Acórdão nº 3807/12.2TJVNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelFERNANDO SAM
Data da Resolução24 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Do Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim - Juiz 2.

*Processo n.º 3807/12.2TJVNF.P1*Relator: Fernando Samões 1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha 2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró* Acordam no Tribunal da Relação do Porto - 2.ª Secção: * I. RelatórioB… e mulher C…, residentes na Rua …, n.º .., …, Vila Nova de Famalicão, instauraram a presente acção declarativa com processo ordinário contra Banco D…, S.A., com sede na Praça …, n.º .., Porto, pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhes a quantia global de 111.568,00€, correspondente a 10.000,00€ de danos patrimoniais e 1.568,00€ de juros vencidos e 100.000,00€ de danos não patrimoniais sofridos, acrescida de juros, à taxa legal, desde a data da citação até integral pagamento.

Para tanto, alegaram, em resumo, o seguinte: Em 1/7/1993, celebraram com o Banco E…, S.A., actualmente integrado na Ré, um contrato de mútuo com hipoteca, o qual veio a ser alterado, por acordo das partes, em 20/6/1996, passando o seu regime geral para o do crédito bonificado, com influência na prestação mensal que passou a ser de 87.091$00, mantendo-se no restante, como seja o montante mutuado de 12.000.000$00, a duração de 15 anos e as 180 prestações mensais, sendo o equivalente em euros de 434,97, prestação essa que era descontada na sua conta bancária com o n.º ………, por si aberta no aludido banco.

Em 21/5/2002, celebraram com a ré novo contrato de mútuo com hipoteca, sendo a quantia mutuada de 40.000,00€, a pagar em 120 prestações mensais e sucessivas de capital e juros, com início em 15/7/2002.

Os autores foram cumprindo as suas obrigações, relativas a tais contratos.

Em Maio de 2006, o banco réu procedeu à retirada, da conta dos autores associada aos aludidos mútuos, da quantia de 986,97€, o mesmo fazendo no mês seguinte, sem conhecimento e contra a vontade daqueles, os quais, após inúmeras tentativas no sentido de apurar a que se devia tal atitude e tendo recebido como resposta apenas a de que “tinha havido um engano” e que “o Banco fez a correcção do engano”, acabaram por retirar todo o seu dinheiro da conta bancária em apreço, para evitar que o Banco Réu continuasse a debitar quantias não contratadas, mantendo-a provisionada, apenas, com a quantia necessária ao débito das prestações acordadas, as quais, no que ao primeiro mútuo concerne, ascendiam a 434,97€.

Todavia, o banco réu continuou a debitar prestações mensais não acordadas, colocando a conta em apreço “a negativo”, contabilizando como tal as prestações que dizia serem devidas e cobrando juros de mora.

Os autores tentaram pagar as prestações acordadas, entregando ao banco réu cheques do aludido valor, mas este, contra a sua vontade, imputou tais valores em outras quantias que dizia estarem em dívida.

Em Julho de 2007, os autores aperceberam-se que a ré havia imputado a quantia destinada ao pagamento das prestações devidas pelo segundo mútuo contratado às quantias que dizia estarem em dívida do primeiro mútuo, dizendo que este segundo mútuo se encontrava, também, em incumprimento.

Em Dezembro de 2008, o banco réu “retirou” a quantia de 10.000,00€ duma aplicação financeira que os autores possuíam em tal banco, sem os ter informado dessa “operação” e do destino dado à referida quantia.

O banco réu comunicou ao Banco de Portugal que os autores se encontravam em situação de incumprimento, o que sabia não ser verdade, e instaurou contra ambos uma execução para pagamento de quantia certa, apresentando como título executivo a escritura pública outorgada em 21/5/2002 e relativa ao segundo mútuo contratado, alegando que aqueles não pagaram a prestação vencida em 15/7/2007, constituindo-se em mora a partir dessa data. Deduzida oposição a tal execução, foi proferida, em 3/9/2011, sentença que a julgou procedente, tendo a execução sido extinta por sentença de 19/10/2011.

Nessa execução, o banco réu tinha nomeado à penhora o imóvel adquirido com o primeiro mútuo contraído, onde os autores tinham instalada a sua casa de morada de família e que foi anunciado para venda, por duas vezes, a qual foi do conhecimento geral e lhes causou forte desespero e enorme angústia, tanto mais que eram questionados e apontados por todos como devedores e relapsos, sendo certo que também a sua vida profissional foi afectada e sofreram problemas familiares.

A ré contestou, invocando as excepções peremptórias da prescrição e o erro de cálculo das prestações que rectificou aumentando-as, e impugnando diversa factualidade alegada na petição inicial, concluindo pela improcedência da acção e pela condenação dos autores como litigantes de má fé, em multa e indemnização não inferior a 20.000,00€.

Os autores replicaram, defendendo a improcedências das invocadas excepções.

Na fase do saneamento, foram julgadas improcedentes as aludidas excepções - a primeira por despacho de fls. 149 e 150 e a segunda por despacho de fls. 312 a 314, proferidos, respectivamente, em 22 de Maio de 2014 e 14/10/2015, já transitados em julgado.

