabilidade tributária criminalizada da Co-Ré D..., e neste sentido também, por via da novação tributária não podia o R. ter sido condenado.

  3. E mesmo que assim se não deva entender, não logrou o Estado fazer prova de que em sede de tributação do IVA, a Devedora principal em sede de tributação tivesse arrecadado imposto não entregue ao Estado, Porquanto, d1) A prova documental carreada para os autos e pelo depoimento dos inspectores tributários, não contém suficiente certeza, de que a Devedora Principal tivesse sequer arrecadado a receita susceptível de tributação; Antes é forçoso reconhecer que por via da entrega de títulos de crédito em pagamento, estes poderiam não ter sido honrados, como não foram, pelos devedores cartulares.

    Antes foi afiançado, que a inspecção tributária foi levada a efeito por amostragem, e que consideraram como pagas, facturas emitidas, pelos fornecimentos efectuados, que na realidade acabaram por não ver recebidos os valores dos preços, por via do incumprimento das obrigações cartulares entregues como meio de pagamento, pelos consumidores finais.

    Sendo certo que a Administração da Massa Insolvente da D... não providenciou pela tramitação da anulação da tributação em sede de IVA, estando a Administração da Insolvência a ser demandada em sede de reversão, em conformidade com o teor dos docs. ora juntos com esta alegação.

    e) Impõe-se ainda referir, que a aceitação por parte da Segurança Social da dação em pagamento dos valores imobiliários, garantidos por hipoteca, em sede de retenção de IRS, constitui também novação obrigacional que ilide e reverte a aplicação da norma incriminatória aplicada, violou consequentemente a Sentença recorrida as normas dos Arts. 5 nºs 1 e 2, Artº 8º e 9º, da Lei Geral Tributária e a Constituição da República Portuguesa – Art. 13 nº 1 e 2 com o disposto no Art. 412 nº 2 alíneas a) e b) do Código de Processo Penal.

  4. Ao reconhecer, face á factualidade patente nos Autos, e ao que é público e notório quanto á crise económico-financeira, a Sentença recorrida errou ao não aplicar o disposto nos Arts. 35 do Código Penal – Estado de necessidade desculpante – e Art. 36 nº 1 do mesmo Código – conflito de deveres.

  5. Não reconhecer qual o dever social preponderante em situação de Estado de Crise do Estado, constitui um erro de qualificação, que impõe dever ser dado provimento ao Recurso.

    Com o presente recurso deve subir o recurso de fls….., notificado ao ora Recorrente sob a referência 3753466331 em 14.11.2016, cuja cópia da notificação s junta para simplicidade de exposição.

    Venerandos Desembargadores: Nestes termos e em conclusão, com o Douto suprimento de V.Exas. deve o presente recurso ser admitido e julgado como procedente e provado, prolatando-se acórdão absolutório do, ou Dispensa de pena do ora Recorrente.

    Assim se julgando se fará uma vez mais Justiça!” 2.2. - O arguido C1...

    finaliza a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): “1. O ora recorrente goza de legitimidade e interesse em agir, nos termos da lei (arts. 401° e 402°, nº 2, ambos do C.P.P.); 2. O presente recurso visa apenas a revogação das condições impostas ao recorrente para a suspensão da execução da pena, delimitação material que é legalmente admitida na lei (n° 1 do art. 402° e n° 1 do art. 403°, ambos do C.P.P.); 3. As condições não se compadecem com o critério da razoabilidade fixado no C.P.P. (art. 51°, nº 2), e vão contra a Jurisprudência dominante, representando uma prestação mensal de 278,00, durante 36 prestações mensais; 4. A prestação mensal de 278,00 implica a redução do montante líquido de 1.672,10 que o ora recorrente recebe (oriundo da prestação da Segurança Social de 5.93,10), para o montante de 1.394,10 (1.672,10 - 278,00); 5. Os gastos mensais do ora recorrente, apurados pelo Tribunal «a quo», são de 1.650,00, pelo que o futuro novo montante de 1.394,10 ultrapassa aqueles, em 255,90 (1.650,00-1.394,10); 6. O actual montante liquido de 1.672,10 auferido pelo ora recorrente equivale ao múltiplo de 3 salários mínimos, como limite máximo do legalmente penhorável (art. 738°, nºs. 1 e 3 do C.P.C., em articulação entre si); 7. Tal limite máximo dos 3 (três) salários mínimos nacionais todavia, pode ser ultrapassado ao abrigo de medidas especiais (nº 6 daquele mesmo artigo 738° do C.P.C.); 8. O salário mínimo é, actualmente de 557,00, sendo, legalmente, aumentado todos os anos; 9. O limite máximo dos 3 salários mínimos é de 1.671,00 euros, e irá crescendo, pois, ao longo do período de duração da suspensão da pena aplicada; 10. A condição pecuniária mensal de 278,00, imposta pelo Tribunal «a quo», para efeitos da suspensão da pena aplicada, não atende à impenhorabilidade legal, prevista nos nºs. 1 e 3 do art. 738º do C.P.C.; 11. Ter apenas o salário mínimo (co-arguido B1...) ou nada sobrar do montante líquido mensal recebido pelo ora recorrente são, na prática, em termos de impenhorabilidade, situações iguais, próximas ou idênticas, (apenas aparente ou formalmente, diferentes ou distintas); 12. Não obstante a mera aparência de tal distinção, enquanto ao ora recorrente, o Tribunal «a quo» condicionou, pecuniariamente, a suspensão, ao outro co-arguido singular (B1...) concedeu a isenção de quaisquer condições; 13. A impossibilidade de cumprimento que o Tribunal «a quo» reconheceu ao co-arguido B1... também se verifica quanto ao ora recorrente, atentos os gastos mensais, provados pelo Tribunal «a quo», em que o mesmo incorre e cujo incumprimento acarretará a «prisão por dívidas ao Estado», gastos aqueles que asseguram, tão só, o mínimo digno da sua...

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