Acórdão nº 14407/13.0TDPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelPEDRO VAZ PATO
Data da Resolução30 de Abril de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Pr 14407/13.0TDPRT.P1 Acordam os juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto I – B… veio interpor recurso do douto acórdão do Juízo Central Criminal do Porto (Juiz 3) do Tribunal Judicial da Comarca do Porto que o condenou, pela prática de um crime de corrupção passiva agravado, p. e p. pelos artigos 373.º, n.º 1, e 374.º-A, n,ºs 2 e 3, do Código Penal, na pena de sete anos e seis meses de prisão; pela prática de um crime de falsificação de documento p. e p. pelos artigos 255.º, a), e 256.º, n.º 1, d), e n.º 4, do mesmo Código, na pena de três anos de prisão, e, em cúmulo jurídico, na pena de oito anos e seis meses de prisão; assim como, nos termos do artigo 66.º, n.º 1, a), b) e c), do mesmo Código, na pena acessória de cinco anos de proibição de exercício das funções de engenheiro civil.

São as seguintes as conclusões da motivação do recurso:«1. O arguido vinha acusado de, em autoria material e na forma consumada, um crime de corrupção passiva agravado, em concurso com um crime de falsificação ou contrafacção de documento, ps. e ps.,e submetido a julgamento, foi o arguido condenado pela prática de tais crimes, na pena única de 8 anos e 6 meses de prisão.

2. Entende o tribunal que o arrependimento do arguido, aqui recorrente, não foi sincero, embora dos factos assentes resulte, além do mais que “prestou declarações confessórias com algum relevo para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa e diz-se arrependido” – facto provado n.º 104.

3. Inexiste, do ponto de vista da lógica, da apreciação e valoração da prova, qualquer razão para que se não considere que a confissão do arguido, como sincera e que uma análise da materialidade dada como assente, demonstra claramente, que, não fosse o arguido ter falado e explicado as circunstâncias de modo tempo e lugar, a maioria do que se encontra dado como provado seria não provado, circunstância que deve ser valorada positivamente e como real arrependimento.

4. Não pretende o Recorrente substituir-se a convicção do Tribunal pela sua própria convicção, pretende demonstrar: Que algumas das conclusões a que o Tribunal chegou não estão subordinadas à razão e à lógica; Que houve arbitrariedade na apreciação da prova; Que não apreciou devidamente as declarações e postura do arguido em julgamento e ao longo de todo o processo – isto com referência, aquilo que o Tribunal “a quo” se pode socorrer e que estava no inquérito.

Mal andou o tribunal ao desvalorizar a confissão do arguido.

5. Se atentarmos na matéria dada como provada pelo tribunal, facilmente se concluiu que aquilo que resultou mais incriminatório derivou precisamente da sua confissão e assim é quanto: Ao (longo período) pelo qual desenvolveu a sua actividade criminosa; Quanto ao modus operandi da sua actuação, mormente quanto ao inflacionamento do preço, ao modo como as obras decorriam – omissões, etc.; E quanto a todo o demais circunstancialismo factual que resulta dos factos provados – pág. 21a 78 do Douto Acórdão.

6. Olhando para os factos provados e confrontando-os com a motivação constante das páginas 86 a 151 do Douto Acórdão não se percebe como não pôde o tribunal valorar – nos termos em que o devia – a confissão do arguido e a, efectiva relevância, daquilo que resultou para a descoberta da verdade – desta e doutros factos, quiçá relevantes para a justiça e para o país.

7. Desde logo e como supra se referiu, pelo período temporal dado como provado pelo tribunal – vide factos provados 18.Esta matéria apenas foi possível apurar porque o arguido o disse e explicou as circunstâncias em que o fez e como o fez. Percorrida a motivação do Douto Acórdão, resulta evidente a inexistência de qualquer outra prova.

8. O mesmo se diga quanto ao número de concursos, quanto ao tipo de obras, etc. Não fosse o arguido a falar e explicar o seu procedimento, a forma como inflacionava os custos, como «certificava» as obras e tudo o demais que melhor consta da materialidade assente, mormente dos factos provados, como é que o tribunal o concluiria? 9. Idem quanto ao concreto valor que correspondia o suborno/pagamento em dinheiro. Inexistem dúvidas que, ao tribunal, seria fácil, apurar que concursos e/ou ajustes foram adjudicados a determinadas empresas, bem como os respetivos valores com intervenção do arguido, mas, quem, além do arguido (poderia) explicou: Em que percentagem os orçamentos foram inflacionados? Em que circunstâncias essa percentagem foi negociada e com quem? Quanto é que o arguido recebeu de forma ilícita? E de quem, e a que título? Porque adjudicou determinadas obras a determinadas empresas? 10. Ninguém! Não fosse o arguido ter prestado declarações confessórias neste sentido, todas as questões supra referidas ficaram sem resposta e resultariam não provadas.

