Acórdão nº 40/17.0GCOAZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelJOSE CARRETO
Data da Resolução09 de Maio de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Rec nº 40/17.0GCOAZ.P1 TRP 1ª Secção Criminal Acordam em conferência os juízes no Tribunal da Relação do Porto No Proc. C. C. nº 40/17.0GCOAZ do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro - Juízo Central Criminal de Santa Maria da Feira -Juiz 1 foi julgado o arguido B...

O MP, ao abrigo do disposto no artigo 82º-A do Código de Processo Penal, e do artº 21.°, nºs 1 e 2, da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro, deduziu pedido de reparação da vítima, peticionando a condenação do demandado/arguido a pagar àquela a quantia de 20.000,00 (vinte mil euros), ressarcido desse modo os danos de natureza não patrimonial por si sofridos.

Após julgamento por acórdão de 18/12/2017 foi proferida a seguinte decisão: “FACE AO EXPOSTO, julga-se a acusação pública parcialmente procedente e, por conseguinte, acorda o Tribunal Coletivo em:

  1. Absolver B... da prática do crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.°, n.os 1, alínea b), 2, 4 e 5, do Código Penal de que vinha acusado.

  2. Convolar o crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.°, n.os 1, alínea b), 2, 4 e 5 do Código Penal, imputado ao arguido num crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143.°, n.º 1, do Código Penal e, em consequência, condenar o arguido pela prática, em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143.°, n.º 1, do Código Penal, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de €5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos).

  3. Absolver B... da prática de um crime de violação, previsto e punido pelo artigo 164.°, n.º 1, alínea a), do Código Penal de que vinha acusado.

  4. Absolver B... da prática de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.°, n.º 1, 155.°, n.º 1, alínea a), com referência ao artigo 131.°, todos do Código Penal de que vinha acusado. INSTÂNCIA CÍVEL e) Julgar improcedente o pedido de reparação da vítima deduzido, absolvendo o demando do mesmo.

    * Em face do que acima se decide: Declaram-se cessadas as medidas de coacção impostas ao arguido [artigo 35.°, nº5 da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro e artigo 214.°, n01, al. d) do CPP] com exceção do TIR.

    Dê conhecimento à DGRSP - equipa de vigilância electrónica.

    Condena-se o arguido nas custas processuais relativas à parte criminal, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC [cfr. artigos 513.° n.º 1 e 514.° n.º 1, todos do Código de Processo Penal e artigo 8.°, n.05 e tabela III do Regulamento das Custas Processuais.

    Sem custas cíveis, atenta a isenção subjetiva do MP.

    * Após trânsito: • Remeta boletim ao Registo Criminal - artigo 6.°, n." 1, alínea a), da Lei n." 37/2015, de 05 de Maio.

    • Comunique à SGMAI, para efeitos de registo e tratamento de dados de acordo com o que dispõe o artigo 37.°, nº1 e com as limitações do nº2, da Lei 112/2009, de 16/9 [com as alterações introduzidas pela Lei nº 129/2015, de 03/09].

    Recorre o Mº Pº o qual no final da sua motivação apresenta as seguintes conclusões: 1) Vem o presente recurso interposto do acórdão proferido nos autos, no qual o Coletivo de Juízes “a quo” na parte em que decidiu absolver o arguido B... da prática do crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152º, n.ºs 1, al. b), 2, 4 e 5, co Código Penal; convolar o referido crime num crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143º, n.º1, do Código Penal, na pena de 80 dias de multa, à taxa diária de €5,50; e, julgar improcedente o pedido de reparação da vítima deduzido, absolvendo o demandado do mesmo.

    2) Salvo devido respeito por opinião contrária, não podemos concordar com a posição adotada pelo Coletivo de Juízes uma vez que, em nosso entender, in casu, os factos dados como provados no douto Acórdão preenchem o tipo objetivo e subjetivo do crime de violência doméstica.

    3) No que se reporta ao tipo objetivo e ao agente do crime, temos que resulta dos factos provados que: “O arguido B... e a ofendida C... mantiveram uma relação de namoro entre maio e agosto de 2015 e viveram como se de marido e mulher se tratassem, em comunhão de cama, mesa e habitação, entre agosto de 2015 e novembro de 2015, sendo que mantiveram, após a cessação da coabitação, relação de namoro, com frequentes visitas do arguido a casa da/ ofendida, durante as quais mantiveram relações sexuais. Durante o período da coabitação, fixaram residência na Rua ..., n.º ..., Oliveira de Azeméis e, posteriormente, na Rua ..., n.º ..., ..., ..., Oliveira de Azeméis e na Rua ..., n.º ..., ..., ..., Oliveira de Azeméis.” 4) O arguido B... manteve com a vítima uma relação análoga à dos cônjuges, relação íntima existente de facto durante o período dos factos, pelo que o arguido integra o conceito de agente do referido crime.

