Acórdão nº 433/11.7TVPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelRODRIGUES PIRES
Data da Resolução06 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 433/11.7TVPRT.P1 Comarca do Porto – Porto – Instância Central – 1ª Secção Cível – J1 Apelação Recorrentes: “Banco B…, SA”; “C1…” Recorrido: “D….” Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e Maria de Jesus Pereira Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIOA autora “D….”, com sede em …, Suite …, …, …, …, instaurou a presente ação declarativa de condenação sob a forma do regime processual civil experimental regulada pelo Dec. Lei nº 108/2006, de 8.6, contra os réus “C…, S.A.”, com sede na Avenida …, … a …, Porto, atualmente “Banco B…, S.A.”, com sede na Avenida …, nº …, Edifício …, Lisboa, “C2…, S.A.”, com sede na Avenida …., … a …, e “C1…”, sociedade incorporada nas Ilhas Cayman, com sede efetiva na Avenida …, … a …, Porto, tendo pedido a condenação solidária dos réus: a) na quantia de 521.854,00€; b) na quantia supra, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, desde 30.1.2008 no que concerne ao montante de 450.356,00€, e desde 19.10.2009 no que respeita à quantia de 71.498,00€, até efetivo e integral pagamento; c) nos honorários suportados com os seus mandatários e demais despesas incorridas com a propositura da ação, designadamente, as custas judiciais.

Para tanto alega, em síntese, que em Janeiro de 2000 procedeu à abertura da conta n.º ……. junto do C1… na qual foi depositando, ao longo dos anos, várias quantias, que eram aplicadas em depósitos a prazo, de acordo com as indicações do Private Banker do C…, em …, E….

Com efeito, aquando da abertura de conta a autora informou o C…, na pessoa de E…, que pretendia aplicar parte do seu dinheiro em depósitos ou aplicações a prazo, sempre com garantia do capital investido, ainda que os juros fossem mais baixos.

Deste modo, E…, enquanto funcionário do C…, foi aplicando, ao longo dos anos, parte do dinheiro pertencente à autora em várias aplicações a prazo, sendo certo que, pelo menos a partir de Julho de 2002, aplicou 300.000,00€ num depósito a prazo, por três meses renováveis.

Nos termos acordados, em virtude dessa aplicação financeira, passou a pagar à autora, regularmente, juros trimestrais, no início de cada trimestre.

O capital permanecia sempre o mesmo, só variando em consequência de alguns reforços de capital que foram sendo efetuados, quando havia algum levantamento de dinheiro, ou quando se dava ordem para incorporar os juros pagos.

Em Julho de 2007, a autora dispunha de €450.291,08 aplicados no mencionado depósito a prazo, tendo sido pagos os juros acordados, trimestralmente, como vinha sendo usual.

Contudo, no início do trimestre seguinte, em Outubro de 2007, sem qualquer justificação, o C… deixou de pagar os juros que havia acordado relativamente a essa aplicação, pagando juros inferiores ao que vinha efetuando até essa data e, no início de Janeiro de 2008, deixou mesmo de pagar quaisquer juros à autora.

Esta solicitou então a devolução do seu capital para realizar outras aplicações, o que não ocorreu, sendo que sempre lhe foi transmitido que a Administração do C… tinha decidido honrar os compromissos assumidos, pelo que iria proceder ao reembolso do valor aplicado.

A autora nunca fora informada de que a aplicação a prazo do seu dinheiro teria por objeto a compra de títulos com risco, o que nunca autorizara, sempre lhe tendo sido afirmado que o capital investido estava garantido.

Com a atuação dos réus, a autora para além de perder os juros que lhe haviam sido prometidos, perdeu todo o capital que tinha aplicado, e que, segundo o que lhe havia sido transmitido, não corria qualquer risco.

Os réus ao aplicarem aquele dinheiro da autora em produtos de elevado risco, sem o cuidado de a informar previamente, enganaram-na deliberadamente, violando os deveres legais, éticos e deontológicos básicos, sobretudo numa relação de “Private Banking”.

Para além disso, em 18.12.2008 o Banco procedeu, de forma unilateral, ao débito de uma quantia de 59.435,79€ na conta à ordem da autora, sob a descrição de “…”, que por não estar provisionada representou um movimento negativo, equivalente a uma dívida ao Banco.

Essa pretensa dívida, que nunca foi explicada ou justificada à autora, gerou juros à taxa de 22% entre 18.12.2008 e 19.10.2009, a favor do Banco, perfazendo, assim, um total debitado à autora no montante de 71.498,00€.

Na sequência desse débito, de 71.498,00€, a autora viu-se forçada a vender os títulos que detinha no C…, em momento não previsto, por ser essa a única possibilidade que tinha de pagar ao Banco o valor que aquele injustificadamente reclamava.

Regularmente citados, os réus “C…, S.A.” e C2…, S.A.”, deduziram contestação conjunta, na qual impugnaram os fundamentos da ação, defendendo-se por impugnação e por exceção, sustentando a ilegitimidade da ré “C2…, SA” e também a prescrição do eventual crédito da autora sobre todos os réus.

