Acórdão nº 495/17.3T8PNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelRUI PENHA
Data da Resolução24 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 495/17.3T8PNF.P1 Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório B..., residente na Rua ..., ..., 2º dto., ..., Paredes, patrocinada pelo Ministério Público, com benefício de isenção de custas, veio intentar a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra C...

, residente na Rua ...

, ..., Paredes, patrocinada por mandatário judicial, litigando com apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo.

Formula os seguintes pedidos: 1. Ser declarado ilícito o despedimento da autora; 2. Ser a ré condenada a pagar à autora: A. A quantia de 650,00€, a título de compensação pelo despedimento, bem como as retribuições que se vierem a vencer até ao trânsito em julgado da sentença, acrescida de juros a partir da citação; B. A quantia de 1.950€ a título de indemnização em substituição da reintegração, acrescida da que se venha a vencer até ao trânsito em julgado da sentença; C) A quantia de 455€ relativa à retribuição do serviço prestado no mês de Agosto de 2016; D. A quantia de 970€ referente a férias e subsídio de férias proporcionais ao serviço prestado para a ré; E. A quantia de 485€ referente a proporcionais de subsídio de Natal relativamente ao serviço prestado para a ré; 3. A autora peticiona, ainda, juros de mora à taxa legal sobre todas as prestações até integral pagamento, sendo os já vencidos no valor de 83,03€.

Alega em síntese que: foi admitida ao serviço da ré em 7 de Dezembro de 2015, por acordo verbal, para prestar serviços de limpeza em prédios urbanos, mediante a retribuição mensal de 650€, tendo despedido a autora no dia 26 de Agosto de 2016, sem lhe pagar a retribuição desse mês.

Realizou-se audiência da partes, não se tendo logrado obter conciliação destas.

A ré veio contestar e reconvir, pedindo a condenação da autora a pagar-lhe a quantia de € 650,00, por falta de cumprimento do aviso prévio de resolução do contrato.

Alega em síntese que: não reconhece a autora como sua trabalhadora, tendo acordado com a mesma trabalhar nos locais que a ré indicava, nos termos que a autora achava adequados, com inícios em finais de dezembro de 2015, não definindo a ré o modo como a tarefa devia ser exercida, nem controlando o concreto exercício das funções, ou a assiduidade; os instrumentos de limpeza era fornecidos pela ré e alguns instrumentos e água pelos condomínios, de acordo com as preferências da autora, da ré e das outras colegas de ambas, o que vale por dizer que a A. trabalhava por conta própria; no dia 22 de agosto de 2016, a autora mandou uma mensagem à ré dando conta que não queria continua a trabalhar com a ré e com as outras colegas, por motivos pessoais, no dia 12 de setembro de 2016, a ré foi a casa da autora para lhe entregar €325,00, valor que ambas consideraram estar em dívida.

A autora respondeu sustentando o alegado na petição inicial.

Foi proferido despacho saneador e elaborado despacho contendo a matéria de facto assente e os temas de prova.

Foi fixado à acção o valor de € 5.243,03.

Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, com gravação da prova testemunhal nela produzida.

Foi proferida sentença, com fixação da matéria de facto provada e não provada, decidindo-se a final julgar a acção totalmente procedente por proada, e, em consequência: a) Declarou ilícito o despedimento da Autora; b) Condenou a Ré a pagar à Autora: b1) a quantia de €650 a título de compensação pelo despedimento, bem como as retribuições vencidas e vincendas desde 13-02-2017 até ao trânsito em julgado da sentença, acrescida de juros a partir da citação; b2) a quantia de €1.950, a título de indemnização em substituição da reintegração, acrescida da que se venha a vencer até ao trânsito em julgado da sentença; b3) a quantia de €455 relativa á retribuição do serviço prestado no mês de Agosto de 2016; b4) a quantia de €970 referente a férias e subsídio de férias proporcionais ao serviço prestado para a ré; b5) a quantia de €485 referente a proporcionais do subsídio de Natal relativamente ao serviço prestado para a ré; b6) os juros de mora á taxa legal, vencidos e vincendos sobre todas as prestações desde 13-02-2017 até integral pagamento, sendo os já vencidos até 13-02-2017 no valor de €83,03.

  1. Julgou totalmente improcedente por não provada a reconvenção deduzida e em consequência absolveu a Autora reconvinda do pedido reconvencional contra si deduzido.

Inconformada interpôs a ré o presente recurso de apelação, concluindo: 1. O presente Recurso vem interposto da sentença que considerou verificada a existência de contrato de trabalho entre a A. e R. e julgou ilícito o despedimento, bem como condenou a Recorrente no pagamento de créditos laborais, e julgou improcedente a reconvenção deduzida pela R.

  1. A Recorrente pretende e requer a modificabilidade da decisão sobre a matéria de facto, ao abrigo do disposto no art. 640º e ss. do C.P.C., em virtude de se encontrem no processo elementos de prova documental e prova gravada que importariam uma decisão diversa.

