Acórdão nº 1328/16.3T8MTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelMANUEL DOMINGOS FERNANDES
Data da Resolução19 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 1328/16.3T8MTS.P1-Apelação Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto-Juízo Local Cível de Matosinhos-J2 Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Miguel Baldaia 2º Adjunto Des. Jorge Seabra Sumário: ......................................................

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*I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B... e mulher, C...

, casados entre si, residentes na Rua ..., nº ...., ....-... ..., instaurou a presente acção declarativa, com processo comum, contra Banco D..., S.A.

, com sede na Rua ..., nº .., ....-... Lisboa, peticionando a condenação do Réu a: a) reconhecer que não houve qualquer razão que legitimasse a referida alteração contratual, devendo manter-se o spread em 3 pontos percentuais tal como consta na cláusula quarta, ponto quatro, do contrato de mútuo; b) indemnizar os Autores com a quantia correspondente à diferença entre o valor das prestações que pagaram e venham a pagar até ao trânsito em julgado da sentença, e o valor das mesmas se não tivesse havido aumento do spread, a liquidar posteriormente.

Para o efeito, alegam, em síntese: que em 03/06/2005 o Réu lhes deu de empréstimo € 224.720,00, mediante contrato escrito, no qual ficou convencionada a taxa de juro; que aquando da celebração do contrato os Autores foram fazer exames médicos à companhia de seguros indicada pelo Réu, com vista à celebração do seguro de vida; que como o Autor padecia de doença cardíaca a seguradora recusou-se a celebrar contrato de seguro; que o Réu não valorizou esse facto como impeditivo da celebração do contrato de seguro, até porque o mútuo estava garantido por hipoteca; que durante 10 anos o contrato decorreu sem incidentes; que em 26/05/2014 o Réu levantou a questão da inexistência do contrato de seguro; que face à insistência do Réu subscreveram proposta de seguro de vida; que até então pagavam uma prestação média mensal de €1.580,00; que no dia 02/11/2014 o Réu sacou da conta dos Autores €1.786,17 para pagamento da prestação do crédito, mantendo-se os valores sacados desde então próximos dessa quantia; que o Réu lhes comunicou que por a seguradora não aceitar a subscrição do contrato de seguro de vida o valor da prestação mensal não seria reduzido e que o Réu não altera a sua posição, apesar das reclamações apresentadas. Mais alegou que a alteração unilateral do valor spread é ilegal e que mesmo que o Autor tivesse o direito de alterar o contrato nesses termos tal direito estaria prescrito; que o Réu não cumpriu com a obrigação de comunicação aos autores do seu direito à resolução do contrato, nem especificou o montante a partir do qual as alterações introduzidas unilateralmente seriam aplicáveis.

*O Réu apresentou contestação alegando, em síntese: que a celebração de seguro de vida era uma obrigação contratual a que o mutuário estava obrigado e que o seu não cumprimento implicaria a não redução do spread de 4% para 3%, do que os Autores foram informados; que os Autores são pessoas informadas e experientes na contratação de produtos bancários; que na data da celebração do contrato, devido à urgência dos Autores na celebração do mútuo e cientes da dificuldade em contratar seguro devido à sua idade solicitaram que a contratação do seguro fosse efectuada após a celebração do contrato, o que foi autorizado pelo Réu, que aprovou a operação de crédito com a celebração do seguro a posteriori; que foi realizado um pedido de adesão a seguro de saúde, que requereu a realização de exames médicos pelos Autores, que estes não realizaram, não tendo sido realizado o seguro; que o Réu ficou a aguardar que os Autores fizessem o seguro e lhe dessem conhecimento do mesmo, o que não ocorreu; que num processo de revisão dos contratos em 2014 se detectou a falta de seguro, do que foi dado conhecimento aos Autores, bem como lhes foi dado conhecimento da alteração da bonificação do spread no caso de não lhe ser demonstrada a existência do seguro; que os autores diligenciaram novamente pela realização de seguro, o que, face à sua idade já não foi possível; que a não alteração anterior do spread não traduz qualquer renúncia a este direito, nem abuso de direito; que o que está em causa não é a alteração do contrato, nem da taxa de juro, mas apenas a aplicação de uma cláusula contratual explicada aos Autores.

*Foi realizada audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador e seleccionados temas de prova.

*Procedeu a julgamento com observância das formalidades legais.

*A final foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, por não provada e, consequentemente, absolveu o Réu dos pedidos contra ele formulados.

*Não se conformando com o assim decidido vieram os Autores interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela seguinte forma: A.- Na cláusula do contrato de mútuo celebrado entre os recorrentes e o Banco recorrido, em que especificamente se consignam as consequências da falta de subscrição de apólice de seguro de vida, não se prevê o aumento do spread.