Por impugnação, alegaram que o departamento de “Private Banking” do réu C… foi procurado no início do ano de 2000 por um individuo de nacionalidade espanhola, chamado F…, legal representante da autora, que visava obter rentabilidades superiores às que eram oferecidas pelos produtos financeiros tradicionais, maxime depósitos a prazo ou obrigações emitidas por entidades nacionais.

A autora começou por constituir junto do réu “C1…” depósitos a prazo, mas pouco tempo depois, e insatisfeita com a rentabilidade que lhe era oferecida, solicitou a aplicação de algumas das suas economias em produtos diversificados, e com maior rentabilidade.

Foi nesse contexto que a autora adquiriu para a sua carteira de títulos o produto denominado de …, tendo sido devidamente informada sobre as suas características.

Nunca foi garantido à autora o reembolso do capital por ela investido no produto ….

Concluem pela improcedência da ação.

Também regularmente citado, o réu “C1…” deduziu igualmente contestação na qual alegou que F…, representante da autora, era um experimentado homem de negócios e investidor financeiro, que sempre procurou rentabilizar o melhor possível os seus investimentos imobiliários, inclusive com recurso a produtos com risco associado.

Foi neste quadro que a autora procedeu à aquisição do produto financeiro denominado …, depois de analisar e obter as informações que se consideraram pertinentes, o que se concretizou numa altura em que o produto se destacava pela elevada rentabilidade que proporcionava.

A autora conhecia bem as características do produto ….

O comportamento que agora adotou é suscetível de consubstanciar abuso de direito, para além de, “in casu”, ocorrer prescrição do direito invocado.

Conclui pela improcedência da ação.

A autora apresentou resposta às contestações na qual respondeu às exceções suscitadas.

Foi depois proferido despacho saneador, no qual a Ré “C2…, S.A.” foi considerada parte ilegítima e consequentemente absolvida da instância, relegando-se para final o conhecimento das exceções da prescrição e do abuso de direito, porque dependentes de prova a produzir.

Procedeu-se ainda à organização da matéria de facto assente da base instrutória.

Realizou-se audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo.

Foi proferida sentença que julgou a ação procedente e, em consequência, condenou solidariamente os réus “Banco B…, S.A.” e “C2…” a pagarem à autora “D….” o montante global de 521.854,00€, acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde 31.1.2008 no que concerne ao montante de 450.356,00€ e desde 19.10.2009 no que respeita à quantia de 71.498,00€ até efetivo e integral pagamento.

Inconformado com o decidido, interpôs recurso o réu “Banco B…, S.A.” que finalizou as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. A decisão relativa à matéria de facto, e com excepção da constante das als. BBB), DDD), EEE), FFF), GGG), KKK), NNN) OOO), QQQ) e SSS), todos eles resultantes de confissão da autora, é nula, já que a sua fundamentação é claramente insuficiente, vaga e apresentada em bloco para todos os factos dados como provados.

  1. Sendo que todos os meios probatórios indicados como fundamento da decisão proferida são apresentados acriticamente, ao mesmo nível, sem que seja referido qualquer critério ou distinto grau de relevância de cada um deles.

  2. E este procedimento abrange não apenas os documentos identificados na motivação como as testemunhas, cujo depoimento é selectivamente escolhido, mas sem qualquer tipo de apreciação crítica.

  3. [1] A decisão da matéria de facto deve ser fundamentada em relação a cada um dos factos nela discriminados, porque só assim será possível aferir da razoabilidade da convicção em que ela assenta.

  4. Deveria dar-se como PROVADO que a autora tinha e utilizava o aconselhamento de um consultor privado de nacionalidade espanhola, que o SR. F… beneficial owner ouvia antes de proceder a qualquer investimento em produtos financeiros, designadamente em “Fundos Internacionais“.

  5. Não obstante não ter sido objecto de alegação em nenhum dos articulados, a verdade é que se trata de facto instrumental que resultou da instrução da causa, e que até foi reconhecido no depoimento de parte do próprio proprietário da autora.

    Do mesmo modo.

  6. Deverá ser tido como provado, porque facto notório, a crise económica e financeira que deflagrou na segunda metade de 2007 e se prolongou pelo menos até 2009, com evidentes consequências nefastas para os mercados financeiros e liquidez dos mercados.

  7. A matéria dada como provada nas als. R), U), V), W), X), CC) e DD) deverá ser alterada, passando a ter a seguinte redacção: R) Em virtude dessa aplicação financeira, o C… passou a creditar regularmente à A. juros trimestrais liquidados pela entidade emitente, U) No início do trimestre seguinte, isto é, em Outubro de 2007, sem qualquer justificação, os juros relativos a essa aplicação foram inferiores ao que vinha sendo pago até essa data.

    1. No início de Janeiro de 2008, esses juros deixaram mesmo de ser pagos, tendo na altura o C…, através dos seus comerciais do Private Banking, pedido aos clientes um pouco de paciência.

    2. Ao...

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