  2. A matéria de facto deve ser alterada julgando-se Não provado o B1, a que corresponde o número 3 da fundamentação de facto. E, em sua substituição, considerar-se como provado o B23 a B28. O que decorre do doc. a fls. 30. Também se extrai, das regras da experiência comum, que a negociação quanto às condições de trabalho ocorre sempre entre as partes. Logo, é expectável que a recorrida não quisesse declarar os seus rendimentos, por estar insolvente. No demais, deverá ser valorado o depoimento da Recorrente, cuja credibilidade não é posta em crise, de acordo com a gravação acima id.. Sobre este facto não depôs D..., pelo que apreciou mal o Tribunal a quo.

  3. De igual modo, a matéria de facto provada em B2 a B8 e B10, a que corresponde o número 4 a 8 e 17 da fundamentação de facto, deverá ser considerado NÃO PROVADO. Mas, em sua substituição, considerar-se como provado B29 a B41. Para o efeito, deverão ser valoradas, devidamente, as declarações prestadas pela Recorrente, o depoimento de E... e de F... (supra id.) donde resulta que não dava ordens à A.; não trabalhava no mesmo sítio; a contrapartida era em dia variável; os produtos e instrumentos de limpeza eram sempre fornecidos pelos condomínios mediante verba que lhe estava adstrita; a A. prestava trabalho para terceiros; não existiam faltas. As declarações de parte e das duas testemunhas são coincidentes entre si.

  4. A questão da impugnação do despedimento foi apreciada incorretamente, dado que o Tribunal a quo considerou como provado o alegado em B14, a que corresponde o ponto 22 da fundamentação de facto da matéria provada. Mas, deveria ter julgado como provado B43, B44, B45, B48, B50, B51.

  5. O Tribunal a quo considera indistintamente que o despedimento ilícito operou-se de forma tácita ou verbal. Emerge uma flagrante incongruência entre a decisão sobre a matéria de facto e a fundamentação, ou seja, entre despedimento verbal e despedimento tácito. Pelo que, salvo o devido respeito por entendimento diverso, a sentença deverá ser considerada nula, nos termos e para os efeitos da al. c) do nº 1 do art. 651º do C.P.C..

  6. Para que operasse o despedimento tácito operado teria de se apurar uma vontade de pôr termo ao contrato inequívoca, não sendo de admitir o despedimento tácito com a amplitude decorrente do artigo 217º do CC., como parece ter acolhido a primeira instância. Não existe um único facto a considerar como provado que revele uma atitude inequívoca da Recorrente através de palavras, quer através de actos equivalentes, que revelem, clara e inequivocamente, a vontade de fazer cessar imediatamente o contrato de trabalho, segundo o critério definido no art. 236º, nº 1, do CC.” 8. Pois, se bem percebemos, o dito despedimento tácito decorreria do facto de a A. se ter desencontrado da Recorrente do ponto de encontro habitual, e de não ter atendido o telefone durante algumas horas, por motivos de trabalho. Para o tribunal a quo, daqui terá resultado que a A. interpretou que a R. não a queria mais como trabalhadora.

  7. Esta ilação ou interpretação muito ofende a segurança do comércio jurídico e será contrária à Lei. Somos de opinião que a A. não fez prova dos factos demonstrativos do seu despedimento, como impõe o art. 342º nº 1 do C.C.. Não se apurou se a R. impediu o exercício da atividade, naquele dia e em dias subsequentes.

  8. Não pode ter acolhimento o dito despedimento verbal, tanto mais que o Tribunal a quo apenas se estribou nas declarações da A. (interessada no desfecho da demanda), que não foram confirmadas pela demais prova testemunhal produzida.

  9. Novamente, o tribunal a quo trata, indistintamente, factos tão diversos como a “R. fez saber à Autora que não a queria mais como empregada” (fundamentação) e “a Ré disse por telefone à Autora que não precisava dos seus serviços” (motivação da decisão de facto). E, ainda, “Não precisava dos seus serviços” e “não a queria mais como sua empregada”. Pelo que, salvo o devido respeito por entendimento diverso, é arguida a nulidade da sentença, nos termos da al. c) do nº 1 do art. 651º do C.P.C.

  10. Considerar que a A. foi “despedida” em virtude de um telefonema que só a própria A. relata e, que foi negado pela R. e por 2 testemunhas, poderá configurar puro arbítrio do Tribunal que é tão contrário aos pilares em que assenta o nosso ordenamento jurídico.

  11. O único facto que ocorreu foi uma mensagem que a A. remeteu à recorrente do teor seguinte: “Já vi que não faço falta no trabalho. Diga qual é o dia para eu receber e entregar a bata”. Ou seja, estamos perante a iniciativa da A. em pôr termo ao contrato de trabalho, sem aviso prévio, como se extrai das concretas passagens acima id..

  12. Deverá, ainda, ser considerado como NÃO PROVADO o ponto B15 e B16, a que corresponde o número 23 da matéria de facto provada da fundamentação. Consequentemente, dever-se-á considerar como provado os pontos B46, B47 e B49. Incorreu em erro de julgamento o Tribunal a quo apenas por...

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