Acórdão nº 1787/07.5TBPFR-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

RECURSO DE APELAÇÃO PROCESSO N.º 1787/07.5TBPFR-B.P1 [COMARCA FR PORTO ESTE / JUÍZO DE FAMÍLIA E MENORES DE PAREDES] Acordam os Juízes da 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto:I. Relatório:B…, divorciada, residente em …, Paços de Ferreira, veio, «ao abrigo do disposto nos artigos 1º, 2º e 3º, nº 1, da Lei nº 75/98, de 19/11, e 3º e 4º do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13/5, requerer a fixação da prestação de alimentos a cargo do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores», alegando que o progenitor dos seus dois filhos foi condenado, na acção de regulação do exercício das responsabilidades parentais, a pagar-lhe uma prestação de alimentos no valor de €100 mensais e que não paga essa prestação desde 2008, nem tem rendimentos económicos que lhe permitam fazê-lo.

Autuado o requerimento como incidente de incumprimento das responsabilidades parentais, foi notificado o devedor para alegar o que tivesse por conveniente e veio aos autos informar que de facto não tem cumprido a obrigação de prestação de alimentos, mas tal sucede porque não tem emprego, nem rendimentos que o permitam, vivendo de favor com a mãe que lhe dá alimentação.

Foram feitas diligências para verificar se o devedor é trabalhador por conta de outrem, em resultado das quais se obteve informação negativa.

Foi solicitado à Segurança Social o relatório previsto no nºs 1 e 2 do artigo 4º do Decreto-Lei n.º l64/99, de 13/05, o qual foi junto e no qual se afirma que a requerente não reúne a condição de recursos à prestação social a cargo do Fundo de Garantia dos Alimentos devidos a Menores.

A requerente exerceu o contraditório em relação a este relatório, defendendo conclusão inversa.

O Ministério Público promoveu que se decida no sentido indicado pela Segurança Social.

A seguir foi proferida sentença a declarar verificado o incumprimento do devedor no montante de €5.650,00. Na fundamentação da decisão escreveu-se o seguinte «perante a factualidade dos autos e o que exposto fica, … não se mostram verificados os pressupostos do art.º 3º do mencionado DL nº 164/99 de 13/5, para a atribuição e pagamento da prestação de alimentos ao menor por parte do FGADM».

Do assim decidido, a autora interpôs recurso de apelação, terminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões: 1ª – Os direitos fundamentais sociais consagrados em normas da Constituição dispõem de vinculatividade normativo-constitucional (não são meros programas ou linhas de direcção política); 2ª – As tarefas constitucionalmente impostas ao Estado para a concretização dos direitos sociais, devem traduzir-se na edição de medidas concretas e determinadas, e não em promessas vagas e abstractas; 3ª – O conteúdo ético-social dos direitos económicos, sociais e culturais, e atenta a teleologia intrínseca do conteúdo dos mesmos, articulam-se directamente com o disposto nos artigos 18º, nº 1, e 26º, nº 3, da C.R.P., conformação que há-de ser respeitada na aplicação das normas hierarquicamente inferiores, e chamadas a integrar juridicamente dada situação de facto nessa matriz de princípios e valores; 4ª – As prestações que são estabelecidas pelas normas conjuntas da Lei 75/98, de 19.11, e do DL 164/99, de 13.5, têm estrutura obrigacional, devendo ser vistos à luz dos comandos do artigo 69º, nºs 1 e 2, e tomando em conta a teleologia que decorre da dogmática conceptual dos direitos sociais previstos no Texto Fundamental; 5ª – Consequentemente, o direito a alimentos, ou as prestações de semelhante conteúdo que os visam substituir, e que o Estado promove, fundam-se na própria pessoa dos menores, no que têm de fundamentalmente individual, no objectivo que perseguem, que é afinal permitir-lhes um mínimo de vida condigno, compatível com as suas necessidades, e sobretudo, com a fragilidade da sua condição humana.

  1. – No apuramento da capitação dos rendimentos, ao abrigo do Dec. Lei nº 70/2010, de 16 de Junho, a ponderação de cada um dos elementos do agregado familiar é efectuada de acordo com a escala de equivalência fixada no artigo 5º do mesmo diploma: requerente – 1; cada indivíduo maior – 0,7; cada indivíduo menor – 0,5.

  2. – Como a lei não distingue entre requerentes maiores ou menores, sendo o beneficiado o requerente da prestação de alimentos o menor, o coeficiente a ter em conta no apuramento da capitação é de 1, e não de 0,5.

  3. – Assim, partindo dum rendimento mensal total de €578,17 relativo ao ano de 2016, considerando o factor de 1,7 (1+0,7), atribuindo ao menor requerente da prestação, o peso de 1 e, à sua mãe, o peso de 0,7, pelo que a capitação dos rendimentos do agregado familiar é inferior ao valor de €419,22, dado que, considerando o aludido factor obtemos o rendimento mensal per capita de €340,10.

  4. – De igual modo, partindo de um rendimento mensal total de €690,44 relativo ao ano de 2017, considerando o factor de 1,7 (1+0,7), atribuindo ao menor requerente da prestação, o peso de 1 e, à sua mãe, o peso de 0,7, pelo que a capitação dos rendimentos do agregado familiar é inferior ao valor de €419,22, dado que, considerando o aludido factor obtemos o rendimento mensal per capita de €406,14.