    5) Conforme resulta dos factos provados o arguido, de forma reiterada, no interior da residência, na presença da filha de C..., dirigiu a esta insultos, “Sua puta, sua ordinária, sua vaca, sua cabra! Tu não vais ser de mais ninguém!, “És uma vaca, és uma puta! Não és para mim, não és para mais ninguém! Eu mato-te!” e “És uma puta, és uma vaca, andas com todos, és uma boieira, eu mato-te, sua puta! Se não fores minha não vais ser de mais ninguém!” e, no dia 5 de março de 2017, pelas 14.30 h, no exterior da residência da ofendida, sita na Rua ..., n.º ..., ..., ..., Oliveira de Azeméis, o arguido dirigiu àquela as seguintes expressões “És sempre a mesma merda, já fazes de propósito para te esqueceres da carteira, sabias que eu não tinha gasóleo! És uma puta, és uma vaca! E “Vai-te foder minha puta do caralho!”, factos dados como provados e que integram uma reiteração de maus tratos psíquicos verbais dirigidos à ofendida de forma reiterada, durante todo o período da relação e que inequivocamente prejudicam o bem estar psicológico da mesma.

    6) Mais resulta dos factos provados que o arguido durante todo o relacionamento infligiu à ofendida maus tratos físicos, “em quantidades não concretamente apuradas mas por mais do que uma vez, inclusive no interior da residência da ofendida e na presença da filha D..., o arguido desferiu no corpo da ofendida bofetadas e empurrões, projetando-a contra o chão e as paredes” e no dia 5 de março de 2017, pelas 14.30 h, no exterior da residência da ofendida, sita na Rua ..., n.º ..., ..., ..., Oliveira de Azeméis, “agarrou a ofendida e desferiu-lhe três bofetadas na zona dos olhos, dizendo em seguida: “Eu mato-te!”, provocando-lhe lesões “dores faciais, com a mímica facial; na face, equimose arroxeada peri-orbicular, bilateral, lesões que lhe determinaram, como consequência direta e necessária, quatro dias para a cura, sendo um dia com afetação da capacidade de trabalho geral e quatro dias com afetação da capacidade de trabalho profissional”.

    7) As condutas descritas preenchem inequivocamente o tipo objetivo do crime de violência doméstica.

    8) Quanto ao elemento subjetivo resultou provado que o arguido conhecia a relação especial que mantinha com a vítima e agiu com dolo direto tendo com o seu comportamento reiterado o propósito de molestar física e psicologicamente a ofendida: “Sabia o arguido que com a sua descrita conduta lesava a sua companheira e namorada na saúde física e mental, como efetivamente lesou, diminuindo-a, como mulher, na sua autoestima, que prejudicava a sua liberdade de ação, lesando a sua integridade física, e ainda que atacava a sua dignidade como pessoa, mulher e mãe, e que perturbava o seu bem-estar no lar, espaço que deveria estar associado a sentimentos de segurança e harmonia, como efetivamente veio a suceder, não se coibindo de adotar tais comportamentos na residência da vítima e na presença da filha menor da mesma. O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo serem as suas condutas proibidas e punidas por lei”.

    9) Pelo que os factos provados preenchem o tipo legal de crime de violência doméstica, quer quanto aos elementos objetivos do tipo, quer quanto aos elementos subjetivos do tipo.

    10) Verifica-se igualmente a qualificativa prevista no artigo 152º, n.º2, do Código Penal, porquanto dos factos provados resulta que grande parte dos factos foram praticados na residência comum ou da vítima e na presença da filha da vítima ainda menor.

    11) No nosso entendimento não resulta dos factos provados qualquer reciprocidade adequada a afastar o preenchimento do tipo legal de crime de violência doméstica.

    12) Não resulta dos factos provados que a ofendida tenha insultado ou agredido o arguido nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar em que foi agredida e insultada pelo mesmo, mas apenas que desde o início do relacionamento também o insultou e o ameaçou. Tal, afasta qualquer reciprocidade ou, pelo menos, a mesma não resulta provada.

    13) A reciprocidade pressupunha agressões e insultos recíprocos, isto é, no mesmo tempo, lugar e contexto, o que claramente não é o que resulta dos factos provados.

    14) Mais se refira que não resulta dos factos provados e dos não provados que as agressões e insultos proferidos pela vítima mais não foram de que uma reação ao comportamento reiterado por parte do arguido de infligir maus tratos físicos e psíquicos à C.... Porque se foram em reação ao comportamento maltratante do arguido também não seriam adequados a afastar o preenchimento do crime de violência doméstica por parte do arguido, mesmo seguindo o entendimento do Tribunal.

    15) Por conseguinte, e ao contrário da posição assumida pelo Coletivo de Juízes, entendemos que o comportamento do arguido descrito nos pontos 1 a 13 dos factos provados integra a prática, pelo mesmo, em autoria material, de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152º, n.ºs 1, al. b) e 2 do Código Penal, com pena de dois a cinco anos de prisão.

    16) Quanto à pena afigura-se-nos apresentar-se como adequada e justa a aplicação ao arguido duma pena de prisão não inferior a 3 anos, que deverá ser suspensa na sua execução por idêntico período.

    17) Estão verificados os pressupostos para ser arbitrada à...

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