Acórdão nº 1118/15.0T8VLG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 1118/15.0T8VLG.P1 Sumário do acórdão:....................................................

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Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. Relatório Em 5.06.2015, D… intentou na Instância Local, Secção Cível (J2) de Valongo, na Comarca do Porto, ação declarativa sob a forma de processo comum, contra B…, S.A., alegando, em síntese: é proprietário do veículo de matrícula .. – GM - .. e quando circulava com o mesmo na A.., ocorreu um acidente devido a um embate num cão que se encontrava na via; em virtude do embate resultaram danos para o veículo, cuja reparação ascendeu a €4.831,19; sofreu ainda prejuízos resultantes da paralisação do veículo, que ascendem a €1.378,00.

Concluiu requerendo que a ação seja julgada procedente e, em consequência, a ré seja condenada a pagar ao autor, a quantia de €6.209,19 acrescida de juros legais contados desde a citação e até efetivo e integral pagamento.

Citada, veio a ré contestar, invocando, desde logo, a exceção de incompetência territorial, impugnando a factualidade relativa ao acidente e aos danos, por desconhecimento e alegando cumpriu todas as obrigações resultantes da sua qualidade de concessionária.

Na sua contestação, a ré requereu a intervenção principal provocada da Companhia de Seguros C… – Sucursal em Portugal, por ter transferido para a mesma a sua responsabilidade civil decorrente de sinistros da natureza do dos autos.

Por despacho de 10.09.2015 foi admitida a intervenção requerida.

Regularmente citada, veio a chamada C…, apresentar contestação invocando a exceção de incompetência do tribunal e impugnando por desconhecimento a factualidade alegada pelo autor.

Em 17.12.015 foi proferido despacho no qual se declarou a incompetência territorial da Instância Local de Valongo, determinando a remessa dos autos à Instância Cível do Tribunal Judicial da Maia, fixando ainda o valor da ação em €6.209,19.

Distribuído o processo na Instância Local, Secção Cível, J3, do Tribunal da Maia, Comarca do Porto, por despacho de 26.01.2016 foi determinada a notificação das partes para virem aos autos comunicar se se opunham a que fosse dispensada a realização da audiência prévia.

As partes manifestaram a sua concordância, tendo sido proferido despacho, em 17.03.2016, no qual: se manteve o valor da ação anteriormente fixado; se dispensou a realização da audiência prévia; se afirmou a verificação de todos os pressupostos processuais que permitem o conhecimento do mérito da ação; se definiu o objeto do litígio; e se enunciaram os temas de prova.

Realizou-se a audiência de julgamento em duas sessões (10.05.2017 e 24.05.2017), após o que foi proferida sentença, em 1.06.017, na qual se julgou improcedente a ação e se absolveu a ré de todos os pedidos formulados pelo autor.

Não se conformou o autor e interpôs recurso de apelação, apresentando alegações, findas as quais formulou as seguintes conclusões: 1. A sentença objecto do presente recurso merece censura pois, ao entender que a presunção de culpa que recai sobre a Ré não pode operar neste caso e, em consequência, ao julgar a presente ação improcedente por não provada, absolvendo a Ré, não fez adequada aplicação do Direito aos factos.

  1. A Sentença proferida pelo Tribunal a quo é juridicamente censurável e deve, porque em violação do disposto nos artigos 369º, 371º e 372º todos do Código Civil (doravante CC) e do artigo 12º, n.º1, b) e n.º2, da Lei n.º24/2007, de 18 de Julho, revogar-se da ordem jurídica e ser alterada por outra que condene a Ré no pedido contra ela deduzido nos presentes autos.

    1. DA IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO 3. O Recorrente considera que foi incorretamente julgado, ao ser dado como provado na Sentença recorrida, o facto n.º28.

  2. Nos autos existe prova gravada e, da audição desta, da motivação da Sentença dada à matéria de facto e dos documentos juntos aos autos, resultam, à evidência, os notórios erros de julgamento.

  3. Desde logo, o documento n.º 2 junto pelo Autor, com a sua petição, correspondente à cópia da participação policial do referido acidente, elaborada pelo Comando Territorial do Porto, da Guarda Nacional Republicana, impunha uma decisão diversa da recorrida.

  4. Do teor de tal documento decorre que o órgão de polícia criminal (GNR) – confirmou o local do acidente (KM .. da A..) - confirmou a causa do acidente (atropelamento de animal), - fez averiguações no local do acidente, tendo confirmado a existência de um animal morto na via esquerda e, ainda, - atestou que um funcionário da concessionária da via retirou o animal morto da via esquerda.

  5. Os factos constantes da participação policial ficaram, pois, plenamente provados, nos termos do art. 371º, n.º 1, do Código Civil, porque a Ré não logrou provar a sua falsidade.

  6. Conclui-se que ficou plenamente provado que a autoridade policial competente – a Brigada de Trânsito da G.N.R. – confirmou as causas do acidente no local, conforme decorre da cópia do auto de participação, pelo que o facto n.º28 não podia ter sido dado como provado 9. Assim, a prova documental autêntica constante dos autos, cuja falsidade não foi demonstrada pela Ré, implica que o facto n.º28 não podia ter sido dado como provado.