Foi, ainda, identificado o objecto do processo e foram enunciados os temas de prova, sem reclamações.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, finda a qual, em 4/9/2017, foi proferida douta sentença, que culminou com o seguinte dispositivo: “Face a tudo quanto supra se expendeu decide-se julgar a presente acção parcialmente procedente, por provada e, em consequência, condenar a Ré a pagar aos Autores a quantia de €8.680,74 (oito mil seiscentos e oitenta euros e setenta e quatro cêntimos) e a cada um dos Autores a quantia de €15.000,00 (quinze mil euros), acrescidas de juros de mora à taxa legal, até integral pagamento, vencidos sobre a quantia de €8.680,74 desde 4.12.2008 e sobre as quantias de €15.000,00 desde a citação.

Do demais peticionado absolve-se a Ré.

Do pedido de condenação dos Autores no pagamento de uma indemnização não inferior a €20.000,00, a favor da Ré, por litigância de má-fé, absolvem-se aqueles.

Custas a cargo de Autores e Ré, na proporção do decaimento (art. 527º, nº 1 e 2, do Código de Processo Civil).

Registe e notifique.” Inconformada com o assim decidido, a ré interpôs recurso e apresentou as suas alegações que terminaram nas seguintes conclusões: “I. A Recorrente não pode conformar-se com a decisão final, porquanto entende que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, devendo a sentença ser revogada, porque inquinada por erro de julgamento da matéria de facto por si levado a cabo (razão pela qual, no presente recurso, se impugna tal decisão sobre a matéria de facto, nos termos e para os efeitos do art. 640 do C.P.Civ.), como considera, também, que os factos em causa jamais permitiriam a solução de direito adoptada na decisão sub judice.

  1. Para efeitos de enquadramento e decisão da questão objecto do presente Recurso dir-se-á que cumpre apreciar se o Banco podia alterar unilateralmente o valor da prestação do contrato de mútuo, prestação essa que, decorrente de erro operacional, era consideravelmente inferior.

  2. Entende a Recorrente que, atenta a prova documental junta aos autos e, principalmente, a prova testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, o Tribunal a quo não podia ter deixado de considerar que não houve qualquer violação do contrato, nem do dever de agir de boa fé.

  3. Salvo o devido respeito, pelo teor dos depoimentos supra transcritos e que resumem a questão essencial, devem ser alterados os pontos 9. 10. 11. 12. 17. 18. 19. 23. dos factos provados, sendo certo que se impõe igualmente, porque têm interesse para a boa decisão da causa, incluir ainda quatro pontos à matéria dada como provada.

  4. Salienta-se, desde já, que os depoimentos das testemunhas da Ré foram desconsiderados pela Ré, por serem funcionárias daquela, e defenderam, visivelmente, os interesses desta, o que importa rebater.

  5. O facto de a testemunha ter um vínculo laboral com um dos litigantes, não é óbice para que seja considerada idónea, pois tal situação não constitui nem inabilidade para depor, nem impedimento que previsto na lei processual civil nos termos dos arts. 495.º e 496.º do C.P.Civ..

  6. Ouvida a prova gravada, nomeadamente, o depoimento da Dr.ª F…, que foi ouvida na Sessão de 15.12.2016 (CD – Minuto 00:00:01 a 00:43:46), Dr. G… que prestou depoimento na Sessão de 06/07/2017 (CD – Minuto 00:00:01 a 00:49:04) e Dr. H…, depoimento prestado na Sessão de 06.07.2017 (CD – Minuto 00:00:01 a 00:34:45) poderão V. Ex.as aferir da credibilidade do depoimento das testemunhas, que foram claras a explicar todos os momentos chave da celebração e alteração dos contratos de mútuo, a posição da Recorrente, ou seja, a razão de ciência dos factos relacionados com o caso sub judice.

  7. Aliás, todas elas tiveram, em dado momento, conhecimento e intervenção directa, o que explica como conheciam a situação com pormenor e, por via disso, defenderam a posição assumida pela Recorrente, de forma independente, mesmo que tenham, por vezes, utilizado a palavra “nós”.

  8. Acresce que, e como notarão V. Ex.as, as testemunhas demonstram elevado grau de percepção do sucedido, dando, de facto, ao longo do depoimento, as suas impressões pessoais mas de forma espontânea e coerente, pelo que não se vislumbra porque não merecem credibilidade havendo, claramente, erro manifesto ou grosseiro na apreciação da prova, sendo certo que também os documentos levavam a uma resposta inequívoca em sentido diferente.

  9. No ponto 9., ficou provado o seguinte: “O Banco Réu, em Maio de 2006, para pagamento da prestação do contrato referido em 1, alterado nos termos referidos em 2, que à data se cifrava em €434,97, procedeu à retirada, da conta dos Autores referida em 6 e 7, da quantia de €986,97…” e no ponto 10. “… o que fez sem qualquer pré-aviso”.

  10. Desde logo, este foram redigidos de forma parcial, indiciando, desde logo, um juízo de censura à actuação da Ré; a falta de isenção na redacção deste facto, determina só por si, a sua correcção, e neste sentido, deve alterar -se o ponto 9. passando do mesmo a...

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