Acórdão nº 1123/09.6JACBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 06 de Abril de 2011

Magistrado ResponsávelALICE SANTOS
Data da Resolução06 de Abril de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra.

No processo Comum Colectivo, supra identificado, após a realização de audiência de discussão e julgamento foi proferido acórdão que: 1. Julgou parcialmente provada e procedente a acusação deduzida nos autos contra o arguido SS..., e, consequentemente: a) condenou o mesmo, como autor material de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos Arts. 131º e 132º, nºs 1 e 2 alínea i) do Código Penal, na pena de 18 ( dezoito ) anos de prisão.

  1. Julgou parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido nos autos contra o mencionado arguido pela demandante FF..

    , e, consequentemente: a) Condenou o arguido a pagar à mencionada demandante a título de danos patrimoniais o montante de € 1.559,50 ( mil, quinhentos e cinquenta e nove euros e cinquenta cêntimos ) e a título de danos não patrimoniais o montante de € 65.000,00 ( sessenta e cinco mil euros ), quantias essas acrescidas de juros moratórios desde a data da notificação de tal pedido de indemnização sobre o primeiro dos mencionados montantes e apenas a partir da presente decisão sobre o segundo de tais montantes, até integral pagamento e à taxa de 4%.

    Inconformado com esta decisão, dela interpôs recurso a assistente FF… e o arguido, SS... que nas respectivas motivações concluíram: FF… 1 - A Assistente discorda da medida concreta da pena aplicada, reputando--a branda face à materialidade provada, pelo que em concreto deveria ter sido aplicada uma pena de prisão nunca inferior a 22 anos.

    2 - A pena de 18 anos de prisão que o Tribunal a quo fez corresponder ao crime praticado, na forma qualificada, é por demais reduzida em face da premente necessidade das finalidades de prevenção, maxime geral, pelo que se impunha assim um aumento no quantum da pena concretamente aplicada.

    3 - O Tribunal a quo deu como não provado que o Arguido adquiriu a marreta dos Autos com a finalidade de tirar a vida à falecida JC..., o que decidiu na altura em que o fez, por não admitir que esta colocasse fim na relação amorosa entre ambos, apesar de o Arguido não ter logrado convencer o Tribunal que a compra da marreta se justificaria devido a ameaças de que supostamente estaria a ser vítima em virtude de um episódio ocorrido em meados de Outubro de 2009 na discoteca W..., em ....

    4 - A Assistente concorda inteiramente da análise e interpretação dos factos que, conjugados com as regras comuns da experiência, levaram à formação da convicção do Tribunal naquele particular.

    5 - A Assistente concorda com a conclusão que o Tribunal extraiu das declarações do Arguido prestadas em julgamento, bem como das prestadas por este 2 ou 3 dias após a prática do crime perante o Juiz de Instrução Criminal; as quais constam do Auto de primeiro interrogatório a fls. 124-152 e a cuja leitura se procedeu ao abrigo do disposto na alínea b) do nº' 2 do artigo 357° do CPP na 1ª Sessão de Julgamento, conforme Acta de 02-09-2010, 6 - Conforme considerou o Tribunal em relação ao primeiro interrogatório judicial de arguido detido, ..

    esse momento é aquele em que alguém detido nas circunstâncias do Arguido com mais facilidade esgrime perante o Juiz que o interroga todos os argumentos susceptíveis de atenuar a sua responsabilidade.

    ou de pelo menos permitir compreender ao Juiz a sua actuação ".

    7 - No caso concreto, o Arguido não apresentou perante aquele Juiz de Instrução qualquer motivo que o levasse a comprar a dita marreta.

    8 - De igual modo, o Arguido também não invocou naquele momento as alegadas agressões (empurrões) na discoteca W..., nem tão-pouco as supostas ameaças de que hipoteticamente fora vítima, não tendo sequer verbalizado ou descrito o teor das mesmas perante o Juiz de Instrução Criminal nem em sede de Julgamento.

    9 - Entende a Assistente que o Tribunal não analisou criteriosamente o depoimento da testemunha TS... - pai do Arguido - quanto a esta matéria, o qual está em contradição com toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento, tendo por conseguinte errado na sua valoração.

    10 - Atenta a delimitação temporal e espacial do depoimento desta testemunha, é evidente que o mesmo resulta disforme aos factos que o Tribunal usou para formar a sua convicção.

    11 - Pelo que haveria que concluir pela inverosimilidade de tal depoimento, pois esta testemunha nunca poderia ter visto a marreta dos Autos em ZZ..., porquanto o Arguido não esteve ali no período em causa.

    tendo ficado em ..., como aliás resulta da prova produzida em sede de julgamento bem como da confissão do Arguido vertida no Auto do primeiro interrogatório.

    12 - Esta testemunha, pai do Arguido, apenas se preocupou em aventar factos que suportassem objectivamente a hipótese de defesa que o Arguido delineou.

    13 - Bastaria o simples confronto do depoimento desta testemunha com a factualidade acima referida para que o Tribunal constatasse que, através do mesmo, esta testemunha nada mais pretendesse que justificar o comportamento do Arguido, por um lado e ajudá-lo, por outro, pelo que deveria ter concluído pela óbvia falta de credibilidade de tal depoimento neste particular.