  7. O Autor declarou em audiência que um dos dois agentes da autoridade policial com quem falou na rotunda referida no facto provado n.º 27 se deslocou efetivamente ao local do embate e aí verificou as causas do acidente, designadamente o embate no cão que ficou morto na via.

  8. Nesse sentido, veja-se o depoimento constante da gravação áudio registada com o título D…, da audiência de 10.05.2017, entre os minutos 00:08:50 a 00:09:05 e os minutos 00:19:30 a 00:19:43, onde este atesta que a GNR foi ao local ver o cão, tendo ficado um agente junto do Autor, na rotunda onde este imobilizou a viatura em segurança, e o outro agente foi ao local confirmar que estava lá o animal.

  9. A testemunha E…, mãe do Autor que foi ao local passados cerca de 5 minutos depois do acidente, confirmou que dois agentes da GNR se deslocaram ao local de mota e que foram ao local do acidente e viram o cão morto na via.

  10. Neste sentido, veja-se o depoimento constante da gravação áudio registada com o título E… da audiência de 10.05.2017, entre os minutos 00:03:44 a 00:04:50 e os minutos 00:31:25 a 00:32:05, onde esta disse, perentoriamente, que dois agentes da GNR vieram de mota ao local, estiveram lá a tomar conta da ocorrência e depois foram ver o cão que ainda estava na via.

  11. Atenta a citada prova produzida, forçoso é, pois, concluir que: (i) dois agentes da GNR foram ter com o Autor ao local onde este imobilizou a viatura após o acidente, (ii) foram inspeccionar o local do acidente e (iii) viram o animal morto na via.

  12. O Tribunal a quo errou ao dar como provado o facto n.º 28, pois os elementos constantes dos autos implicam considerar tal facto como não provado.

  13. No entender do Recorrente, em face da supra citada prova produzida nos autos, deve ser dado como provado o seguinte facto: a autoridade policial esteve com o condutor do GM na rotunda referida no facto n.º 27 e confirmou que estava um animal morto na via onde ocorreu o sinistro, assim se alterando a decisão proferida pelo Tribunal de Primeira Instância sobre a matéria de facto, o que, assim, se requer a V. Exas..

    1. DA SUBSUNÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO ALTERADA AO DIREITO 17. Decorre da matéria fáctica provada, designadamente, e entre outros, dos factos provados n.º 1, 5, 6, 8, 9, 10 e 28 (alterado), que o artigo 12º da Lei 24/2007 se aplica aos presentes autos.

  14. Aplicando-se, como se aplica, o artigo 12º da Lei 24/2007 ao caso sub iudice, vale a presunção de culpa da concessionária, pelo que cabia à Ré o ónus de provar que cumpriu com todas as condições de segurança, ou seja, que cumpriu de forma cabal ou de modo a evitar o dano, ou, noutra formulação, de que não atuou com culpa.

  15. A Jurisprudência tem sido unânime em entender que nos acidentes ocorridos por força da entrada de animais na via, para ilidir a presunção de culpa prevista no artº 12º, nº 1 da Lei 24/07, a concessionária tem que provar as circunstâncias concretas que levaram à introdução do animal, donde resulte que essa introdução ocorreu por motivos que não lhe são imputáveis, sendo insuficiente a prova do cumprimento genérico das suas obrigações de vigilância e de conservação.

  16. Ou seja, o artigo 12º, n.º 1, a), da Lei 24/2007, de 18.7, deve ser interpretado no sentido de que no caso de acidentes provocados por objectos ou animais existentes nas faixas de rodagem das auto-estradas concessionadas presume-se a culpa das concessionárias, podendo estas ilidir essa presunção se lograrem provar que essa presença ocorreu por motivos que não lhe são imputáveis (na expressão da lei “prova do cumprimento das obrigações de segurança”).

  17. No caso em apreço, A Ré, aqui Recorrida, não logrou ilidir a presunção de culpa que para ela decorre do disposto no artigo 12º, nº 1, al. b) da Lei 24/07.

  18. Torna-se imprescindível provar que, no caso concreto, o cão surgiu na auto estrada de forma incontrolável para si ou que lá foi colocado, negligente ou intencionalmente, por outrem 23. No caso concreto, não se tendo provado a forma como o animal que provocou o acidente se introduziu na A.., conclui-se que a Ré não conseguiu provar que essa introdução não era por si controlável, não lhe sendo, por isso, imputável.

  19. Tendo o animal penetrado na via e embatido no veículo do A., já se conclui que, e conforme decorre da matéria de facto supra mencionada, muito embora tendo vigiado, o cumprimento deste dever ocorreu de forma imperfeita, pois o animal acedeu à via e não foi detectado pela Ré de forma a evitar o embate.

  20. Era dever da Ré manter a auto-estrada A.. livre de qualquer obstáculo, para o que lhe incumbia um especial dever de vigilância, o qual por ela foi violado ao ter permitido a entrada...

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