Acórdão nº 10672/15.6T8VNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelANA PAULA AMORIM
Data da Resolução08 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Insolv-PER-10672/15.6T8VNG Comarca do Porto V. N. Gaia - Inst. Central - 2ª Sec. Comércio - J2-Juiz Desembargador Relator: Ana Paula Amorim Juízes Desembargadores Adjuntos: Manuel Fernandes Miguel Baldaia de Morais*Acordam neste Tribunal da Relação do Porto[1] (5ª secção judicial – 3ª Secção Cível)I. RelatórioB… e C…, casados entre si e residentes na Rua …, nº …., …, …. - …, …, Vila Nova de Gaia, vieram ao abrigo do disposto no artigo 17º-A do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas intentar o presente processo especial de revitalização.

-Proferiu-se despacho que procedeu à nomeação do administrador judicial provisório, nos termos do disposto no artigo 17º-C/3/a) do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

-O Administrador juntou lista provisória de créditos ( fls. 88 a 90 ).

-O Ministério Público em representação do Estado (Fazenda Nacional) veio impugnar a lista de créditos, porque na mesma se omitiram os créditos tributários e que são devidos pelos devedores.

-O Digno Ministério Público em 03 de fevereiro de 2016 apresentou o parecer que se transcreve: “ Visto o teor dos autos vislumbram-se alguns indícios do caráter potencialmente fraudulento do presente processo de revitalização, em especial: - Na petição inicial não foram indicados créditos fiscais, já então preexistentes; - Como não foi remetida carta registada à AT, conforme impõe o artigo 17.º-D, n.º 1, do CIRE, dando nota da existência do processo, para efeitos de convite à participação no processo negocial, tudo como resulta do antecedente requerimento da lavra do Ministério Público; - Os requerentes indicam um domicílio em Vila Nova de Gaia (Rua … Nº …., …) mas os dados quanto a si disponíveis na plataforma Citius atribuem-lhes morada – “Rua …; … …. - … …” (de resto o bem de que se afirmam proprietários, segundo fls. 85) – que os situa fora da área de competência em razão do território desta Instância Central; - Uma breve pesquisa em https://www.google.pt/maps/@41.1133717,- 8.6051941,3a,90y,67.68h,104.19t/data=!3m6!1e1!3m4!1sJ6Q9SIFcOQRvV_aMBH3BQ!e0!7i13312!8i6656!6m1!1e1, ainda que empiricamente – por isso sem o grau de certeza jurídica ou consistência necessárias –, revela que ao endereço em referência parece corresponder um edifício de cinco andares e r/c elevado com afetação comercial, por isso, uma morada aparentemente inexistente ou de mera conveniência; - Preexistem ações de insolvência e de revitalização iniciadas há menos de um ano quanto aos aqui requerentes, comungando-se da bondade do raciocínio jurídico vertido no douto despacho judicial de fls. 55 e 56, proferido na comarca de Aveiro e cujas razões substantivas e adjetivas, a nosso ver, impedem, igualmente, a continuidade do presente processo”.

-Os devedores notificados da impugnação vieram requerer que se considere reconhecido o crédito reclamado pela Fazenda Nacional.

-O Administrador Judicial Provisório notificado veio apresentar o plano de revitalização e ata da deliberação que aprovou a medida proposta, com o seguinte resultado: “os votos expressos representam €193.456,17, o que equivale a uma participação de 99,88% dos créditos com direitos de voto, constantes da lista definitiva de créditos. Em face do nº1 do art. 212º do CIRE está verificada a existência de quórum deliberativo. Votaram a favor da aprovação do plano de recuperação proposto pela devedora os credores que correspondem a €144.447,19, os quais representam 74,67% dos votos regularmente expressos. Votaram contra a aprovação do Plano de Recuperação proposto pela devedora os credores que correspondem a €48.772,13, os quais representam 25,21% dos votos regularmente expressos”.

Consignou-se na ata que não foi rececionada proposta do credor D…, SA com um crédito de €236,85(0,12%).

-Notificado o Ministério Público apresentou o parecer que se transcreve: “ Visto o teor dos autos denota-se o insólito da respetiva tramitação e a possibilidade de não estarem reunidos os pressupostos para a respetiva validação.

Esse insólito manifesta-se em algumas omissões também anotadas a fls. 97 e noutros detalhes que não caberá agora explanar.

Para lá da confessada situação de insolvência por via da instauração de ação dessa natureza com incidente de plano de pagamentos – processo 2495/15.9T8AVR-J1 ICC Aveiro, instaurado em 13-07-2015 (fls. 58 verso e 86 verso) – os aqui devedores requereram na mesma IC a respetiva revitalização – 3803/15.8T8AVR-J2 (fls. 55) – e, no aparente insucesso de uma e outra das pretensões, “alteraram domicílio” (em contexto sobre o qual já nos pronunciamos a fls. 97) para, em menos de 5 meses, se envolverem numa terceira instância processual que possui o mesmo objeto concreto: procurar satisfazer os respetivos credores por estarem em situação de insolvência.

