Acórdão nº 287/14.1EAPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 31 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelERNESTO NASCIMENTO
Data da Resolução31 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo comum singular 287/14.1EAPRT da Comarca do Porto, Juízo Local Criminal de Santo Tirso, J2 Relator - Ernesto Nascimento Adjunto – José Piedade Acordam, em conferência, na 2ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório I. 1. Efectuado o julgamento, no que ao caso aqui releva, foi o arguido B... condenado, pela prática de um crime de exploração de jogo ilícito de fortuna e azar, p. e p. pelo artigo 108.º do Decreto Lei 422/89, nas penas de 6 meses de prisão, substituída por 180 dias de multa, à taxa diária de € 7,00 e, em 80 dias de multa, à mesma taxa e, em cúmulo, na pena única de 260 dias de multa, à taxa diária de € 7,00, num total de € 1.820,00.

  1. 2. Inconformado com o assim decidido, recorre o arguido – pugnando pela revogação da sentença e sua substituição por outra que o absolva da prática do crime de exploração ilícita ou, caso assim não se entenda, que decida pela aplicação de penas substancialmente inferiores - rematando o corpo da motivação com as conclusões que se passam a transcrever: 1. discorda o recorrente da qualificação jurídica efectivada relativamente à conduta que lhe é imputada, e que foi efectivada pelo Digníssimo Tribunal “a quo” em sede de Sentença proferida e ora recorrida, pelo que, por entender ser de perspectivar um enquadramento jurídico diverso, vem pelo presente manifestar a sua discordância quanto à sua condenação pela prática do mencionado crime de exploração ilícita de jogo de fortuna e azar, p. e p, pelo artigo 108.º do Decreto Lei 422/89, de 2 de Dezembro; 2. na verdade, a entender-se que os computadores apreendidos à ordem dos presentes autos desenvolviam um qualquer jogo de fortuna e azar, sempre teria que se ter presente que os mesmos permitem aos utilizadores o acesso livre à internet, logo, qualquer tipo de jogo, pode ser utilizado, desenvolvido e jogado “online” através da internet por qualquer utilizador (através de acesso à internet, que tais máquinas permitiam) – conforme resulta da factualidade provada e do teor do relatório pericial elaborado; 3. ora, aquando da prática dos factos pelo qual o recorrente foi condenado, não existia qualquer regulamentação legal relativa aos “Jogos de Fortuna e Azar” desenvolvidos online (bem como as apostas desportiva à cota de base territorial, via online), o que só veio a acontecer com a entrada em vigor do Decreto Lei 66/2015, de 29 de Abril, cuja produção de efeitos legais se reporta a 29 de Junho de 2015; 4. com efeito, no caso em concreto verifica-se, que à data da prática dos factos em discussão nos presentes autos, existia claramente um vazio legal no que aos “Jogos e Apostas Online” dizia respeito, vertendo o nosso próprio legislador no preâmbulo de um tal diploma legal que, “Emerge, assim, a premente necessidade de criar um novo modelo de exploração e prática de jogo online, pensado à luz desta realidade e do vazio legal existente”, cfr., neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 2.11.2015, proferido no âmbito do processo 70/12.9EAMDL.G1 – ao que se sabe, “não publicado”; 5. a tudo acrescem as normas previstas nos artigos 1.º, 4.º alíneas n) e o), 5.º/1 alínea v), 49.º e 55.º do Decreto Lei 66/2015, de 29 de Abril, em que de uma forma clara e inquestionável, se tipifica a prática e a exploração de jogos de fortuna e azar via online, e claramente se renúncia à aplicação (eventualmente) subsidiária do Decreto Lei 422/89, de 2 de Dezembro, que era o anterior regime jurídico que tutelava a exploração e prática de jogos de fortuna e azar (por via física e não online); 6. sem descurar, importará também aqui salientar que inclusivamente, da matéria de facto dada como provada, os jogos não eram disponibilizados fisicamente pelas máquinas apreendidas, mas sim, eram disponibilizados apenas “via internet” e mediante servidores externos a tais máquinas, sendo por isso tais jogos jogados apenas mediante o acesso à internet, seja, via “online”; 7. assim, e segundo o princípio da legalidade, “nullum crimen sine lege”, princípio este consagrado no artigo 1º do C Penal e artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa, não poderá o recorrente ser condenado por uma conduta que à data da sua prática não era legalmente punível, o que se requer seja reconhecido para todos os devidos e legais efeitos e com todas as consequências daí advenientes; sem prescindir, 8. sem conceder do exposto, sempre apraz referir que, de forma alguma se poderá compreender e aceitar a(s) pena(s) aplicada(s) ao recorrente, na medida em que, extravasa(m) claramente a culpa deste e as próprias necessidades de prevenção, e não tem(têm), devidamente, em conta as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depõem a favor do mesmo recorrente; 9. é de todo incompreensível, porque exagerada(s) e desproporcionada(s), a(s) pena(s) aplicada(s) ao recorrente, não se percebendo do porquê de, de modo absolutamente