  5. – Mostram-se, pois, violados os artigos 18º, nº 1, 26º, nº 3, e 69º, nºs 1 e 2, da C.R.P., artigos 1º, 3º, nº 1, e 6º, nº 3, da Lei 75/98, de 19.11, artigo 3º, nº 1, als a) e b) do nº 2 do DL 164/99, de 13.5, e artigos 4º, 5º e 6º do DL 70/2010, de 16.06, entre outros.

O Ministério Público respondeu a estas alegações defendendo a falta de razão dos fundamentos do recurso e pugnando pela manutenção do julgado.

Após os vistos legais, cumpre decidir.

  1. Questões a decidir:As conclusões das alegações de recurso demandam desta Relação que decida as seguintes questões: i) Se está ou não verificada a condição de recursos.

    ii) No caso de não estar, se é inconstitucional a interpretação das normas que conduza a essa conclusão.

  2. Os factos:Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos (que se transcrevem na íntegra): 1 - O menor C… nasceu no dia 18-8-2000 e é filho de D… e de B….

    2 - Por acordo 27-11-2007, homologado por sentença transitada em julgado foi fixado, para além do mais, a residência do menor C… junto da mãe, e o progenitor ficava obrigado a pagar a quantia mensal de 50,00€, até ao dia 10 de cada mês, por meio de dinheiro, cheque ou vale postal, a título de pensão de alimentos para o menor e, bem assim, metade das despesas escolares e medicamentosas.

    3 - Sucede que o requerido terá pago no máximo seis prestações a título de alimentos, durante o ano de 2008, não mais tendo pago à requerente qualquer outra quantia; 4 - De acordo com a informação da Segurança Social o requerido não está associado a nenhuma entidade empregadora e não aufere quaisquer prestações, subsídios ou pensões; 5 - Do relatório Social resulta que o agregado familiar da progenitora é composto por 2 pessoas, das quais 1 criança, sendo o rendimento do agregado familiar de €649,64 de rendimentos do trabalho e €40,80 de prestações familiares, pelo que não reúne a progenitora condições para receber a prestação social em causa.

  3. O mérito do recurso[1]:A] Da condição de recursos: Nos termos do n.º 1 do artigo 1.º da Lei n.º 75/98, de 19 de Novembro, «quando a pessoa judicialmente obrigada a prestar alimentos a menor residente em território nacional não satisfizer as quantias em dívida pelas formas previstas no artigo 189.º do Decreto-Lei n.º 314/78, de 27 de Outubro, e o alimentado não tenha rendimento ilíquido superior ao valor do indexante dos apoios sociais (IAS) nem beneficie nessa medida de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre, o Estado assegura as prestações previstas na presente lei até ao início do efectivo cumprimento da obrigação.» Nos termos do n.º 1 do artigo 2.º da mesma Lei, «as prestações atribuídas nos termos da presente lei são fixadas pelo tribunal e não podem exceder, mensalmente, por cada devedor, o montante de 1 IAS, independentemente do número de filhos menores.» Acrescenta o n.º 2 da norma que «para a determinação do montante referido no número anterior, o tribunal atenderá à capacidade económica do agregado familiar, ao montante da prestação de alimentos fixada e às necessidades específicas do menor.» A Lei n.º 75/98, de 19.11, foi regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 164/99, de 13.05.

    O n.º 1 do artigo 3º deste diploma, na redacção proveniente da Lei n.º 64/2012, de 20.12, aplicável ao caso, estabelece que: «O Fundo assegura o pagamento das prestações de alimentos referidas no artigo anterior até ao início do efectivo cumprimento da obrigação quando: a) a pessoa judicialmente obrigada a prestar alimentos não satisfizer as quantias em dívida pelas formas previstas no artigo 189.º do Decreto-Lei n.º 314/78, de 27 de Outubro; e b) o menor não tenha rendimento ilíquido superior ao valor do indexante dos apoios sociais (IAS) nem beneficie nessa medida de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre.» O n.º 2 da citada norma acrescenta o seguinte: «entende-se que o alimentado não beneficia de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre, superiores ao valor do IAS, quando a capitação do rendimento do respectivo agregado familiar não seja superior àquele valor.» O n.º 3 dispõe que «o agregado familiar, os rendimentos a considerar e a capitação dos rendimentos, referidos no número anterior, são aferidos nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de Junho, alterado pela Lei n.º 15/2011, de 3 de maio, e pelos Decretos-Leis n.os 113/2011, de 29 de Novembro, e 133/2012, de 27 de Junho».

    O n.º 4 prescreve que «para efeitos da capitação do rendimento do agregado familiar do menor, considera-se como requerente o representante legal do menor ou a pessoa a cuja guarda este se encontre».

    E o n.º 5 estatui que «as prestações a que se refere o n.º 1 são fixadas pelo tribunal e não podem exceder, mensalmente, por cada devedor, o montante de 1 IAS, devendo aquele atender, na fixação deste montante, à capacidade económica do agregado familiar, ao montante da...

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