Acórdão nº 307/14.0TBMTS-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Março de 2018
Magistrado Responsável | ANABELA DIAS DA SILVA |
Data da Resolução | 20 de Março de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Apelação Processo n.º 307/14.0TBMTS-A.P1 Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo de Execução do Porto – J8 Recorrente – Banco B…, SA Recorrida – C… Relatora – Anabela Dias da Silva Adjuntas – Desemb. Ana Lucinda Cabral Desemb. Maria do Carmo Domingues Acordam no Tribunal da Relação do Porto (1.ªsecção cível) I – Por apenso à execução comum para pagamento de quantia certa que o Banco B…, SA intentou no Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo de Execução do Porto contra C… e outro, veio aquela deduzir oposição à execução mediante embargos de executado, pedindo que: 1. se declare que não houve renúncia por parte da fiadora/embargante ao benefício do prazo que o artigo 782.º do C.C. lhe garante pelo que a mesma só poderá ser responsabilizada pelas prestações vencidas e não pagas; 2. se declare a desoneração da embargante/fiadora da obrigação que contraiu, na medida em que por facto positivo da exequente, não pode ficar sub-rogada nos direitos a que a esta compete; 3. se declare o abuso de direito da exequente na modalidade de venire contra facum proprium e em consequência, a nulidade/ineficácia/inibição do exercício contra a embargante/fiadora do direito á resolução dos contratos de mútuo e a perda do benefício do prazo; 4. se declare a mora do credor/exequente por omissão de informação, falta de cooperação e abuso de direito e em consequência declarar-se a desresponsabilização da fiadora/embargante das consequências do incumprimento dos devedores principais, designadamente, pelo vencimento dos juros; 5. se declare a nulidade da cláusula décima sexta dos documentos complementares, como cláusula contratual geral, por falta de comunicação e informação, violação do princípio da boa-fé e proporcionalidade; 6. Ou para o caso de assim não se entender; seja declarada improcedente por não provada a execução com as demais consequências legais.
Alegou, para tanto e em síntese que à embargante, enquanto fiadora, não é extensiva a perda de benefício do prazo, sendo que não foi ela interpelada.
Verifica-se abuso de direito da exequente e a liberação por impossibilidade de sub-rogação. Verifica-se a inexigibilidade da obrigação; alteração das circunstâncias; mora do credor e a nulidade de cláusulas contratuais gerais respeitantes à mora, constantes dos documentos complementares.
*Recebidos os embargos, o exequente veio contestar, pedindo a sua improcedência.
Para tanto, alegou que nos termos dos acordos dados à execução se afastou o regime regra relativo ao benefício do prazo dos fiadores, sendo certo que a executada/embargante foi interpelada para pagamento da quantia exequenda, verificado o incumprimento pelos devedores mutuários.
Não se verifica qualquer abuso de direito, nem há lugar à liberação por impossibilidade de sub-rogação. Não há inexigibilidade da obrigação ou mora do credor, nem a inexigibilidade dos juros e nulidade de cláusula remuneratória.
*Foi realizada audiência prévia, no âmbito da qual, nomeadamente, foi proferido despacho de saneamento, determinado o objecto do litígio e fixados os termas da prova.
*Procedeu-se à realização de audiência de julgamento, com observância das formalidades legais, após o que foi proferida sentença de onde consta: “Por todo o exposto, julgam-se os presentes embargos parcialmente procedentes e, em consequência, ordena-se o prosseguimento da execução quanto à embargante apenas na parte relativa às prestações em dívida que se venceram até à data da entrada do requerimento executivo e respectivos juros de mora, com a correspondente liquidação, extinguindo-se, quanto à dita executada, a execução quanto ao demais”.
*Não se conformando com tal decisão dela veio o exequente recorrer de apelação pedindo que a sua revogação e substituição por outra que ordene o prosseguimento da execução quanto à totalidade do valor exequendo peticionado no requerimento executivo.
O apelante juntou aos autos as suas alegações que terminam com as seguintes conclusões: 1. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal ad quo que julgou parcialmente procedente a oposição à execução deduzida por considerar que não se verifica quanto à dita embargante a perda do benefício do prazo, por aplicação do artigo 782.º do C.C.
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O recorrente não se conforma com tal decisão.
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A embargante constituiu-se fiadora dos contratos que titulam a presente execução, renunciando ao benefício da excussão prévia, pelo que é solidariamente responsável pelos valores emergentes dos referidos contratos.
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Os mutuários não pagaram pontualmente as prestações do empréstimo o que levou o exequente a fazer usos da faculdade que lhe é concedida pelo artigo 781.º do C.C. de declarar vencida a totalidade dos empréstimos.
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E acontece que, no caso vertente, não se aplica o artigo 782.º do C.P.C, que impede que os efeitos do 780.º e 781.º se estendam aos co-obrigados do devedor e a terceiro que a favor do crédito tenha constituído garantia, uma vez que este artigo tem natureza supletiva.