injustificado, ter sido aplicada ao ora recorrente uma pena de prisão que se distancia de forma considerável do seu limite mínimo, e, uma pena de multa que se aproxima do meio da pena abstractamente aplicável; 10. já no que respeita às circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depõem a favor da recorrente, é de referir que, não parece ter sido devidamente valorada a ausência de antecedentes criminais do tipo, bem como a inserção familiar, social e profissional do mesmo e, bem assim, o facto de não existir uma qualquer notícia posterior da prática de quaisquer factos similares da sua parte ou de outros factos ilícitos; 11. ao que acresce a total impossibilidade de uma qualquer reincidência por parte do recorrente, na medida em que, não explora um qualquer estabelecimento comercial do género do dos autos, o que, atenta a especificidade do tipo, faz diminuir de forma significativa as necessidades de prevenção especial; 12. no caso presente, e por de aplicação ao mesmo, atenta a problemática em apreço, deverá relevar-se tudo quanto vem vertido no douto Acórdão da Relação do Porto, de 18/09/2013 (proferido pela 4ª Secção no âmbito do Proc. 311/10.7EAPRT.P1), que nos refere estarmos perante o «domínio das denominadas “bagatelas penais”, com um pequena grau de ilicitude dos factos e com pequenas necessidades de prevenção geral, porquanto, o tipo em causa não é causador de grande alarme social; 13. ademais, e na sequência do decidido pelo STJ, no seu douto Acórdão de Fixação de Jurisprudência 8/2013, sempre temos que a substituição da pena de prisão aplicada deveria ter sido efectivada, não em medida igual ou proporcional àquele prazo, mas sim em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, apresentando-se assim como exagerada e desproporcional a pena aplicada, impondo-se em medida inferior; 14. também o quantitativo diário, de € 7,00 da pena de multa que o Digníssimo Tribunal “a quo” julgou por adequado ao caso presente, merece a reprovação por parte do recorrente, na medida em que, ao fixar tais valores, não parece haver o Digníssimo Tribunal “a quo” ponderado, devidamente, os pressupostos legais, descurando “a situação económica e financeira” do aqui recorrente e “os seus encargos pessoais”, incorrendo, dessa forma, numa clara violação do disposto no artigo 47.º/2 C Penal; 15. pois que, na verdade, e ainda que resulte dos factos provados a ausência de constrangimentos relevantes a nível financeiro por parte do ora recorrente, o único rendimento mensal por aquele auferido corresponde ao salário mínimo nacional, com o que tem que fazer face a todas as suas despesas; 16. a pena aplicada ao ora recorrente, não é de forma alguma correcta e justa, revelando-se, aliás, como exagerada e desproporcionada às exigências de prevenção geral e especial aqui reclamadas, não se enquadrando, por isso, de forma alguma, nos princípios legais reguladores da presente matéria, como sejam, os artigos 40.º e 71.º C Penal; 17. de igual modo, também o quantitativo diário da pena de multa se revela como exagerado, e, em clara violação disposto no artigo 47.º/2 C Penal, por se afigurar como desproporcional à situação económica e financeira do recorrente e aos seus encargos pessoais; 18. donde, sempre será de concluir que, no caso presente, e atento tudo o exposto, sempre deverá decidir-se pela aplicação de penas substancialmente inferiores, na medida em que, das mesmas sempre resultarão perfeitamente prosseguidas as exigências de prevenção, resultando, daí, por realizadas, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição; 19. a douta Sentença sob recurso violou os artigos 40.º, 43.º, 47.º e 71.º C Penal, 1.º, 3.º, 4.º e 108.º, todos do Decreto Lei 422/89, de 2 de Dezembro, 1.º, 2.º, 5.º, 8.º, 9.º, 10.º, 49.º e 55.º, todos do Decreto Lei 66/2015, de 29 de Abril e 29.º da Constituição da República Portuguesa.

  2. 3. Na resposta que apresentou a Magistrada do MP pugna pelo não provimento do recurso.

  3. Subidos os autos a este Tribunal o Exmo. Sr. Procurador Geral Adjunto, da mesma forma, defende o não provimento do recurso.

    Proferido despacho preliminar e colhidos os vistos legais, vieram os autos à conferência e dos correspondentes trabalhos resultou o presente Acórdão.

  4. Fundamentação III. 1. Tendo presente que o objecto dos recursos é balizado pelas conclusões da motivação apresentada pelo recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas - a não ser que sejam de conhecimento oficioso - e, que nos recursos se apreciam questões e não razões, bem como, não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, então, as questões suscitadas no presente são tão só, a subsunção dos factos ao direito e, a dosimetria das penas.

  5. 2. A fundamentação de facto da decisão recorrida.

    No dia 14 de Outubro de 2014, cerca das 15h20, no estabelecimento comercial de restauração e bebidas denominado “C..., Lda”, situado na ..., ..., Loja ., freguesia ..., Santo Tirso, explorado pelo arguido B... e no interior de uma sala que funciona...

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