Acórdão nº 29987/15.7T8PRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução24 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 29987/15.7T8PRT-A.P1 Sumário do acórdão: ......................................................

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Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. Relatório Em 4.12.2015, no Juízo de Execução do Porto (Juiz 5) do Tribunal da Comarca do Porto, B..., SA, instaurou ação executiva contra C..., SA, para cobrança coerciva da quantia de € 329.457,35, com base na livrança vencida em 13.12.2012, com os seguintes dizeres: Livrança nº ..................; Importância - € 269.395,33; Local e data de emissão – Porto – 2012/12/03; Vencimento – 2012/12/13; Titulação de garantia autónoma 2008.00290; Subscritora – D..., Lda, com aposição no local respetivo da assinatura de dois gerentes sobre o carimbo da referida sociedade; Avalistas – E..., F..., G..., H... e I..., SA, com aposição das suas assinaturas (no último caso, com a assinatura do representante F... sobre o carimbo da sociedade) na face posterior precedidas da frase “bom para aval ao subscritor”.

Em 15.02.2016, a executada C..., SA, deduziu oposição por embargos de executado, alegando em síntese[1]: (i) a prescrição do direito de ação nos termos dos artigos 70º, 1, 77º e 32º, 1, da Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças, por ter decorrido prazo superior a três anos desde a data do vencimento até à citação da executada; (ii) a nulidade do aval prestado pela executada C..., SA (anteriormente designada I..., SA) a favor da sociedade D..., Lda, nos termos do artigo 6º, nºs 1 e 3, do Código das Sociedades Comerciais, pelo facto de a executada não ter qualquer interesse nem ter recebido qualquer benefício como contrapartida da garantia prestada, a qual foi totalmente gratuita; (iii) a inexistência parcial do crédito exequendo por não ter sido considerado o pagamento no âmbito da insolvência da sociedade D..., Lda (Processo nº 2166/10.2TBPFR), decorrente da execução da hipoteca do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Paredes sob o nº 727/19940413 (freguesia ...) registada sob a AP. 27, em 07/04/2008, bem como do penhor constituído sobre 6000 ações nominativas representativas do capital social da própria exequente, pertencentes à sociedade insolvente; (iv) a inexigibilidade dos juros moratórios em virtude de a livrança dada à execução não ter sido apresentada a pagamento à embargante e por não ser do seu conhecimento aquando da prestação do aval o local de pagamento inscrito na mesma “Av. ..., .... – 3º Esc. .../... – ....-... Porto”, e, finalmente, (v) a inexigibilidade dos juros moratórios à taxa prevista para as operações comerciais.

Os embargos foram liminarmente admitidos por despacho de 25.02.2016.

Notificada, a embargada apresentou contestação, pugnando pela improcedência das exceções invocadas e a consequente manutenção do título dado à execução, terminando pelo pedido de condenação da sociedade executada como litigante de má-fé.

Em 5.03.2017 foi proferido despacho, no qual: i) se dispensou a realização da audiência prévia; ii) se saneou o processo, considerando-se presentes todos os pressupostos processuais que permitem o conhecimento do mérito; iii) se julgou improcedente a alegada exceção de prescrição do direito de ação; iv) se identificou o objeto do litígio; v) se enunciaram os temas da prova, programando-se os atos da audiência.

Não se conformou a embargante, com a decisão proferida sobre a prescrição invocada, e interpôs recurso de apelação.

O recurso foi admitido por despacho de 29.05.2017, a subir de imediato, em separado e com efeito meramente devolutivo.

O recurso subiu em separado, tendo sido confirmada a decisão neste Tribunal, por acórdão de 12.07.2017.

Em 30.05.2017 realizou-se a audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença em 29.06.2017, com o seguinte dispositivo: «Assim, em face de todo o exposto, decide-se julgar parcialmente procedentes, por parcialmente provados, os embargos de executado deduzidos pela executada C..., SA, determinando-se, em consequência, o prosseguimento da respetiva ação executiva intentada pela exequente B..., SA, mas apenas para pagamento da quantia de € 269.395,33, acrescida dos juros vencidos e vincendos à taxa legal de 4%, contados a partir de 13/12/2012 até integral pagamento.

Custas por embargante e embargada na proporção do respetivo decaimento (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil)».

Não se conformou novamente a embargante e interpôs recurso de apelação, apresentando alegações, findas as quais formula as seguintes conclusões: 1 – A decisão proferida sobre a matéria de facto deve ser alterada nos exactos termos alegados no antecedente item i, 1 e 2, aqui dados por reproduzidos por manifesta questão de economia processual.

2 - a prestação de garantias reais ou pessoais a dívidas de outras entidades não faz parte do objecto social da apelante (cf. n.º 9 dos factos provados), o qual determina a sua capacidade jurídica nos termos dos artigos 160º do código civil e 11º do csc, nem contribui, objectivamente, para a realização da finalidade lucrativa que a caracteriza.