B.- Nos termos da cláusula quarta, ponto “quatro”, do contrato de mútuo, a falta de seguro de vida, por si só, não confere ao Banco recorrido o direito de aumentar o spread de 3 para 4 pontos percentuais, na medida em que, desde que o mutuário tenha três dos produtos ou serviços aí elencados, o spread tem de manter-se nos 3 pontos processuais, mesmo que nenhum desses três produtos ou serviços seja o seguro de vida.

C.- A douta sentença baseou-se no ponto “Cinco” dessa mesma cláusula quarta para a decisão que proferiu, mas este ponto “Cinco” é inaplicável ao caso concreto.

D.- O contrato tem de ser analisado e interpretado como um todo. E havendo, como acontece no caso concreto, cláusulas específicas que regulamentam a obrigação de subscrição de apólice de seguro de vida e as consequências da sua falta (cláusula décima segunda pontos “Dois” e “Cinco” e cláusula quarta ponto “Quatro”), não pode entender-se que uma cláusula genérica, como a que consta do ponto “Cinco” da cláusula quarta, as derroga, muito menos quando essa própria cláusula salvaguarda a redução do spread “enquanto forem cumpridos os requisitos acima indicados”.

E.- O Banco recorrido não podia ter aumentado o spread, a não ser que verificasse que os recorridos não preenchiam pelo menos três das condições referidas nas alíneas a) a f) do ponto “Quatro” da cláusula quatro do contrato de mútuo.

F.- A douta sentença recorrida violou as regras de interpretação das declarações negociais previstas nos artigos 236º a 238º do Código Civil.

G.- A inexistência de seguro de vida não foi razão impeditiva da celebração do contrato de mútuo e este vigorou durante quase 10 anos sem que essa mesma inexistência justificasse a alteração do spread H.- O Banco recorrido sempre soube da inexistência do seguro de vida.

I.- No contrato de mútuo está expresso que o seguro de vida é um produto com virtualidade para reduzir o spread da taxa de juro, estando, por isso, abrangido pelo n.º 2 do citado artigo 9º do DL 51/2007 J.- Consequentemente, nos termos do n.º 4 desse mesmo artigo 9º, o Banco recorrido teria de exigir o cumprimento da obrigação de subscrição de apólice de seguro de vida no prazo de um ano a partir da data da celebração do contrato.

K.- Não o tendo feito, já há muito se encontrava prescrito o seu direito a exigir o cumprimento da obrigação de subscrição de apólice de seguro de vida.

L.- Por isso, mesmo que se considerasse que o Banco recorrido tinha direito à retirada da bonificação do spread (no que não se concede), sempre tal direito teria de ser declarado prescrito.

M.- A douta sentença também aqui violou as regras interpretativas previstas nos artigos 236º a 238º do Código Civil, bem como fez errada interpretação dos nºs 2 e 4 do artigo 9º do DL 51/2007, violando o disposto no art.º 9º do mesmo diploma legal.

*Não foram apresentadas contra-alegações.

*Corridos os vistos legais cumpre decidir.

*II- FUNDAMENTOS O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.

*No seguimento desta orientação são duas as questões que importa apreciar: a)- saber no âmbito do contrato de mútuo celebrado entre as partes havia, ou não, fundamento contratual para o Banco Réu aumentar o spread de 3% para 4%; b)- saber se mesmo a existir tal fundamento o referido direito estava, ou não, prescrito.

*A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO É a seguinte a matéria de facto que vem dada como provado pelo tribunal recorrido: 1 – Por acordo a que o Réu deu o nº ................., celebrado no dia 3 de Junho de 2005, os Autores, como mutuários, obtiveram do Réu um empréstimo de €224.720,00 para fazer face a compromissos financeiros–cfr. doc. junto a fls. 243 a 247, que aqui se dá por integralmente reproduzido.

2 – O prazo do contrato foi fixado em 216 meses.

3 – Consta da cláusula quarta de tal contrato o seguinte: “TAXA DE JURO” Um–O capital mutuado vencerá juros calculados tendo por base a média aritmética das cotações diárias da taxa “Euribor a 3 meses” do mês civil anterior ao da contagem de juros, excluindo os dois últimos dias, arredondando ao 1/8 p.p. (um oitavo de ponto percentual) imediatamente superior, acrescida de 4 pontos percentuais.

Dois–A TAEG é de 7,814%.

Três–A taxa de juro determinada nos termos do Parágrafo Um será ajustada trimestralmente, mantendo-se constante durante cada período de contagem de juros.

Quatro–A “IC” reduzirá o acréscimo de 4 pontos percentuais estabelecido no Parágrafo um para 3,0 pontos percentuais, desde que o “Mutuário” preencha, em cada momento, no Banco onde a conta adiante referida se encontra domiciliada, pelo menos três das condições indicadas nas seguintes alíneas, com respeito pelas características próprias de cada um dos Produtos e Serviços:

  1. Ter a...

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