A nosso ver não faltarão motivos concretos para colocar termo formal ao presente processo, sem conhecer do plano, por uma série de fundamentos aí plasmados (litispendência ou caso julgado e desaforamento irregular atento o disposto no artigo 7.º, n.º 1, do CIRE; falta dos pressupostos do artigo 17.º-A, n.º 1, do CIRE por preexistência de ação de insolvência por apresentação dos mesmos devedores; fraude à lei, relevando nesta última hipótese a norma do artigo 612.º do CPC). Poderá mesmo estar em causa uma situação de litigância de má-fé.

Todavia, tendo em conta que a AT manifestou adesão ao plano (fls. 116) a intervenção processual do Ministério Público surge condicionada por falta de interesse em agir no sentido de inviabilizar qualquer acordo que, à partida, aparenta compatibilidade com o interesse público.

Neste contexto, antes se promove o seguinte: A) Que seja oficiado ao processo 2495/15.9T8AVR-J1 ICC Aveiro no sentido de nos ser informado se aí foi decretada a insolvência dos aqui devedores e se ocorreu – e quando - trânsito em julgado de tal decisão ou, inversamente, se foi proferida decisão que suspendesse os termos desse processo durante a pendência de processo especial de revitalização, bem como estado atualizado desse pleito; B) Que seja dado conhecimento do teor da exposição de fls. 108 a 109 verso à Exm.ª Magistrada Judicial, aí em causa, para que possa acionar os mecanismos legalmente aplicáveis, se entender estar em causa a sua honorabilidade”.

-O credor Banco E…, SA que não aprovou a medida, veio a fls. 127 verso, declarar que acompanha a douta promoção do Digno Ministério Público e pronunciou-se no sentido de não ser homologado o “Processo Especial de Revitalização” o que se interpreta como não homologação da medida proposta.

-Os devedores vieram exercer o contraditório em relação à douta promoção do Ministério Público e posição assumida pelo credor Banco E…, SA.

-Por despacho de 09 de setembro de 2016 considerou-se inútil a apreciação da impugnação que tinha por base a omissão na relação de créditos do crédito da Autoridade Tributária, por se considerar reconhecido o crédito.

-Proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve: “Pelo exposto: Homologo por sentença, nos termos do 17º-F nºs 5 e 6 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa, o plano de revitalização dos devedores B… e C…, casados, residentes na Rua …, n.º …., …. - … Vila Nova de Gaia.

A presente decisão vincula todos os credores, mesmo que não hajam participado nas negociações – artº 17º-F, nº 6 do CIRE.

Custas pelos apresentantes, sendo o valor da ação para efeitos de custas equivalente ao da alçada da Relação, nos termos do art. 301º do CIRE.

Registe, notifique e publicite nos termos dos arts. 37º e 38º, ex vi nº 6, do art. 17º-F, todos do C.I.R.E”.

-O credor Banco E…, SA veio interpor recurso da sentença.

-Nas alegações que apresentou o apelante formulou as seguintes conclusões: 1 - O presente recurso tem por objeto o douto despacho de 23-09-2016, o qual homologou o acordo de pagamento entre o supra identificado Devedores e todos os seus Credores reclamantes.

2 - Ora face ao plano de revitalização apresentado, e depois de o aqui Recorrente ter votado contra o mesmo, e requerendo a sua não homologação, foi este homologado, porquanto o Tribunal a quo considerou que o mesmo respeitava a maioria prevista no artigo 17º-I, nº4 do CIRE e não subsistiam quaisquer das circunstâncias previstas nos e não se verificavam quaisquer das circunstâncias previstas nos artigos 215º e 216º.

3 - Decidindo como decidiu, salvo o devido respeito, o Mº Juiz a quo não fez correta interpretação dos factos nem adequada aplicação do direito.

4 - Tal decisão, salvo o devido respeito para entendimento diferente, não aprecia a legitimidade de quem requer tal plano, nem analisa as circunstâncias em que o mesmo é apresentado, bem como o seu conteúdo e a sua expressão na esfera económica dos credores, sopesando apenas a votação dos mesmos.

5 - Os Devedores alegam encontrarem-se em situação económica difícil, recorreram ao processo especial de revitalização, como expediente para a sua recuperação económica.

6- O ora Recorrente considera contudo, que tal instituto não lhes é aplicável, porquanto, atento o espirito da lei e a sua ratio, o mesmo destina-se apenas a devedores empresários e não a quaisquer outras pessoas singulares.

7 - Ora, o Processo Especial de Revitalização pretendeu e pretende consubstanciar-se num mecanismo célere e eficaz que possibilite a revitalização dos devedores que se encontrem em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda não tenham entrado em situação de insolvência actual.

8 - A situação económica difícil obriga a procurar soluções que sejam, em si mesmas, eficazes e eficientes no combate ao desaparecimento dos agentes económicos, de forma a por cobro à extinção de oportunidades comerciais, que dificilmente, se podem recuperar pelo surgimento de novas empresas – cf. Exposição de Motivos da Proposta de Lei nº 39/XII, de 30 de Dezembro de 2011.

9 - Claro se mostra então, que tal processo foi criado em torno e para recuperação dos agentes económicos, ou seja, de comerciantes, de empresários...

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