3 - por regra, a prestação de garantias reais ou pessoais a dívidas de outras entidades é nula por se considerar contrária ao fim da sociedade, na medida em que excede a sua capacidade de gozo, faltando-lhe em absoluto o direito de se obrigar nas referidas condições.

4 - o ónus de alegar e provar a verificação de alguma das excepções a essa regra, previstas na 2ª parte do nº 3 do artigo 6º, do CSC - o justificado interesse próprio ou a relação de domínio entre as sociedades garante e garantida -, recaía sobre a apelada. porém, 5 - a apelada não alegou quaisquer factos ou circunstâncias concretas que traduzissem o justificado interesse próprio da apelante na prestação do aval ou sequer a relação de domínio entre ambas as sociedades, como era ónus seu para se prevalecer, validamente, da garantia invocada. por conseguinte, 6 - o aval pelo qual a apelante está a ser executada é nulo por força do disposto no artigo 6.º, n.ºs 1 e 3, do csc.

7 – nenhuma das circunstâncias consideradas pelo tribunal “a quo” para afirmar a validade do aval tem fundamento, ou sequer virtualidade, para afastar a nulidade de que o mesmo enferma. de facto, 8 – não se pode considerar provado que a sociedade I..., S.A. seja titular de uma quota correspondente a cerca de 96% do capital social da sociedade D..., Lda. por outro lado, 9 - a deliberação social inserta na acta nº 1/2008 (fls.58/58vº) não serve para justificar o interesse próprio da apelante no aval em causa visto que, na sua motivação, é completamente omissa quanto às circunstâncias concretas que, objectivamente te apreciadas, traduzam a obtenção de qualquer vantagem ou ganho para a apelante. de facto, 10 – O que dela resulta é que essa garantia da apelante era fundamental, isso sim, para a concretização de um financiamento essencial à viabilidade da sociedade D..., Lda. ora, 11 - O justificado interesse próprio há-de ser da sociedade garante “e não o de proporcionar uma vantagem ao credor ou ao devedor (em e por si)”. de resto, 12 - Validar-se a dita deliberação para justificar o interesse próprio da apelante na prestação do aval em causa significaria que “cairíamos no absurdo de ser, afinal, o incapaz a decidir da sua capacidade de gozo”. Por outro lado, 13 - O interesse próprio da pessoa singular que é, simultaneamente, administrador da sociedade avalista e gerente da sociedade avalizada não se confunde, de modo algum, com os interesses de cada uma delas, nem poderá motivar a prática de quaisquer atos no exercício das suas funções. de facto, 14 – Cada sociedade tem a sua própria personalidade e capacidade jurídicas, que compreendem “os direitos e obrigações necessárias ou convenientes à prossecução do seu fim” – artigo 6º, nº 1, CSC. Acresce que 15 – A invocação pela apelante da nulidade do aval não consubstancia qualquer abuso de direito. na verdade, 16 - o nº 3 do artigo 6º do csc visa acautelar os interesses de terceiros, “maxime” dos credores sociais da sociedade garante, das consequências nefastas que para si provocariam, se consideradas válidas, garantias reais ou pessoais a dívidas de outras entidades, não tendo a sociedade capacidade para assumi-las, por estranhas ao seu objecto e finalidade. por isso, 17 – Considerar abusiva a invocação da nulidade do aval por parte da apelante significa esvaziar de qualquer utilidade o nº 3 do artigo 6º do CSC, contrariando o pensamento legislativo que esteve na base do preceito. outrossim, 18 - Do contrato de fls 8vº/11vº consta expressamente que o crédito da apelada beneficia de duas garantias reais, hipoteca e penhor, contemporâneas da prestação do aval, não sendo verosímil que a apelante se obrigaria à mesma caso não existissem essas garantias reais.

19 – A 2ª parte do n.º 1 do artigo 639º do Código Civil reconhece ao fiador “o direito de exigir a execução prévia das coisas sobre que recai a garantia real” e consagra a presunção implícita de que, existindo garantia real contemporânea, o garante “não quis responsabilizar-se pela dívida senão depois de excutidos os bens onerados”.

20 - Estando a dívida garantida por bens de terceiro, da análise conjugada dos nº 2 e 3 do artigo 54º CPC resulta que “(…) o credor está obrigado a intentar a execução contra o possuidor dos bens dados em garantia” e só depois de reconhecida a insuficiência desses bens é que poderá executar também o devedor”, 21 - Regra que se deverá aplicar também quando a execução tiver sido requerida contra o terceiro garante, desde que o património deste não responda apenas subsidiariamente. Assim, 22 - Estando a dívida exequenda provida de garantias reais, cabia à apelada alegar e provar a insuficiência dessas garantia para conseguir o fim da execução, como pressuposto para poder executar a apelante, o mesmo é dizer, fazer recair a penhora noutros bens, como se exige no nº 1 do artigo 752º, CPC, o que ela não fez.

23 – Assim não tendo sido decidido...

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