11. De igual forma deve ser considerado o arrependimento do arguido perante os factos, coisa que o tribunal não considera, mas que, salvo o devido respeito, se verifica, bastando para tal ouvir as declarações do arguido gravadas no sistema de gravação digital do tribunal da comarca do Porto, Juízo 3 – vide acta de julgamento do dia 2.05.2017 a partir do minuto 37 e acta de 22.09.2017, de minuto 0m52s a 1m44s.

12. Além das declarações propriamente ditas há que ter em conta a conduta do arguido, quer na fase de inquérito, quer na fase do julgamento: alguém que decide explicar a forma como agia na execução dos factos ilícitos: como o fazia, em que circunstâncias e porquê; que refere que o fez durante um período tão longo; que diz como recebia, quanto e como, só pode ser alguém que se manifesta, profundamente, arrependido por aquilo que fez, pois de outra forma não tinha o tribunal forma de o saber e consequente dar como provado.

13. Deve pois considerar e dar-se como provado que, se verifica por parte do arguido recorrente um, sincero, arrependimento e uma efectiva confissão, situações que terão (e de que maneira) relevância na medida da pena, tanto mais que resulta do facto provado 104 que o arguido, aqui recorrente, “prestou declarações confessórias com algum relevo para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa”.

14. O arguido recorrente foi condenado pela prática de dois crimes: um de corrupção passiva e um de falsificação de documentos – penas autónomas, posteriormente cumuladas.

15. In casu a falsificação de documentos constituiu um meio para atingir a corrupção. Sendo assim, não deveria ser penalizada autonomamente o crime de falsificação de documentos, pois neste caso o ordenamento jurídico bastar-se-ia com a punição da corrupção, uma vez que o crime de falsificação de documentos e o crime de corrupção são dois crimes que estão entre si, numa relação de consunção, impondo-se a absolvição pelo crime de falsificação de documentos.

16. Do Douto Acórdão resulta (páginas 128 e 129), bem como da gravação da prova produzida em julgamento – vide acta de 2.05.2017 – sistema de gravação do tribunal da partir de 1h46m, que o arguido referiu que os valores das comissões recebidas – 10% sobre quantia facturada antes de impostos, se destinavam a ser repartidas em partes iguais por si e ao coordenador do departamento onde exercia funções da ARSN, a quem posteriormente entregava.

17. Mais resulta que o tribunal desvalorizou o que o arguido recorrente disse em sede de julgamento por este, na fase de inquérito não o ter referido, naquilo que seria de crucial importância para a sua defesa e para o andamento dos autos - vide pág. 129 do Douto Acórdão.

18. No caso concreto, dúvidas não existem de que, o arguido referiu na fase de inquérito aquilo que, repetiu em sede de julgamento, isto é, que as comissões recebidas não eram só para si mas também para o seu coordenador/chefe, sendo certo que o mesmo explicou, que – neste inquérito – se silenciou nessa parte – em que denuncia o seu coordenador, por, existir um outro inquérito no qual o referido coordenador estaria (estará) a ser investigado por factos semelhantes. Foram as autoridades que superintendem as investigações criminais – MP e PJ – que pediram que o arguido não o referisse nestes autos.

19. O arguido, ora recorrente, foi já ouvido – antes do julgamento destes autos – nesse outro inquérito. E se é certo que, mesmo omitindo neste inquérito, no interesse da investigação, tal facto, a verdade é que poderia o arguido ter beneficiado do regime do art.º 374-B do CP.

20. Se o arguido, de modo próprio, não diligenciou por demonstrar ao Tribunal, o que disse e supra se expõe, deveria o tribunal oficiosamente, ao abrigo do disposto no art.º 340º do CPP ter apurado tal facto.

21. Mesmo sabendo que dessa diligência poderia resultar vantagem objectiva para a descoberta da verdade material e para a defesa do arguido, o tribunal de primeira instância nada fez, violando assim a obrigação prevista no art.º 340º do CPP, o que implica a nulidade da decisão nos termos do disposto no art.º 120º e 340º do CPP, bem como a sua inconstitucionalidade.

22. A descoberta da verdade material deve constituir o escopo mor do nosso ordenamento jurídico, daí que, no caso concreto, em face de tudo o exposto, se impunha e se impõe, a realização de todas as diligências necessárias para se apurar se o arguido recorrente prestou declarações – antes do julgamento- em inquérito – neste ou noutro – perante policia ou procurador do Ministério Público declarações que auxiliem concretamente na obtenção ou produção das provas decisivas para a identificação ou a captura de outros responsáveis, é que, se assim for, deverá a pena que lhe vier a ser cominada ser especialmente atenuada nos termos do disposto no n.º 2, al. a) do n.º 2 do art.º 374-B do CPP, sob pena de nulidade.

23. Entende o arguido que – em face do que expôs no ponto A, C e D – conclusões n.ºs 2 a 13 - e mesmo que assim não seja, isto é, ainda que não se atenda a tal argumentação - deverá, ser posta em causa a medida da pena.

24. O Tribunal “a quo” na determinação da medida da pena, tendo em consideração todas a circunstâncias que depuseram a favor...

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