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E as partes, ao abrigo do princípio da liberdade contratual (artigo 405.º do C.C.), afastaram a aplicação do mesmo acordando, livremente, que "(...) o não pagamento de uma prestação do empréstimo na data do seu vencimento confere desde logo à "IC" [instituição de crédito] o direito de considerar vencidas todas as outras, independentemente de qualquer prazo contratualmente fixado, pôr termo ao contrato e exigir o integral reembolso daquilo que lhe for devido por força do mesmo, promovendo a sua imediata execução judicial" - CFR ponto dois da cláusula décima-sexta dos contratos.
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Acresce ainda que, na última cláusula do contrato, a cláusula décima nova, se estabeleceu que os fiadores "aceitam este contrato, com todas as condições que precedem e a cujo inteiro cumprimento ficam obrigados".
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E nem se diga que a cláusula décima-sexta pretende transpor para o contrato o regime supletivo do Código Civil pois que, a ser assim, por identidade de razões, deveria existir uma outra cláusula (ou parágrafo) que previsse, igualmente, a inaplicabilidade da perda do benefício do prazo relativamente aos co-devedores - o que não se verifica.
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Mas ainda que assim não se entendesse, sempre se dirá que, contrariamente ao que entende o Tribunal recorrido, o recorrente interpelou a embargada para o pagamento das quantias em dívida.
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Com efeito, resulta provado (facto provado n.º16) que em 15.10.2013 a exequente procedeu ao envio de carta à executada/embargante comunicando-lhe a situação de incumprimento dos mutuários e a comunicação à central de responsabilidades de crédito da situação de incumprimento.
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Mais tarde, conforme resulta igualmente provado (facto provado n.º18), foi efectuada interpelação por carta registada com A/R, pela qual a exequente notificou a embargante para o vencimento dos empréstimos por força do incumprimento dos mutuários, interpelando-a para o pagamento dos valores em dívida.
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Ainda sem prescindir, mesmo que se entendesse que a interpelação, sendo necessária, não teria sido feita da forma adequada, sempre se dirá que a citação para a presente execução constitui uma interpelação judicial.
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Por tudo quanto foi exposto, não pode manter-se a decisão recorrida por não fazer correcta interpretação da cláusula décima-sexta dos documentos complementares anexos às escrituras de mútuo com hipoteca e fiança e, ainda, por desconsiderar a interpelação levada a cabo pelo exequente que, no entanto, sempre se consideraria interpelado na data da citação para a presente execução.
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Assim, deve a mesma ser revogada e, consequentemente deve a execução prosseguir quanto à totalidade do valor exequendo peticionado no requerimento executivo.
*Não há contra-alegações.
II – Da 1.ª instância chegam-nos assentes os seguintes factos: 1) A execução de que estes embargos constituem apenso deu entrada em juízo em 15 de Janeiro de 2014.
2) No requerimento executivo que constitui fls. 2 e ss. dos autos de execução de que os presentes embargos constituem apenso foi, além do mais, declarado: “Factos: O exequente celebrou com os executados, em 14.12.2005, um contrato de mútuo com hipoteca e fiança, através do qual concedeu aos primeiro e segunda executados um empréstimo no montante de €65.000,00, a liquidar em 360 prestações mensais e sucessivas, vencendo juros á taxa Euribor a 3 meses, acrescida de um spread de 2,5%, e nas demais condições constantes do referido título, que se junta. A terceira executada constituiu-se fiadora e principal pagadora, renunciando ao benefício da excussão prévia (...). Os executados não pagaram pontualmente as prestações do empréstimo, o que determinou o vencimento imediato da dívida em capital (...), estando em dívida o capital de €61.549,32, quantia a que acrescem os juros de mora, vencidos e vincendos até integral pagamento, contados desde 02.04.2013, à taxa de 5,467% acrescida de sobretaxa moratória de 4%. Acresce que o exequente celebrou com os executados, em 14.12.2005, um contrato de mútuo com hipoteca e fiança, através do qual concedeu aos primeiro e segunda executados um empréstimo no montante de €10.000,00, a liquidar em 360 prestações mensais e sucessivas, vencendo juros á taxa Euribor a 3 meses, acrescida de um spread de 2,5%, e nas demais condições constantes do referido título, que se junta. A terceira executada constituiu-se fiadora e principal pagadora, renunciando ao benefício da excussão prévia (...). Os executados não pagaram pontualmente as prestações do empréstimo, o que determinou o vencimento imediato da dívida em capital (...), estando em dívida o capital de €9.449,06, quantia a que acrescem os juros de mora, vencidos e vincendos até integral pagamento, contados desde 02.04.2013, à taxa de 5,467% acrescida de sobretaxa moratória de 4% (...)” (cfr. requerimento de fls. 2 e ss. dos autos de execução cujo teor se dá aqui por integrado e reproduzido para os devidos e legais efeitos).
3) Por documento datado de 14.12.2005 e designado “Compra e Venda - Mútuo com Hipoteca” foi, além do...
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