    14 - Entende a Assistente que o Tribunal, ao dar tal como não provada a ocorrência do alegado confronto na discoteca W... - com as hipotéticas ameaças daí decorrentes - deveria ter retirado desse facto outras ilações essenciais à descoberta da verdade e com peso para a opção pela qualificação da conduta criminosa do arguido.

    15 - O Tribunal, embora infirmando a tese do Arguido de que havia sido ameaçado, não ponderou toda a factualidade resultante dos depoimentos das testemunhas IM... e VV..., as quais depuseram na sessão de 29-09-2010 e CC… que depôs na sessão de 22-10-2010.

    16 - Depoimentos estes dos quais resulta categoricamente que o Arguido D..., a falecida JC..., a IM...e as amigas estiveram no W... cerca de um mês antes da pratica do crime, ou seja em meados de Outubro de 2009, factualidade aliás confirmada pelo próprio depoimento do Arguido.

    17- O Tribunal limitou-se a dar como não provadas as alegadas agressões e ameaças, não tendo contudo considerado, fixado e analisado o enquadramento temporal daquelas, factor que se reverte de crucial importância para a formação da convicção e ulterior juízo de qualificação da conduta criminosa do Arguido 18 - Entende a Assistente que esta matéria - atinente ao "quando" das supostas agressões e ameaças - deverá constar dos factos provados, porquanto releva para a análise da conduta anterior do Arguido à pratica do crime, fazendo cair por terra qualquer duvida que ainda persistisse no espírito do Tribunal quanto à premeditação.

    19 - Não se poderá deixar de concluir, à luz das regras da experiência, que quem supostamente é ameaçado em meados de Outubro de 2009 nunca vai comprar uma marreta para se defender só volvido quase um mês, ou seja, em 6 de Novembro de 2009!!! 20 - O mais lógico é sim concluir que se esta compra foi feita apenas uma semana antes dos factos criminosos dos Autos e numa altura em que o Arguido e a falecida se encontravam zangados, é porque a mesma foi feita já com o fito de perpetrar o crime e não como instrumento de defesa, 21 - Pelo que a defesa arquitectada pelo Arguido não tem a menor consistência à luz da verdade factual.

    22 - Ficou também demonstrado que o Arguido sabia que a sua relação com a vítima estava em perfeita deterioração, sendo perfeitamente concebível que o Arguido representasse como possível o fim daquela relação amorosa após a vítima ingressar no Ensino Superior, pois conforme também se sabe, a vítima dizia às amigas e à Assistente que o Arguido "não a deixava respirar" e "a sufocava ", facto confirmado pela Assistente, a qual asseverou que "desde que a sua filha tinha entrado nesse ano para a Universidade a mesma se queixava de que o Arguido a controlava e que a não deixava respirar com os amigos ", conforme resulta de fls. 16 do Acórdão dos Autos.

    23 - Esta factualidade resulta ainda dos depoimentos das testemunhas DD... e NS..., ambas colegas de curso da vitima que atestaram respectivamente que "a JC... andava mais triste do que o habitual" e que "a JC... lhe disse que estava decidida a acabar o namoro com o arguido porque as coisas entre eles não estavam a funcionar" (sic), depoimentos estes que foram acolhidos pelo Tribunal na fundamentação da matéria de facto.

    24 - Na Sexta-Feira, dia 13 de Novembro de 2009, ocorreu uma discussão entre a JC... e o Arguido na casa deste, "onde ambos pernoitavam todas as sextas-feiras ( ... ) como costumava acontecer, e que tivessem ficado zangados até ao dia em que os factos aconteceram ". (cfr.

    confissão do arguido transcrita na fundamentação do Tribunal a fls. 12 do Acórdão) 25 - Neste segmento veja-se ainda e também o depoimento da Assistente FF…, a qual referiu que no dia 15 de Novembro a filha lhe referiu "que tinha terminado tudo com o Arguido, facto que o Tribunal também analisou. (cfr. fls. 15 do Acórdão) 26 - Não poderia o Tribunal ter deixado de admitir e concluir que havia um propósito firme da vítima em terminar a relação com o Arguido pelo menos em 13/11/09, data do corte da relação por parte da JC..., e que o Arguido tinha plena consciência de tal facto.

    27 - Ao invés, entendeu o Tribunal que tal não seria um propósito final, uma vez que existiam contactos telefónicos escritos (SMS) havidos posteriormente àquela data, ou seja, em 16 e 17 de Novembro de 2009, os quais - e realce-se - são promovidos unicamente pelo Arguido, inexistindo neles qualquer propósito manifestado pela vítima em encetar uma qualquer reconciliação.

    28 - O teor dos mesmos - documentados a fls. 257 a 279 dos Autos - aponta para uma rejeição sucessiva da vítima às "investidas" do Arguido, em face das quais este induziu a vítima a encontrar-se pessoalmente com ele, o que viria a culminar com o infeliz episódio dos Autos.

    29 - Ao contrário do que considerou o Tribunal, não resulta nenhum elemento nos Autos que permita concluir que uma reconciliação entre Arguido e vítima se...

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